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INTRODUÇÃO

AO ESTADO DE
DIREITO

Magnum Eltz
Direito objetivo e
Direito subjetivo
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Compreender a distinção entre Direito objetivo e Direito subjetivo.


„„ Analisar a natureza jurídica dos direitos subjetivos.
„„ Aplicar a classificação dos direitos subjetivos.

Introdução
O Direito pode ser dividido entre Direito subjetivo e Direito objetivo, sendo
essa distinção basicamente fruto das revoluções burguesas que substi-
tuem a figura de um direito metafísico teológico por um ordenamento
jurídico representado pelo Estado (Direito objetivo) capaz de tutelar os
direitos naturais inerentes à seus sujeitos humanos (Direitos subjetivos).
Neste capítulo, você vai ler a respeito das principais discussões sobre
a definição de direitos objetivos e subjetivos, sobre a sua natureza jurídica
e, finalmente, sobre a classificação dos direitos subjetivos.

Distinção entre Direito objetivo


e Direito subjetivo
O Direito, a partir da visão histórica e positivista, pode ser classificado como
Direito objetivo ou subjetivo. Essa distinção é essencial para o desenvolvimento
de argumentos consistentes e está diretamente relacionada com as distinções
entre direitos naturais e positivos, Direito Privado e Direito Público.
Segundo Ruolf von (apud JHERING, 1943, p. 150), essa divisão não pode
ser atribuída ao Direito romano puro, eis que:

A maneira de ver dos romanos (e, ao mesmo tempo, a síntese da explicação


que se segue), pode exprimir-se, com exatidão, dizendo que consideravam a
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liberdade, não como uma coisa subjetiva, um bem, uma qualidade da pessoa,
mas como uma propriedade objetiva indestrutível, independente da vontade
pessoal, pertencente às instituições jurídicas.

Dessa forma, não se poderia falar em uma dicotomia entre Direito objetivo
e objetivo a essa época, pois eram indissolúveis como parte do ordenamento
jurídico. No entanto, a noção romana que legou a construção de um Direito
subjetivo em contraste à organização estatal é evidenciada por Jhering
(1943, p. 87):

Nenhum direito existe que não tenha procedido do esforço individual e cujas
origens não se percam nas profundezas da força física. Para muitos povos,
esse período de formação violenta do direito desapareceu completamente da
memória dos que fundaram o mundo do direito com a rudeza de seus braços,
para não falar mais que dos deuses, ou dos servidores dos deuses que deram
aos homens o direito como presente, ou lh’o impuseram como regra. O suor
e o sangue dos homens, que cimentaram a origem do direito, ficam ocultos
pelo nimbo divino que este circunda.
[...]
Assim não acontece com o Direito Romano, no qual o tempo não pôde fazer
desaparecer o vestígio de suor e de sangue com que a fadiga dos homens o
maculou. Para a sua história, o princípio da força individual, como fonte do
direito, é uma das verdades primordiais.
[...]
A força individual é a origem do direito, dissemos, e estas palavras são qua-
se ininteligíveis para nós. Habituados a confiar tudo ao Estado, a definir o
direito como se fora a vontade do Estado, e descurar a sua realização, apenas
conhecemos a força individual. Onde quer que se mostre sem a autorização
do Estado, perseguimo-la e castigamo-la como um atentado a ordem jurídica.
Mas, assim como aos nossos olhos a força e o direito se diferenciam, assim,
também, a intuição atual que temos dessas ideias difere da que possuíam os
antigos romanos.

