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13.

2 Sintomas intradialíticos
Esta sessão trata dos seguintes tópicos:
 Hipotensão intradialítica.
 Síndrome de desequilíbrio.
 Perturbações hidro-electróliticas.
 Reacções de hipersensibilidade.

13.3 Sintomas intradialíticos


Os sintomas intradialíticos são sintomas que o doente experimenta durante a sessão de diálise. Duas das alterações
que podem ocorrer na diálise são a hipotensão sintomática e os desequilíbrios hidro-electrolíticos. A sua etiologia
é provavelmente multifactorial e os sintomas que causam podem ser variados.

13.4 Hipotensão
A hipotensão pode ser atribuída a um acentuado aumento do peso interdialítico e às elevadas velocidades de
ultrafiltração daí resultantes, que são necessárias para a remoção desse excesso de líquido. Para alguns doentes, até
a remoção de pequenos volumes de líquido é susceptível de causar hipotensão. Isso pode dever-se a uma avaliação
incorrecta do peso seco. Outros factores possivelmente envolvidos incluem a anemia, a diminuição do cálcio
ionizado ou potássio no soro, uma função cardíaca anormal, anomalias da “compliance” venosa e do tónus venoso,
o aumento da temperatura do corpo, a neuropatia autonómica, terapêuticas antihipertensivas e síntese e/ou
libertação anormal de substâncias vasoactivas (Hegbrant 1995).

13.5 Possibilidade de ocorrência de sintomas


Podem ocorrer sintomas como consequência da necessidade de administrar uma diálise adequada num curto
espaço de tempo, utilizando elevados débitos de sangue e dialisadores com uma grande superfície. Daí resulta uma
diminuição rápida da osmolalidade plasmática e em alguns doentes um síndrome de desequilíbrio. A instabilidade
cardiovascular é um problema durante a diálise: comorbilidades como a diabetes, a doença cardiovascular e o
envelhecimento contribuem para sintomas intradialíticos/instabilidade. É importante compreender porque é que os
sintomas ocorrem de modo a poderem ser tratados da forma mais apropriada.

13.6 Diálise
Os objectivos da diálise consistem em substituir as funções excretoras do rim:
 Remover o excesso de líquido.
 Corrigir desequilíbrios electrolíticos.
 Corrigir desequilíbrios ácido-base.
 Remover produtos residuais.
Podem ocorrer sintomas como resultado directo da necessidade de remover solutos e líquido simultaneamente
durante a diálise. Os sintomas também surgem em consequência de alterações rápidas do equilíbrio electrolítico ou
ácido-base.

13.7 Percentagem de água no corpo humano


Ao considerar as causas prováveis dos sintomas intradialíticos é importante lembrar alguns princípios fisiológicos
básicos sobre o conteúdo de água corporal total e a sua distribuição. Uma quantidade substancial do peso corporal
é água. A quantidade real varia consoante o sexo, a idade e a quantidade de tecido adiposo. Um homem de meia-
idade com um peso corporal médio terá aproximadamente 60% do seu peso corporal em água. Nos doentes
hemodialisados, a água corporal total (ACP) pode variar alguns litros durante o período interdialítico.

13.8 Distribuição da água corporal total


Vendo a distribuição da água corporal total pode concluir-se que a maioria, 2/3 (40% do peso corporal), está
contida no interior das células. O 1/3 restante encontra-se no espaço extracelular. Do 1/3 de água corporal total
existentes no espaço extracelular, 75% estão no compartimento intersticial e os restantes 25% no compartimento

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intravascular. Esta distribuição compartimental mantém-se notoriamente estável mesmo na doença renal crónica
(DRC) estádio 5. Durante a diálise só se consegue ter acesso directo ao compartimento intravascular – aos 5% de
água corporal total nele contidos; isto constitui o maior desafio durante a diálise, visto que é a água corporal total
que necessita de ser tratada.

