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DISTÚRBIOS DA ÁGUA

HIPONATREMIA
A hiponatremia tem uma prevalência de 7% em pacientes ambulatoriais e de 28% em pacientes internados.

Sua importância está no aumento da morbidade e mortalidade dos pacientes com hiponatremia aguda, levando a
um maior tempo de internação. Já as hiponatremias leves podem se agravar quando o paciente é internado
dependendo da conduta realizada durante a internação. Além disso, há uma maior mortalidade de pacientes
hiponatrêmicos, sejam eles pacientes com insuficiência cardíaca e cirrótica, por exemplo. Por tudo isso, se questiona
se a hiponatremia por si só, leva a uma pior evolução do paciente, ou se é um marcador prognóstico da doença base.
Sua correção inadequada por causar danos neurológicos permanente e morte.

Definição

O valor normal do sódio é entre 135-145 mEq/L. A definição de hiponatremia é o sódio menor que 135 mEq/L.

Podemos separar a hiponatremia em diversos tipos:

 Pseudohiponatremia: hiponatremia não verdadeira. Isso pode ser explicado analisando a amostra sanguínea
de determinado indivíduo. Uma vez o sangue centrifugado o sangue é separado em 2 fases: série vermelha e
a série plasmática. A série vermelha é sedimentada e a série plasmática é dividida em parte aquosa e parte
proteico-lipídica. A parte proteico-lipídica representa 7% do total de sangue colhido. No cálculo da natremia,
é utilizado o sódio contido no plasma total (aquosa+ proteico-lipídica) pela parte proteico-lipidica. Assim, na
pseudohiponatremia, condições que aumentem o valor da porção proteico-lipidica do plasma levam a
diminuição da parte aquosa, levando a pseudohiponatremia. Esses casos são característicos em pacientes
com hiperlipidemia ou hipoproteinemia muito pronunciada. O mieloma múltiplo, por exemplo, pode levar
ao aumento dos níveis de proteinemia, gerando uma pseudohiponatremia.

 Hiponatremia hipertônica: apesar do sódio ser o


principal fator frente a osmolaridade sérica (ver
quandro ao lado) , no caso da hiponatemia
hipertônica, há uma diminuição do sódio frente a
valores elevados de glicemia. Assim, hiperglicemias
Fórmula do cálculo da osmolaridade sérica.
como na cetoacidose diabética/ estado hiperosmolar
Perceba a importância do sódio frente as demais
não cetótico é comum a hiponatremia hipertônica.
variáveis, glicemia e ureia.
Manitol, por ser uma solução hipertônica, também
leva a diluição do sódio, causando hiponatremia hipertônica, além da imunoglobulina EV com solução de
maltose ou sucrose.

 Hiponatremia isotônica: ocorre em um caso muito específico, a síndrome de ressecção transuretral. O


urologista, para ter melhor acesso visual à bexiga, utiliza-se soluções líquidas isotônicas, que em grande
parte são absorvidas fluindo para o plasma. Dessa forma, a solução torna o plasma isotônico.

 Hiponatremia hipotônica (verdadeira): hiponatremia hipotônica. Responsável pelos piores sintomas


relacionados ao sódio, podendo ser necessário à instituição de tratamento.

Exame clínico

Primeiro passo ao querer avaliar um paciente com hiponatremia é analisar seu status volêmico, ou seja, se esse
paciente está hipovolêmico, euvolêmico ou hipovolêmico.
Hiponatremia hipervolêmica

Achados clínicos

Em pacientes hipervolêmicos podemos ter como achados clínicos o edema, jugular túrgida e ascite.

As patologias que cursam com hipervolemia são a insuficiência cardíaca, cirrose hepática e a insuficiência renal.

Podemos dividir essas patologias de acordo com o sódio urinário baixo ou alto. Insuficiência cardíaca (IC) e cirrose
hepática cursam com sódio urinário baixo, enquanto que a insuficiência renal cursa com sódio urinário alto.

Na IC há uma falência de bomba que impede que o sangue chegue adequadamente até o rim, sendo que esse
interpreta como uma deficiência de sal e água ativando o SRAA, reabsorvendo sal a custas de potássio, secretando
ADH e reabsorvendo água, piorando a insuficiência cardíaca. Na insuficiência renal crônica os mecanismos de
filtração estão prejudicados por uma perda dos mecanismos.

