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Direito administrativo

É o ramo de direito público, formado por um conjunto de normas, regras e princípios,


dotadas de uma lógica própria e traços específicos, que regulam a organização e
funcionamento da Administração Pública, o direito da organização administrativa, bem
como as relações que esta estabelece com outros sujeitos de Direito no exercício da
atividade administrativa de gestão pública, o direito da atividade administrativa.

Administração pública

É o conjunto de entidades, órgãos, serviços e agentes, que correspondem à


administração em sentido objetivo ou orgânico, articulados entre si, que executam
tarefas, correspondestes à administração em sentido objetivo ou material,
preordenadas, fixadas pelo legislador, com vista à satisfação do interesse público.
Prosseguem fins heterónomos, não escolhidos por ela, mas pelo legislador.

Interesse público

É o fim prosseguido pela administração pública para satisfação das necessidades de uma
sociedade politicamente organizada, que o legislador qualifica como indispensáveis. São
interesses gerais ou coletivos identificados pelos órgãos político-legislativos,
essencialmente através da função legislativa e pelos órgãos administrativos da
comunidade, sendo definido por lei.
Segundo o princípio da prossecução do interesse público, este tem de ser prosseguido
pela administração pública, uma vez que caso este não existisse, também não existiria
a necessidade de administração pública; este princípio é definido por lei no artigo 4º
CPA.
Segundo o princípio da legalidade os órgãos da administração pública, na prossecução
do interesse público, devem atuar em conformidade com a lei e com o direito (artigo 3º
CPA) respeitando os direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos (artigo 3º
CPA).

Interesse público primário: corresponde ao bem comum, ao bem-estar material e


espiritual da comunidade. São os objetivos últimos de uma comunidade politicamente
organizada, difíceis de atingir e nunca inteiramente efetiváveis, cuja realização imediata
é pedida aos órgãos político-legislativos da comunidade.

Interesse público secundário ou instrumental: corresponde aos meios necessários para


a prossecução do interesse público primário. Sempre que é atribuído poder a um órgão,
este está afeto a um interesse público secundário.
Administração pública em sentido orgânico ou subjetivo

Este nível de administração compreende os vários níveis de administração, a


multiplicidade de entes públicos existentes em cada um desses níveis. Traduz-se no
complexo de entidades, órgãos, serviços e agentes que têm como tarefa fundamental a
satisfação do interesse público, estruturando-se e funcionando de forma articulada,
assumindo a expressão de administração um significado organizatório.
A administração pública em sentido organizatório é composta pelo Estado-
administração e pelos demais entes públicos com natureza jurídico-organizatória
pública, que compreende a administração estadual e a administração autónoma.

Administração pública em sentido objetivo

A administração em sentido objetivo apresenta três significados possíveis. A


administração em sentido material que se reconduz à atividade administrativa como
conjunto típico de tarefas reconduzíveis à ideia de administrar; a administração em
sentido funcional, que abarca toda a atividade administrativa resultante do exercício da
função administrativa pelas entidades nesta investidas, independentemente da sua
natureza, pública ou privada; e a administração em sentido formal, que corresponde aos
atos jurídicos típicos da função administrativa com valor formal e força jurídica própria
através dos quais se manifesta normalmente a atividade administrativa e dos quais se
destacam o regulamente, o ato e o contrato administrativos.

Administração pública em sentido material

É a atividade de administrar típica dos órgãos e serviços administrativos, que estes


desenvolvem no interesse geral da comunidade. Esta reflete os princípios e apresenta
as características especiais que a atuação da administração deve observar e possuir.
Trata-se de um modo especial e típico de atuação privativo dos entes ou sujeitos
públicos com determinadas notas externas típicas que as distinguem da atuação dos
demais sujeitos jurídicos.
Quando se fala nesta constata-se que nunca é uma atividade privada, mas sim uma
atividade formal e substancialmente pública, exercida em função de alguma coisa que é
exterior àquele que a exerce.
Administração pública em sentido funcional

Consiste na atividade levada a cabo pelos órgãos e serviços administrativos e também


pelas entidades substancialmente privadas investidas no exercício da função
administrativa, como por entidades formalmente privadas, mas sob a influência pública,
desde que desempenhem funções administrativas.
Compreende toda a atividade resultante do exercício da função administrativa, seja
levada a cabo por entidades privadas ou por entidades públicas, podendo ser regida
pelo direito privado ou pelo direito administrativo. O que revela é que a atividade se
reconduza ao exercício da função administrativa.