13.9 Peso seco


Uma das razões pelas quais um doente apresenta sintomas durante a diálise é o facto de o seu peso seco estar
incorrecto. Como referimos na sessão 6, a estimativa do peso seco é difícil e envolve muitas observações. Um peso
seco subestimado pode causar problemas, com episódios agudos de hipotensão sintomática em resposta à
ultrafiltração.
Embora o peso seco do doente se possa manter razoavelmente constante, também pode variar dependendo de uma
série de factores, nomeadamente do estado de saúde geral, do estado nutricional e de variações sazonais da
quantidade de tecido adiposo. É importante observar o doente quanto a sinais de sub e sobrehidratação. Uma
remoção de líquido excessiva em relação ao peso seco efectivo do doente causa hipotensão. Quando um doente
exibe sintomas, o peso seco deve sempre ser reavaliado.

13.10 Mecanismos de transporte na diálise


Os processos de transporte que utilizamos para remover os solutos e o líquido durante o tratamento podem ter um
efeito adverso na tolerância ao tratamento:
 Remoção de líquido por ultrafiltração - ocorrem sintomas durante a diálise devido à remoção de excesso de
líquido quando a ultrafiltração excede a velocidade de reposição do plasma.
 Remoção de solutos por difusão - ocorrem sintomas em consequência da remoção simultânea de produtos
residuais e excesso de líquido durante a diálise.

13.11 Equilíbrio
Para compreendermos como as complicações se desenvolvem durante a diálise temos de considerar os diferentes
compartimentos do corpo: nesta figura e em algumas das figuras seguintes, a área verde representa o líquido de
diálise. As áreas vermelha e amarela designam compartimentos diferentes, conforme estejamos a pensar na
remoção de líquido ou de solutos.

Para a remoção de líquido, a área vermelha representa o compartimento intravascular e a amarela o compartimento
intersticial. Assim, as membranas apresentadas são a membrana de diálise e a parede vascular.

Para a remoção de solutos, a área vermelha representa os compartimentos intersticial e intravascular combinados,
isto é, o espaço extracelular, e a amarela o compartimento intracelular. Assim, as membranas apresentadas são a
membrana de diálise e a membrana celular.

As duas figuras mostram uma situação de equilíbrio, a situação em que os compartimentos do corpo estariam no
início da diálise.

13.12 Ultrafiltração assintomática


Uma importante causa de hipotensão é a diminuição do volume de sangue causada pela ultrafiltração (Petitclerc,
1995). As alterações do volume de sangue durante a diálise ocorrem como resultado de dois fenómenos
antagónicos: primeiro, uma redução do volume de sangue por ultrafiltração e, segundo, uma reposição do volume
de sangue pelo líquido do espaço intersticial: reposição do plasma. Durante a ultrafiltração assintomática a
reposição do plasma não é excedida pela UF. Por outras palavras, quando o líquido é removido do compartimento
extracelular através da membrana de diálise é substituído pelo líquido do compartimento intersticial.

13.13 Hipotensão intradialítica


A hipotensão intradialítica (HI) ocorre quando a velocidade de ultrafiltração é superior à velocidade de reposição
do plasma, resultando numa hipovolemia. Isto pode ocorrer quando o excesso de líquido ainda está presente no
corpo, devido ao facto de o líquido não passar pela parede vascular com a rapidez com que é removido através da
membrana de diálise.

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13.14 Podem ocorrer desequilíbrios
A diminuição da reposição do plasma pode verificar-se devido a uma baixa pressão oncótica, especialmente nos
casos de malnutrição (nível baixo de albumina sérica), ou a uma diminuição da resistência periférica quando o
doente tem problemas cardiovasculares. Mesmo a baixas velocidades de ultrafiltração, o volume em circulação
pode diminuir e o doente ficar hipotenso. Conseguir uma ultrafiltração adequada nestes doentes pode ser difícil.

13.15 Hipotensão intradialítica versus taxa de ultrafiltração


À medida que a taxa de UF aumenta, a incidência de hipotensão intradialítica também é maior. A resposta dos
doentes a um aumento da velocidade de UF é individual e normalmente existe para cada doente um ponto acima
do qual desencadeiam hipotensão intradialítica. Regra geral, aumentos de peso interdialíticos > 3% de peso
corporal predispõem para hipotensão intradialítica.

13.16 Sintomas dos doentes - ligeiros


Alguns dos sintomas que os doentes referem quando estão em diálise incluem:
 Desconforto abdominal.
 Insónia/bocejos.
 Diminuição do fluxo do acesso, especialmente com a fístula AV.
 Diminuição de concentração.
 Visão turva/tonturas.
 Sensação de calor/sudorese.
 Desconforto/agitação.
Se se observar qualquer um destes sintomas ou uma mistura dos mesmos, a hipotensão intradialítica deve ser
considerada como a causa provável e o doente deve ser devidamente tratado. Se os sinais forem identificados
numa fase inicial, podem ser tratados antes de a pressão arterial descer significativamente.

