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CONSIDERAÇÕES SOBRE O CORPO E SUAS PRERROGATIVAS EM PESQUISAS

ARQUEOLÓGICAS NO NORDESTE BRASILEIRO.

James S. Oliveira
Juliane Guedes
Itelmar de Negreiros Oliveira
Igor Gadelha Soares
Vanessa Sial
Severino Ribeiro da Silva
Sergio Francisco Serafim Monteiro da Silva

“Quem está desperto e consciente diz: sou todo corpo e nada fora dele”
(Also sprach Zarathustra, Os odiadores do Corpo, Friedrich Wilhelm Nietzsche, 1883)1

INTRODUÇÃO

Aqui são apresentadas algumas reflexões significativas sobre o estudo do corpo na


Arqueologia do Nordeste, com ênfase em sete prerrogativas de estudos de casos de pesquisas
discentes realizadas entre 2019 e 2023 no Programa de Pós-Graduação em Arqueologia pela
Universidade Federal de Pernambuco. A partir de considerações de que o corpo pode ser
abordado enquanto sujeito ativo e/ou passivo de performances socioculturais, na instância
simbólica, discursiva e como corpo físico vestigial, não plenamente psicossomático, quase
como um objeto de cultura material, na perspectiva anatomofisiológica, as pesquisas indicam
possibilidades de interpretações arqueológicas com a real possibilidade do desenvolvimento
de uma arqueologia do corpo, englobando uma bioarqueologia social. O corpo possuiria três
instâncias analíticas: o corpo representado na cultura material, o corpo físico - remanescentes
humanos, e os artefatos do corpo, todas passíveis de relações de performance, como rituais de
passagem. Esta não mais como um trust hegemônico, dado por um guarda-chuva
paradigmático essencialmente predatório na relação com uma Arqueologia do Nordeste do
Brasil, mas uma direção possível para o futuro desta área das ciências sociais aplicadas.

1
Ver Abbagnano (1999, p. 211).
1
Considerações sobre o corpo na arqueologia

Incluir o corpo como objeto de estudo da arqueologia parece-nos uma obviedade. Este,
enquanto um biofato2, constitui, de longa data, mais uma dentre as várias modalidades de
vestígios arqueológicos: trata-se do conjunto de remanescentes do sujeito, do agente social,
daquele ser antes psicossomático, produtor sociobiológico de comportamentos e das próprias
culturas materiais e imateriais. Para incluir este corpo como temática e algo passível de
problematização da pesquisa arqueológica, aliás, objeto-sujeito de inúmeras abordagens na
sociologia do corpo (LE BRETON, 2012), antropologia do corpo (LE BRETON, 2021),
histórias do corpo (DEL PRIORI; AMANTINO, 2011), enfim, de outras ciências humanas
correlacionadas, para além das anatomias, podemos considerar alguns estudos mais centrados.
Na perspectiva arqueológica, o corpo enquanto materialidade pode ser escrito, pensado, pode
ser teorizado como cultura material. Importam os corpos humanos quanto aos seus
significados culturais, como símbolos, artefatos do corpo, meios, metáforas, corporificações
de experiências vividas, corpo-agência, corpo simétrico, corpos-performances, tecnologias do
corpo representadas por culturas materiais extra-somáticas (RAUTMAN, 2000; HAMILAKIS
et al, 2002; JOYCE, 2005; SOFAER, 2006).

O corpo social em sua relação com o corpo individual, da pessoa, e a as diferentes


ênfases entre as experiências compartilhada e individual podem representar duas abordagens
diferentes do corpo (SOFAER, 2006). Uma das tendências paradigmáticas, de perfil teórico
de natureza construtivista, está representada pelo avanço das bioarqueologias, fundadas
enquanto arqueologias com um comprometimento científico em relação à arqueologia. Então,
uma conjectura pode ser sugerida: uma teoria osteoarqueológica tácita tenta se conectar a
uma teoria hegemônica arqueológica interpretativa da cultura material, sendo premente e
desejante uma conexão frutífera entre elas. Uma reconciliação entre as ciências e as
humanidades em um nível meta-teórico é desejável (SOFAER, 2006). Notavelmente a

[...] empirical nature of the process of knowledge acquisition from the skeleton is not much
different to that applied to other more readily recognisable artefacts, such as pots or flints,
in terms of the recording of objects by measuring, drawing, photographing, identifying and
classifying morphological differences (SHANKS; TILLEY, 1987, p.114 apud SOFAER,
2006, p.88).

2
Entre os campos de pesquisa do corpo na sociologia, Le Breton (2012) propôs o dos imaginários sociais do
corpo que incluem as “teorias” do corpo, abordagens biológicas da corporeidade , diferenças entre os sexos, o
corpo enquanto suporte de valores, o corpo imaginoso do racismo e o corpo “deficiente”
2
Portanto, o corpo humano pode ser um locus primário de investigação, onde
abordagens de base científica compreendem seus remanescentes como fenômenos universais,
concretos e essencialmente biológicos, passíveis de encarceramento sob a égide do discurso
exclusivamente anatomofisiológico: torna-se exclusividade das bioarqueologias do corpo,
usuárias do campo distinto da osteoarqueologia humana (abordagem biomédica). O
procedimento descritivo preliminar da osteoarqueologia tem auxiliado na determinação e
categorização de pessoas através de seus corpos como mulheres ou homens, crianças,
adolescentes ou adultos, entre outros, dentro do tratamento do corpo como espécie, ou
propriamente um objeto (SOFAER, 2006).

Nesse sentido, o corpo objetificado se faz cenário de diversificadas narrativas a


respeito do sexo, do gênero, da idade e do envelhecimento, do comportamento, pois atuam
mudanças biológicas/fisiológicas e sociais que são incorporadas na vida social por meio de
uma negociação cultural. Nenhum corpo é, então, essencialmente biológico e nem
essencialmente cultural. Seria bio(socio)cultural3? Existem limites dessa materialidade
corporal, cujo limite do social se situa na morte. As vidas das pessoas são passíveis de
limitações biológicas e o próprio corpo seria um recurso biológico limitado (SOFAER, 2006).

A importância da justiça social no contemporâneo pode ter, na inserção da arqueologia


do corpo, um viés efetivo no desenvolvimento de políticas comprometidas com as diretrizes
dos direitos humanos e para o aprimoramento das arqueologias forenses. Demandas sociais
pela justiça em relação aos inúmeros casos de desaparecimentos de pessoas por longos
períodos durante a Era Vargas, a ditadura militar no Brasil (1964-1985); dos contextos da
história do presente e casos criminais domésticos; e nos contextos coloniais de aldeamentos
religiosos, diáspora, escravidão e plantation, que contaram com mais de 300 anos de violência
extrema contra os corpos africanos e dos povos originários; todas perfazem campo de
aplicação das abordagens holísticas e não holísticas do corpo. Os vestígios bioantropológicos
de pessoas/indivíduos dessas populações e suas representações na cultura material, incluindo
seus adornos, artefatos, técnicas do corpo e corpos que passaram por performances de
transmutação em contextos funerários por parte dos vivos, têm sido registrados em
importantes sítios do Nordeste do Brasil.

