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LP

EM.12.LP.3.7.11.P-3921

Sequência Didática do Professor


Leitura e

Campo artístico-literário
Interpretação

Ensino Médio Conto - Pré-modernismo


e Modernismo

Habilidades Habilidades
FOCO RELACIONADAS
• (EM13LP49) Perceber as peculiaridades • (EM13LP06) Analisar efeitos de sentido
estruturais e estilísticas de diferentes decorrentes de usos expressivos da
gêneros literários (a apreensão pessoal do linguagem, da escolha de determinadas
cotidiano nas crônicas, a manifestação livre palavras ou expressões e da ordenação,
e subjetiva do eu lírico diante do mundo combinação e contraposição de palavras,
nos poemas, a múltipla perspectiva da vida dentre outros, para ampliar as possibilida-
humana e social dos romances, a dimen- des de construção de sentidos e de uso
são política e social de textos da literatura crítico da língua.
marginal e da periferia etc.) para experi- • (EM13LP46) Compartilhar sentidos
mentar os diferentes ângulos de apreensão construídos na leitura/escuta de textos
do indivíduo e do mundo pela literatura. literários, percebendo diferenças e even-
• (EM13LP01) Relacionar o texto, tanto na tuais tensões entre as formas pessoais e
produção como na leitura/escuta, com as coletivas de apreensão desses textos,
suas condições de produção e seu con- para exercitar o diálogo cultural e aguçar a
texto sócio-histórico de circulação (leitor/ perspectiva crítica.
audiência previstos, objetivos, pontos de
vista e perspectivas, papel social do autor,
época, gênero do discurso etc.), de forma
a ampliar as possibilidades de construção
de sentidos e de análise crítica e produzir
textos adequados a diferentes situações.
LP Leitura e
Interpretação
Campo artístico-literário |
Conto - Pré-modernismo e Modernismo
Ensino Médio

Orientação ao
PROFESSOR
"Enquanto realizava as pesquisas, literário mais adequado à tradução
leituras e releituras que me levaram às dos sentimentos profundos e das
INTRODUÇÃO escolhas finais, não só confirmei que contradições que agitaram nossa alma
Esta SD tem a principal finalidade de a arte do conto brasileiro moderno é basicamente urbana no decorrer das
introduzir e, ao mesmo tempo, ampliar a de nível superior, como tive a alegria últimas décadas."
reflexão dos alunos sobre a diferenciação de constatar que ela não parou de
entre os contos produzidos no Pré-Mo- melhorar e aperfeiçoar-se à medida A SD sobre a leitura de contos do século
dernismo e Modernismo brasileiros, suas que o tempo passava. Claro que temos XX tem, portanto, também a finalidade de
respectivas caracterização, composição, grandes obras de ficção curta na ampliar a reflexão dos alunos sobre as
linguagem e estilo. primeira metade do século. Elas estão características relativas à ficcionalidade,
incluídas nesse volume. Algumas são à literariedade, à narratividade e à veros-
O estudo de três contos brasileiros busca
bastante representativas dos movimen- similhança, além de retomar com o aluno
diferenciar os temas e os estilos dos
tos culturais que formataram o sentir os elementos que estruturam, em geral, a
autores selecionados — Lima Barreto,
e o pensar brasileiros nas diversas narrativa concentrada do conto.
Antônio de Alcântara Machado e Clarice
fases da história contemporânea. Mas
Lispector — num panorama que com- A mobilização de conhecimentos prévios
o fato incontestável é que a partir dos
preende de 1911 a 1960. dos alunos (de mundo, textuais e linguís-
anos 60 o conto passou por verdadeira
ticos), os aprendidos, inclusive em outras
Na introdução de Os cem melhores con- explosão em nosso país, uma autêntica
SDs sobre os gêneros narrativos, em
tos brasileiros do século (Rio de Janeiro: revolução de qualidade. A velocidade
especial o conto, é condição para um me-
Objetiva, 2001, p. 11-12), o pesquisador, narrativa, a capacidade de nocautear
lhor aproveitamento do material, por isso
Ítalo Moriconi, responsável pela seleção o leitor com seu impacto dramático
nada pode ser desconsiderado, principal-
e organização da coletânea, explica que: concentrado, lembrado aqui a defini-
mente nas colocações orais dos alunos
ção de conto dada pelo mestre Júlio
em vários momentos da aprendizagem.
Cortázar, fizeram do gênero o espaço

Orientação ao
PROFESSOR

Ponto de Ponto de
PARTIDA
PARTIDA

A observação e comparação entre


Você, provavelmente, já ouviu falar ou leu sobre os movimentos artísticos do duas pinturas — O Jantar, de Debret,
século XIX até o início do século XX (artes plásticas, literatura, arquitetura etc.) e e Carnaval II, de Di Cavalcanti —,
as profundas mudanças introduzidas com a Semana de Arte Moderna em 1922. tem por finalidade despertar no
Para compreender como isso se deu no Brasil, vamos refletir sobre as diferen- aluno uma reflexão inicial a respeito
dos diferentes modos de conceber
tes concepções de mundo, o modo de representar artisticamente a realidade
e de representar artisticamente o
brasileira, os modos de narrar, buscando caracterizar e, principalmente, distinguir
mundo, em função de alterações so-
o Pré-Modernismo do Modernismo.

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Observe, inicialmente, a pintura a seguir.
Orientação ao
PROFESSOR

ciais na realidade brasileira ao longo


do tempo. Com apoio nos quadros
Você sabia?, das demais informa-
ções a respeito dos dois pintores e
das alterações artísticas do início
do século XX, o aluno deverá refletir,
com seus colegas, sobre as duas
questões propostas — (a) Você
acredita que é possível captar a
essência de um país por meio da
pintura? e (b) De que maneira cada
uma dessas pinturas representou a
vida cotidiana e a cultura brasilei-
ras em sua época? — que orientam
a observação dos quadros e devem
ser entendidas como um roteiro
para suscitar a reflexão e o debate
entre os alunos.
As reflexões dos alunos, orienta- DEBRET. O Jantar.1820. Disponível em: www.iqe.org.br/surl/?1967d6.
dos pelas duas questões, deverão Acesso em: 11 mar. 2020.
ser mediadas e subsidiadas pelo
professor, que poderá ampliar
as informações sobre os dois
quadros observados. O quadro O
Jantar, de Jean-Baptiste Debret
representa uma cena comum ao
?
século XIX, antes da abolição da Você
escravidão no Brasil, quando as SABIA? O francês Jean-Baptiste Debret (1768-1848) foi pintor da
famílias dispunham de escravos corte de Napoleão, além de ter sido pintor oficial da Coroa
negros para servi-las em ambiente Portuguesa no Brasil. Foi um dos fundadores da Academia
doméstico. Há duas crianças nuas Imperial de Belas Artes (AIBA), no Rio de Janeiro e desenhou a bandeira
sendo alimentadas no chão, pelo do Brasil. O quadro O Jantar faz parte da obra Viagem Pitoresca e Históri-
casal de senhores brancos, prova- ca ao Brasil.
velmente filhas dos negros adultos
e serviçais que também participam FRAZÃO, Dilva. Jean Baptiste Debret. Ebiografia, [s.d.]. Disponível em:
www.iqe.org.br/surl/?cd3250. Acesso em: 11 mar. 2020. (Com cortes).
da cena. Como se sabe, a Abolição
da Escravidão no Brasil ocorreu em

Durante o século XIX e início do século XX, na pintura vigorava o academicis-


mo da Escola Nacional de Belas-Artes, do Rio de Janeiro, conforme vimos na pin-
tura O Jantar (1820), de Jean-Baptiste DEBRET. Apenas em 1917, uma exposição
de Anita Malfatti, realizada em São Paulo, provoca uma forte reação que redun-
daria na Semana de Arte Moderna de 1922.
As telas expressionistas apresentadas por Anita Malfatti nessa Exposição de
Pintura Moderna representam um conjunto inédito para o público da época.
Nas obras expostas – como Homem Amarelo (1917), ao lado, são incorpora-
dos procedimentos básicos da arte moderna: a relação dinâmica e tensa entre
a figura e fundo; a pincelada livre que valoriza os detalhes da superfície; os tons
fortes e usados de forma não convencional; as sugestões de luz que fogem ao MALFATTI. Homem Amarelo. 1917.
Disponível em: www.iqe.org.br/surl/?d3c162.
claro-escuro tradicional; e a liberdade de composição. Acesso em: 11 mar. 2020.