13.17 Tratamento de sintomas ligeiros


Se a pressão arterial do doente for baixa mas este se apresentar apenas ligeiramente sintomático, o tratamento deve
consistir em:
 Suspender a ultrafiltração até os sintomas melhorarem.
 Deitar o doente e levantar-lhe os pés, para ajudar a melhorar o retorno venoso ao coração e fazer subir a
pressão arterial.
 Avaliar frequentemente a pressão arterial do doente.
Suspendendo a UF e deitando o doente, a pressão arterial sobe em muitos casos. Este processo pode levar alguns
minutos, dado que a reposição do plasma se faz gradualmente.

13.18 Tratamento da hipotensão grave


Se a hipotensão for mais acentuada e os sintomas do doente forem mais graves, administre cloreto de sódio
fisiológico a 0,9% IV. A concentração do cloreto de sódio fisiológico é de 154mEq/L de sódio e cloreto. Isto ajuda
a restabelecer o volume circulatório e também fornece mais sódio que, por sua vez, aumenta a reposição de
plasma. Porém, é importante lembrar que o líquido e o sódio adicionais podem não ser totalmente removidos
durante o resto da diálise e, portanto, contribuir para o aumento do peso interdialítico.

13.19 Avaliar peso seco


Depois de um episódio de hipotensão, o peso seco do doente deve ser sempre avaliado. Se parecer satisfatório,
pode tornar-se necessário considerar outras estratégias para facilitar a remoção de líquido em futuros tratamentos.

13.20 Restringir a ingestão de alimentos durante o tratamento


Uma outra intervenção preventiva a considerar é restringir a ingestão de alimentos pelo doente durante a diálise.
Quando o doente ingere alimentos, o sangue é desviado para o sistema gastrointestinal a fim de intervir na digestão
e na absorção de nutrientes (Daugirdas, JT, 2001). Isto reduz a circulação periférica e pode provocar uma redução
da pressão arterial. Nesses casos, é aconselhável desencorajar o doente de ingerir alimentos enquanto está em
diálise.

Interacção:
Atendendo a que o bem-estar psicológico e a boa nutrição são muito importantes, o que é que podemos fazer para
aliviar a fome/melhorar a nutrição destes doentes, enquanto estiverem na clínica?

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13.21 Em alguns casos
Em certos casos, os sintomas podem ser mais graves ou o doente pode não responder às intervenções de primeira
linha. Por isso, é possível que o tratamento subsequente seja mais complexo. Nesses casos, o doente pode
desenvolver um síndrome de desequilíbrio. Este é normalmente causado por uma diminuição da osmolalidade
plasmática devido à remoção rápida dos solutos.

13.22 Remoção difusiva dos solutos


Para compreendermos a remoção dos solutos, o espaço intravascular e o espaço intersticial podem ser
considerados como um compartimento dado que o movimento dos solutos entre eles é normalmente rápido. O
movimento dos solutos através da membrana de diálise e da membrana celular deve ser considerado como a causa
de desequilíbrios. Durante a remoção difusiva assintomática dos solutos, os solutos permeáveis à membrana são
removidos do espaço intersticial, verificando-se um movimento correspondente de solutos do espaço intracelular
para o espaço intersticial. Assim, entre os vários compartimentos do corpo mantém-se um equilíbrio do nível de
soluto.

13.23 Osmose
Antes de pensar no que acontece quando a remoção de solutos causa sintomas, devemos considerar o princípio de
transporte da osmose. Embora na HD a osmose não seja um princípio de transporte, tem um papel importante na
distribuição da água corporal total durante a diálise. Todos os solutos intervêm na osmose. À medida que os níveis
de solutos se alternam entre os diferentes compartimentos, estabelecem-se gradientes osmóticos. Quando os níveis
de solutos variam, ocorre o movimento do líquido por osmose, com a passagem do líquido de um compartimento
para o outro para tentar manter um estado de equilíbrio.