No caso específico da região Nordeste do Brasil, os estudos do corpo na arqueologia


estão vinculados ao Departamento de Arqueologia da Universidade Federal de Pernambuco
(UFPE), com a implantação e produções do grupo de pesquisa do CNPq Arqueologias do
3
Ver a perspectiva da sociobiologia aplicada à teoria da evolução biocultural humana em Lopreato (1984).
3
Corpo: aparência humana e imagens corporais a partir dos ossos, dentes, adornos e
representações da cultura material (2021), na incorporação da disciplina da graduação
Arqueologia do Corpo (2023) e disciplinas de pós-graduação em arqueologia da UFPE de
Tópicos Especiais (Arqueologia do Corpo e da sexualidade). Em consonância com as
demandas didáticas destas e de disciplinas correlatas criadas entre 2012 e 2023, como
Arqueologia forense, Evolução Humana e Cultura, Pré-História I, Laboratório IV (atual
Vestígios Bioarqueológicos), Arqueologia e os dentes e Arqueologia funerária está o
Laboratório de Arqueologia Biológica e Forense (LABIFOR), criado em 2012. Na mesma
universidade, no Centro de Ciências da Saúde, também é significativa a criação de um
Laboratório de Osteologia e Antropologia Forense (LAOF), vinculado com o Departamento
de Anatomia e criado mais recentemente. Em todos esses ambientes de pesquisa, ensino e
extensão, o corpo representa uma temática muito significativa.

Outras instituições de ensino superior da Região Nordeste, como a UNIVASF e


especialmente a UFS, que apresentam tradição nos estudos da bioantropologia e da
zooarqueologia, representam centros com o desenvolvimento de linhas de pesquisa de pós-
graduação e de ensino também intimamente ligados aos temas do corpo, em especial também
ao seu estudo na Bioarqueologia, Arqueologia funerária, Arqueologia forense e
Arqueotanatologia. Aqui, dentro da Bioarqueologia, os corpos não humanos são abordados
nos estudos zooarqueológicos, compartilhados com outras universidades, como a UFPE.

Por outro lado, nas últimas décadas, conforme Bynum (1995 apud DIEMLING;
VELTRI, 2009), o corpo estava sendo cada vez mais estudado, através da observação,
discussão e análise, a partir de um olhar sobre o mesmo como um constructo social e
histórico. Pode-se dizer que este tema possui inúmeras potencialidades. A partir delas, como
uma nova plataforma analítica, se podem iniciar investigações sobre o âmago das vivências
sociais. Os estudos do corpo têm se mostrado como uma "lente" analítica poderosa, seja
dispondo este psicossoma em um sentido social, metafórico, fenomenológico ou ao se referir
à sua constituição física.

Para D’Agostino e Schnnapp (1982), o corpo é um representante importante para a


construção das estruturas sociais a partir do ponto de vista da complexidade social intrínseca.
Merlino e Quilici (2013) consideram o corpo algo além da matéria: ele é todo um sistema
somático, “cujo conjunto de percepções, representações mentais, crenças e atitudes”, podem e
devem ser percebidas de dentro para fora, como uma rede intricada das imagens corporais,

4
definida como propriocepção, sendo esta uma experiência sentida a partir do posicionamento
corporal que constitui a imagem do corpo e podem ser influenciados por aspectos sociais,
culturais e emocionais.

Assim para a arqueologia, o corpo é um testemunho das experiências humanas como


um “diário biológico & cultural”, comportando informações sobre a vida e a morte dos
indivíduos e que, por sua vez, é transformado em materialidade onde este é fruto do resultado
dessas experiências vividas pelo grupo. Entre elas está a morte como fator importante na
discussão sobre o corpo e a materialidade pois é a partir desta que é possível visitar partes do
passado através dos remanescentes transformados (FAHLANDER; OESTIGAARD, 2008).

As análises do corpo são feitas a partir da premissa de que as representações


socioculturais estão também impressas nele - que ao mesmo tempo encarna o simbólico
durante a vida, reduz o mundo ao próprio corpo, o qual existe é recipiente do mundo em
forma simbólica (LE BRETON, 2021). Sendo assim, o corpo pode ser compreendido como
uma variável dentro do contexto arqueológico que detêm grande potencial analítico e
interpretativo, simbólico, principalmente quando se trata da discussão sobre não apenas as
suas informações demográficas (soma) mas as informações culturais (psique).

Binford (1971) quando apresenta o tratamento do corpo como uma das principais
variáveis a serem consideradas no estudo das deposições funerárias, levou em conta a
potencialidade do corpo-esqueleto, considerando que este também conteria informações
sobre as escolhas feitas cotidianamente pelos seres humanos do passado. Assim, esta
discussão se torna também voltada para as inferências culturais feitas pelo grupo. Portanto o
corpo torna-se um registro dos gestos corporificados dos vivos, se transformando primordial
para uma análise comportamental (JOYCE, 2005).

“Pensar através do corpo pode ser similar ao pensar através dos objetos de cultura
material, dentro da produção do conhecimento arqueológico” (SILVA, 2019, p. 194). Neste
mesmo texto de Hamilakis et al (2002), o corpo, como proposto por Sarah Tarlow na
introdução de em Bodies, selves and individuals, pode ser compreendido de variadas formas.
No caso dos corpos dos mortos, estes providenciam aos arqueólogos uma aparente
fundamentação para interpretar as sociedades antigas. Portanto, a busca para compreender
estas sociedades e cada indivíduo que se encontrou inserido no meio social e ambiental é o
principal ou uns dos elementos primordiais para entendermos os grupos humanos do
“passado” e construirmos inferências científicas sobre como estes viviam e como morreram

5
ou, até mesmo, conjecturar sobre as possibilidades relacionadas as suas representações sobre a
morte e se estas refletiam direta ou indiretamente sua vida cotidiana (SILVA, 2019, p.195;
O’SHEA, 1981; MIGNON, 1993).

Muito embora essas considerações preliminares indiquem as instâncias distintas nas


quais o corpo humano pode estar situado, sob a perspectiva transformativa de uma sociologia
do corpo lebretoniana, existem lógicas culturais e sociais que se propagam no corpo. Ainda
existe um risco, que Le Breton (2019, p. 36) considera como a “(...) diluição do objeto,
insuficientemente definido pelo pesquisador que, querendo tudo abarcar, acaba perdendo o
ambicionado objetivo”. Para o autor, procedimentos de análise, métodos de coleta de dados,
adequações conceituais, em relações pluridisciplinares com a fenomenologia, etnologia,
história, psicanálise, economia, por exemplo, geradas no estudo do corpo representam etapas
que merecem precauções, interpelações e reutilização de resultados dessas disciplinas.

Como é uma disciplina que faz uso da repetição ao longo do tempo como base para o
reconhecimento das práticas culturalmente inteligíveis, a arqueologia descreve as maneiras
pelas quais diferentes formas de corporificação acabaram sendo historicamente produzidas,
reproduzidas e transformadas. Ao mesmo tempo, profissionais de arqueologia estão cientes
das lacunas que existem entre a materialidade dos vestígios do passado, a experiência humana
e as interpretações arqueológicas que esses traços possibilitam (JOYCE, 2005). Ainda, o
corpo como lugar central na teoria social contemporânea, segundo esta autora, pode ser
abordado enquanto metáfora da sociedade, instrumento de experiência vivida e superfície de
inscrição, isoladamente ou simultâneamente.