Administração pública em sentido formal

Traduz-se no complexo de atos típicos principais através dos quais a administração atua
juridicamente, sendo esses atos considerados os mais fortes e significativos meios
próprios utilizados para a prossecução do interesse público. Estes atos consubstanciam
o modo de agir próprio e típico da administração pública enquanto poder executivo,
desempenhando um papel idêntico ao que a lei e a sentença desempenham enquanto
atos próprios e típico, resultantes do poder legislativo e judicial.
A atividade administrativa é levada a cabo por regulamentos, atos e contratos
administrativos.
Atos administrativos são atos sem carácter normativo, existindo para um caso concreto
e único, esgotando-se neste os seus efeitos jurídicos. Trata-se de decisões
administrativas unilaterais que se impõem aos seus destinatários, circunscrevendo os
seus efeitos a situações concretas.
Regulamentos administrativos são normas jurídicas emitidas pela administração.
Contratos administrativos são acordos de vontade celebrados entre a administração e
um particular, preordenados à prossecução de um interesse público, cuja formação e
execução são regidas pelo direito administrativo.
Administração estadual direta

É formada por um conjunto de órgãos não personalizados, ou seja, que pertencem à


pessoas coletiva pública Estado- Administração, cujo órgão máximo é o Governo, órgãos
esses assistidos por serviços que preparam e executam as respetivas decisões, e que se
estruturam em forma de pirâmide, estando todos eles sujeitos à direção e fiscalização
de um poder situado, em linha máxima, no Governo. Esses órgãos e serviços podem ser
centrais e periféricos. É de destacar que apresenta uma estrutura fortemente
hierarquizada.
Os órgãos centrais são aqueles que têm uma competência alargada a todo o território.
Enquanto os órgãos periféricos ou locais são aqueles que têm competência limitada a
uma certa circunscrição administrativa, sendo aquilo a que chamamos de
desconcentração funcional, que pode ser interna ou externa.

Administração estadual indireta

É composta por pessoas coletivas públicas distintas do Estado-Administração, nos quais


temos os institutos públicos. Trata-se de entes criados pelo Estado, a quem o ato de
criação legislativa atribui tarefas administrativas específicas que se reconduzem a
atribuições estaduais, e cujos dirigentes máximos são nomeados e exonerados
livremente pelo Governo, gozando estes de autonomia jurídica, administrativa,
financeira e patrimonial.
Os institutos públicos escapam ao poder de direção do Governo, ficando apenas
subordinados a poderes de orientação e de controlo do executivo.
É característica essencial desta administração a sua sujeição aos poderes de
superintendência e tutela do Governo.

Do ponto de vista objetivo ou material a administração estadual indireta é uma


atividade administrativa do Estado, realizada, para a prossecução dos fins deste, por
entidades públicas dotadas de personalidade jurídica própria e de autonomia
administrativa ou administrativa e financeira.

De um ponto de vista subjetivo ou orgânico define-se como o conjunto das entidades


públicas que desenvolvem, com personalidade jurídica própria e autonomia
administrativa, ou administrativa e financeira, uma atividade administrativa destinada à
realização de fins do Estado.
Administração estadual independente

É constituída por autoridades criadas por lei para prosseguirem interesses estaduais,
não tendo em alguns casos de personalidade jurídica própria, mas dispondo de poderes
regulatórios intensos.
O que caracteriza este subnível de administração estadual é o facto de não responderem
os seus órgãos dirigentes perante o Governo, pela sua atividade e pelo exercício dos
seus poderes, não estando sujeitos a ordens ou instruções de qualquer instância
superior, nem a poderes de mera orientação ou controlo do Governo.

Administração autónoma

É aquela que prossegue interesses públicos próprios das pessoas que a constituem e por
isso se dirige a si mesma, definindo com independência a orientação das suas atividades,
sem sujeição a hierarquia ou superintendência do Governo. O único poder que
constitucionalmente o Governo pode exercer sobre esta é o poder de tutela. São
exemplos de administração autónoma as associações públicas, as autarquias locais e as
Regiões autónomas dos Açores e da Madeira.