Tratamento

O tratamento da hipernatremia hipervolêmica envolve a restrição hídrica (800-1000ml/dia) associado com um


diurético de alça (furosemida), atuando sobretudo na alça de Henle, na medula renal que é hiperconcentrada,
havendo uma inibição do ADH a nível inferior e não central, “lavando” essa medula.

Hiponatremia hipovolêmica

Achados clínicos

Em pacientes hipovolêmicos os achados clínicos são jugular não visível, turgor de pele diminuído, mucosas secas,
axilas secas, hipotensão secas, hipotensão e taquicardia postural.

Também podemos dividir a hiponatremia hipovolêmica em sódio urinário baixo e alto. As patológicas que cursam
com sódio urinário baixo são a diarreia e vômitos por uma depleção do volume do espaço extra celular, por uma
tentativa frustrada do corpo tentar reabsorver sódio e água.

Já as hiponatremias que cursam com sódio urinário baixo encontramos pacientes que usam diuréticos tiazídicos
(hidroclorotiazida, clortalidona). Há uma excreção acentuada de sódio pelo fato do diurético adicionar aquaporinas
no ducto coletor. A epidemiologia desse tipo de hiponatremia com hipovolemia é comum em mulher idosa.

Tratamento

Reposição volêmica com soro fisiológico e retirar o agente causador (tiazídico).

Hiponatremia euvolêmica

Há inúmeras causas de hiponatremia euvolêmica, porém a de maior relevância clínica, sem sombra de dúvidas é a da
síndrome da secreção inapropriada do ADH (SIADH). Porém, hipotireoidismo, insuficiência adrenal (má produção da
aldosterona na zona glomerular), gestação (mais por um mecanismo diluicional), hiponatremia induzida pelo
exercício físico, intoxicação por ectasy (boca seca leva ao usuário beber água), polidipsia primária (paciente
psiquiátrico às vezes induzida pela medicação), beer potomania (usuários que bebem excesso, já que a cerveja é livre
de sal) e pós-operatório são causas já confirmadas de hiponatremia euvolêmica.

Devemos entender que as principais causas de SIADH envolvem:

 Câncer: sobretudo CA de pequenas células, linfomas, sarcomas.


 Doenças pulmonares: pneumonia, tuberculose, asma, fibrose cística.
 Doença do SNC: infecções como encefalite, meningite, tumores de cérebro, trauma cerebral, esclerose
múltipla, Guillain-Barret.
 Medicações

O nome mais correto para SIAD seria síndrome da secreção inapropriadamente alta do ADH, com liberação excessiva
do hormônio antidiurético, diminuindo a perda de água. O diagnóstico envolve:

 Osmolaridade plasmática baixa (<275mOsm/Kg) já que haverá uma retenção de água e diluição desses
solutos.
 Urina será inapropriadamente concentrada (OsmUr>100mOsm/Kg).
 Euvolemia.
 Excreção aumentada de sódio urinário (maior ou igual a 30mEq/L), sendo um mecanismo compensatório a
para evitar edema (o quadro abaixo tenta explicar melhor esse mecanismo).
 Excluir alteração de função renal, tireoidiana, adrenal.

ATENÇÃO! Quando falamos em hiponatremia ou hipernatremia estamos discutindo distúrbios da água e não do
sódio. Os distúrbios do sódio cursam com edema ou depleção. Fique atento para essa diferença. Exemplo prático é
pensar em pessoas que ingerem muita água. Ela ficará edemaciada? Não, certamente ela terá uma alteração do
nível do sódio. Porém, agora pense em uma pessoa que consuma em um dia diversos potes de azeitona,
certamente essa pessoa se apresentará edemaciada, pelo alto consumo de sódio ingerido.

Quadro clínico

Paciente pode apresentar quadros de cefaleia, náusea, vômito e encefalopatia hiponatrêmica (Na<120mEq/L). A
encefalopatia hiponatrêmica causa confusão mental, desorientação, déficit neurológico focal, convulsões e morte. É
comum haver confusão desse quadro com AVC, por isso, nos protocolos de acidente vascular cerebral, deve-se
excluir hiponatremia. A rapidez da instalação prediz a gravidade dos sintomas. Os sintomas neurológicos pela
alteração dos níveis de sódio se relacionam com hipertensão craniana.

Tratamento

Primeiramente deve-se tratar a causa base (lembrar das causas de SIADH pois é a mais comum). Por exemplo, se a
hiponatremia é por conta de uma pneumonia, tuberculose devemos tratar essas patologias.