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Agora, observe e reflita com seu colega sobre o quadro do brasileiro Di Cavalcanti
Orientação ao
a seguir. PROFESSOR

1888, com a assinatura da Lei Áurea


pela princesa Isabel, devolvendo a
liberdade a uma grande quantidade
de negros escravizados, por isso
essa cena pode ser considerada
como representativa do cotidiano
da época.
Por sua vez, o quadro Carnaval II,
de Di Cavalcanti (1965) representa
os negros e mestiços brasileiros em
uma situação urbana, na rua: livres,
em clima de euforia, de alegria
durante os festejos carnavalescos.
Di Cavalcanti tinha predileção por
retratar mulheres “mulatas brasilei-
ras”, com muita sensualidade. Nas
suas palavras:
“A mulata, para mim, é um símbolo
do Brasil. Ela não é preta nem
branca. Nem rica nem pobre. Gosta
CAVALCANTI. Carnaval II. 1965. Disponível em: www.iqe.org.br/surl/?16fa30. de dança, gosta de música, gosta
Acesso em: 11 mar. 2020. do futebol, como o nosso povo.
Imagino ela deitada em cama
pobre como imagino o país deitado
em berço esplêndido.”

? BELTRÃO, Catherine. Negros e negras.


ArtenaRede, 2015. Disponível em:
Você www.iqe.org.br/surl/?62af01.
SABIA? O pintor carioca Emiliano Augusto Cavalcanti de Albu- Acesso em: 11 mar. 2020.
querque e Melo, mais conhecido como Di Cavalcanti, era
apaixonado pela sua terra, suas personagens, festas,
acontecimentos sociais. Foi um dos idealizadores da Semana de Arte Em relação às características técni-
Moderna (1922) e sua obra representa, principalmente, a paisagem da cas das obras, quando comparadas,
cidade litorânea (praias, favelas, morros e casas típicas dos subúrbios), percebe-se maior academicismo no
suas personagens (as mulatas sensuais, com o olhar triste, as curvas quadro de Debret, O Jantar, pois as
angulosas, o ar misterioso e os movimentos lentos e preguiçosos) e as personagens têm proporcionalidade
cenas cariocas (as festas, o samba, o carnaval). entre si, os seres são representados
são retratados figurativamente em
cores esmaecidas, em um am-
FRAZÃO, Dilva. Di Cavalcanti. Ebiografia, [s.d.]. Disponível em: biente doméstico. Já a obra de Di
www.iqe.org.br/surl/?0c2e71. Acesso em: 11 mar. 2020. (Com cortes)
Cavalcanti, Carnaval II, rompendo
com a tradição, coloca a cena em
perspectiva (frente/fundo), em
cores marcadamente fortes, com
Tomando por base essas primeiras informações, reflita com seu colega sobre
algumas deformações em relação à
as cenas cotidianas brasileiras representadas no quadro O Jantar, de Debret, e proporção corporal, de tal modo que
Carnaval II, de Di Cavalcanti, sua importância histórica e algumas de suas carac- os representados distanciam-se da
terísticas técnicas: as personagens e o modo de representá-las, a perspectiva, o pessoa real.
uso das cores etc.
a) Você acredita que é possível captar a essência de um país por meio da pintura?
b) De que maneira cada uma dessas pinturas representou a vida cotidiana e a
cultura brasileiras em sua época?

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Nessa Sequência Didática você vai ler e comparar contos representativos do Pré-Modernismo e do Modernismo brasi-
leiros. O objetivo é refletir sobre suas características e, especialmente, sobre o que os distingue, visto que são movimentos
literários que se sucederam e que tematizaram a vida dos brasileiros, seus costumes, sua linguagem.

Atividade 1

Texto 1

O HOMEM QUE SABIA JAVANÊS

Em uma confeitaria, certa vez, ao meu amigo Castro, contava eu as partidas que havia pregado às convic-
ções e às respeitabilidades, para poder viver.
Houve mesmo, uma dada ocasião, quando estive em Manaus, em que fui obrigado a esconder a minha qua-
lidade de bacharel, para mais confiança obter dos clientes, que afluíam ao meu escritório de feiticeiro e adivinho.
Contava eu isso.
O meu amigo ouvia-me calado, embevecido, gostando daquele meu Gil Blas vivido, até que, em uma pausa da
conversa, ao esgotarmos os copos, observou a esmo:
— Tens levado uma vida bem engraçada, Castelo!
— Só assim se pode viver... Isto de uma ocupação única: sair de casa a certas horas, voltar a outras, aborrece,
não achas? Não sei como me tenho aguentado lá, no consulado!
— Cansa-se; mas, não é disso que me admiro. O que me admira, é que tenhas corrido tantas aventuras aqui,
neste Brasil imbecil e burocrático.
— Qual! Aqui mesmo, meu caro Castro, se podem arranjar belas páginas de vida. Imagina tu que eu já fui
professor de javanês!
— Quando? Aqui, depois que voltaste do consulado?
— Não; antes. E, por sinal, fui nomeado cônsul por isso.
— Conta lá como foi. Bebes mais cerveja?
— Bebo.
Mandamos buscar mais outra garrafa, enchemos os copos, e continuei:
— Eu tinha chegado havia pouco ao Rio e estava literalmente na miséria. Vivia fugido de casa de pensão em
casa de pensão, sem saber onde e como ganhar dinheiro, quando li no Jornal do Comércio o anúncio seguinte:
“Precisa-se de um professor de língua javanesa. Cartas etc.” Ora, disse cá comigo, está ali uma colocação que não
terá muitos concorrentes; se eu capiscasse quatro palavras, ia apresentar-me. Saí do café e andei pelas ruas, sempre
a imaginar-me professor de javanês, ganhando dinheiro, andando de bonde e sem encontros desagradáveis com os
“cadáveres”. Insensivelmente dirigi-me à Biblioteca Nacional. Não sabia bem que livro iria pedir; mas, entrei, entre-
guei o chapéu ao porteiro, recebi a senha e subi. Na escada, acudiu-me pedir a Grande Encyclopédie, letra J, a fim de
consultar o artigo relativo a Java e a língua javanesa. Dito e feito. Fiquei sabendo, ao fim de alguns minutos, que Java
era uma grande ilha do arquipélago de Sonda, colônia holandesa, e o javanês, língua aglutinante do grupo maleo-poli-
nésico, possuía uma literatura digna de nota e escrita em caracteres derivados do velho alfabeto hindu.
A Encyclopédie dava-me indicação de trabalhos sobre a tal língua malaia e não tive dúvidas em consultar um
deles. Copiei o alfabeto, a sua pronunciação figurada e saí. Andei pelas ruas, perambulando e mastigando letras.
Na minha cabeça dançavam hieróglifos; de quando em quando consultava as minhas notas; entrava nos jardins
e escrevia estes calungas na areia para guardá-los bem na memória e habituar a mão a escrevê-los.

6
À noite, quando pude entrar em casa sem ser visto, para evitar indiscretas perguntas do encarregado, ainda
continuei no quarto a engolir o meu “a-b-c” malaio, e, com tanto afinco levei o propósito que, de manhã, o sabia
perfeitamente.
Convenci-me que aquela era a língua mais fácil do mundo e saí; mas não tão cedo que não me encontrasse
com o encarregado dos aluguéis dos cômodos:
— Senhor Castelo, quando salda a sua conta?
Respondi-lhe então eu, com a mais encantadora esperança:
— Breve... Espere um pouco... Tenha paciência... Vou ser nomeado professor de javanês, e...
Por aí o homem interrompeu-me:
— Que diabo vem a ser isso, Senhor Castelo?
Gostei da diversão e ataquei o patriotismo do homem:
— É uma língua que se fala lá pelas bandas do Timor. Sabe onde é?
Oh! alma ingênua! O homem esqueceu-se da minha dívida e disse-me com aquele falar forte dos portugueses:
— Eu cá por mim, não sei bem; mas ouvi dizer que são umas terras que temos lá para os lados de Macau. E o
senhor sabe isso, Senhor Castelo?
Animado com esta saída feliz que me deu o javanês, voltei a procurar o anúncio. Lá estava ele. Resolvi ani-
mosamente propor-me ao professorado do idioma oceânico. Redigi a resposta, passei pelo Jornal e lá deixei a
carta. Em seguida, voltei à biblioteca e continuei os meus estudos de javanês. Não fiz grandes progressos nesse
dia, não sei se por julgar o alfabeto javanês o único saber necessário a um professor de língua malaia ou se por
ter me empenhado mais na bibliografia e história literária do idioma que ia ensinar.
[...]