Territorial: é formada por entes autónomos com uma base geográfica que coincide com
determinada parcela do território do Estado. É o caso das autarquias locais e das Regiões
Autónomas. São pessoas coletivas que têm por substrato um conjunto de pessoas que,
por habitarem numa determinada área contígua têm entre si laços de vizinhança
geradores de interesses comuns múltiplos e que se autoadministram, elegendo os
titulares dos órgãos de topo dos respetivos entes.

Funcional: é composta por entes autónomos não territoriais, de base associativa ou


institucional. Estes entes de substrato parcial ou totalmente corporativo prosseguem,
não interesses próprios das respetivas comunidades, mas antes fins específicos e de
cariz estadual, autoadministrando-se, através da eleição dos seus dirigentes. A
Constituição e a lei afastam os poderes de superintendência e quase todos os poderes
de controlo do Governo, gozando de uma autonomia muito próxima da Lei Fundamental
garante aos entes autónomos territoriais.

Autarquias locais

Pertencem à administração autónoma, sendo pessoas coletivas distintas do Estado. São


pessoas coletivas públicas de população e território, correspondentes aos agregados de
residentes de diversas circunscrições do território nacional, e que asseguram a
prossecução dos interesses comuns resultantes da vizinhança mediante órgãos
próprios, representativos dos respetivos habitantes.
Poder de direção

É um poder de controlo típico da administração estadual direta. Caracteriza-se pelo


poder que o órgão dirigente tem de fixar ao órgão dirigido, quer os fins a alcançar, quer
os meios através dos quais irá atingir esses fins. Este poder inclui a possibilidade de o
órgão dirigente emanar verdadeiras ordens que o órgão dirigido tem necessariamente
de acatar, a menos que se trate de uma ordem manifestamente ilegal ou cujo
cumprimento se vá traduzir na prática de um ilícito criminal.

Poder de superintendência

É o poder conferido ao Estado ou a outra pessoa coletiva de fins múltiplos, como as


autarquias, de definir os objetivos e guiar a atuação das pessoas coletivas públicas de
fins singulares colocadas por lei na sua dependência. Quanto às últimas, este poder,
traduz-se na fixação de orientações estratégicas.
É um poder característico da administração estadual indireta. A superintendência
implica que o órgão que superintende tenha a possibilidade de fixar os fins a atingir pela
entidade superentendida, mas não de lhe fixar os meios através dos quais cai atingir
esses fins, ao contrário do poder de direção.

Poder de tutela

Consiste no conjunto de poderes de intervenção de uma pessoa coletiva pública na


gestão de outra pessoa coletiva pública, a fim de assegurar a legalidade e/ou mérito da
sua atuação. Desta definição resulta que a tutela pressupõe a existência de duas pessoas
coletivas públicas distintas e que o fim da tutela administrativa é assegurar, em nome
da entidade tutelar, que a entidade tutelada cumpra as leis em vigor e garantir que são
adotadas as soluções convenientes e oportunas para a prossecução do interesse
público.
É um poder típico de controlo da administração autónoma. A tutela, quanto ao fim, tem
tradicionalmente duas vertentes, a tutela de legalidade e a tutela de mérito.
Na tutela de legalidade, a tutela traduz-se num poder de fiscalização da conformidade
da atuação de um órgão administrativo face à lei. Na tutela de mérito, o poder de
fiscalização vai mais longe e estende-se ao mérito dessa atuação, ou seja, trata-se de
fiscalizar a conveniência e a oportunidade da atuação administrativa.
Espécies de tutela

Tutela inspetiva: é o poder que o órgão tutelante tem de fiscalizar os documentos e as


contas do órgão tutelado. É uma tutela aceite entre nós.

Tutela anulatória: é o poder que o órgão tutelante tem de aplicar sanções ao órgão
tutelado, dentro dos limites da lei. É aceite entre nós, em regra, após a tutela inspetiva.