Enfim, o corpo, na perspectiva da arqueologia, simetricamente às configurações da


antropologia, da sociologia e da história do corpo, como também da anatomia e correlatas do
discurso anatomofisiológico sobre o corpo físico, os artefatos do corpo, o corpo representado,
o discurso ocidental europocêntrico, evidentemente colonizado, apresenta o corpo do Outro e
seus fazeres. Passemos, a seguir, a algumas considerações discursivas individuais de pesquisa
com direcionamentos aproximativos enquanto “arqueologias do corpo”.

Corpos físicos da diáspora africana e seus artefatos: os idés e os dentes modificados dos
escravizados do engenho Jaguaribe, Pernambuco e Marechal Deodoro, Alagoas4

4
Discurso de autoria de James S. Ferreira, de 2023, exclusivo para este capítulo.
6
Estudos arqueológicos em contextos de construções sacras e engenhos do Nordeste
brasileiro são ainda bastante escassos. Os estudos dos sítios Taperaguá-AL e Jaguaribe-PE
(OLIVEIRA, 2011), podem contribuir com as linhas de pesquisa da arqueologia histórica (DE
SOUZA; SYMANSKI, 1988; ALLEN, 2017), funerária e do corpo. Optamos por trabalhar
com a perspectiva do corpo adornado, artefatos do corpo, e dentes modificados (LIRYO, et
al., 2001; SMITH-GUZMÁN, et al., 2020) e adornados, considerando a identidade (DÍAZ-
ANDREU, 2005) e os ritos simbólicos em contexto funerário.
Os métodos e técnicas da bioarqueologia e arqueologia funerária (SILVA, 2014), têm
auxiliado a observar os fenômenos culturais, ritualísticos e religiosos, que se assemelham nos
esqueletos dos indivíduos 03 e 06 do sítio Taperaguá-AL, (FERREIRA,2019-2022; SILVA,
2020) e dos indivíduos 03 e 07 do Engenho Jaguaribe-PE,(OLIVEIRA e SILVA, 2022),
contribuindo com as linhas de pesquisas na arqueologia histórica da diáspora africana de
corpos pretos escravizados do período colonial no Nordeste brasileiro. A arqueologia aqui
está focada no indivíduo, nos estudos direcionados em identificar e analisar os aspectos
bioculturais dos remanescentes, seus adornos e as mudanças dentárias como marcadores de
identidade social, cultural e religiosa.
Assim, a pesquisa é muito significativa para a arqueologia do Nordeste brasileiro, por
possibilitar discussão de dois sítios importantes, um em contexto de igreja e outro de engenho,
ambos do período colonial. As pesquisas nesses sítios tiveram início com o sítio Taperaguá-
AL, pois foi caracterizada uma pulseira, denominada de ide, adorno associado ao braço
esquerdo do individuo 3, de sexo masculino. Mediante análises iniciais, a pusseira poderia ter
sido usada no cotidiano do indivídduo, um possível sacerdote ou um adepto de religião
africana (KARASCH, 1943, p. 247).
Por certo, as pulseiras ides tem a função, a priori, de conexão do indivíduo com a
ancestralidade (MUNANGA, 1994; SANTOS, 2012), no aspecto religioso. É marcador de
identidade, pois todos do grupo se reconhecem entre si, além de decorar o corpo. Para a
sociedade escravista colonial, o ide não passava de um balangandã.
A partir das evidências dos indivíduos do Jaguaribe-PE, resolvemos analisar os dois
sítios em conjunto, a princípio para verificar se todos os indivíduos são de ancestralidade
africana, e se os adornos e as modificações dentárias estão associados a corpos e rostos
decorados e as pulseiras tem um papel religioso e decorativo.

7
Contando com isso, as práticas funerárias (SILVA, 2014) revelam os aspectos do
cotidiano de um grupo ou sociedade, possibilitando observar atributos culturais (AGOSTINE,
1996, 2016), identitários e religiosos (BASTIDE, 2001; SANTOS, 2012; SUSNOW, 2022),
através do rito funerário da tríade estrutural das deposições funerárias corpo, cova e
acompanhamentos, fornecendo dados dos mortos relativos às suas sociedades, mas muito
mais dos vivos que realizaram os rituais funerários, dos quais, os sítios Taperagua-AL e
Jaguaribe-PE, se articulam nessa descrição.
Ademais, pode-se considerar que as implicações sociais, antropológicas e religiosas
das divergências identificadas entre ações e contextos funerários ritualizados e não rituais são
de longo alcance, incluindo a descoberta de um ethos religioso, até então não detectado e
questionando, como os templos do sul do Levante, considerados casas de deuses (SUSNOW,
2022).

A tradição é um passado presente, uma memória individual, porque dá identidade


ao indivíduo, e coletiva, porque dá sentido e partilha efetiva de pertencimento (OST,1994).
O corpo é a parte na arqueologia que causa mais atração: é algo tangível, podendo se
observar a história inscrita, cujas observações das mudanças que ocorrem de forma natural
e cultural. Dessa forma, o corpo para a osteoarqueologia promove diferentes abordagens,
como sujeito e corpo contextualizado (SOFAER, 2006).
De certo, Fernandes (2013) considera intencional a propriedade do corpo, que se
mantém por duas questões fundamentais: a primeira seria a ideia de um corpo próprio,
enquanto a segunda, que o corpo não é mera constituição física (MERLEAU-PONTY, 2006),
mas um organismo, cujas noções de ordem e forma fundamentam a intencionalidade do
corpo a partir dos pressupostos oriundos da estrutura da percepção do nível orgânico, que
passa para uma forma simbólica do comportamento constituindo um mundo único de
significados.

Como consequência, os corpos, os dentes modificados e as pulseiras do sítio


Taperaguá-AL e do Engenho Jaguaribe-PE, também podem ser considerados parte onde toda
a energia é depositada por meio de rituais africanos, por meio de objetos, materiais biológicos
e não biológicos (orgânicos e inorgânicos) são as plantas e minerais, utilizados como poder
nos objetos (ides) em ferro, que passam a desenvolver a força no corpo de quem prepara o
ritual e de quem está portando tais artefatos, assim como o que é ritualizado. Esse processo
permite a interiorização e a mobilização de elementos simbólicos ou espirituais,
individualmente ou coletivamente, que transformam o ser humano num verdadeiro altar vivo
8
no qual pode ser invocada a presença da divindade e dos antepassados (VERGER,1997;
MATVEIEV,1997; SANTOS, 2012; FERREIRA, 2018; LOPES, 2021)

Assim sendo, as pulseiras ides pertencentes aos indivíduos 3 do Taperaguá - AL e 7


do Jaguaribe - PE, associados aos seus corpos, lugar de inscrições que a um primeiro olhar
pareçam ou sejam adornos. O corpo transformado, paramentado ou decorado, pode ser
entendido como lugar recipiente de energia gerada a partir de rituais, onde o fenômeno é
visualmente simbólico (SANTOS, 2012, p. 44).