13.24 Síndrome de desequilíbrio


Quando a remoção difusiva dos solutos é demasiado eficiente, verifica-se um movimento rápido destes a partir do
espaço extracelular. A membrana celular forma uma barreira através da qual os solutos não conseguem mover-se à
mesma velocidade. Assim, constata-se um desequilíbrio entre a quantidade de solutos existente no compartimento
intracelular e no compartimento extracelular. Este desequilíbrio impele o líquido do compartimento extracelular
para o compartimento intracelular por osmose. É o síndrome de desequilíbrio.

13.25 Sintomas dos doentes: mais graves


O síndrome de desequilíbrio provoca frequentemente sintomas diferentes e, às vezes, mais graves do que quando
se verifica uma diminuição do volume em circulação devido a um défice de reposição do plasma. Os sintomas que
podem ocorrer são:
 Náuseas/vómitos.
 Cãibras.
 Cefaleias.
 Hipotensão grave.
Nos casos mais graves:
 Lipotímia.
 Convulsões.
 Perda de consciência.
 Paragem cardio-respiratória.

13.26 Tratamento de primeira linha para os sintomas graves


Todas estas acções devem ser realizadas o mais rapidamente possível:
 UF mínima.
 Posição de Trendelenburg.
 Infusão salina.
A pressão arterial deve ser monitorizada para assegurar a eficácia das acções realizadas.

13.27 Intervenções de primeira linha no caso de sintomas graves


O resultado possível destas intervenções combinadas é a pressão arterial responder e os sintomas diminuírem de
intensidade. Se isso acontecer, o objectivo da UF para o resto do tratamento deve ser revisto. Também é possível
que a pressão arterial responda inicialmente mas não possa ser mantida ou não haja resposta ou apenas uma
resposta mínima ao tratamento inicial.

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13.28 Soluções hiperosmolares IV para sintomas graves
Se os sintomas não regredirem, pense em alternativas ao cloreto de sódio a 0,9% IV:
 Cloreto de sódio hipertónico.
 Glucose a 10%, 20% ou 30%.
 Expansores plasmáticos.
Estes fármacos são todos de natureza hiperosmolar e podem ser úteis especialmente se se suspeitar de síndrome de
desequilíbrio.

13.29 Soluções hiperosmolares IV


Ao se administrar soluções hiperosmolares estamos a administrar soluto osmoticamente activo no espaço
intravascular. O objectivo é restabelecer a concentração de soluto no líquido extracelular e ajudar a restabelecer o
seu volume, promovendo o movimento do líquido para o exterior das células. Nette R et al (2002) compararam o
efeito da solução salina a 0,9%, do cloreto de sódio a 3%, da glucose 5%, da glucose 20% e do manitol 20% no
volume de sangue relativo durante a hemodiálise. Verificaram que a glucose 20% causou um aumento maior do
volume de sangue relativo do que iguais volumes das outras soluções, incluindo o manitol, que tem a mesma
osmolalidade. Embora pareça que a glucose 20% tem um efeito benéfico no volume de sangue, nenhum estudo
clínico demonstrou o benefício da sua utilização no tratamento do síndrome de desequilíbrio e da hipotensão.

13.30 Cloreto de sódio hipertónico IV


É importante considerar o efeito da utilização de cloreto de sódio hipertónico 3-10% IV. Quando é administrado
durante a diálise verifica-se:
 Aumento da carga de sódio durante a diálise.
 Aumento da sensação de sede.
 Aumento da ingestão de líquidos.
 Maior aumento de peso interdialítico.

13.31 Após a administração de soluções hiperosmolares


Lembre-se de que, quando estas soluções são utilizadas ou quando são administrados mais de 300 ml de solução
salina, é necessário registar o incidente.

13.32 Revisão / avaliação da prescrição de diálise


Depois da ocorrência de um incidente desta natureza é importante rever o peso seco do doente. Se se suspeitar de
desequilíbrio também pode ser necessário rever a prescrição de diálise, especialmente a “clearance” pretendida
em ml/min. Podem igualmente ser consideradas outras intervenções.