BARRETO, Lima. O homem que sabia javanês e outros contos.


Curitiba: Polo Editorial do Paraná, 1997. (Fragmento).

?
Você
SABIA? Afonso Henrique de Lima Barreto (1881-1922), escritor e jornalista carioca, escreveu romances com níti-
dos traços autobiográficos e que exploram as injustiças sociais e as dificuldades das primeiras décadas
da República. Por produzir uma literatura desvinculada dos padrões linguísticos e do gosto vigente à
época, com temática relacionada à vida cotidiana das classes populares, recebeu muitas críticas em seu tempo.

Obras principais:

• Recordações do Escrivão Isaías Caminha, romance, • Clara dos Anjos, romance, 1948
1909 • Coisas do Reino do Jambon, sátira política e literá-
• Aventuras do Dr. Bogoloff, humor, 1912 ria, 1956
• Triste Fim de Policarpo Quaresma, romance, 1915 • Feiras e Mafuás, crônica, 1956
• Numa e Ninfa, romance, 1915 • Bagatelas, crônica, 1956
• Vida e Morte de M. J. Gonzaga e Sá, romance, 1919 • Marginália, crônica sobre folclore urbano, 1956
• Os Bruzundangas, sátira política e literária, 1923 • Vida Urbana, crônica sobre folclore urbano, 1956

FRAZÃO, Dilva. Lima Barreto. Ebiografia, [s.d.]. Disponível em:


www.iqe.org.br/surl/?c62634. Acesso em: 11 mar. 2020. (Fragmento).

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1. “O homem que sabia javanês” foi publicado pela primeira vez no jornal
Orientação ao
PROFESSOR Gazeta da Tarde, Rio de Janeiro (1911), sendo, posteriormente, incluído na
coletânea O homem que sabia javanês e outros contos. A leitura do trecho
inicial do conto permite entender que o tema é uma
Atividade 1 A) sátira social, pois trata do respeito e poder conferidos a quem fala bonito
ou difícil.
Questão 1 – A resposta que contém B) crítica às pessoas que falam javanês e que trabalham no consulado de
o tema desse conto é (A) sátira Java, no Brasil.
social, pois trata do respeito e poder
conferidos a quem fala bonito ou di- C) ironia bem-humorada, visto que narra a vida de uma personagem que
fícil. São observados o oportunismo faz trapalhadas linguísticas.
e a falsa sabedoria da personagem D) crítica político-social porque a personagem trabalha em um consulado
protagonista em contraposição com estrangeiro.
a ingenuidade dos antagonistas (os
enganados), formando um retrato de E) reflexão sobre o papel e a sabedoria necessária a todo professor para
uma faceta do Brasil e do brasileiro: exercer seu ofício.
a nossa vocação para o improviso,
para o “jeitinho brasileiro” que tudo 2. A frase do texto em que se percebe crítica política é:
resolve, mesmo que seja apenas por
meio de aparências. A) Houve mesmo, uma dada ocasião, quando estive em Manaus, em que
fui obrigado a esconder a minha qualidade de bacharel.
Questão 2 – A alternativa correta é
(B) O que me admira, é que tenhas B) O que me admira, é que tenhas corrido tantas aventuras aqui, neste
corrido tantas aventuras aqui, neste Brasil imbecil e burocrático.
Brasil imbecil e burocrático. C) Aqui mesmo, meu caro Castro, se podem arranjar belas páginas de vida.
Questão 3 – O sentido das expres-
D) Eu tinha chegado havia pouco ao Rio e estava literalmente na miséria.
sões grifadas:
E) Animado com esta saída feliz que me deu o javanês, voltei a procurar o
a) as peças que eu pregava para
anúncio.
poder viver.
b) compreendesse quatro palavras.
3. Explique o sentido das expressões grifadas nos trechos do Texto 1, com
c) uma literatura notável, importante.
base no contexto:
d) sinais pictográficos; escrevia
a) Em uma confeitaria, certa vez, ao meu amigo Castro, contava eu as partidas
esses sinais, (quase entidades
que havia pregado às convicções e às respeitabilidades, para poder viver.
para o narrador personagem).

Questão 4 – No Texto 1, o narra-


dor é a personagem protagonista,
portanto o foco narrativo é de 1ª
pessoa, marcado por formas verbais
e pronomes em 1ª pessoa do singu-
b) Ora, disse cá comigo, está ali uma colocação que não terá muitos con-
lar ou do plural, como em: “Em uma
correntes; se eu capiscasse quatro palavras, ia apresentar-me.
confeitaria, certa vez, ao meu amigo
Castro, contava eu as partidas que
havia pregado às convicções e às
respeitabilidades, para poder viver.
Houve mesmo, uma dada ocasião,
quando estive em Manaus, em que
fui obrigado a esconder a minha
c) ...possuía uma literatura digna de nota e escrita em caracteres derivados
qualidade de bacharel, para mais
confiança obter dos clientes, que do velho alfabeto hindu.
afluíam ao meu escritório de feiticei-
ro e adivinho. Contava eu isso.”.

8
d) Na minha cabeça dançavam hieróglifos; de quando em quando consul-
Orientação ao
tava as minhas notas; entrava nos jardins e escrevia estes calungas na PROFESSOR
areia para guardá-los bem na memória e habituar a mão a escrevê-los.

Questão 5 – No Texto 1, a conversa


entre o protagonista, Castelo, e seu
amigo ocorre em uma confeitaria do
Rio (de Janeiro), Brasil. No entanto,
ele faz referência a um aconteci-
mento do passado remoto, ocorrido
4. Quais são as marcas textuais que identificam o narrador e o foco narrativo em Manaus, também narra um
no Texto 1? Justifique. acontecimento anterior, quando faz
uma pesquisa na Biblioteca Nacio-
nal, e, posteriormente, as atividades
para decorar o javanês em sua
casa, um cômodo de aluguel. Há,
no texto 1, algumas indicações da
época dos fatos narrados, percebi-
das, por exemplo, no emprego da
segunda pessoa do singular “tu”
5. Quais os termos e expressões do Texto 1 que indicam o lugar e época em
para dirigir-se ao interlocutor ou no
que ocorrem os fatos narrados?
uso de expressões de linguagem
pouco usuais na atualidade, tal
como o pronome pessoal depois do
verbo: “Em uma confeitaria, certa
vez, ao meu amigo Castro, contava
eu as partidas que havia pregado às
convicções e às respeitabilidades,
para poder viver”; “Imagina tu que eu
6. O tempo da narrativa é linear? Justifique. já fui professor de javanês! — Quan-
do? Aqui, depois que voltaste do
consulado?”; “— Conta lá como foi.
Bebes mais cerveja?” etc.).

Questão 6 – O tempo da narrativa


segue o fluxo do pensamento do
narrador, por isso percebe-se que há
7. Releia o trecho do texto 1: um tempo presente (o da conversa
do protagonista com o amigo), um
tempo antecedente (o encontro do
— Senhor Castelo, quando salda a sua conta? anúncio, a pesquisa e a aprendiza-
gem do javanês etc.) e um tempo
Respondi-lhe então eu, com a mais encantadora esperança: bem anterior (em que o protagonista
— Breve... Espere um pouco... Tenha paciência... Vou ser nomea- residia em Manaus).
do professor de javanês, e...
Questão 7 – O uso das reticências
nesse trecho é indicativo de que o
protagonista não tem certeza de
O emprego das reticências indica que a resposta da personagem demonstra
quando saldará sua dívida, por isso
A) sabedoria. é evasivo. A resposta correta é (E)
B) susto. incerteza.

C) chateação. O quadro Você sabia? expõe ao


D) insegurança. aluno a caracterização básica do
E) incerteza.

Sequência Didática | Língua Portuguesa | Leitura e Interpretação de Textos | Conto - Pré-modernismo e Modernismo 9
Orientação ao
PROFESSOR ?
Você
movimento denominado Pré-Moder- SABIA? O Pré-Modernismo foi marcado por duas carac-
nismo brasileiro para que ele possa terísticas, de certo modo, contraditórias: certo
responder à Questão 8 – O Texto 1 conservadorismo que se cruza com a busca de
tematiza o nascimento da burguesia renovação temática, a relação da obra de arte com a realidade
urbana, no Rio de Janeiro, no início brasileira, suas tensões sociais e políticas.
do século XX, relacionando-se com A literatura pré-modernista inter-relaciona-se com o momento
o momento histórico brasileiro, seus histórico brasileiro, pautado por uma série de conflitos sociais,
conflitos sociais. religiosos e políticos (o fanatismo religioso de Antônio Conse-
lheiro e Padre Cícero; o cangaço no Nordeste; revoltas sociais
Na atividade, são desenvolvidos em vários estados brasileiros; a oligarquia rural; o nascimento da
aspectos das habilidades foco burguesia urbana; a industrialização e o surgimento do proletaria-
EM13LP01 E EM13LP01, além da do; a segregação dos negros pós-abolição; a imigração europeia).
relacionada EM13LP46.