Tutela revogatória: é o poder que o órgão tutelante tem de revogar os atos praticados
pelo órgão tutelado, uma vez que a revogação tem por base critérios de mérito, esta
espécie de tutela não é aceite no nosso ordenamento jurídico.

Tutela substitutiva: é o poder que o órgão tutelante tem de se substituir ao órgão


tutelado na prática de um ato administrativo que este último tenha omitido ilegalmente.
Desconcentração funcional

Típica da administração estadual direta. Traduz-se na divisão do poder decisório pelos


vários órgãos da mesma pessoa coletiva. Todos os órgãos integrados na pessoa coletiva
do Estado têm poder decisório próprio. Esta desconcentração pode alcançar duas
formas, a desconcentração originária e a desconcentração derivada.
A desconcentração originária significa que é a lei que direta e imediatamente fixa a
competência do órgão administrativo.
A desconcentração derivada significa que o órgão administrativo detentor de uma
determinada competência, desde que para tal habilitado por lei, pode delegar noutro
órgão, passando esse a exercer essa competência. É a figura da delegação de poderes.

Desconcentração personalizada

Típica da administração estadual indireta. Neste tipo de desconcentração o poder


decisório encontra-se dividido pelos vários órgãos de uma pessoa coletiva, mas, além
disso, encontra-se, logo à partida, dividido por várias pessoas coletivas. Estas pessoas
coletivas verificam um certo grau de autonomia face ao Estado que se traduz numa
autonomia patrimonial, financeira, uma vez que estas entidades elaboram o seu próprio
orçamento e executam-no, mas sempre sujeitas ao orçamento do Estado e à
fiscalização, e administrativa, dado que têm o poder de praticar atos administrativos.

Descentralização

Típica da administração autónoma. Esta descentralização implica a existência de


pessoas coletivas públicas verdadeiramente autónomas face ao Estado, caracterizando-
se por uma autonomia necessária, dado que resulta de imperativo constitucional;
autonomia genérica, uma vez que estas pessoas coletivas públicas têm de prosseguir
interesses públicos próprios distintos dos interesses públicos do Estado; e uma
autonomia democrática, pois os principais órgãos dirigentes e os seus titulares são
eleitos por sufrágio direto, universal e secreto, típico do voto.
Atribuições e competências

As pessoas coletivas públicas existem para prosseguir determinados fins, aos quais
chamamos de atribuições, que são os fins ou interesses públicos que a lei incumbe as
pessoas coletivas de prosseguir e realizar. Para esse efeito, as pessoas coletivas dispõem
de órgãos que detêm poderes funcionais, poderes esses que se designam de
competências.
Assim, as competências são o conjunto de poderes funcionais que a lei confere aos
órgãos administrativos da pessoa coletiva pública em que estão inseridos, enquanto as
atribuições são os fins ou interesses que a lei incumbe as pessoas coletivas de realizar.
No caso de os órgãos da administração praticarem atos estranhos às atribuições das
pessoas coletivas públicas os atos são nulos (artigo 161º/2/b CPA). Caso pratiquem atos
fora da competência do órgão que os deve praticar os atos são anuláveis (artigo 163º/1
CPA).

Pessoas coletivas públicas

A organização administrativa corresponde ao conjunto de unidades organizatórias que


desempenham, a título principal, a função administrativa. Como elementos temos as
pessoas coletivas de direito público, que se manifestam através dos órgãos
administrativos que têm na sua dependência serviços públicos.
As pessoas coletivas públicas são pessoas coletivas criadas por iniciativa pública,
dotadas de prerrogativas de direito público para assegurar a prossecução de interesses
públicos, respeitando os critérios de iniciativa, poderes e finalidade.
São dirigidas por órgãos, a quem cabe tomar as decisões em nome delas. Os órgãos são
centros institucionalizados de poderes funcionais, com titulares ou membros, poderes
funcionais esses que são atribuídos em função da prossecução de fins públicos
específicos e predeterminados.
Princípio da legalidade