Ademais, a combinação de materiais e objetos não é uma fórmula fixa. Cada


combinação é determinada por objetivos específicos da comunidade e do indivíduo que a
compõe, dentes modificados, uso de ides, rostos e corpos decorados revestidos de identidade
como acontece em ambos sítios citados anteriormente. Dessa forma, é apropriado dizer que os
corpos dos quatro indivíduos sejam altares religioso, social e cultural, visto no rito fúnebre,
como oferendas, no qual o corpo é revestido de poder, lugar de consagração de forma
adornada (CARNEIRO, 1948; BASTIDE, 2001).
Os corpos de humanos escravizados analisados em contexto arqueológico histórico
mostram a importância de se examinar pressupostos culturais do comportamento desses
grupos, que usaram seus corpos inseridos de símbolos usados no passado, quando estiveram
em suas nações (FERREIRA, 2009; LOPES, 2021), usaram seus símbolos para dar sentido ao
presente no qual estavam vivendo, agindo no reconhecimento de forma conjunta através de
sua herança cultural (HEYWOOD, 2008, p. 217).
As modificações em dentes humanos têm significado antropológico e social. Estudá-
los ajuda compreender o comportamento humano do passado e no presente a partir de uma
perspectiva geográfica, cultural, religiosa e estética (GONZÁLEZ, 2010):
Os dentes dos remanescentes humanos escavados no Engenho Jaguaribe e Taperagua, são
únicos e importantes devido a sua vinculação com os trabalhadores do engenho,
representados pelos africanos escravizados e libertos. As modificações dentárias estão
relacionadas a questões de status sociais e rituais, no sentido de ideal de beleza, com
intuito de caracterizar uma ordem social e cultural. Nesse sentido, a remodelação tem uma
forma ou características de um adorno fixo transformável, em que os dentes, assim como o
corpo, tenha a mesma percepção de beleza. Interfere-se, portanto, que ainda há a
necessidade de pesquisa em torno das práticas culturais e religiosas, nos adornos dentários
modificados intencionalmente, de grupos africanos de período colonial, que visem
contribuir com a diáspora africana na arqueologia histórica, com material dentário.
(FERREIRA; SILVA, 2022).

Assim sendo, as modificações dentárias são parte de um rosto decorado, e as pulseiras


são adornos que remetem a identidade cultural e religiosa de pessoas pretas compradas e
arrastadas da África para serem escravizadas, e mesmo assim conseguiram se reinventar, a

9
partir do momento partilhado dos mesmos problemas, para não perder a identidade cultural e
religiosa.
As indumentárias, adornos, pulseiras, manilhas, todos esses nomes são sinônimos de
adornos, confeccionados, criados e pensados por tecnologias artísticas africana, bem antes dos
invasores europeus começarem a se interessar pelas riquezas das nações da África. Desse
jeito, partindo de uma classificação mais assídua – adorno – associada às noções de
estética/valor, é plausível ainda inferir tais artefatos como parte integrante da economia do
prestígio no sistema cultural africano. Ou seja, da promoção de valores relacionados à beleza,
demarcação de posição social, valia de troca, entre outros mais, expressados na carne
(SANTOS, 2020, p. 65)
Dessa maneira, os sítios Taperaguá -AL e Jaguaribe -PE, tem muito a contribuir com
as pesquisas que envolvem remanescentes humanos e as discussões relacionadas ao corpo,
sobretudo, o corpo adornado e modificado, cujo tema se encontra crescente e sendo debatido
em outras áreas de saberes, ao ponto de gerar disciplina obrigatória em alguns programas
acadêmicos. Nesse sentido a remodelação tem uma forma ou características de adorno fixo
transformável, em que os dentes, assim como corpo, tenham a mesma representação de
beleza. (ALT E PICHLER, 1999; GARVEM, 2011).

Corpo da e para a comunidade: o povo Kapinawá e os (seus) remanescentes humanos5

Os estudos mortuários e de curadoria de coleções de remanescentes humanos


arqueológicos datam do séc. XIX, dentro de um sistema científico de produção de
conhecimento. As análises mortuárias na Arqueologia (MIGNON, 1993; PARKER-
PEARSON, 2002; SPRAGUE, 2005; SILVA, 2014) compreendem as investigações de
antigos sepultamentos humanos para a obtenção de informações sobre sistemas socioculturais
do passado.

A compreensão sobre os modos de vida de populações antigas por meio da sua cultura
material tem sido objeto da Arqueologia desde os séculos XVIII e XIX, inicialmente
vinculados a fundamentar formas de imperialismo e dominação entre as populações da
Europa, da África e América. As coleções antropológicas geradas em escavações estão sob a
guarda de instituições de ensino, pesquisa, extensão e em museus e coleções particulares,

5
O texto deste subtítulo do capítulo é de autoria de Juliane Guedes, relacionando-se à sua monografia de
graduação em arqueologia e ao mestrado, ainda em construção.
10
representando um material muito importante para a produção do conhecimento arqueológico
sobre a memória e a história da humanidade (CASSMAN et al, 2008).

Em todo o Brasil, as universidades e centros de pesquisa, os museus e instituições


correlatas, apresentam sempre uma coleção antropológica de origem diversa, comumente
associada a uma pesquisa, coletas assistemáticas e investigações criminais ocorridas há algum
tempo. Esses vestígios resultam em coleções de natureza sensível, por causa do seu conteúdo
biocultural, com elementos simbólicos pré-existentes e diretamente relacionados com a sua
origem no contexto sistêmico ou de vida de uma população no “passado”. Portanto, são
coleções de natureza sensível, com elevada carga simbólica, compostas de remanescentes
ósseos e objetos de cultura material que são indissociáveis entre si (SILVA, 2014) e que
acabam por demandar a participação da comunidade diretamente ou indiretamente envolvida
ou afetada.

É importante ressaltar que os estudos biarqueológicos são de extrema relevância para


uma primeira compreensão das sociedades pretéritas e suas respectivas culturas. Através de
análises osteológicas, é possível traçar estimativas de idade, sexo, ancestralidade, patologias,
como também evidências étnicas, como é o caso dos dentes modificados presentes em
algumas populações humanas (WHITE, FOLKENS, 2005; SILVA, 2014; FERREIRA;
SILVA, 2022).

Em paralelo à importância que os estudos bioarqueológicos possuem para a ciência,


encontram-se comunidades aliando suas pautas político-sociais à repatriação e reinumação de
bens arqueológicos de interesse comunitário (relativos à reterritorialização de núcleos
identitários), no sentido de compreenderem tais escavações, em certos contextos, como uma
violação aos simbolismos que os norteiam (RUIBAL, 2012). Segundo Santos (2019), os
pedidos de repatriação de objetos advindos de escavações por meio das comunidades surgem
na década de 1980, em várias partes do mundo.

A esse respeito, representantes de povos indígenas têm visto os arqueólogos como


profanadores de antigos ritos e de suas respectivas tradições culturais. Por outro lado, os
arqueólogos norte-americanos veem seus meios de subsistência e a ciência ameaçados pela lei
de reparação federal de 1990, que dá aos povos indígenas o controle sobre os remanescentes
humanos em seus territórios tradicionais (THOMAS, 2001).

De acordo com McGowan e LaRoche (1996, p. 4), ossos humanos são alvos de análises
sistemáticas no âmbito dos laboratórios, porém é negligenciado “o metafísico à medida que os
11
dados inerentes aos restos mortais humanos se tornam primordiais”. Relacionando a isto, o
famoso antropólogo físico, William Bass (1981) diz que “do ponto de vista de um biólogo que
estuda o esqueleto humano [o re-enterro] é semelhante a queimar os livros em nossas
bibliotecas”.

A partir desta perspectiva, observa-se que os remanescentes ósseos humanos carregam


uma dualidade de valores éticos e simbólicos, que permeiam os âmbitos acadêmicos e sociais.
Com isso, os corpos atuantes no processo, sejam eles os representados pelos pesquisadores ou
pelas comunidades indígenas, buscam empreender seus esforços pela luta da aquisição dos
corpos evidenciados nos sítios arqueológicos. A luta dos povos originários pela reconquista
dos seus antepassados, sua identidade e territorialidades - coleções de museus e instituições de
pesquisa ocidentais e europocêntricas - pode se concretizar em acordos de negociação com
tais instituições.