Restrição hídrica com limite diário de 800ml/dia também deve ser instituído.

Já as medicações que devem ser prescritas são os antagonistas dos receptores de vasopressina (aquaréticos), que
competem com o ADH, sobretudo nos receptores V1a, V1b e V2, sendo o V2 o mais importante. O Tolvaptan, via
oral, é seletivo para V2, enquanto que o Conivaptan (EV) antagoniza receptores V1a e V2.

Demeclociclina e o lítio apesar de fazer parte do escopo do tratamento, são raramente usados. Na prática, se faz a
restrição hídrica e furosemida.

Entra-se com salina hipertônica quando o paciente tem manifestações clínicas de hiponatremia, dentre elas,
agitação psicomotora, confusão mental e convulsões. Caso contrário, paciente sem sintoma, deve-se tratar a causa
base, restringir a ingesta de líquidos e usar furosemida.

Não se usa indiscriminadamente salina hipertônica, pois não devemos aumentar o sódio agudamente, tendo um
limite de 10mEq/L/DIA, com risco de mielinólise pontina (Síndrome de desmielinização cerebral).

Em sintomas graves (convulsão ou coma):

 Bolus de salina 3% 100ml até 3 vezes a cada 10 min.


Em sintomas não graves (confusão mental ou letargia):

 Usar a fórmula de Androgue-Matias. Antes de tudo devemos saber que uma solução salina a 3% possui
aproximadamente 513mEq/L de sódio e que a quantidade de água do organismo é 60% do peso corporal.
Pela fórmula, temos uma ideia de
quanto o sódio irá variar em infusão de
1000ml dessa solução. Podemos, pela
fórmula, excluir o potássio caso não haja
na solução. Assim uma pessoa com
sódio de 110mEq e que pese 70kg, 42
(70kg x 60%) será o valor absoluto de
água. Pondo na formula, será 513-110/42+1, com resultado aproximado de 10mEq. Como sabemos que a
variação de sódio em 24h deve ser de no máximo 10mEq, devemos correr essa solução durante um dia.
Deve-se constantemente avaliar a quantidade de sódio, para avaliar a necessidade de infusão.

HIPERNATREMIA
A hipernatremia, por definição, é o valor de sódio maior que 145mEq/L.

Diferente da hiponatremia, a hipernatremia é sempre hipertônica.

Ambulatoriamente é mais frequente em idosos e em indivíduos com déficit cognitivo sem acesso a água, como por
exemplo, em sequelados de AVC, acamados que não podem buscar água. Em causas intrahospitalares, 50% por
iatrogenia e 50% por alteração do nível de consciência.

Patofisiologia

A partir do momento que a ingesta de água fica diminuída, a osmolaridade plasmática vai subindo a tal ponto que é
responsável por desencadear o mecanismo da sede, por acúmulo de sódio. Logo depois, vem o aumento do nível de
ADH para evitar que o corpo desenvolva hipernatremia.

Exame clínico

Novamente, a primeira coisa a se fazer em um paciente com distúrbio da água é checar o status volêmico. Assim,
separamos a hipernatremia em hipovolêmica, euvolêmica e hipervolêmica.

Hipernatremia hipervolêmica

É a forma menos comum e geralmente iatrogênica. As causas são administração excessiva de solução fisiológica ou
bicarbonato de sódio, hiperalimentação por sonda parenteral, dialise hipertônica e hipercortisolismo.

Tratamento

Tirar o fator causal, por exemplo, é a alimentação parenteral a causadora, se sim, devemos readequá-la. Acrescentar
diurético de alça (furosemida) associado com água livre, já que somente o diurético pode agravar a hipernatremia.

Hipernatremia hipovolêmica

Geralmente mais comum. Podemos dividir em perda renal e não renal.

Da perda renal engloba os diuréticos de alça (furosemida), poliúria pós-IRA (IRA, por exemplo, devido a uma sepse
de foco pulmonar, necessitando de diálise e que a função renal volta ao normal após 15 dias, com poliúria pós-IRA,
perdendo mais água líquida do que sais), poliúria pós-desobstrução (paciente com hiperplasia prostática e após a
sonda urina grandes volumes perdendo mais água do que sais), diurese osmótica (diabetes descompensado).
Perda não renal entra quadros gastrointestinais por diarreia e vomito, e por queimadura e sudorese profusa,
podendo levar a hiponatremia hipovolêmica por má reposição de líquidos.