13.33 Estratégias gerais


As estratégias gerais que podem ser consideradas se os doentes apresentarem sintomas intradialíticos incluem:
 Utilização do dialisante a baixa temperatura - necessita de monitorização/consideração especial dado que a
sensação de frio, os arrepios ou o uso de muitos cobertores podem contrariar os benefícios desejados.
 Utilização da UF isoladamente - pode ser eficaz mas aumenta o tempo total do tratamento de diálise.
 Alteração da composição do dialisante - há muitos aspectos a considerar, embora o habitual para a
hipotensão sintomática ou para o síndrome de desequilíbrio seja alterar o teor de sódio.

13.34 Composição do dialisante


A composição do dialisante pode aliviar os sintomas intradialíticos ou causá-los ao criar desequilíbrios dos
electrólitos ou ácido-base. Durante a próxima parte desta sessão, vamos abordar os elementos constituintes do
dialisante:
 Sódio.
 Glucose.
 Potássio.
 Cálcio.
 Bicarbonato.

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+
13.35 Sódio (Na )
Sódio:
 É o principal ião extracelular.
 Mantém o volume extracelular.
O nível de sódio no líquido extracelular e no líquido de diálise influenciam a tolerância do doente ao tratamento e
podem agravar ou atenuar os sintomas de síndrome de desequilíbrio.

13.36 Equilíbrio do sódio


O nível de sódio no líquido de diálise produzido pela maioria das máquinas pode variar entre 130 e 150 mmol/l. O
equilíbrio apropriado é individual e as necessidades podem diferir no mesmo doente em dias diferentes. É
importante estabelecer um equilíbrio de sódio apropriado para cada doente.
+
13.37 Nível baixo de Na no dialisante
Durante muitos anos, foram utilizadas concentrações de sódio de 130-135mmol/l na hemodiálise mas estes níveis
fazem com que o sódio seja transportado para fora do sangue, o que cria um desequilíbrio osmótico entre os
compartimentos de líquido extracelular e intracelular que, por sua vez, provoca transferências de líquido e edema
intracelular: um síndrome de desequilíbrio. Quanto mais baixo for o nível de sódio e mais eficiente for a diálise,
mais pronunciado é este efeito. Se o nível de sódio estiver regulado para um valor excessivamente baixo em
relação ao sódio plasmático, o doente pode sofrer sintomas como: cãibras, náuseas, vómitos e cefaleias. Como já
foi referido, a combinação da ultrafiltração com a depleção do volume extracelular causa frequentemente
hipotensão. A utilização de um líquido de diálise com maior teor de sódio ajuda a prevenir estes sintomas.
+
13.38 Nível elevado de Na no dialisante
Verifica-se o inverso quando o nível de sódio no líquido de diálise é superior ao sódio existente no plasma. Dá-se
uma nítida difusão de sódio para o sangue, o que ajuda a mobilizar as reservas de líquido intracelular. A
ultrafiltração é facilitada e a pressão arterial mantém-se estável. Porém, o equilíbrio é delicado: embora um
elevado nível de sódio mantenha a osmolalidade extracelular e atenue sintomas como a hipotensão, causa
desidratação celular e aumento da carga de sódio o que, por seu vez, aumenta a sede e provoca acentuação do
aumento de peso interdialítico e hipertensão.

13.39 Sobrecarga de líquido - hipervolémia


A sobrecarga de líquido, principalmente se for de longa duração, pode por sua vez provocar hipertensão,
hipertrofia ventricular esquerda (HVE) e, se for grave, edema pulmonar.

13.40 Dialisante com glicose


Nos primeiros tempos da diálise foram utilizadas elevadas concentrações de glicose (3 000 mg/dl). Estas
provocavam hiperglicemia grave, agitação, sede e cefaleias. Desde o início da década de 1970, a maioria dos
doentes têm sido tratados com dialisante que contém concentrações fisiológicas de glucose entre 100-200 mg/dl ou
que não contém glucose. Houve quem sugerisse que existem diferenças pequenas mas significativas entre estes
vários tipos de tratamento de diálise (Van Stone, 1994). Quando se utilizam 200 mg/dl de glucose no líquido de
diálise verifica-se uma absorção de glucose de 16-23 gramas, ao passo que o líquido sem glucose provoca uma
perda de glucose líquida de 28-30 gramas e com 100 mg/dl conduz a uma transferência mínima de glicose.