A criação jusnaturalista de um direito essencial à liberdade, inerente a todos


os homens, faz com que tornemos separados os direitos de criação e autonomia
da vontade dos cidadãos apartados da organização estatal que criamos para
defendê-los. E é nessa importante cisão com o Direito romano clássico que o
Direito moderno, no seu positivismo, passa a criar uma dicotomia entre os
direitos individuais, subjetivos, e os direitos que são impostos aos cidadãos
pelo Estado como um direito objetivo.
Direito objetivo e Direito subjetivo 105

Essa evolução histórica é evidenciada por Jhering (1943, p. 134, 140):

Nossa concepção atual da relação do Estado e da autoridade com o indivíduo é


produto da relação do Estado e da autoridade com o indivíduo, é produto de um
grande progresso, e não estamos, de modo algum, autorizados a considerar, nas
épocas antigas, a superioridade da autoridade sobre o cidadão, como uma noção
que se compreende por si mesma, senão que, ao contrário, temos o dever de
examinar quando e como esta ideia pode nascer na antiga comunidade e Roma.
[...]
A antiga associação política, em nosso pensar, amalgama esses dois princí-
pios — de coordenação e de subordinação. Assim, o Estado antigo tem suas
raízes na família e, elevando seu tronco, esparge as ramagens na organização
militar; ou em outros termos, as gentes e o respectivo lugar que ocupavam os
indivíduos no seio delas, se fundam na ideia de família; as cúrias, as tribos,
com seus chefes e o rei, no interesse militar.

A partir do estudo histórico de Jhering, houve uma verdadeira correspon-


dência entre a composição de vontades individuais para a criação da figura do
Estado como uma extensão da família civil nos tempos romanos e a retomada
da valorização da vontade no período moderno. Trata-se de uma evolução
natural de uma construção teórica de um estado superior ao indivíduo, neces-
sária para a perpetuação desse conceito, importante para garantir uma unidade
militar, territorial e cultural aos povos e, mais tarde, uma desconstrução em
que se evidencia que o poder estatal emana da própria vontade do povo, que
se sujeita à sua criação para defender este dele mesmo ou de outros Estados.
A diferença entre o Direito objetivo (organização estatal e o seu orde-
namento jurídico) e o Direito subjetivo (direitos do cidadão) não deve ser
confundido com o aspecto subjetivo da interpretação dos fatos reais em relação
ao Direito objetivo estatal, como exemplifica Kelsen (1999, p. 3):

Na verdade, o indivíduo que, atuando racionalmente, põe o ato, liga a este um


determinado sentido que, se exprime de qualquer modo e é entendido pelos
outros. Este sentido subjetivo, porém, pode coincidir com o significado obje-
tivo que o ato tem do ponto de vista do Direito, mas não tem necessariamente
de ser assim. Se alguém dispõe por escrito do seu patrimônio para depois da
morte, o sentido subjetivo deste ato é o de um testamento. Objetivamente,
porém, do ponto de vista do Direito, não o é, por deficiência de forma. Se uma
organização secreta, com o intuito de libertar a pátria de indivíduos nocivos,
condena à morte um deles, considerado um traidor, e manda executar por um
filiado aquilo que subjetivamente considera e designa como uma sentença de
condenação à morte, objetivamente, em face do Direito, não estamos perante
a execução de uma sentença, mas perante um homicídio, se bem que o fato
exterior não se distinga em nada da execução de uma sentença de morte.
106 Direito objetivo e Direito subjetivo

Dessa forma, o entendimento subjetivo da organização, ao retirar o Direito subjetivo


à vida do indivíduo, contrapõe-se ao sentido objetivo da norma penal, contemplado
pelo Direito objetivo (ordenamento jurídico). Nesse sentido, há uma clara distinção
entre o sentido subjetivo (interpretação dos fatos) da norma e o sentido objetivo
(conteúdo da norma) e o Direito subjetivo (direitos do indivíduo) e o Direito objetivo
(conjunto de regras que compõe a organização estatal).