Para Lima (1994), existem representações simbólicas que permeiam os ossos humanos,
que não podem ser violados, pois existem valores morais e espirituais que cercam os
indivíduos. Sendo assim, havendo uma existência de laços simbólicos que conectam o grupo
com quem já morreu, isso é evidente, segundo Silva (2014), quando nos deparamos com os
adornos e as diferentes posturas corporais dentro dos sepultamentos arqueológicos.

No que tange os ossos humanos, os mesmos contarão histórias sobre seu passado, por
meio da análise sistemática dos mesmos é possível compreender a cultura a qual pertencem
ou pertenceram. Para Silva (2014), ao analisar os remanescentes, há a possibilidade de uma
importante descrição morfológica dos mesmos, quanto ao seu perfil biológico, como também
seu contexto social. Aqui, um “(...) sepultamento é parte de um funeral e um funeral é parte de
um conjunto de rituais pelos quais os vivos relacionam-se com a morte” (SILVA, 2014, p.
50).

O fenômeno que envolve a morte está para além de corpos se decompondo, do


desligamento da alma da matéria, ou das atividades vitais do corpo quando este morre.
Segundo Silva (2014), a morte rege normativas que mudam o comportamento de quem está
vivo. É através de como o indivíduo está enterrado que saberemos mais sobre comunidades
pretéritas enquanto vivas.

O ato de morrer com tudo o que ele implica, se converte sempre em uma
realidade sociocultural. Assim, a morte faz surgir, tanto no plano da
consciência individual, quanto grupal, conjuntos complexos de
representações (SILVA, 2014, p. 37).
12
A ciência e a religião entram em conflitos ao se tratar dos remanescentes humanos.
Segundo Lima (1994), “este inflamado conflito ideológico entre religião e ciência, ou entre
moral e ciência, extrapolou os muros acadêmicos”. Os corpos humanos anatomizados, para
estudos científicos, ainda sofrem grande polêmica no que diz respeito às múltiplas formas de
enxergar a morte para cada comunidade envolvida. Lima (1994) também discorre que “em
nome da ciência, a remoção formal de cemitérios para instituições de pesquisa tornou-se uma
prática comum, legítima e inquestionável”. Isso decorre de formas eurocêntricas e
colonialistas de reafirmação póstuma das metrópoles sobre suas colônias, cujos troféus são
rotineiramente expostos nas instituições museais ou abandonados nas suas reservas técnicas.

Ossos humanos, além de exigirem uma atenção e um método adequado ao serem


manipulados por muitas vezes se encontram friáveis, devido a uma série de processos
tafonômicos e tanatológicos, devido a fatores do substrato geológico e de processos pós –
deposicionais, possuem alta carga simbólica, pois neles é identificado, na sua maioria, o que
compõe a tríade da Arqueologia Funerária, dada pelo corpo, cova e acompanhamentos.
(SILVA, 2014).

De acordo com Santos (2019), as coleções compostas por remanescentes humanos,


remontam um período que compreende entre os séculos XIX e XX, no qual eram formados de
vestígios ósseos humanos e toda materialidade sagrada que envolvia os mesmos. Durante este
período, vários cemitérios foram escavados, com o intuito de ajudar no desenvolvimento de
pesquisas científicas. Para Endere (2000), essas coleções se tornaram imprescindíveis para os
espaços museais e âmbitos acadêmicos, sendo consideradas como pertencentes ao patrimônio
nacional.

O interesse nos remanescentes ósseos humanos data desde o século XVIII, no contexto
internacional. No Brasil, as coleções antropológicas se iniciam no século XIX, com a coleta
de remanescentes ósseos em Lagoa Santa pelo naturalista Peter W. Lund, os quais, até 1990,
eram denominados de restos do “Homem de Lagoa Santa”, até as pesquisas de Walter Neves
serem iniciadas na região. A partir de polêmicas, no contexto internacional, que estavam
relacionadas com a presença de remanescentes humanos e sua antiguidade no território
brasileiro, D. Pedro II iniciou uma série de expedições arqueológicas em toda extensão
nacional (SANTOS, 2019).

Souza (2014, apud SANTOS, 2019, p. 73), diz que os estudos bioantropológicos da
segunda metade do século XIX, convergiam para análises puramente antropométricas, com o

13
principal objetivo classificar “raças” através de processos analíticos das estruturas ósseas,
para apresentar e documentar a diversidade humana. Neste período, que se estende até o
século XX, pesquisadores da Arqueologia Biológica estavam imersos nos estudos voltados à
anatomia óssea, tendo uma aproximação com as ciências naturais e se afastando de
perspectivas sociais e das humanidades, que também estão presentes na ciência arqueológica.
Nesse aspecto, a arqueologia se constitui cada vez mais uma ciência social aplicada.

Atualmente, existem etnias indígenas (de povos originários) que vivem em regiões
próximas aos sítios arqueológicos, e no contexto estudado, os Kapinawá convivem com esses
sítios, os quais são lugares sagrados, enxergando os sítios com uma ótica divergente a dos
profissionais da Arqueologia, cabendo o(a) pesquisador(a) conciliar suas pesquisas que são
importantes para evidenciar populações que viveram no passado e suas relações ontológicas
com povos que existem nos dias atuais.

Com isso, entendendo a extrema importância da escuta das populações que reivindicam
a cultura material escavada, coletada e analisada por profissionais da Arqueologia, através da
História Oral, serão apresentados alguns fragmentos da entrevista realizada com Dona
Roseana Prachenawá, líder da aldeia Ponta da Várzea, no dia 18 de Agosto de 2019, a partir
de visita técnica ao Sítio Arqueológico Alcobaça, Buíque, Pernambuco.

A entrevista através da metodologia da História Oral, ocorreu durante pesquisa de


Monografia de Juliane Carla Guedes Lima da Silva, intitulado “Implicações Simbólicas e
Científicas na lida com Remanescentes Ósseos Humanos: Proposta de Parâmetros éticos para
Código de Conduta em Arqueologia”, sob a orientação do Sérgio Francisco Serafim Monteiro
da Silva, com financiamento do PIBIC/CNPQ, no ano de 2021.

A entrevistada teve a possibilidade de transcorrer sua narrativa, tendo como cenário


visual, o paredão rochoso composto de pinturas rupestres. Dona Roseane Prachenawá proferiu
suas palavras fazendo menção ao que estava vendo, no caso das pinturas. No tocante à
Tradição Agreste e sua relação com o fenômeno da morte, ela diz:

Ó, sempre quando tem um círculo, é porque morreu gente. Quando tem círculo
morreu gente. Quando ele tem assim a mãozinha, a mãozinha deles, morreu gente.
Quando... tem gente, tem inscritura por ai, que tem a perna, que tem a mão, que tem
a cabeça, então é porque morreu gente ali (Dona Roseane Prachenawá, 2019).