8. Com base nessas primeiras reflexões, busque justificar o texto 1 como representativo do Pré-Modernismo brasileiro.

Atividade 2

Texto 2

GAETANINHO

— Chi, Gaetaninho, como é bom!


Gaetaninho ficou banzando bem no meio da rua. O Ford quase o derrubou e ele não viu o Ford. O carroceiro
disse um palavrão e ele não ouviu o palavrão.
— Eh! Gaetaninho! Vem pra dentro.
Grito materno sim: até filho surdo escuta. Virou o rosto tão feio de sardento, viu a mãe e viu o chinelo.
— Subito!
Foi-se chegando devagarinho, devagarinho. Fazendo beicinho. Estudando o terreno. Diante da mãe e do
chinelo parou. Balançou o corpo. Recurso de campeão de futebol. Fingiu tomar a direita. Mas deu meia volta
instantânea e varou pela esquerda porta adentro.
Eta salame de mestre!
Ali na Rua Oriente a ralé quando muito andava de bonde. De automóvel ou carro só mesmo em dia de enterro.
De enterro ou de casamento. Por isso mesmo o sonho de Gaetaninho era de realização muito difícil. Um sonho.

10
O Beppino por exemplo. O Beppino naquela tarde atravessara de carro a cidade. Mas como? Atrás da tia Pero-
netta que se mudava para o Araçá. Assim também não era vantagem.
Mas se era o único meio? Paciência.
Gaetaninho enfiou a cabeça embaixo do travesseiro.
Que beleza, rapaz! Na frente quatro cavalos pretos empenachados levavam a tia Filomena para o cemité-
rio. Depois o padre. Depois o Savério noivo dela de lenço nos olhos. Depois ele. Na boleia do carro. Ao lado do
cocheiro. Com a roupa marinheira e o gorro branco onde se lia: Encouraçado São Paulo. Não. Ficava mais bonito
de roupa marinheira, mas com a palhetinha nova que o irmão lhe trouxera da fábrica. E ligas pretas segurando
as meias. Que beleza, rapaz! Dentro do carro o pai, os dois irmãos mais velhos (um de gravata vermelha, outro
de gravata verde) e o padrinho seu Salomone. Muita gente nas calçadas, nas portas e nas janelas dos palacetes,
vendo o enterro. Sobretudo admirando o Gaetaninho.
Mas Gaetaninho ainda não estava satisfeito. Queria ir carregando o chicote. O desgraçado do cocheiro não
queria deixar. Nem por um instantinho só.
Gaetaninho ia berrar, mas a tia Filomena com a mania de cantar o Ahi, Mari! todas as manhãs o acordou.
Primeiro ficou desapontado. Depois quase chorou de ódio.
Tia Filomena teve um ataque de nervos quando soube do sonho de Gaetaninho. Tão forte que ele sentiu re-
morsos. E para sossego da família alarmada com o agouro tratou logo de substituir a tia por outra pessoa numa
nova versão de seu sonho. Matutou, matutou, e escolheu o acendedor da Companhia de Gás, Seu Rubino, que
uma vez lhe deu um cocre danado de doído.
Os irmãos (esses) quando souberam da história resolveram arriscar de sociedade quinhentão no elefante. Deu a
vaca. E eles ficaram loucos de raiva por não haverem logo adivinhado que não podia deixar de dar a vaca mesmo.
O jogo na calçada parecia de vida ou morte. Muito embora Gaetaninho não estava ligando.
— Você conhecia o pai do Afonso, Beppino?
— Meu pai deu uma vez na cara dele.
— Então você não vai amanhã no enterro. Eu vou!
O Vicente protestou indignado:
— Assim não jogo mais! O Gaetaninho está atrapalhando!
Gaetaninho voltou para o seu posto de guardião. Tão cheio de responsabilidades.
O Nino veio correndo com a bolinha de meia. Chegou bem perto. Com o tronco arqueado, as pernas dobra-
das, os braços estendidos, as mãos abertas, Gaetaninho ficou pronto para a defesa.
— Passa pro Beppino!
Beppino deu dois passos e meteu o pé na bola. Com todo o muque. Ela cobriu o guardião sardento e foi parar
no meio da rua.
— Vá dar tiro no inferno!
— Cala a boca, palestrino!
— Traga a bola!
Gaetaninho saiu correndo. Antes de alcançar a bola, um bonde o pegou. Pegou e matou.
No bonde vinha o pai do Gaetaninho.
A gurizada assustada espalhou a notícia na noite.
— Sabe o Gaetaninho?
— Que é que tem?
— Amassou o bonde!

Sequência Didática | Língua Portuguesa | Leitura e Interpretação de Textos | Conto - Pré-modernismo e Modernismo 11
A vizinhança limpou com benzina suas roupas domingueiras.
Às dezesseis horas do dia seguinte saiu um enterro da Rua do Oriente e Gaetaninho não ia na boleia de ne-
nhum dos carros do acompanhamento. Ia no da frente dentro de um caixão fechado com flores pobres por cima.
Vestia a roupa marinheira, tinha as ligas, mas não levava a palhetinha.
Quem na boleia de um dos carros do cortejo mirim exibia soberbo terno vermelho que feria a vista da gente
era o Beppino.

MACHADO, Antônio de Alcântara. Brás, Bexiga e Barra Funda.


In: Para gostar de ler. 13ª. ed., São Paulo: Editora Ática,
Volume 10 – Contos, p. 45-48.

?
Você
SABIA? O escritor paulista Antônio de Alcântara Machado (1901- 1935) foi advogado, jornalista e político. Voltado
para a vida cotidiana da sua cidade, o autor trouxe o imigrante para dentro da prosa ficcional modernista,
em especial os italianos, registrando suas influências em um novo modo de falar na capital paulista.
Nos contos de Brás, Bexiga e Barra Funda (1927), encontra-se uma narrativa ágil, pitoresca em que se tematiza a vida
difícil do imigrante italiano, habitante de bairros operários e de classe média, que participa da construção de uma nova
identidade para a cidade de São Paulo.

Obras principais:
• Pathé Baby, crônicas, 1926
• Brás, Bexiga e Barra Funda, contos, 1927
• Laranja da China, contos, 1928
• Novelas paulistanas, reunião de sua ficção (póstuma), 1961.

FRAZÃO, Dilva. Alcântara Machado. Ebiografia, [s.d.]. Disponível em:


www.iqe.org.br/surl/?53f7e5. Acesso em: 11 mar. 2020. (Fragmento).

Orientação ao
PROFESSOR
9. Considere o trecho:

Atividade 2
“O Ford quase o derrubou e ele não viu o Ford. O carroceiro disse
Questão 9 – A alternativa que um palavrão e ele não ouviu o palavrão”.
substituiu a conjunção “e” é (C),
entretanto, uma conjunção adversa-
tiva, visto que o sentido da segunda
Assinale a alternativa em que a substituição da conjunção “e” não altera o
parte de cada frase é de oposição à
primeira (derrubou/ não viu; disse/ sentido do trecho.
não ouviu): “O Ford quase o derru- A) ou
bou, entretanto ele não viu o Ford.
B) pois
O carroceiro disse um palavrão,
entretanto ele não ouviu o palavrão”. C) entretanto
A substituição, nesse caso, implica- D) portanto
ria o emprego de vírgulas antes das
conjunções adversativas. E) logo

12
10. Explique o sentido das expressões grifadas nos trechos do texto 2, com
Orientação ao
base no contexto: PROFESSOR
a) Gaetaninho ficou banzando bem no meio da rua.
Questão 10 – As expressões grifa-
das nos trechos do texto 2, a seguir,
têm sentido de:
a) pensando, meditando, matutando
b) Mas deu meia volta instantânea e varou pela esquerda porta adentro. b) Eta menino esperto!
Eta salame de mestre!
c) os pobres
d) pancada na cabeça com o nó do
dedo, cascudo.
e) bateu no rosto.
f) força.
c) Ali na Rua Oriente a ralé quando muito andava de bonde.