Ao definir as diferenças entre o Direito objetivo e Direito subjetivo, Kelsen


(1999, p. 140) sintetiza esses conceitos no seguinte ensaio:

Usualmente contrapõe-se ao dever jurídico o direito como direito subjetivo,


colocando este em primeiro lugar. Fala-se no domínio do Direito, de direito
e dever, não dever e direito (no sentido subjetivo) como no domínio da Moral
onde se acentua mais aquele do que este. Na descrição do Direito, o direito
(subjetivo) avulta tanto no primeiro plano, que o dever quase desaparece por
detrás dele e aquele — na linguagem jurídica alemã e francesa — é mesmo
designado pela própria palavra com que se designa no sistema das normas que
forma a ordem jurídica: pela palavra Recht (direito), droit. Para se distinguir
deste, tem o direito (Brerchtigung), como direito “subjetivo” (ou seja, pois,
o direito de um determinado sujeito), de ser distinguido da ordem jurídica,
como Direito “objetivo”. Na linguagem jurídica inglesa, dispõe-se da palavra
right quando se quer designar o direito (subjetivo), o direito de um determi-
nado sujeito, para distinguir da ordem jurídica, do Direito objetivo, da law.

Em relação aos direitos subjetivos, alerta Jhering que não se encontram,


como ilustrado pela ponderação de Kelsen (1999, p. 140) sobre a interpretação
subjetiva, livres do controle estatal:

O aniquilamento da liberdade por si mesma — Que a própria ideia de liber-


dade parece tornar possível é a mais perfeita pedra de toque para controlar
a concepção dessa ideia.
O direito de ser livre, como tantas vezes temos repetido, implica necessaria-
mente, a possibilidade de renunciá-lo, no todo ou em parte. Se é um direito,
por que não podemos renunciá-lo? Se a vontade é livre, porque o seu exercício
não poderá consistir em limitar-se em ligar-se, em encarceirar-se? A liberdade
traz em si o gérmen de sua negação; da boa semente da liberdade pode brotar
o gérmen da servidão.
[...]
Direito objetivo e Direito subjetivo 107

Disto resulta, desde logo, para o indivíduo, que o seu direito à liberdade consti-
tui, ao mesmo tempo, um dever; e resulta, depois, para o Estado, que não deve
reconhecer e realizar senão a verdadeira liberdade, que se funda na moral.
A missão do Estado, ante a liberdade individual, não é puramente negativa,
nem de um espectador indiferente; ao contrário, é de natureza essencialmente
positiva, para a realização da liberdade jurídica, assegurá-la contra o perigo
de uma opressão exterior, ou uma supressão por parte do próprio indivíduo.

Dessa forma, a liberdade, ao mesmo tempo em que é um direito subjetivo


que requer a abstenção do Estado em restringi-la, é também um direito objetivo
no sentido de que o Estado deve protegê-lo mesmo contra o seu detentor — eis
a importância da criação abstrata do Estado como um defensor dos direitos
subjetivos contra terceiros e contra o próprio detentor do direito subjetivo.
Nesse sentido, sintetiza a discussão (NADER, 2001, p. 298), onde:

O direito subjetivo apresenta-se sempre em relação jurídica. Apesar de re-


lacionar-se com o Direito objetivo, ele se opõe correlativamente é ao dever
jurídico. Um não existe sem o outro. O sujeito ativo da relação é o portador
do direito subjetivo, enquanto o sujeito passivo é o titular de dever jurídico.
Este possui o encargo de garantir alguma coisa àquele. O direito subjetivo
apresenta duas esferas: a de licitude e a da pretensão. A primeira corresponde
ao âmbito da liberdade da pessoa, agere licere, pelo qual movimentar-se e
atuar na vida social, dentro dos limites impostos a todos pelo ordenamento
jurídico. É ele quem garante a conduta livre dos indivíduos, por que o Direito
objetivo impõe a toda a coletividade o dever jurídico de respeitar essa faixa
de liberdade, bem como a integridade física e moral de cada um.