13.41 Glicose no dialisante


Existem várias razões para considerar a utilização de glicose no dialisante, incluindo:
 Diabetes - será considerada em mais pormenor.
 Nutrição - alguns autores sugeriram que podem ser administradas calorias no tratamento dialítico. A
utilização de 400-500 mg/dl de glicose no dialisante permitiria uma velocidade de utilização de glucose
máxima de 50-100 g/h ou 700-1500 calorias por tratamento (Van Stone, 1994).
 Desequilíbrio - 200 mg/dl de glicose no dialisante é 2-3 vezes a quantidade existente no sangue normal
(Ledebo, 1990). A glucose tem um efeito osmótico e contribui para a ultrafiltração promovendo a reposição
do plasma. Assim, a utilização de 200 mg/dl de glucose ajuda potencialmente a tratar o desequilíbrio:
 Aumento da osmolalidade.
 Diminuição das cãibras musculares.
 Alívio das cefaleias.

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13.42 Hipoglicémia
Foi reportada a ocorrência de hipoglicémia significativa durante a utilização de dialisante sem glicose na presença
de caquexia e sépsis e com o uso de certos fármacos como a aspirina e o propanolol*, assim como nos doentes
diabéticos tratados com agentes hipoglicémicos (Van Stone, 1994).

(*Nota: os beta-bloqueantes não estão contra-indicados na diabetes; contudo, podem dar origem a uma pequena
deterioração da tolerância à glucose e interferir com as respostas metabólicas e autonómicas à hipoglicémia).

13.43 Hipoglicémia relacionada com a HD


A utilização de concentrações fisiológicas de 100 mg/dl parece ser apropriada para a maioria dos doentes. Dois
estudos realizados pelo mesmo autor investigaram o impacto da glicose no dialisante primeiro em 21 doentes não
diabéticos e, depois, em 18 doentes diabéticos. Utilizaram dialisante sem glicose e não ingeriram alimentos na
primeira hora e observou-se uma diminuição da glicose no sangue em ambos os grupos. A perda média na diálise
foi = 9,2 g/h. Utilizando 100 mg/dl de glicose no dialisante, o nível de glucose manteve-se estável (Jackson, 1999
e 2000).
+
13.44 Potássio (K )
O potássio é o principal ião intracelular (98% do seu teor total no corpo é intracelular). Mantém o volume
intracelular e é necessário para a actividade muscular. O músculo cardíaco, em particular, é sensível a alterações
dos níveis de potássio.

13.45 Arritmias
A diálise é a principal via de eliminação do potássio. Para ser adequada, a remoção de potássio durante a diálise
deve ser equivalente à sua acumulação interdialítica. Como esta é geralmente difícil de quantificar, a remoção de
potássio é habitualmente considerada satisfatória se se evitar a hipercaliémia pré-diálise. A maioria dos doentes
tem o potássio pré e pós-diálise entre 6 e 3 mmol/l quando se utilizam 2 mmol/l (Locatelli, 2004) de potássio no
dialisante.
+
13.46 Nível de K no dialisante
A maioria dos doentes dialisados com uma quantidade de potássio padrão de 1-2 mmol/l no dialisante tolera bem o
tratamento e não sofre complicações de hipocaliémia ou hipercaliémia. Todavia, alguns indivíduos com doença
cardíaca subjacente são propensos a arritmias à medida que a hipocaliémia se desenvolve durante a diálise. O risco
de arritmias também aumenta nas fases iniciais da sessão de diálise quando o potássio no plasma ainda pode estar
normal mas em declínio rápido (Palmer, 2001).
+
13.47 K no dialisante
Se se evitar a hipocaliémia intradialítica, as arritmias cardíacas graves ficam quase exclusivamente limitadas aos
doentes com cardiopatia clinicamente evidente. Em geral, a incidência de arritmias é maior no início da diálise,
quando os fluxos são maiores, e não nas fases posteriores. Está demonstrado que a redução súbita da concentração
de potássio durante a parte inicial da diálise altera desfavoravelmente o ECG (Palmer, 2001). Isto sugere que a
velocidade de alteração do potássio é mais importante do que o nível absoluto de potássio. Quando os doentes têm
arritmias, o gradiente entre o potássio no dialisante e o potássio no plasma deve ser diminuído, devendo sempre
evitar-se um nível de potássio de 0 no líquido de diálise.
++
13.48 Cálcio (Ca )
Os iões de cálcio têm um papel importante no processo contráctil das células vasculares e cardíacas. Nos
indivíduos saudáveis, a concentração de cálcio no soro pode afectar a pressão arterial através de dois mecanismos:
 Alteração da resistência vascular sistémica.
 Alteração do débito cardíaco mediada por uma alteração da contratilidade cardíaca.
Estudos realizados em doentes dialisados indicam a existência de uma relação directa entre a concentração de
cálcio no dialisante e a pressão arterial.
++
13.49 Ca no dialisante
Os doentes com um cálcio sérico pré-diálise normal têm um equilíbrio de cálcio positivo ou negativo no fim do
tratamento dependendo da concentração de cálcio no líquido de diálise. Para os doentes com um elevado cálcio
sérico ou que estão a tomar substâncias captadoras do fostato que contêm cálcio utiliza-se frequentemente uma
baixa quantidade de cálcio de 1,25 mmol/l porque daí resulta um equilíbrio negativo. Se o doente apresentar um
cálcio sérico baixo, uma quantidade elevada de 1,75 mmol/l de cálcio no dialisante produz um equilíbrio positivo.