Segundo este princípio a administração pública só pode atuar quando a lei o permitir,
segundo uma lei habilitante. O princípio da legalidade da administração no que respeita
à atividade da administração de gestão pública desdobra-se em três subprincípios, o
princípio do primado de lei, da precedência de lei e da reserva de lei.
Segundo o princípio do primado da lei, não pode a atividade da administração contrariar
a lei, e, no caso de existir contrariedade entre o ato administrativo e a lei, prevalece
esta, com a consequente invalidade do ato, regulamento ou contrato administrativo que
a contrarie.
Segundo o princípio da precedência de lei o poder administrativo tem de estar fixado
previamente na lei em matéria de normas, competências e fins, ou seja, os entes
públicos só podem atuar quando a lei o permite e é necessário. A atividade da
administração tem de ser conforme à lei, não bastando não a contrariar, como afirma o
artigo 3º CPA, quando diz “dentro dos limites dos poderes conferidos e em
conformidade com o fim”.
Segundo o princípio de reserva de lei exige-se que nas matérias cuja regulação a
Constituição reserve à lei não pode o próprio legislador atribuir à administração.
Função administrativa e função política

A função política corresponde à prática de atos que exprimem as grandes opções sobre
a definição e prossecução dos interesses essenciais da coletividade.
Quanto ao fim, a finalidade da administração política é a definição dos interesses gerais
da comunidade, enquanto a finalidade da função administrativa é a realização, em
concreto, desses mesmos interesses.
Quanto ao objeto, constituem objeto da função política as prioridades a fixar para um
determinado país, em contrapartida, o objeto da função administrativa traduz-se na
satisfação regular e contínua das necessidades coletivas.
Por fim, quanto à natureza, a função política é criadora e plenamente inovadora, sendo,
portanto, uma função livre e uma função primária. Já a função administrativa é uma
função com natureza executiva e condicionada à lei, sendo, desse modo, uma função
secundária.

Função administrativa e função legislativa

A função legislativa é uma função primária que consiste na atividade permanente do


poder político que se traduz na elaboração de regras de conduta social, segundo formas
previstas constitucionalmente.
No que respeita a função administrativa esta é uma função secundária, totalmente
subordinada à lei, dado que a lei é fundamento, critério e limite de toda a atividade
administrativa.
Função administrativa e função jurisdicional

A função judicial é a que corre mais risco de se confundir com a função administrativa,
uma vez que são ambas funções derivadas ou secundárias, subordinadas ao direito.
Trata-se de duas funções secundárias, uma vez que se traduzem na execução da lei. A
função jurisdicional visa aplicar o direito aos casos concretos dependendo os direitos e
os interesses legalmente protegidos dos particulares. Já a função administrativa visa
prosseguir interesses públicos relativos à coletividade.
Por outro lado, a função judicial tem uma atividade essencialmente jurídica de
interpretação e aplicação do direito a conflitos concretos. Em contrapartida, a função
administrativa, embora também tenha essa função de atividade jurídica, vai mais longe
realizando também operações materiais no âmbito da prossecução do interesse público.
A função judicial apresenta como características a sua independência, uma vez que os
seus órgãos, os tribunais, são órgãos soberanos do Estado independentes dos outros
órgãos; passividade, o que significa que os Tribunais não andam à procura dos conflitos,
tendo de ser os particulares a se dirigir aos Tribunais; e a sua imparcialidade.
Por outro lado, a função administrativa, caracteriza-se pela sua dependência; iniciativa,
uma vez que sempre que surge um interesse público a acautelar a administração pública
vai atuar; e a sua parcialidade, pois está sempre do lado do interesse público.
Delegação de poderes

A delegação de poderes é o ato pelo qual um órgão da Administração, normalmente


competente para decidir em determinada matéria, permite, de acordo com a lei, que
outro órgão ou agente pratique atos administrativos sobre a mesma matéria.
Os requisitos da delegação são: a existência de uma lei habilitante, uma lei que preveja
expressamente a faculdade de um órgão delegar poderes noutro; é necessária a
existência de dois órgãos, ou de um órgão e de um agente da mesma pessoa coletiva
pública, ou de dois órgãos de pessoas coletivas públicas distintas, dos quais um seja o
órgão normalmente competente e outro seja o órgão eventualmente competente; e a
necessidade da prática do ato de delegação de poderes propriamente dito, o ato pelo
qual o delegante concretiza a delegação de poderes no delegado, permitindo-lhe a
prática de certos atos na matéria sobre a qual é normalmente competente.