Em resumo, pode-se dizer que os direitos subjetivos emanam dos Direitos


Naturais de liberdade e igualdade trabalhados pela filosofia iluminista e
positivada nas constituições modernas, contrapondo-se à organização estatal
que se reconfigurou da sua noção romana de superioridade aos cidadãos para
se tornar uma consequência da união de vontades dos cidadãos por meio da
representação democrática moderna. Essa dicotomia, no entanto, não representa
uma dissociação entre os interesses estatais objetivos e os direitos subjetivos
dos seus sujeitos, uma vez que a figura do primeiro existe para a defesa dos
últimos e, portanto, é essencial para a garantia dos direitos essenciais para
a manifestação da vontade dos cidadãos nas suas relações protegidas pelo
Estado Democrático de Direito.
108 Direito objetivo e Direito subjetivo

Principais teorias acerca da natureza


do Direito subjetivo
Como visto na seção anterior, o Direito subjetivo é um direito que protege
o cidadão contra a atuação de um ou mais indivíduos, ou mesmo contra si
próprio, a fim de manter os seus direitos essenciais, provenientes da teoria
do Direito Natural, contrapondo-se ao Direito objetivo, compreendido como
a ordem normativa estatal sobre a qual os seus sujeitos não podem se opor,
exceto no uso dos seus direitos políticos.
A natureza jurídica desses direitos subjetivos é o palco de grande discussão
na doutrina juspositivista, esta compilada por Nader (2001) na obra Introdução
ao estudo do Direito, que utilizaremos como base para explicar as principais
teorias expostas pelos escritores clássicos.
A primeira teoria apontada por Nader (2001, p. 301) é:

A teoria da Vontade — Para Bernhard Windscheid (1817–1892), jurisconsulto


alemão, o direito subjetivo “é o poder ou senhoria da vontade reconhecido pela
ordem jurídica”. O maior crítico dessa teoria foi Hans Kelsen, que através de
vários exemplos refutou, demonstrando que a existência do direito subjetivo
nem sempre depende da vontade de seu titular.

Como apontado por Jhering em nosso último ponto, a vontade privada


é a grande fonte da construção do conceito de Estado Romano e a força mo-
triz por trás da reconstrução jurídica jusnaturalista e a sua visão do Estado
Democrático de Direito. Nesse sentido, a construção de Windscheid segue
um raciocínio jusnaturalista histórico em que a vontade seria o principal fio
condutor dos direitos naturais. Porém, conforme visto também em nosso último
ponto, a vontade não é um direito subjetivo absoluto, pois, na lição de Kelsen,
há limites para a disposição sobre os direitos subjetivos impostas pelo Direito
objetivo compreendido como o ordenamento jurídico.
A próxima teoria apontada por Nader (2001, p. 301) é a:

Teoria do Interesse — Rufdolf von Ihering (1818–1892), jurisconsulto alemão,


centralizou a ideia do direito subjetivo no elemento interesse, afirmando que o
direito subjetivo seria “o interesse juridicamente protegido”. As críticas feitas
à teoria da vontade são repetidas aqui, com pequena variação. Os incapazes,
não possuindo compreensão das coisas, não podem chegar a ter interesse nem
por isso fiam impedidos de gozar de certos direitos subjetivos. [...] Muitos
criticam ainda essa teoria entendendo que seu autor confundiu a finalidade
do direito objetivo com a sua natureza.
Direito objetivo e Direito subjetivo 109

Não causa estranheza que o próprio Jhering viesse a conceituar a natureza


jurídica dos direitos subjetivos como um elemento volitivo, uma vez já explicada
a sua posição sobre o próprio ordenamento jurídico. No entanto, a crítica de
Kelsen se repete quanto à vontade como um composto único ou uma parcela
do elemento privado.
O autor segue a sua lista com a Teoria Eclética de Georg Jellinek (1851–1911)
(apud NADER, 2001, p. 301), onde:

Georg Jellinek (1851–1911), jurisconsulto e publicitário alemão, considerou


insuficientes as teorias anteriores, julgando-as incompletas. O que direito
subjetivo não seria apenas vontade, nem exclusivamente interesse, mas a
reunião de ambos. O sujeito subjetivo seria “o bem ou interesse protegido
pelo reconhecimento do poder da vontade”. As críticas feitas isoladamente à
teoria da vontade a à do interesse foram acumuladas no presente.