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Os níveis de cálcio no dialisante são variados para tratar a hipercalcémia e permitir a utilização de fármacos que
contêm cálcio. Porém, em geral, recomendam-se 1,5 mmol/l de cálcio (Locatelli, 2004).
++
13.50 Níveis de Ca baixo versus elevado no dialisante
O cálcio no líquido de diálise pode ter um efeito hemodinâmico significativo. Um baixo nível de cálcio de 1,25
mmol/l no dialisante tem sido associado a uma diminuição significativa da pressão arterial sistólica (Vander
Sande, 1998). Em contraste, no mesmo doente, com um elevado nível cálcio de 1,75 mmol/l no dialisante a
pressão arterial média permaneceu inalterada. Por conseguinte, um aumento do nível de cálcio no dialisante pode
ter um efeito positivo clinicamente importante na pressão arterial. Foi sugerida a utilização de 1,75 mmol/l de
cálcio no dialisante para melhorar a estabilidade hemodinâmica nos doentes com a função cardíaca comprometida,
dado poder ter um impacto benéfico na qualidade de vida (Locatelli, 2004).

13.51 Alguns doentes manifestam uma grande variedade de sintomas


Alguns doentes podem queixar-se de sintomas no início da diálise, como dores abdominais e dispneia. Também é
possível que se observem sinais como rubor e hiperventilação. Outros sintomas prováveis são a taquicardia e
hipertensão. Poucos minutos após o início do tratamento, o doente parece sentir-se muito mal.

13.52 Reacções de hipersensibilidade


Estes tipos de reacções são frequentemente designados como reacções de hipersensibilidade. Historicamente, a
razão mais comum para este tipo de reacção era a sensibilidade do doente ao óxido etileno (OET). Isto acontecia
principalmente nos dialisadores capilares em que o composto de preenchimento no dialisador actuava como
reservatório para o OET. Quando o dialisador era utilizado, o OET era libertado. Certos doentes também reagiam à
membrana celulósica, especialmente quando se utilizava o cuprofano; este tinha um elevado potencial para causar
activação do complemento e leucopenia. Hoje em dia, muito poucos dialisadores são esterilizados com OET e a
maior parte contém membranas sintéticas para eliminar estas reacções. No entanto, alguns doentes ainda podem
ter reacções de hipersensibilidade.

13.53 Nível de bicarbonato no dialisante


O componente mais importante para corrigir a acidose metabólica é o bicarbonato no dialisante. O objectivo é
repor o nível de bicarbonato plasmático até valores fisiológicos pré e pós-diálise. Se se utilizar bicarbonato em
quantidade insuficiente, o doente permanece acidótico, o que pode causar osteopenia, aumento do catabolismo das
proteínas e malnutrição. Se o doente estiver exposto a demasiado bicarbonato ou a uma correcção excessivamente
rápida da acidose, torna-se alcalótico pH no sangue> 7,50. A alcalose não é bem tolerada porque pode causar
letargia, cãibras e confusão (Parker, 2000).