Questão 11 – Resposta pessoal.


No entanto, é irônica a situação
narrada, visto que quem sempre
desejou ir na boleia do carro fúnebre
d) ... Seu Rubino, que uma vez lhe deu um cocre danado de doído era o Gaetaninho, mas agora como
defunto ele ia no carro da frente,
dentro de um caixão.

Questão 12 – A alternativa correta é


(A) Subito; palestrino - Rua Oriente.
e) — Meu pai deu uma vez na cara dele. A primeira palavra é italiana (de
origem latina como o português) e
quer dizer rápido, depressa; a segun-
da palavra se refere a quem nasceu
em Palestrina, uma cidadezinha da
província de Roma, Itália. O conto
f) Beppino deu dois passos e meteu o pé na bola. Com todo o muque. tem como cenário a Rua Oriente, no
bairro do Brás, em São Paulo.

Questão 13 – Trata-se de um
narrador de terceira pessoa, que
não participa dos acontecimentos
narrados. No entanto, ele sabe o que
11. Na sua opinião, há ironia na situação narrada ao final do texto – “Quem na sentem e pensam seus persona-
boleia de um dos carros do cortejo mirim exibia soberbo terno vermelho gens, é onisciente: “Tia Filomena
que feria a vista da gente era o Beppino”? Justifique. teve um ataque de nervos quando
soube do sonho de Gaetaninho. Tão
forte que ele sentiu remorsos”.

12. Assinale a alternativa em que os termos e expressões são indicativos da origem italiana das personagens e do lugar em
que ocorrem os fatos narrados.
A) Subito; palestrino - Rua Oriente.
B) Beppino; Peronetta - Araçá.
C) Gaetaninho; Beppino – cemitério.
D) Subito; Beppino – cemitério.
E) palestrino; Peronetta - Companhia de Gás.

Sequência Didática | Língua Portuguesa | Leitura e Interpretação de Textos | Conto - Pré-modernismo e Modernismo 13
13. Quais são as marcas textuais que identificam o narrador e
Orientação ao
PROFESSOR o foco narrativo no texto 2? Justifique.

Questão 14 – Os fatos narrados no texto 2 ocorrem


em dois dias subsequentes: o dia da morte de Gaeta-
ninho e o posterior, o do seu enterro: “Às dezesseis ho-
ras do dia seguinte saiu um enterro da Rua do Oriente”.
14. Em que período de tempo os fatos narrados no texto 2
Na atividade, são desenvolvidos aspectos da habilida- ocorrem? Justifique.
de foco EM13LP49 e da relacionada EM13LP06.

Atividade 3

Texto 3

UMA GALINHA

Era uma galinha de domingo. Ainda viva porque não passava de nove horas da manhã.
Parecia calma. Desde sábado encolhera-se num canto da cozinha. Não olhava para ninguém, ninguém olhava
para ela. Mesmo quando a escolheram, apalpando sua intimidade com indiferença, não souberam dizer se era
gorda ou magra. Nunca se adivinharia nela um anseio.
Foi pois uma surpresa quando a viram abrir as asas de curto voo, inchar o peito e, em dois ou três lances,
alcançar a murada do terraço. Um instante ainda vacilou — o tempo da cozinheira dar um grito — e em breve
estava no terraço do vizinho, de onde, em outro voo desajeitado, alcançou um telhado. Lá ficou em adorno des-
locado, hesitando ora num, ora noutro pé. A família foi chamada com urgência e consternada viu o almoço junto
de uma chaminé. O dono da casa, lembrando-se da dupla necessidade de fazer esporadicamente algum esporte
e de almoçar, vestiu radiante um calção de banho e resolveu seguir o itinerário da galinha: em pulos cautelosos
alcançou o telhado onde esta, hesitante e trêmula, escolhia com urgência outro rumo. A perseguição tornou-se
mais intensa. De telhado a telhado foi percorrido mais de um quarteirão da rua. Pouco afeita a uma luta mais
selvagem pela vida, a galinha tinha que decidir por si mesma os caminhos a tomar, sem nenhum auxílio de sua
raça. O rapaz, porém, era um caçador adormecido. E por mais ínfima que fosse a presa, o grito de conquista
havia soado.
Sozinha no mundo, sem pai nem mãe, ela corria, arfava, muda, concentrada. Às vezes, na fuga, pairava ofe-
gante num beiral de telhado e enquanto o rapaz galgava outros com dificuldade tinha tempo de se refazer por
um momento. E então parecia tão livre.
Estúpida, tímida e livre. Não vitoriosa como seria um galo em fuga. Que é que havia nas suas vísceras que
fazia dela um ser? A galinha é um ser. É verdade que não se poderia contar com ela para nada. Nem ela própria
contava consigo, como o galo crê na sua crista. Sua única vantagem é que havia tantas galinhas que morrendo
uma surgiria, no mesmo instante, outra tão igual como se fora a mesma.

14
Afinal, numa das vezes em que parou para gozar sua fuga, o rapaz alcançou-a. Entre gritos e penas, ela foi
presa. Em seguida carregada em triunfo por uma asa através das telhas e pousada no chão da cozinha com
certa violência. Ainda tonta, sacudiu-se um pouco, em cacarejos roucos e indecisos.
Foi então que aconteceu. De pura afobação a galinha pôs um ovo. Surpreendida, exausta. Talvez fosse
prematuro. Mas logo depois, nascida que fora para a maternidade, parecia uma velha mãe habituada. Sentou-se
sobre o ovo e assim ficou, respirando, abotoando e desabotoando os olhos. Seu coração, tão pequeno num pra-
to, solevava e abaixava as penas, enchendo de tepidez aquilo que nunca passaria de um ovo. Só a menina estava
perto e assistiu a tudo estarrecida. Mal porém conseguiu desvencilhar-se do acontecimento, despregou-se do
chão e saiu aos gritos:
— Mamãe, mamãe, não mate mais a galinha, ela pôs um ovo! ela quer o nosso bem!
Todos correram de novo à cozinha e rodearam mudos a jovem parturiente. Esquentando seu filho, esta não
era nem suave nem arisca, nem alegre, nem triste, não era nada, era uma galinha. O que não sugeria nenhum
sentimento especial. O pai, a mãe e a filha olhavam já há algum tempo, sem propriamente um pensamento qual-
quer. Nunca ninguém acariciou uma cabeça de galinha. O pai afinal decidiu-se com certa brusquidão:
— Se você mandar matar esta galinha nunca mais comerei galinha na minha vida!
— Eu também! jurou a menina com ardor.
A mãe, cansada, deu de ombros.
Inconsciente da vida que lhe fora entregue, a galinha passou a morar com a família. A menina, de volta do
colégio, jogava a pasta longe sem interromper a corrida para a cozinha. O pai de vez em quando ainda se lembrava:
“E dizer que a obriguei a correr naquele estado!” A galinha tornara-se a rainha da casa. Todos, menos ela, o sabiam.
Continuou entre a cozinha e o terraço dos fundos, usando suas duas capacidades: a de apatia e a do sobressalto.
Mas quando todos estavam quietos na casa e pareciam tê-la esquecido, enchia-se de uma pequena coragem,
resquícios da grande fuga — e circulava pelo ladrilho, o corpo avançando atrás da cabeça, pausado como num campo,
embora a pequena cabeça a traísse: mexendo-se rápida e vibrátil, com o velho susto de sua espécie já mecanizado.
Uma vez ou outra, sempre mais raramente, lembrava de novo a galinha que se recortara contra o ar à beira do
telhado, prestes a anunciar. Nesses momentos enchia os pulmões com o ar impuro da cozinha e, se fosse dado
às fêmeas cantar, ela não cantaria mas ficaria muito mais contente. Embora nem nesses instantes a expressão
de sua vazia cabeça se alterasse. Na fuga, no descanso, quando deu à luz ou bicando milho — era uma cabeça
de galinha, a mesma que fora desenhada no começo dos séculos.
Até que um dia mataram-na, comeram-na e passaram-se anos.

LISPECTOR, Clarice, Uma galinha. In: MORICONI, Ítalo (Org.),


Os Cem Melhores Contos Brasileiros do Século.
Rio de Janeiro: Objetiva, 2001, p. 258-260.