Espécies de delegação

Ampla ou restrita, conforme o delegante resolva delegar uma grande parte dos seus
poderes ou apenas uma pequena parcela deles.

Quanto ao objeto pode ser específica e genérica. É específica quando abrange a prática
de um ato isolado, sendo que uma vez praticado o ato delegado a delegação caduca.
É genérica quando abrange a prática de uma pluralidade de atos, sendo que uma vez
praticado o ato delegado, o delegado continua indefinidamente a dispor da
competência, a qual exercerá sempre que tal se torne necessário.

Requisitos

Quanto ao conteúdo: no ato de delegação deve o órgão delegante especificar os


poderes que são delegados ou os atos que o delegado pode praticar, devendo incluir a
indicação da norma que atribui o poder ao delegado, bem como a norma habilitadora
da delegação – artigo 47º/1 CPA. Este requisito é um requisito de validade, pelo que a
falta dele torna o ato de delegação inválido.

Quanto à publicação: a publicação dos atos de delegação deve fazer-se mediante o


disposto no artigo 159º CPA – artigo 47º/2 CPA. A publicidade é um requisito de eficácia,
pelo que a falta deste requisito conduz à ineficácia do ato de delegação.
Natureza jurídica da delegação de poderes

Tese da alienação: segundo esta tese, a delegação de poderes é um ato de transmissão


ou alienação de competência do delegante para o delegado. A titularidade dos poderes,
que pertenciam ao delegante antes da delegação, passa por força desta, e com
fundamento na lei da habilitação, para a esfera de competência do delegado.

Tese da autorização: de acordo com esta tese, a competência do delegante não é


alienada nem transmitida, no todo ou em parte, para o delegado. O que acontece é que
a lei da habilitação confere desde logo uma competência condicional ao delegado sobre
as matérias em que permite a delegação. Antes da delegação o delegado já é
competente, só que não pode exercer essa competência enquanto o delegante não o
permitir. O ato de delegação visa facultar ao delegado o exercício de uma competência
que, embora condicionada à obtenção de uma permissão do delegante, já é uma
competência do delegado.

Tese da transferência de exercício: segundo esta tese, a delegação de poderes não é


uma alienação, uma vez que o delegante não fica alheio à competência que decida
delegar, nem é uma autorização, porque antes de o delegante praticar o ato de
delegação o delegado não é competente, advindo esta do ato de delegação, e não da lei
de habilitação. Por outro lado, a competência exercida pelo delegado com base na
delegação de poderes não é uma competência própria, mas uma competência alheia. A
delegação de poderes constitui assim uma transferência do delegante para o delegado,
não, porém, uma transferência de titularidade dos poderes, mas uma transferência do
exercício de poderes.
Integração de poderes

Sistema em que todos os interesses públicos a prosseguir pelo Estado, ou pelas pessoas
coletivas de população e território, são postos por lei a cargo das próprias pessoas
coletivas a que pertencem.

Devolução de poderes

Sistema em que alguns interesses públicos do Estado, ou de pessoas coletivas de


população e território, são postos por lei a cargo de pessoas coletivas públicas de fins
singulares. A expressão devolução de poderes é usada para designar o movimento da
transferência de atribuições do Estado para outra entidade.
Discricionariedade

Quando exerce poderes discricionários a administração deixa de atuar na zona de


legalidade restrita para o fazer na zona de mérito. A administração passa a guiar-se por
critérios de oportunidade ou conveniência, cabendo-lhe a si escolher, em cada situação
em concreto, os meios mais adequados à realização do interesse público, em função de
parâmetros técnicos e à luz das regras da eficácia e da eficiência.
Entende-se por competência discricionária a liberdade que é atribuída a um órgão
administrativo de, por delegação do legislador, conformar o conteúdo das decisões
relativas a casos concretos numa determinada matéria.
A discricionariedade administrativa trata-se de uma margem de livre atuação da
administração pública que é conferida por lei e que é da sua responsabilidade, sendo
essa liberdade sempre orientada pela lei, que a concede. A discricionariedade não é
arbitrariedade, tendo como única fonte a lei. De tal modo, o Tribunal só pode analisar a
conduta e ver se há a violação de algum direito quando há discricionariedade.