Como bem ressalta Nader, em uma teoria que tenta conciliar duas faces de
um mesmo conceito baseado na vontade, as críticas a uma parte ou outra desse
conceito apenas se acumulam ante a tentativa de conceituação de Jellinek.
Segue Nader com a lista histórica sobre os ensaios sobre a natureza jurídica
com Duguit:

Seguindo a linha de pensamento de Augusto Comte, que chegou a afirmar que


“dia checará em que nosso único direito será o direito de cumprir o nosso dever...
Em que um Direito Positivo não admitirá títulos celestes e assim a ideia do direito
subjetivo desaparecerá...”, Léon Duguit (1859–1928), jurista e filósofo francês,
no seu propósito de demolir antigos conceitos consagrados pela tradição, negou
a ideia do direito subjetivo, substituindo-o pelo conceito de função social. Para
Duguit, o ordenamento jurídico se fundamenta não na proteção dos direitos
individuais, mas na necessidade de manter a estrutura social, cabendo a cada
indivíduo cumprir uma função social (NADER, 2001, p. 302).

Duguit, em uma tentativa de avançar sobre a teoria da vontade, apresenta


um retorno ao conceito romanístico da supremacia do coletivo (Estado) sobre
o indivíduo, a partir da construção da função social, negando a possibilidade
de liberdade subjetiva.
Essa teoria encontraria eco nas críticas de Kelsen à subjetividade:

Para o renomado jurista e filósofo austríaco, a função básica das normas


jurídicas é a de impor o dever e, secundariamente, o poder se agir. O direito
subjetivo não se distingue em essência, do Direito objetivo. Afirmou Kelsen
que “o direito subjetivo não é algo distinto do Direito objetivo, é o Direito
110 Direito objetivo e Direito subjetivo

objetivo mesmo, de vez que quando se dirige, com a consequência jurídica por
ele estabelecida, contra um sujeito concreto, impõe um dever, e quando se co-
loca à disposição do mesmo, concede uma faculdade” (NADER, 2001, p. 302).

Para Kelsen, a divisão entre Direito subjetivo e objetivo se encontra apenas no “alvo”
do dever imposto a uma pessoa ou em caráter geral, sendo a natureza jurídica do
Direito subjetivo idêntica à do Direito objetivo como parte de um ordenamento
jurídico a ser respeitado.

As diversas teorias da natureza jurídica do Direito subjetivo podem ser


compiladas, mas a partir da noção de que o Direito objetivo, em uma digressão
histórica, é atrelado a uma vontade coletiva composta pela formação legal
democrática — de modo que, em que pese o Direito subjetivo seja um reflexo
do Direito objetivo enquanto um dever jurídico, o mesmo pode ser dito em
relação ao Direito objetivo como um reflexo de um feixe de direitos subjeti-
vos volitivos conduzidos por um devido processo legislativo que legitima a
organização estatal e o ordenamento jurídico.

Classificação dos direitos subjetivos


Seguindo o trabalho de Paulo Nader, traremos a sua compilação sobre as classi-
ficações dos direitos subjetivos, trabalhando as suas semelhanças e diferenças.
A primeira classificação trabalhada pelo autor diz respeito aos direitos
subjetivos públicos:

[...] a distinção entre o direito subjetivo público e privado toma por base a
pessoa do sujeito passivo da relação jurídica. Quando obrigado por pessoa de
Direito Público, o direito subjetivo será público e, inversamente, quando na
relação jurídica o obrigado for pessoa de Direito Privado, o direito subjetivo
será privado. Esta distinção não é antiga, de vez que até há pouco tempo,
relativamente não se admitia a existência de direito subjetivo público, em
face do Direito, pois ele não estaria sujeito às suas normas. O direito subje-
tivo público divide-se em direito de liberdade, de ação, de petição e direitos
políticos (NADER, 2001, p. 303).
Direito objetivo e Direito subjetivo 111