O povo Kapinawá, compreende os espaços de enterramentos dos sítios arqueológicos


como cemitérios indígenas, onde estão seus antepassados. Com essa perspectiva, dona
Roseane diz que esses espaços:

14
São a continuação, né? A continuação da nossa vida, continuação de nós. Então nós
não morremos, nós somos donos, nós somos proprietário, nem é porque sou
indígena, vocês também que não é indígena também é proprietário do mundo, né?
Nós somos filho dessa natureza, essa mãe natureza aqui, que é a terra, ela é... ela é
sagrada, ela é sagrada para todos, né? (...) Eu fazendo uma visita dessa, eu tô
favorecendo meus encantos de luz, né? Meus encantos de luz. Essa semana eu com
certeza, eu vou me dar muito bem em tudo que eu for fazer (Dona Roseane
Prachenawá, 2019).

Ao observar o sítio arqueológico Alcobaça, Dona Roseane Prachenawá, no local onde


aconteceram escavações arqueológicas, relatou que este episódio foi triste. Segundo a
narrativa da mesma, o povo Kapinawá não foi informado para onde os remanescentes ósseos
humanos foram levados e nem como estão sendo tratados:

Essa parte aqui eles já escavam, tá vendo? Então isso dá tristeza também, porque a
gente lá sabe o que tiraram daqui? O que já aconteceu aqui? Num sabe se eles
pegaro o... o restos mortais dos nossos antepassados e levaram. Levaram pra um
canto que a gente nem conhece, né? Que a gente não sabe. Mas o bem material pra
gente é muito, mas num é tanto, agora o espiritual disso que a gente tá vendo aqui,
de tudo que a gente tá vendo aqui eles nunca vai escavacar isso aí, porque isso aí
tem... ali tem inscritura rupestre naquela pedra, como é que eles vai tirar aquela
pedra dali? Eles não vão escavacar isso aí, quem tem conhecimento não vai, nem
deixa. Isso aqui é muito forte, espiritualmente, não vai... num vão nem mexer mais
nisso aí (Dona Roseane Prachenawá, 2019).

Assim sendo, através dos fragmentos da entrevista com Dona Roseane Prachenawá, é
pertinente que façamos uma reflexão através da pergunta de Funari e Robrahn (2008), que
questionam “quem se beneficia da pesquisa arqueológica?”. É imprescindível que
profissionais da Arqueologia se questionem constantemente, “Minha pesquisa está retornando
resultados às comunidades envolvidas? Eu realmente procuro saber se existem comunidades
próximas aos sítios que irei escavar? E quais são as relações das mesmas com o referido sítio
arqueológico?”

Os questionamentos acima se inserem no contexto atual da ciência arqueológica, na


qual deve caminhar junto com os meios que possibilitem a aproximação das instituições de
pesquisa com as populações direta ou indiretamente envolvidas com os estudos. É
responsabilidade das pessoas que compõem a Arqueologia, de inserir mais as comunidades
nos projetos desenvolvidos nos âmbitos acadêmicos de estudo e recuperação dos corpos do
passado. Esses corpos arqueológicos interessam não somente a profissionais de arqueologia,
mas aos povos originários, intensamente prejudicados e violentados física e culturalmente
durante todo o período decorrente da ocupação e exploração do continente pelos europeus.

15
Corpos que fumam: gentes diferentes, cachimbos diferentes6

A incidência de cachimbos em sítios arqueológicos, na capitania de Pernambuco,


indica o uso de cachimbos por determinado seguimento social (holandês, luso-brasileiros e
dos povos originários), revelando a relação de identidades sociais com sua preferência pelo
uso do artefato de fumar. Provavelmente devido a resistência e ao sentimento de identidade
social oposto, existente entre europeus e não europeus.
Os cachimbos, aqui, são compreendidos como artefatos do corpo, para o corpo. São
suas extensões, vinculadas à identidade étnica, saúde, simbolismos, acordos, status,
sexualidade, entre outras performances socioculturais do corpo psicossomático.
Gentes de Pernambuco no século XVII

A capitania de Pernambuco, no século XVII, convivia entre diferentes e com quatro


segmentos sociais, revelando duas manifestações de sentimentos de pertencimento: a de ser
europeu e a de não ser europeu. Os não europeus, aos poucos, adquiriram identidades sociais,
concebendo os europeus como diferentes. Resistiram a dominação holandesa, construíram um
sentimento nativista, podendo ser compreendido como o embrião de “nação brasileira”,
culminando com a Insurreição Pernambucana de 1654, revelando-se através do uso de
cachimbos.
No geral, os segmentos sociais, europeus e não europeus, poderiam ser entendidos e
identificados pelo uso de cachimbos. Os europeus, holandeses, usavam os artefatos de fumar
de sua fabricação, que eram os cachimbos brancos de caulinita; enquanto os “não europeus”,
denominados de “luso-brasileiros”, incluindo também os indígenas, usavam cachimbos não
europeu do tipo avermelhado, podendo ser relacionados como símbolo de uma identidade
social e de resistência cultural, evoluindo para a formação embrionária de “nação brasileira”
como elemento diferenciador do outro.
Gentes diferentes de corpo e alma: Identidades sociais na Capitania de Pernambuco

Gentes diferentes de corpo e alma remetem a noção de identidade, referindo-se à


percepção de unidade com pertencimento a um determinado grupo (BLAKE; MAEL,1989,
p.34). A teoria de identidade social conceitua identidade como sendo a identificação com uma
categoria social, como preto ou branco, cristãos ou judeus, pai ou filho, professor ou aluno
(STRYKER; BURKE, 2000, p. 291-293). Na capitania de Pernambuco, a percepção da
6
Texto de autoria de Severino Ribeiro da Silva.
16
identidade “não europeia” começou a ser revelada como elemento diferenciador,
desenvolvido no período de dominação espanhola e holandesa. O sentimento do
pertencimento de não ser europeu ou do nativismo, pode ser compreendido através do
fortalecimento de significativos laços que uniam as pessoas e ao mesmo tempo excluíam
outros que não compartilhassem de suas simbologias, de seus interesses, de seus códigos, de
sua “nação” de pertencimento por fazerem parte de um povo: contemplar aqueles que eram
iguais e, os demais vistos como diferentes. (BARBATO, 2016, p.5).

Na primeira metade do século XVII, a sociedade colonial no Brasil firmou-se através da


economia do açúcar, sendo a capitania de Pernambuco o seu principal centro produtor. No
entorno dos engenhos, dos núcleos urbanos e das áreas portuárias, surgiu uma sociedade
dominada pela aristocracia açucareira. A partir de 1630, com a ocupação holandesa, a
capitania de Pernambuco poderia ser compreendida e até identificada por quatro segmentos
sociais, com seus respectivos corpos: os indígenas (povos originários da América), os afro-
descendentes (povos da diáspora mercantil), os “luso-brasileiros” e os holandeses. Faziam
parte dessa sociedade, os “brancos” produtores de açúcar (senhores de engenhos e lavradores
de cana), negociantes do açúcar, banqueiros (judeus ou cristãos novos), trabalhadores livres
assalariados, profissionais especializados (como barbeiros, sapateiros, artesãos), “índios” em
guerras ou aldeados e “negros” livres ou escravizados (FERLINI, 1988, p.31-80). Essa
sociedade e dentro desse período, todos fumavam cachimbos cerâmicos, exceto os afro-
descendentes e escravizados, necessitando de uma investigação futura.
Corpos que fumam cachimbos
O consumo do fumo poderá se relacionar com gente de corpo e alma. Corpos entendidos
como objeto material, instrumento da alma, como túmulo e queda da alma no corpo. O corpo
como sendo todo objeto material situa-se no espaço, possui uma massa com suas substâncias e
com três dimensões: a altura, a largura e a profundidade (ABBAGNANO, 1999). Porém, a
concepção mais antiga e difundida do corpo encontra-se como instrumento da alma e do
espírito e consequentemente, este corpo poderá receber o apreço pela função que exerce,
sendo por isso elogiado ou exaltado, ou então pode ser criticado por não corresponder a seu
objetivo ou por implicar limites e condições. Do mundo clássico ao moderno, revelado por
Platão e Nietzsche, o corpo possuía uma concepção de túmulo ou prisão da alma, revelada
com a expressão: “quem está desperto e consciente diz: sou todo corpo e nada fora dele".
Também, Platão expôs a tendência do “mito da queda da alma no corpo”, com a concepção de