A lei pode conceder discricionariedade através de 4 formas:

Indeterminações estruturais: a utilização de indeterminações que respeitam a estrutura


das normas podem, por vezes, por si só conferir discricionariedade à administração
pública, através de normas facultativas ou normas obrigatórias de escolha alternativa.
• Normas facultativas são aqueles que utilizam o conceito pode, ou seja, caso se
verifique determinado facto, X, a administração pode Y.
• Normas obrigatórias de escolha alternativa são aqueles em que caso se verifique
determinado acontecimento da vida real a administração tem de atuar, dando-
se à administração diversas formas de atuar. Caso seja uma norma obrigatória,
mas sem escolha alternativa já não se concede discricionariedade à
administração.
Aqui, se X, a administração deve Y, W ou Z, há uma concessão de
discricionariedade, mas se X, a administração deve apenas Z, já não concede
discricionariedade.
Indeterminações concetuais: por vezes o legislador lança mão de conceitos imprecisos
ou indeterminados que são conceitos com um conteúdo elástico, ou seja, são suscetíveis
de várias interpretações possíveis. Estes conceitos aparecem normalmente ao lado da
previsão da norma. No entanto, apenas alguns destes conceitos atribuem
discricionariedade à administração pública.
• Conceitos imprecisos classificatórios: estes conceitos não atribuem
discricionariedade à administração, pois, embora abstratamente sejam
suscetíveis de várias interpretações, uma vez contextualizados na norma,
perdem a sua elasticidade, sendo suscetíveis de uma única interpretação.
• Conceitos imprecisos tipo: atribuem discricionariedade ao agente
administrativo, uma vez que estes conceitos, mesmo depois de contextualizados
na norma, não perdem a sua elasticidade, não podendo o seu preenchimento
ser apurado apenas em função de um raciocínio de interpretação, sendo
necessário um raciocínio subsumido, ou seja, é necessário reconduzir a situação
real à subsunção no conceito impreciso.

Prerrogativas de avaliação: são momentos procedimentais que conferem à


administração grande margem de discricionariedade, o que implica que o Tribunal não
pode nestes casos implicar esta avaliação feita pela administração pública.

Juízos de prognose: estes juízos têm base num raciocínio de uma probabilidade de que
venha a acontecer um determinado facto ou um determinado efeito, procedendo a
administração desde logo a uma atuação tendente a afastar a ocorrência de tal facto ou
efeito, conferindo a lei à administração o direito de atuar previamente.
Vinculação e discricionariedade

Quando a Administração exerce poderes discricionários, deixa de atuar na zona de


legalidade restrita, passando a fazê-lo na zona de mérito. Neste caso, em vez da atuação
se traduzir na aplicação de regras jurídicas, a administração passa a guiar-se por critérios
de oportunidade ou conveniência, cabendo-lhe a si escolher em cada situação concreta
os meios mais adequados à realização do interesse público, em função de parâmetros
técnicos e à luz de ditames de eficácia e eficiência.
Entende-se por competência discricionária a liberdade que é atribuída a um órgão
administrativo de, por delegação do legislador, conformar o conteúdo das decisões
relativas a casos concretos numa determinada matéria.
A discricionariedade administrativa trata-se de uma margem de livre atuação da
administração pública que é conferida por lei e que é da sua responsabilidade, sendo
essa liberdade sempre orientada pela lei, que a concede. A discricionariedade não é
arbitrariedade, tendo como única fonte a lei. De tal modo, o Tribunal só pode analisar a
conduta e ver se há a violação de algum direito quando há discricionariedade.
Em contrapartida, quando a competência do tribunal é vinculada, a aplicação da lei pela
administração, tendo esta, imediata e mediatamente como parâmetros de atuação
regras jurídicas, constitui uma mera operação silogística, em que figuram a lei como
premissa maior, o caso concreto subsumido à previsão legal como premissa menor e a
decisão de aplicação da lei ao caso como a conclusão do silogismo. Estamos assim
perante uma atuação automática, totalmente conduzida por um legislador que
antecipadamente a programa em cada detalhe.
Sendo a competência vinculada, os Tribunais administrativos podem e devem, na sua
atuação revisora da atividade administrativa, levar a cabo um controlo positivo e total
do modo como a administração aplicou a lei, ou seja, a atuação do tribunal não deverá
ser apenas de declarar a nulidade ou anular o ato, devendo incluir também a
determinação do conteúdo do ato a praticar, enquanto ato devido.
Pessoa coletiva e órgão