Dessa forma, se o Direito subjetivo possui características que são conexas


com um dever de abstenção de uma ou mais pessoas (física ou jurídica),
estamos lidando com a categoria de direitos subjetivos privados; no entanto,
se a proteção dos direitos subjetivos em questão requere uma abstenção do
Estado, trata-se da categoria de direito subjetivo público.
Como exemplo de Direito subjetivo privado, podemos destacar o direito
de propriedade, em que a propriedade de uma pessoa sobre determinado objeto
requer a abstenção de outras pessoas tomarem essa coisa para si. No caso de
tomada de coisa alheia em proveito próprio, estamos diante do crime de furto
ou roubo, a depender das circunstancias concretas.
O mesmo exemplo pode ser utilizado para descrever um Direito subjetivo
público, pois mesmo o Estado deve abster-se de utilizar a propriedade de outra
pessoa, sendo a prerrogativa estatal de expropriação uma exceção à regra que
gera o dever de compensação pela ruptura para com o seu dever de abstenção
em relação ao direito subjetivo lesado.
A segunda categoria elencada por Nader (2001, p. 303) diz respeito à divisão
dos direitos subjetivos em categorias patrimoniais ou não patrimoniais:

Direitos subjetivos privados — sob o aspecto econômico, os direitos subjeti-


vos privados dividem-se em patrimoniais e não-patrimoniais. Os primeiros
possuem valor de ordem material, podendo ser apreciados pecuniariamente,
o que não sucede com os não-patrimonais, de natureza apenas moral.

Dessa forma, se estamos tratando de um direito de propriedade sobre um


veículo, o objeto veículo claramente possui valor econômico determinável,
de modo que se trata de um direito subjetivo patrimonial; no entanto, se
estamos diante da saúde psicológica de uma pessoa ou do seu sofrimento físico
ou psíquico, estamos diante de categorias de difícil mensuração financeira, de
modo que se trata de direitos subjetivos não patrimoniais, ou morais, cuja
lesão enseja na norma de responsabilização sobre o bem lesado.
Outra categoria trazida pelo autor diz respeito aos direitos subjetivos
absolutos ou relativos:

[...] nos direitos absolutos a coletividade figura como sujeito passivo da relação.
São direitos que podem ser exigidos contra todos os membros da coletividade,
por isso são chamados erga omnes. O direito de propriedade é um exemplo.
Os relativos podem ser opostos apenas em relação a determinada pessoa ou
pessoas, que participam da relação jurídica. Os direitos de credito, locação,
familiais são alguns exemplos (NADER, 2001, p. 304).
112 Direito objetivo e Direito subjetivo

Nos direitos erga omnes, portanto, toda a coletividade deve se abster de


realizar condutas que lesem o direito subjetivo em questão, como é o caso da
vida, liberdade, igualdade, integridade física, etc. Já quanto aos direitos inter
partes, como é o caso dos direitos negociais, apenas aqueles que concordaram
em estabelecer os seus direitos e deveres recíprocos são obrigados pelo ato
jurídico ao qual se vincularam.
Por exemplo, apenas a empresa que realizou determinada oferta é vinculada
às suas condições, não podendo o consumidor exigir as mesmas condições
de outro fornecedor do mesmo produto, visto que somente o Direito objetivo
pode determinar regras de ordem geral aos privados — com exceção dos
direitos naturais, essenciais à vida e ao cumprimento das funções dos seres
humanos, conforme o jusnaturalismo recebido pelos direitos fundamentais
constitucionais.
A próxima classificação diz respeito aos direitos transmissíveis e não
transmissíveis:

Direitos transmissíveis e não-transmissíveis — como os nomes indicam,


os primeiros são aqueles direitos subjetivo que podem passar de um titular
para outro, o que não ocorre com os não-transmissíveis, seja por absoluta
impossibilidade de fato ou por impossibilidade legal (NADER, 2001, p. 304).