Sequência Didática | Língua Portuguesa | Leitura e Interpretação de Textos | Conto - Pré-modernismo e Modernismo 15
?
Você
SABIA? Clarice Lispector (1920-1977) nasceu na Ucrânia, mas seus pais imigraram para Maceió, Brasil, quando
ela tinha apenas dois meses. Em 1924, a família mudou-se para o Recife e, posteriormente, para o Rio de
Janeiro.
Formou-se em Direito e trabalhou como redatora para a Agência Nacional e como jornalista no jornal A Noite. Casou-se
em 1943 com o diplomata Maury Gurgel Valente, com quem viveria durante muitos anos fora do Brasil.
Em 1959, Clarice, separada do marido, retorna ao Rio de Janeiro, começando a trabalhar no jornal Correio da Manhã,
assumindo a coluna “Correio Feminino”. Em 1960, trabalha no Diário da Noite com a coluna “Só Para Mulheres” e nesse
mesmo ano lança Laços de Família, livro de contos que recebeu o Prêmio Jabuti da Câmara Brasileira do Livro. Em 1961,
publica A Maçã no Escuro, pelo qual recebe o prêmio de melhor livro do ano em 1962.
Reconhecida pelo público e pela crítica, em 1976, recebeu o prêmio da Fundação Cultural do Distrito Federal, pelo conjun-
to de sua obra.

Obras principais:

• Perto do Coração Selvagem, romance, 1944 • A Legião Estrangeira, conto, 1964


• O Lustre, romance, 1946 • Uma Aprendizagem ou Livro dos Prazeres, romance,
• A Cidade Sitiada, romance, 1949 1969

• Alguns Contos, contos, 1952 • Felicidade Clandestina, conto, 1971

• Laços de Família, conto, 1960 • Água Viva, romance, 1973

• A Maçã no Escuro, romance, 1961 • Imitação da Rosa, contos, 1973

• A Paixão Segundo G.H., romance, 1961 • A Via Crucis do Corpo, contos, 1974
• A Hora da Estrela, romance, 1977

FRAZÃO, Dilva. Clarice Lispector. Ebiografia, [s.d.]. Disponível em:


www.iqe.org.br/surl/?3b30aa. Acesso em: 11 mar. 2020. (Fragmento).

Orientação ao
PROFESSOR 15. Releia trechos do texto 3:

Atividade 3 • “É verdade que não se poderia contar com ela para nada. Nem
ela própria contava consigo, como o galo crê na sua crista.”
Questão 15 – No Texto 3, a vida narrada • “O pai de vez em quando ainda se lembrava: E dizer que a
da personagem galinha simboliza (B) a
obriguei a correr naquele estado!”
problemática social da mulher na década
de 1960. A luta por liberdade feminina, visto • “A galinha tornara-se a rainha da casa.”.
que, historicamente, a sociedade tolhe os
seus desejos (“Se fosse dado às fêmeas
cantar, ela não cantaria”) e lhe destina os Entende-se que, nesse conto, a personagem “galinha” simboliza:
papéis de esposa e mãe, um ser que não
evolui, pois tem a “cabeça vazia”. Ao final, A) uma comemoração familiar frustrada.
parece confirmar-se essa problemática, B) a problemática social da mulher na década de 1960.
pois a vida da galinha/mulher que não ser-
C) a necessidade de preservação da vida animal.
ve mais à procriação deixa de ter sentido.
Então, ela pode morrer. Uma mulher sem D) os desentendimentos familiares.
voz, sem vez, uma questão evidenciada em E) a fragilidade da vida de animais domésticos.
muitas das obras de Clarice Lispector.

16
16. “Era uma galinha de domingo. Ainda viva porque não passava de nove
Orientação ao
horas da manhã”. PROFESSOR
O termo destacado faz pressupor que:
A) a galinha continuará viva, porque é domingo. Questão 16 – A alternativa correta
B) não é bom matar galinha, a não ser no domingo. é (D) a galinha morreria mais tarde,
para ser servida no almoço.
C) tradicionalmente, galinha deve ser comida somente no domingo.
D) a galinha morreria mais tarde, para ser servida no almoço. Questão 17 – A alternativa correta
E) em geral, mata-se a galinha depois das dez horas da manhã. é (B) de terceira pessoa, não parti-
cipa dos acontecimentos narrados
como personagem, mas é oniscien-
17. O narrador desse conto é te, tudo sabe.

A) de primeira pessoa, pois se manifesta por meio da ausência de diálogos


Questão 18 – As ações ocorrem,
entre personagens.
principalmente, em um só dia, um
B) de terceira pessoa, não participa dos acontecimentos narrados, como domingo: a galinha de domingo
personagem, mas é onisciente, tudo sabe. foge, é apanhada, bota um ovo e
não é sacrificada. No entanto, há ex-
C) de primeira pessoa, visto que o emprego de pronomes e verbos se
pressões que projetam as ações se-
apresenta em primeira pessoa.
quentes: “a galinha passou a morar
D) a personagem protagonista, ou seja, a personagem galinha que narra com a família” e, ao final, “Até que
em primeira pessoa. um dia mataram-na, comeram-na e
passaram-se anos”. Sendo assim,
E) de terceira pessoa, visto que representa “a menina”, uma personagem
não é possível precisar o período de
coadjuvante do conto.
tempo, propriamente da narrativa,
simbolizando a continuidade dos
18. Os fatos narrados no texto 3 ocorrem em que período de tempo? Justifique. problemas sociais femininos.

Questão 19 – A alternativa correta é


(A) alegre – triste; suave – arisca.

Na atividade, são desenvolvidos


aspectos da habilidade foco
19. No texto 3, a caracterização da galinha se dá por meio de termos antitéti- EM13LP49 e da relacionada
cos, ou seja, que se opõem: EM13LP06.
A) alegre – triste; suave – arisca.
B) curto voo – voo desajeitado; hesitante – trêmula.
C) muda – concentrada; exausta – velha.
D) rápida – vibrátil; inconsciente – vazia.
E) apatia – sobressalto; gritos – presa.

Sequência Didática | Língua Portuguesa | Leitura e Interpretação de Textos | Conto - Pré-modernismo e Modernismo 17
!
Você já
SABE As principais figuras de linguagem que encontramos em textos literários são:
(A) Metáfora – emprego de uma palavra com o significado de outra por haver alguma relação de similari-
dade entre elas.
(B) Comparação – atribuição de características de um ser a outro, em virtude de uma determinada semelhança.
(C) Metonímia – troca de uma palavra por outra, permitida pela relação de proximidade de sentidos entre elas (o autor
pela obra; o continente pelo conteúdo; a parte pelo todo; efeito pela causa).
(D) Sinestesia – fusão de impressões sensoriais diferentes.
(E) Eufemismo – substituição de um termo rude, desagradável, por outro mais suave, ou agradável.
(F) Prosopopeia ou personificação – atribuição de características humanas a seres inanimados.
(G) Antítese – uso de palavras de sentidos opostos.
(H) Hipérbole – exagero com finalidade expressiva.
(I) Ironia – inversão dos sentidos, ou seja, diz-se o contrário do que se pensa.
(J) Onomatopeia – reprodução ou imitação de sons diversos.
(K) Paradoxo – oposição entre ideias, não simplesmente das palavras e orações, como na antítese.

Atividade 4 - De um texto ao outro

20. Identifique as figuras de linguagem presentes nas passagens dos textos lidos.

Texto 1 Trecho Figura de linguagem

1 Andei pelas ruas, perambulando e mastigando letras.

1 Na minha cabeça dançavam hieróglifos.

À noite, quando pude entrar em casa sem ser visto, para evitar indiscre-
1 tas perguntas do encarregado, ainda continuei no quarto a engolir o meu
"a-b-c" malaio.

2 Grito materno sim: até filho surdo escuta.

2 Atrás da tia Peronetta que se mudava para o Araçá.

Tia Filomena teve um ataque de nervos quando soube do sonho de Gaeta-


2
ninho.
Mas logo depois, nascida que fora para a maternidade, parecia uma velha
3
mãe habituada.

3 Todos correram de novo à cozinha e rodearam mudos a jovem parturiente.

Na fuga, no descanso, quando deu à luz ou bicando milho — era uma cabe-
3
ça de galinha, a mesma que fora desenhada no começo dos séculos.