A administração é constituída por pessoas coletivas que são figuras abstratas detentoras
de poderes, direitos e deveres, sendo ss pessoas coletivas o conjunto que designa a
administração pública, as pessoas de direito público.
As pessoas coletivas de direito público caracterizam-se por serem dotadas de
personalidade jurídica própria, podendo, nessa medida, atuar por si próprias na sua
capacidade jurídica, sendo sujeitos de relações jurídicas.
Estas pessoas coletivas distinguem-se das demais uma vez que a lei lhes atribui a
prossecução direta e imediata do interesse público. Atuam sob a égide do direito
administrativo, no uso da sua capacidade jurídica especial, que é constituída por
poderes funcionais que integram as suas competências.
O órgão trata-se do elemento da pessoa coletiva, consistindo num centro
institucionalizado de poderes funcionais a exercer pelo indivíduo ou pelo conjunto de
indivíduos que nele estiverem providos com o objetivo de exprimir a vontade
juridicamente imputável a essa pessoa coletiva. Deste modo, pode concluir-se que é
através dos órgãos que se forma a vontade da pessoa coletiva, que esta atua e se
manifesta, interagindo com os demais sujeitos de direito.
Os órgãos são, portanto, meios indispensáveis para as pessoas coletivas públicas
atingirem os seus fins e cumprirem as tarefas que lhes foram encarregues, tendo como
função tomar decisões e manifestar uma vontade que será imputada à pessoa coletiva
ou sujeito a que pertencem.
Sistemas de administração pública

Sistema britânico ou judicial: este sistema caracteriza-se por ser um sistema fortemente
descentralizado, o que significa que para além do Estado, existem muitas outras
entidades que exercem igualmente a atividade administrativa. Neste modelo, as
decisões administrativas só podem ser executadas através da intervenção de um
Tribunal, o que revela uma grande força jurídica das decisões administrativas. É de
destacar que neste modelo não havia direito administrativo.

Sistema francês ou executivo: este modelo caracteriza-se por uma forte centralização
do poder, o que significa que é o Estado quem, maioritariamente exerce a atividade
administrativa. No que respeita a força jurídica das decisões administrativas, neste
modelo as decisões administrativas têm força jurídica própria, podendo ser executadas
pela administração, independentemente do recurso a um Tribunal. Ao contrário do
sistema britânico, neste sistema já há a presença de direito administrativo.

Modelo português: o sistema português é um sistema de administração executiva,


inspirado no sistema francês, mas apresentando, atualmente, algumas semelhanças
com o sistema britânico. Neste sistema assiste-se a uma descentralização, mas
considera-se que ainda é um sistema tendencialmente centralizado, aproximando-se do
sistema britânico. As decisões da administração pública são decisões que apresentam
uma força jurídica própria, característica do sistema francês. Neste modelo há ainda
direito administrativo e verdadeiros tribunais administrativos.
Princípio da igualdade e princípio da proporcionalidade

O princípio da igualdade traduz-se numa autovinculação da administração no âmbito


dos seus poderes discricionários, devendo utilizar critérios substancialmente idênticos
para a resolução de casos idênticos, uma vez que a mudança de critério sem qualquer
fundamento material conduziria à violação deste princípio. Deste modo, a
administração só pode afastar-se de uma prática anterior que não seja considerada
ilegal se existirem alterações na dimensão do interesse público prosseguido ou dos
interesses particulares comprometidos.
O princípio da proporcionalidade constitui um limite interno da discricionariedade
administrativa, que implica que a administração não está apenas obrigada à
prossecução do interesse público, a alcançar os fins visados pelo legislador, mas também
a consegui-lo pelo meios que representa um menor sacrifício das posições jurídicas dos
particulares, desdobrando-se a disposição legal e a juridicidade da decisão
administrativa, nas ideias de adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido
estrito.

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