17
instrumento do corpo no estado de queda e devido ao pecado a alma tem necessidade do
corpo, cujos serviços lhe são indispensáveis (ABBAGNANO, 1998, p.211).
O corpo fez uso de alucinógenos, fumou o tabaco , a paricá e tantas outras ervas
excitantes, como prazer, vício e pecado da alma, faziam parte da vida cotidiana dos povos
indígenas e depois dos europeus. Plantas com substâncias narcóticas promoviam o estupor ou
a letargia, poderiam aliviar ou suprimir a dor, como também logravam ao comportamento
psicodélico com alucinações. Enquanto os cachimbos, eram apenas instrumentos ou artefatos
auxiliares do consumo (SANGIRARDI JR, 1983).
Do termo fumo deriva-se da palavra fumaça, que se inala ao fumar (NAVARRO, 2013,
p.380). A presença e o uso da fumaça remetem a utilização do fogo e da fogueira pelos povos
indígenas, expondo a inalação de ervas sejam consumidas pela queima direta nas fogueiras ou
inspirando com artefatos de fumar pelas vias orais ou nasais (COOPER, 1986, p.105).
O uso ritualístico da fumaça era comum entre os indígenas das Américas. Também
ingerindo substâncias alucinógenas, como o tabaco, e fumando em cachimbos. O cachimbo
era um objeto de profunda adoração, presidia às cerimônias mágicas e religiosas, presentes
nos momentos supremos, nas grandes decisões, na hora de partir para a guerra e na discussão
dos tratados de paz (SANGIRARDI JR, 1983, p.101).
Por volta de 1598, ingleses fumavam tabaco e os cachimbos de cerâmica tinham formatos
de uma pequena concha. Depois de 1617, teve início a fabricação na Holanda, com o inglês
William Baernelts; em seguida, nos dois países, a produção foi expandida em séries de
cachimbos de caulinita (OSWALD,1960, p.1-9). Com esse cenário, na Europa no século
XVII, o tabaco era adorado como “erva santa” e o companheiro de uso das mais diversas
gentes e grupos sociais, desde abastados, como príncipes na corte, pessoas de poucas posses,
como os camponeses nas cabanas, exércitos nas campanhas e até as musas na casa de
escritores. Consumir tabaco tinha várias formas, gestos corporais e significados para o corpo e
a alma, entre eles Fernando Ortiz (1978) descreveu um ritual: “o tabaco é um rito social de
paz e amizade, é o amigo mais constante do soldado e, na guerra, é sempre e em todos os
momentos sua paz". Chamavam na Europa de “erva santa”, usado sob a forma do rapé (pó),
mascando folhas secas, bebendo e fumando com o cachimbo (ORTIZ,1973, p. 266; MELLO
NETO, 1983, p.128 e 132).
A palavra cachimbo encontra-se na África, na língua kimbundu do termo kixima, com o
significado de “tanque de água ou cisterna” (JÚNIOR,1930, p.151). Porém, antes dos
africanos e dos europeus, os cachimbos eram usados pelos povos originários americanos e na
América, o artefato de fumar era chamado de petymbûaba, sendo atribuída a palavra
18
cachimbo da derivação dos termos da língua do tupi antigo, como: catimbó, catimbaba,
catimbaua e catimbu (NAVARRO, 2013, p. 380).
Como resultado de dezenas de intervenções arqueológicas ocorridas em sítios da
Capitania de Pernambuco, do século XVII, poderá conferir a incidência de cachimbos
cerâmicos brancos de caulinita e avermelhados (SILVA, 2015). Quanto as diferenciações
desses artefatos de fumar, deve-se considerar as cores das massas cerâmicas, podendo ser
classificados em cachimbos brancos e avermelhados. Os cachimbos com argilas brancas são
subdivididos em calcárias e não calcárias e diferem das argilas avermelhadas. Encontram-se
subdivididas com referências na plasticidade, na refratariedade e usadas para comparar com as
massas cerâmicas e a queima cerâmica pré-histórica da histórica (SHEPARD, 1985, p.153-
154). Os cachimbos de argilas avermelhadas apresentam-se com mais alto grau de oxidação e
suas massas cerâmicas são constituídas por hematitas e as formas hidratadas de óxido férrico,
goethita e limonita (SHEPARD, 1985, p.16).
No nosso estudo prévio com os artefatos cachimbos procedentes de sítios arqueológicos
da capitania de Pernambuco, estes indicam que gentes consumiam cachimbos: os holandeses
(“europeus”) usavam artefatos de fumar brancos de caulinita, os avermelhados pelos “luso-
brasileiros” e “indígenas” (denominados de “não-europeus”). Pode ser demonstrado que, em
cada grupo, e através do hábito de fumar cachimbo cerâmico, a presença de resistências
culturais e afirmação de identidade social.
Entre os segmentos sociais eram usadas variedades de formas de cachimbos. Para os
cachimbos cerâmicos dos povos originários (“indígenas”) apresentamos o tipo tubular,
descrito por Carlos Ott (1944), como completo com a haste ou só o fornilho para encaixe da
haste na mesma linha horizontal do tubo, podendo ser chamado assim de cachimbo tubular.
(OTT, 1944, p. 30). Para os cachimbos “luso-brasileiros”, este termo é empregado com
referência aos artefatos de fumar produzidos e utilizados pelos indivíduos de origem
portuguesa e brasileira (FERREIRA, 2008, p. 424). Também, encontram-se outros termos,
como “cachimbo de barro”, designado para artefatos de produção colonial e pós-colonial,
inseridos nos contextos de influência europeia e não ameríndias datadas antes da invasão
europeia. Os cachimbos produzidos de argilas vermelhas, encontravam-se geralmente com a
morfologia angular e de haste descartável de origem vegetal, opondo-se aos cachimbos
europeus, também angulares, fabricados de argila branca (de caulinita), inseridos numa rede
global de comércio (ALVES, 2015, p.1101)
O cachimbo surgiu com a funcionalidade de ser um artefato de fumar - para o corpo e do
corpo - e seus elementos morfológicos revelaram-se através de formas e tamanhos. O fumar
19
depende da conexão corpo-cachimbo, essencialmente. Também todos os atributos ligados a
este instrumento, poderão evidenciar a identidade social de determinado segmento cultural e
conferir sua identidade social de gentes diferentes fumando cachimbos diferentes no contexto
colonial pernambucano.