Como exemplo de direitos transmissíveis, temos os direitos de propriedade


sobre coisas móveis, por exemplo, que podem ser transferidos por meio de
compra e venda, em que a transmissão se dá mediante pagamento de dinheiro.
Já como exemplo de direito não transmissível, pode ser exemplificado o
direito à vida, em que é impossível, por limitações do mundo dos fatos (im-
possibilidade de fato), a transferência da vida e uma pessoa a outra — mesmo
se possível fosse, o ordenamento jurídico o vedaria por se tratar de um direito
fundamental e natural do ser humano (impossibilidade legal).
A penúltima categoria compilada pelo autor é a dos direitos principais
e acessórios:

Direitos principais e acessórios – os primeiros são independentes, autônomos,


enquanto que os direitos acessórios estão na dependência do principal, não
possuindo existência autônoma. No contrato de mútuo, o direito ao capital é
o principal e o direito aos juros é acessório (NADER, 2001, p. 305).
Direito objetivo e Direito subjetivo 113

Outro exemplo de direitos principais e acessórios pode ser encontrado nas


relações contratuais, em que o objeto de determinado negócio jurídico pode
depender do cumprimento de determinadas obrigações acessórias, como a
compra e venda de artefato na internet em relação ao dever acessório de trans-
porte da coisa entre o comprador e o vendedor. Em que pese o cumprimento
do dever principal de transmitir a coisa dependa do segundo, a modalidade
de transporte, por exemplo, é acessória ao objeto principal, que é a tradição
da propriedade.
Finalmente, Nader traz como última categoria de classificação dos direitos
subjetivos aqueles que são renunciáveis e aqueles que não são renunciáveis:

Direitos renunciáveis e não-renunciáveis — os direitos renunciáveis são


aqueles que o sujeito ativo, por ato de vontade, pode deixar a condição de
titular do direito sem a intenção de transferi-lo a outrem, enquanto que nos
irrenunciáveis tal fato é impraticável, como se dá com os direitos persona-
líssimos (NADER, 2001, p. 305).

Essa categoria, como vimos, é o pivô das principais críticas às teorias da


natureza jurídica dos direitos subjetivos da vontade e da intenção, uma vez
que há direitos sobre os quais o seu detentor não pode renunciar frente ao
ordenamento jurídico, não dependendo, portanto, da sua vontade a proteção
desses direitos — um exemplo é o direito subjetivo à liberdade. Em que pese
os negócios jurídicos serem a expressão máxima da vontade dos indivíduos, é
vedada a transação que tenha por objeto o trabalho escravo, frente ao direito
personalíssimo da liberdade da pessoa humana; em contrapartida, o direito
renunciável é aquele em que o ordenamento jurídico dispõe maior grau de
liberdade para o indivíduo dispor dos seus direitos e transferi-los conforme
a sua vontade, desde que respeitados os limites de validade que o Direito
objetivo impõe; como é o caso da compra e venda, dos testamentos, legados,
trabalho, etc.
Assim, conforme a compilação trazida por Nader na obra Introdução ao
estudo do Direito, os direitos subjetivos podem ser classificados quanto à sua
disponibilidade, relação de necessariedade ou subsidiariedade, transmissibili-
dade, grau de abstenção entre coletividades definidas ou indefinidas, e final-
mente em relação à natureza jurídica de quem se abstém (pública ou privada).
114 Direito objetivo e Direito subjetivo

JHERING, R. V. O espírito do Direito romano. São Paulo: Alba. 1943. v. 1–2.


KELSEN, H. Teoria pura do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
NADER, P. Introdução ao estudo do Direito: de acordo com a constituição de 1988. 21.
ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001.

Leituras recomendadas
BEVILACQUA, C. Teoria geral do Direito Civil. Rio de Janeiro: Rio, 1975.
GOMES, O. Introdução ao Direito Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2016.
MIRANDA, P. de. Tratado das ações. Campinas: Bookseller, 2016.
REALE, M. Lições preliminares de Direito. São Paulo: Saraiva, 2003.
SAVIGNY, F. C. von. Sistema do Direito romano atual. Ijuí: Ijuí, 2004.

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