18
Orientação ao
PROFESSOR

Atividade 4 - DE UM TEXTO AO OUTRO

Questão 20 – Com base o quadro Você já sabe, segue a identificação das figuras de linguagem dos fragmentos:

Figura de
Texto 1 Trecho
linguagem
1 Andei pelas ruas, perambulando e mastigando letras. metáfora
1 Na minha cabeça dançavam hieróglifos. metáfora
À noite, quando pude entrar em casa sem ser visto, para evitar indiscretas per-
1 metáfora
guntas do encarregado, ainda continuei no quarto a engolir o meu "a-b-c" malaio.
2 Grito materno sim: até filho surdo escuta. paradoxo
2 Atrás da tia Peronetta que se mudava para o Araçá. eufemismo
2 Tia Filomena teve um ataque de nervos quando soube do sonho de Gaetaninho. hipérbole
Mas logo depois, nascida que fora para a maternidade, parecia uma velha mãe
3 comparação
habituada.
3 Todos correram de novo à cozinha e rodearam mudos a jovem parturiente. personificação
Na fuga, no descanso, quando deu à luz ou bicando milho — era uma cabeça de
3 metonímia
galinha, a mesma que fora desenhada no começo dos séculos.

21. Releia em voz alta os trechos dos textos 1, 2 e 3 a seguir:

“Insensivelmente dirigi-me à Biblioteca Nacional. Não sabia bem que livro iria pedir; mas, entrei, entreguei
Texto 1 o chapéu ao porteiro, recebi a senha e subi. Na escada, acudiu-me pedir a Grande Encyclopédie, letra J, a
fim de consultar o artigo relativo a Java e a língua javanesa”.

“Foi-se chegando devagarinho, devagarinho. Fazendo beicinho. Estudando o terreno. Diante da mãe e do
Texto 2 chinelo parou. Balançou o corpo. Recurso de campeão de futebol. Fingiu tomar a direita. Mas deu meia
volta instantânea e varou pela esquerda porta adentro”.

“Todos correram de novo à cozinha e rodearam mudos a jovem parturiente. Esquentando seu filho, esta
não era nem suave nem arisca, nem alegre, nem triste, não era nada, era uma galinha. O que não sugeria
Texto 3
nenhum sentimento especial. O pai, a mãe e a filha olhavam já há algum tempo, sem propriamente um
pensamento qualquer. Nunca ninguém acariciou uma cabeça de galinha”.

a) Há diferenças/semelhanças entre os textos em relação ao ritmo


Orientação ao
dado pela pontuação? Justifique. PROFESSOR

Questão 21
a) A pontuação do Texto 1 dá um ritmo
mais lento à leitura; já nos Textos 2
e 3, a pontuação das frases curtas
acelera o ritmo de leitura.

Sequência Didática | Língua Portuguesa | Leitura e Interpretação de Textos | Conto - Pré-modernismo e Modernismo 19
b) Nos três fragmentos predomina o processo sintático de coorde-
Orientação ao
PROFESSOR nação? Justifique.

b) Sim, especialmente os Textos 1 e 3


apresentam processo sintático de
coordenação entre as orações. O Texto 2,
inicia-se por orações absolutas, períodos
simples; em seguida o processo sintático c) No texto 2, qual o efeito do uso do diminutivo em “devagarinho,
da coordenação das orações.
devagarinho” e “beicinho”?
c) No texto 2, o uso do diminutivo em
“devagarinho, devagarinho” e “beicinho”
demonstra a pouca idade do menino,
que também tem nome próprio diminuti-
vo – Gaetaninho – e sua fragilidade.

A atividade desenvolve aspectos da


habilidade relacionada EM13LP06.

!
Você já
SABE
As diversas vozes no texto

Discurso Conceito Marcas textuais

Narra os fatos, caracteriza perso- Verbos no pretérito, na 1ª ou na 3ª pessoa, de acordo


Narrador
nagens, comenta situações etc. com o foco narrativo.
O narrador reproduz o diálogo Presença de um verbo de dizer (perguntar, dizer, repetir,
Direto entre personagens por meio das falar etc.); há separação gráfica da fala do narrador da
suas próprias palavras. fala das personagens (dois pontos, travessão, aspas).
A fala da personagem constitui uma oração subor-
dinada substantiva objetiva direta do verbo de dizer
A fala das personagens é resumi-
Indireto (perguntar, dizer, repetir, falar etc.), introduzida por uma
da, interpretada pelo narrador.
partícula (conjunção, um advérbio, ou um pronome
interrogativo).
Ao contrário dos discursos direto e indireto, não há
Mesclam-se as falas do nar-
marcas de separação entre a fala do narrador e a das
rador e personagens, ou seja,
personagens: sem verbos de dizer, nem partículas
Indireto no desenrolar da narração, as
introdutórias. Presença de interjeições e de formas
livre falas das personagnes surgem
interrogativas, imperativas, perguntas, súplicas, sendo
espontaneamente no discurso
a pontuação expressiva (exclamações, interrogações,
do narrador.
reticências etc.).

20
22. Leia os fragmentos dos textos 1, 2 e 3 no quadro abaixo, identifique-os na coluna do meio, utilizando a legenda: DN –
discurso do narrador; DD – discurso direto; DI – discurso indireto; DIL – discurso indireto livre. Na coluna à direita,
justifique sua opção.

Texto Trecho Discurso Justificativa

Houve mesmo, uma dada ocasião, quando estive em Manaus,


em que fui obrigado a esconder a minha qualidade de bacha-
1
rel, para mais confiança obter dos clientes, que afluíam ao
meu escritório de feiticeiro e adivinho. Contava eu isso.

Por aí o homem interrompeu-me:


1
— Que diabo vem a ser isso, Senhor Castelo?

Tia Filomena teve um ataque de nervos quando soube do


2
sonho de Gaetaninho. Tão forte que ele sentiu remorsos.

O Beppino por exemplo. O Beppino naquela tarde atravessara


2 de carro a cidade. Mas como? Atrás da tia Peronetta que se
mudava para o Araçá.

Gaetaninho enfiou a cabeça embaixo do travesseiro.


2 Que beleza, rapaz! Na frente quatro cavalos pretos empena-
chados levavam a tia Filomena para o cemitério.

Que é que havia nas suas vísceras que fazia dela um ser? A
3
galinha é um ser.

O pai de vez em quando ainda se lembrava: "E dizer que a


3
obriguei a correr naquele estado!"

Sequência Didática | Língua Portuguesa | Leitura e Interpretação de Textos | Conto - Pré-modernismo e Modernismo 21
Orientação ao
PROFESSOR

Questão 22

Texto Trecho Discurso Justificativa


Houve mesmo, uma dada ocasião, quando
estive em Manaus, em que fui obrigado a
A fala da personagem é transmitida pelo narra-
esconder a minha qualidade de bacharel, para
1 DI dor personagem por meio do verbo de elocução
mais confiança obter dos clientes, que afluí-
“contava”
am ao meu escritório de feiticeiro e adivinho.
Contava eu isso.
Presença de um verbo de elocução (interrom-
Por aí o homem interrompeu-me:
1 DD peu); há separação gráfica da fala do narrador da
— Que diabo vem a ser isso, Senhor Castelo?
fala da personagem (dois pontos e travessão).
Tia Filomena teve um ataque de nervos quan-
Verbos no pretérito de acordo com o foco narrati-
2 do soube do sonho de Gaetaninho. Tão forte DN
vo, na 3ª pessoa.
que ele sentiu remorsos.
O Beppino por exemplo. O Beppino naquela Não há marcas de separação entre a fala do nar-
tarde atravessara de carro a cidade. Mas rador e a do personagem: ausência de verbo de
2 DIL
como? Atrás da tia Peronetta que se mudava elocução e de partículas introdutórias. Presença
para o Araçá. da forma interrogativa/pergunta
Gaetaninho enfiou a cabeça embaixo do
Não há marcas de separação entre a fala do nar-
travesseiro.
rador e a do personagem: ausência de verbo de
2 Que beleza, rapaz! Na frente quatro cavalos DIL
elocução e de partículas introdutórias. Presença
pretos empenachados levavam a tia Filomena
da forma exclamativa.
para o cemitério.
Não há marcas de separação entre a fala do nar-
Que é que havia nas suas vísceras que fazia rador e a do personagem: ausência de verbo de
3 DIL
dela um ser? A galinha é um ser. elocução e de partículas introdutórias. Presença
da forma interrogativa
Presença de um verbo de elocução (lembrava);
O pai de vez em quando ainda se lembrava: "E
3 DD há separação gráfica da fala do narrador da fala
dizer que a obriguei a correr naquele estado!"
da personagem (dois pontos e aspas).