Hipernatremia euvolêmica

Perda de água livre. Dividida em perda não renal e renal.

Perda renal engloba o aumento da perda insensível pela pele (febre, sudorese, queimadura) e taquipneia, além da
ingesta diminuída com hipodipsia primária (idosos, AVEi) e acesso limitado a água. A perda renal envolve o diabetes
insipidus.

Diabetes Insipidus

O nome diabetes vem do grego que significa “sifão”, descrevendo a diurese excessiva pela polidipsia e poliúria. Já
insipidus vem do latim “sem gosto” enquanto mellitus se refere a “doce”, referência à antiga técnica do exame de se
provar a urina. A primeira é causada por uma deficiência do ADH ou não ação e a outra por uma deficiência de
insulina.

Podemos dividir o diabetes insipidus em central ou nefrogênico. Diabetes insipidus central é causada por uma falha
na produção do ADH e o nefrogênico na ação do ADH. Há também o diabetes insipidus gestacional por secreção de
vasopressinase, que quebra a molécula de ADH.

A diferenciação de diabetes insipidus e nefrogênico é com a infusão de ADH sintético (dDavp) no paciente. Se houver
a infusão com melhora do paciente, o diabetes será de causa central, pois ele não produz ADH e passará a ter o
hormônio. Já com infusão se não houver melhora, a causa será nefrogênica, pelo funcionamento inadequado do
ADH.

As causas de diabetes insipidus central são semelhante a da SIADH, sempre lembrando causas oncológicas
(craniofaringinoma, germinoma, leucemia, linfoma), traumas (TCE), cirurgias transfenoidais, infecções do sistema
nervoso central (meningite, encefalite, TB), intoxicação por monóxido de carbono.

As causas de diabetes insipidus nefrogênico devemos lembrar do lítio por ser responsável pelo mau funcionamento
do ADH no rim causando hipernatremia.

Devemos abrir o diagnóstico diferencial para pacientes com diurese abundante para polidipsia primária, diabetes
insipidus central e diabetes insipidus nefrogênico. Nesses casos, devemos fazer uma restrição da dieta líquida desse
paciente com o teste de privação de água, necessitando a internação.

Em pacientes com polidipsia primária, a diminuição da ingesta de líquidos culmina na diminuição da diurese, ao
aumento da osmolaridade plasmática e urinária, que anteriormente era extremamente diluída e ao aumento do
sódio plasmático.

No DI central e nefrogênica a diurese permanece a mesma, pois há uma dificuldade na produção ou ação do ADH,
com aumento da osmolaridade plasmática pela não ingestão de líquido enquanto que a osmolaridade urinária
continua baixa pelo não funcionamento do hormônio, já o sódio plasmático subirá estrondosamente pela baixa
ingesta de líquidos. Até então, conseguimos separar um quadro de polidipsia primária de diabetes insipidus pela
restrição líquida (caso haja dúvida, tentar observar a tabela na outra página).

O próximo passo é a administração de dDavp, e se houver resposta é DI central pela deficiência da produção e se
não houver resposta será nefrogênico, pois nesse há produção porém não há o funcionamento do ADH.
DIURESE OSM.PLASMÁTICA OSM.URINÁRIA Na PLASMÁTICO
POLIDIPSIA ↓ ↑ ↑ ↑
DI CENTRAL = ↑ =(BAIXO) ↑↑↑
DI NEFROGÊNICA = ↑ =(BAIXO) ↑↑↑

Tratamento

O tratamento para DI central é administração de dDavp por via EV. No DI nefrogênico usar diurético tiazídico
(hidrocloritiazida) e AINE (indometacina).

Devemos calcular o déficit de água do indivíduo. Supomos que o paciente tenha um sódio atual de 170mEq/L e pese
70 Kg. Sabemos que água corporal total é 60% do peso total do individuo, logo ele possui 42L de água. Assim,
traçamos uma regra de três na qual o sódio normal (140mEq/l) está para água corporal total(42L) assim como o
sódio atual(170) está para a água atual (X). Porém, esse cálculo deve ser feito por uma regra de três inversa,
resultando, de acordo com o exemplo, em um total de água atual de 32,4L sendo que o necessário seria 42L. Dessa
forma, é necessário fazer a diferença da água total necessária menos (-) a água atual, dando a necessidade que deve
ser reposta, que no caso é de 7,5L (déficit de água).

A correção do déficit pode ser feita com soro glicosado ou soro 0,45%.

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