13.54 Absorção do bicarbonato


A velocidade do fluxo de bicarbonato do dialisante para o doente é determinada pelo gradiente de concentração
transmembrana e pela concentração de bicarbonato no líquido de diálise (Locatelli, 2004). Quanto mais eficiente
for o tratamento de diálise em termos de transporte dos pequenos solutos, mais rápida é a absorção do tampão
(Ledebo, 2000). A diferença de concentrações entre o sangue e o líquido de diálise é a força motriz. Assim, a
absorção do bicarbonato é mais rápida no início do tratamento quando o gradiente de concentração é mais
significativo.

13.55 Dióxido de carbono


Se um doente se queixar de dispneia no início da diálise, a origem pode estar na absorção do dióxido de carbono.
Uma solução de bicarbonato contém sempre uma certa quantidade de dióxido de carbono. Um dialisante padrão
com uma concentração de bicarbonato de 35mmol/l e um pH de 7,2 tem um pCO2 próximo dos 90mmHg. Quando
se utiliza dialisante com bicarbonato o dióxido de carbono é transportado para o sangue. Este excesso de dióxido
de carbono é libertado pelos pulmões, o que pode causar um aumento das ventilações. Está demonstrado que a
carga de dióxido de carbono aumenta a frequência respiratória em 8,5% enquanto que a pCO2 arterial se mantém
constante (Ledebo, 1990).

13.56 Hipóxia
Uma causa possível das reacções de tipo hipersensibilidade é a hipóxia. A hipóxia é definida como uma
diminuição da quantidade de oxigénio presente no sangue. Pode causar aos doentes numerosos sintomas desde
ligeiros a muito graves. A verdadeira causa ainda não foi determinada, mas pensa-se que é de natureza multi-
factorial. Leggate (2000) sugeriu que todos os doentes que se submetem a hemodiálise de rotina desenvolvem um
certo grau de hipóxia e afirmou que os doentes cardiovasculares estão especialmente em risco. A hipóxia é mais

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prevalente quando são utilizados elevados níveis de bicarbonato no dialisante e, especialmente, em conjunto
com dialisadores altamente permeáveis e tratamentos de grande eficiência.

13.57 Tratamento da hipóxia


Se se suspeitar de hipóxia, a primeira medida a tomar é monitorizar a saturação de oxigénio porque em geral
esta desce rapidamente à medida que os sintomas do doente se agravam. As acções a realizar incluem:
 Administração de oxigénio.
 Redução da velocidade de clearance difusiva em ml/min (redução do débito sanguíneo e/ou de dialisante).
 Redução do nível de bicarbonato no dialisante.
Se não for possível medir a saturação de O2 mas o doente responder a uma destas acções ou a uma combinação
das mesmas pode suspeitar-se de que se tratava de hipóxia. O tratamento futuro poderá incluir a utilização de
um nível mais baixo de bicarbonato no dialisante ao longo da diálise ou de um menor débito de dialisante e de
concentração de bicarbonato no dialisante no início da diálise.

13.58 Composição do dialisante: resumo


É difícil utilizar a mesma composição do dialisante para todos os doentes porque o que pode ser adequado para
um pode ser potencialmente nocivo para outro. O sódio pode causar síndrome de desequilíbrio se for insuficiente
ou sobrecarga de líquido se for excessivo. A utilização de 100mg/dl de glucose pode ser benéfica para todos os
doentes, em especial os diabéticos e os que apresentam sintomas de desequilíbrio. Recomendam-se 2 mmol/l de
potássio para a maioria dos doentes mas se os doentes sofrerem arritmias deve considerar-se um menor gradiente
nas primeiras fases da diálise. O cálcio de 1,5 mmol/l é recomendado para a maioria dos doentes excepto se o seu
teor no soro for elevado, mas para os doentes com a função cardíaca comprometida um nível de cálcio de 1,75
mmol/l pode ajudar a manter a pressão arterial. Finalmente, quando os doentes apresentam múltiplos sintomas,
deve considerar-se a hipótese de hipóxia e ajustar o nível de bicarbonato.

13.59 Resumo
Em resumo: um enfermeiro deve saber o que pode causar sintomas intradialíticos e observar os doentes
regularmente durante a diálise quanto a sinais e sintomas. É importante prestar atenção aos primeiros sinais
visto que é muito mais fácil tratar os sintomas ligeiros do que os graves. Conhecer o doente torna o tratamento
dos sintomas muito mais eficaz.

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