Atividade 5 - Do novo ao já conhecido

23. Os três textos são contos, ou seja, são narrativas condensadas, de curta extensão. Complete o quadro, a seguir, com
a caracterização do gênero que você pôde apreender nessas leituras.

22
Autoria O escritor se manifesta sob a figura de um narrador.

T1
Suportes T2
T3
Contexto

Leitor
Apreciador de histórias, de narrativas de ficção.
provável

Temas

Finalidade

Título

a) apresentação da situação inicial, do cenário e das personagens:


T1
T2
T3
b) desenvolvimento da ação e surgimento de um conflito:
T1
T2
T3
c) clímax do conto:
Partes T1
do texto T2
T3
d) resolução do conflito:
T1
T2
Organização

T3
e) desfecho ou conclusão:
T1
T2
T3
1. Foco narrativo de primeira ou de terceira pessoa:
T1
T2
T3
2. Cenário:
T1
T2
T3
Características
3. Personagens:
T1
T2
T3
4. Sequência temporal dos fatos narrados:
T1
T2
T3

1. Presença de diálogos e/ ou monólogos:


Linguagem

2. Uso de discurso direto, indireto e/ou indireto livre:


3. Figuras de linguagem:
4. Predominância de tempos verbais:

Sequência Didática | Língua Portuguesa | Leitura e Interpretação de Textos | Conto - Pré-modernismo e Modernismo 23
Orientação ao
PROFESSOR
Atividade 5

Questão 23

Autoria O escritor se manifesta sob a figura de um narrador.


T1 – Site: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000153.pdf
T2 – Livro: Brás, Bexiga e Barra Funda. In. Para gostar de ler. 13ª. ed. , São Paulo: Editora
Suportes Ática, Volume 10 – Contos
Contexto

T3 – Livro: Uma galinha. In. MORICONI, Ítalo (Org.), Os Cem Melhores Contos Brasileiros do
Século. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001, p. 258-260.
Leitor
provável
Apreciador de histórias, de narrativas de ficção.
Temas Muito variados. No entanto, observa-se que os três textos trazem temas sociais.
Finalidade Contar uma experiência humana, fictícia, mas verossimilhante.
Em geral, o título anuncia o tema da narrativa. Nos três contos, os títulos trazem o assunto e/
Título
ou tema da narrativa.
a) apresentação da situação inicial, do cenário e das personagens:
T1 – Confidências do protagonista a um amigo em uma confeitaria
T2 – Gaetaninho, um menino imigrante italiano, brinca com amigos no meio da Rua Oriente.
T3 – A fuga da galinha de domingo para os telhados vizinhos.
b) desenvolvimento da ação e surgimento de um conflito:
T1 – O anúncio procurando um professor de javanês; a busca de informações sobre esse
idioma na Biblioteca Nacional.
T2 – Gaetaninho sonha andar de carro no enterro da tia.
T3 – O marido consegue pegar a galinha, e a traz de volta para casa.
c) clímax do conto:
Partes T1 – No fragmento, o protagonista “enrola” o homem que lhe cobra aluguel.
do texto T2 – Gaetaninho é atropelado pelo bonde.
T3 – A galinha bota um ovo e não é sacrificada.
Organização

d) resolução do conflito:
T1 – Como se trata de fragmento, não está explícito.
T2 – Gaetaninho morre.
T3 – A galinha passa a morar com a família.
e) desfecho ou conclusão:
T1 – O protagonista engana a todos sobre saber falar javanês, passa a trabalhar em consu-
lado.
T2 – Beppino, amigo de Gaetaninho, anda na boleia do carro fúnebre.
T3 – O tempo passa e a galinha acaba sendo sacrificada.
1. Foco narrativo de primeira ou de terceira pessoa:
T1 – terceira pessoa.
T2 – primeira pessoa.
T3 – terceira pessoa.
Características
2. Cenário:
T1 – Urbano, confeitaria e biblioteca do Rio de Janeiro.
T2 – Urbano, Rua Oriente Bairro do Brás, São Paulo.
T3 – Doméstico, a casa ode estava a galinha e vizinhança.

24
Orientação ao
PROFESSOR

3. Personagens:
T1 – Castelo, o narrador-personagem, seu amigo Castro, o encarregado do aluguel.
T2 – O protagonista, Gaetaninho, Beppino, o antagonista, os secundários (a mãe, as tias
Organização

Peronetta e Filomena, Seu Rubino etc.)


Características T3 – A galinha (protagonista), o dono da casa (antagonista), a menina, a mãe, a cozinheira.
4. Sequência temporal dos fatos narrados:
T1 – não linear.
T2 – linear.
T3 – linear.
Nos contos observa-se uma linguagem urbana, informal, sendo que no texto 1 isso é menos
evidente, tendendo à maior formalidade da linguagem, como convinha à época.
1. Há também presença de diálogos entre personagens, mas apresenta-se bem restrito no
texto 3, ou seja, há poucos diálogos.
Linguagem

2. O uso de discurso direto e indireto aparece os três contos, mas o indireto livre é uma novi-
dade modernista, portanto apresenta-se apenas nos textos 2 e 3.
3. As figuras de linguagem estão presentes nos três contos.
4. Nos três contos, há predominância de tempos verbais do pretérito, por tratar-se do gênero
narrativo.

A atividade desenvolve aspectos da habilidade foco EM13LP49.

?
Você
SABIA? O Modernismo foi um movimento artístico e literário do século XX cujo principal objetivo foi romper com a
tradição poética neoclássica (Parnasianismo, Simbolismo), buscando a libertação estética, a experimen-
tação constante e a independência cultural.
No Brasil, o Modernismo, iniciado na Semana de Arte Moderna (1922, no Theatro Municipal de São Paulo), teve três
fases: a primeira fase caracterizou-se, principalmente, pela ruptura com o tradicional, com a consequente renovação
estética inspirada nas vanguardas europeias (o cubismo, o futurismo, o surrealismo), valorizando-se a liberdade formal,
os temas do cotidiano etc. A segunda fase caracterizou-se, especialmente, pelo grande interesse pelas temáticas
nacionalistas, com o predomínio da prosa de ficção (contos e romances). Na terceira fase, houve tendência pela prosa
urbana, intimista e regionalista, com certa renovação formal.

24. Com base no seu conhecimento prévio literário e nas reflexões feitas nesta Orientação ao
Sequência Didática, é possível dizer que o Texto 2 e o Texto 3 pertencem, PROFESSOR
respectivamente, à eà fases modernistas.
A) primeira – segunda. Questão 24 – A resposta correta é
B) primeira – terceira. (B) primeira – terceira.

C) segunda – segunda.
D) segunda – terceira.
E) terceira – terceira.

Sequência Didática | Língua Portuguesa | Leitura e Interpretação de Textos | Conto - Pré-modernismo e Modernismo 25
Sistematizando
APRENDIZAGENS

Nessa Sequência Didática, você continuou a refletir sobre o gênero conto, estudando, em especial, alguns fragmentos e
contos de autores do século XX, representativos do Pré-Modernismo e Modernismo brasileiros. Teve também oportunidade
de apreciar e comparar algumas obras de pintores do século XIX e XX, buscando compreender o que as diferencia.
Além disso, você pôde aprofundar o estudo relativo às características de composição e de linguagem do conto, além de
analisar a especificidade do estilo pré-modernista e modernista de narrar.
O quadro, a seguir, sintetiza a caracterização do gênero conto.

Autoria Explícita (um escritor) que se manifesta sob a figura de um narrador.

Suportes Conto: jornal, livro, revista, site.


Contexto

Leitor
Apreciador de histórias, de narrativas de ficção.
provável

Temas Muito variados.

Finalidade Conta uma experiência humana, fictícia, mas verossimilhante.

Título O título, em geral, anuncia o tema da narrativa.

a) Apresentação da situação inicial, do cenário e das personagens.


b) Desenvolvimento da ação e surgimento de um conflito.
Organização

Partes
c) Clímax do conto.
do texto
d) Resolução do conflito.
e) Desfecho ou conclusão.
• Foco narrativo de primeira ou de terceira pessoa.
• Narrativa condensada, de curta extensão.
Características
• Em geral, um só cenário; poucas personagens.
• Sequência temporal dos fatos narrados: linear ou não.
1. Presença de diálogos e/ ou monólogos;
Linguagem

2. Uso de discurso direto, indireto e/ou indireto livre;


3. Linguagem literária (figuras de linguagem);
4. Verbos no pretérito perfeito e imperfeito do indicativo, nos trechos narrativos; e no
presente do indicativo, nos diálogos.

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