Problemas na generificação dos registros rupestres do nordeste brasileiro: A construção


social do gênero em questão7

Sobre os registros rupestres na região do Parque Nacional Serra da Capivara, desde


que as pesquisas foram iniciadas, na década de 1970, as arqueólogas Niède Guidon, Anne-
Marie Pessis e Gabriela Martin buscaram meios de sistematizar seus estudos, gerando com
isso classificações preliminares, fundamentadas em premissas estruturalistas e histórico-
culturais. A partir do reconhecimento de evidências acessíveis ao observador, foram
inicialmente divididos em duas grandes tradições: a Tradição Nordeste e a Tradição Agreste.
Posteriormente, as pesquisadoras estabeleceram outra tradição, denominada de “Geométrica”,
composta por “grafismos puros, algumas mãos e pés, figuras humanas e répteis” (GUIDON,
2007, p. 85).

Frente a esse cenário, nos primeiros estudos, era priorizada uma abordagem dos
registros rupestres como um sistema visual de comunicação, pautados nas primeiras propostas
apresentadas por Pessis (2003, p. 56), onde os grafismos rupestres permitiriam “Identificar os
modos como se apresentam diferentes culturas e descobrir os temas mais valorizados”
(PESSIS, 2003, p. 68).

Desta forma, as pesquisas na região foram desenvolvidas a partir de investigações que


buscavam por um reconhecimento de padrões de similaridades e diferenças, que poderiam
indicar atribuições de autoria a um determinado grupo (PESSIS et al., 2014). Nesses estudos,
frequentemente, é apontado que a indicação do sexo biológico estaria limitada a
manifestações sociais em que a distinção entre homem/mulher seria “necessária”. Assim as
figuras femininas estão representadas com uma vagina exteriorizada, em cenografias de
cópula ou associadas ao processo da gravidez (PESSIS, 2005, p. 20), enquanto as
representações masculinas, indicadas nos registros pela presença do falo, encontram-se
representadas em pinturas com temáticas interpretadas como cópula, ritualista, caça, agressão
entre outras. Seguindo esses primeiros estudos, a partir dos anos 2000, começam a ser

7
Este texto é de autoria de Itelmar de Negreiros Oliveira, 2023.
20
elaboradas novas pesquisas que se propõem construir interpretações sobre gênero e
sexualidade nas sociedades pré-coloniais a partir dos registros rupestres do PNSC, com a
participação do pesquisador Michel Justamand (JUSTAMAND e FUNARI, 2011;
JUSTAMAND, 2012; OLIVEIRA e JUSTAMAND, 2021).

Nesses novos estudos é preciso destacar um ponto altamente problemático identificado


nessas discussões sobre as noções de gênero, sexo e sexualidade a partir dos registros
rupestres que são a utilização de termos como “zoofilia”, “bestialidade” e “pedofilia”, sendo
utilizadas para descrever contextos associados a representações de práticas sexuais entre
pessoas do mesmo sexo. A vinculação da prática sexual entre pessoas do mesmo sexo a
patologias e atitudes criminosas é facilmente difundida, pois vivemos em uma sociedade que
é estruturalmente homofóbica e heteronormativa. Ao costurar essas práticas sob a forma de
discurso científico, são produzidos sentidos que naturalizam preconceitos ao recorrer a um
passado remoto, ao mesmo tempo que reforça as visões de bestialidade para as populações
ancestrais. Esses estudos são preconceituosos e violentos, pois, além de produzirem
hierarquias de poder sobre os corpos, eles reiteram uma normatização do modelo de sociedade
colonial.

Frente a esse contexto e à luz dessas perspectivas queer e demais teorias críticas aos
padrões eurocêntricos, é fundamental problematizarmos a generificação dos registros
rupestres a partir dos discursos arqueológicos (PAGNOSSI, 2013; RIBEIRO, 2017a;
GONTIJO e SCHAAN, 2017). Podemos destacar alguns estudos que vêm sendo
desenvolvidos nas ciências sociais nas últimas décadas, como as propostas defendidas por
Butler (2003) no âmbito da teoria Queer, nas quais a autora vai defender que a noção de
gênero é uma construção social não universal. Nessa mesma direção, temos as pesquisas das
arqueólogas Margareth Conkey e Janet Spector (1984) que problematizam o fato dos estudos
arqueológicos se sustentarem em um discurso masculinista e falocêntrico para tentar
reconstruir o cotidiano pré-colonial, no qual o macho é o caçador, responsável pelas
atividades mais importantes de subsistência e as fêmeas estão sempre atreladas a um contexto
secundário e “menos importante” (CONKEY; SPECTOR, 1984, p. 04).

Os estudos mencionados chamam a atenção para as possibilidades de como os dados


arqueológicos podem ser operacionalizados para a manutenção de narrativas arqueológicas
sexistas, que excluem quaisquer corpos que não se encaixem no padrão considerado como

21
norma pelas sociedades ocidentais/ocidentalizadas, e que, por sua vez, são impostas sobre
povos em posição de subalternidade (RIBEIRO, 2017b; PAGNOSSI, 2017).

Nesse sentido, é de extrema importância que os pesquisadores comecem a questionar e


contestar as pesquisas que constroem suas narrativas a respeito do universo pré-colonial,
baseada em parâmetros de comportamento estabelecidos pela lógica colonial, com os registros
rupestres sendo apresentados como uma “crônica” de uma realidade ancestral em analogia
com a modernidade colonial. Desta forma, amparados nos estudos atuais sobre gênero e
sexualidade, conseguimos efetuar de forma crítica consistentes problematizações capazes de
derrubar os pressupostos de identidades normativas interpretadas sobre os registros rupestres,
visto que estas pesquisas são construídas a partir de uma leitura exclusivamente binária, onde
gênero equivale ao sexo, e o sexo é representado por meio de signos interpretados pela ordem
colonial (OLIVEIRA, 2022).

Ao concordarmos que o gênero é uma construção social, reconhecemos que as noções


e papéis atribuídos aos indivíduos são influenciados por fatores culturais, históricos e
contextuais. A ideia de que existem apenas duas categorias rígidas de gênero, masculino e
feminino, é uma simplificação que não leva em conta a diversidade de experiências e
identidades de gênero.

Além disso, precisamos nos conscientizar de que binarismo de gênero mata, que
centenas de milhares de pessoas são agredidas, violentadas e mortas devido a pressuposições
de uma ordem natural do mundo e que determinados discursos arqueológicos, de forma
consciente ou não, tentam corroborar. Mas é possível superá-los, neutralizando as expressões
materiais dessas assimetrias na prática arqueológica, nas relações entre as pessoas e na
projeção desse binarismo ao passado. Trazer os estudos de gênero e Queer para os discursos
arqueológicos é uma forma de ampliar e realçar novos campos de possibilidade de se pensar
sobre o corpo e sobre o desejo entre os povos pré-coloniais.

Ao interpretarmos as representações dos corpos humanos nas pinturas rupestres,


devemos ter em mente que as normas e concepções de gênero variaram ao longo do tempo e
entre diferentes culturas. O que pode ser interpretado como uma representação feminina em
uma sociedade contemporânea pode não ser o mesmo em uma sociedade antiga. Para uma
interpretação mais consciente e inclusiva, é necessário adotar uma abordagem crítica que
questione os pressupostos implícitos e estereotipados na generificação dos registros rupestres.

22
Isso implica em reconhecer a existência de identidades de gênero que vão além das categorias
binárias, considerando a possibilidade de figuras que desafiam os padrões convencionais.

A generificação dos registros rupestres do Nordeste brasileiro a partir da perspectiva


da construção social do gênero é um campo desafiador e complexo. Requer uma abordagem
crítica, reflexiva e interdisciplinar, que leve em consideração as construções sociais, históricas
e culturais relacionadas ao gênero. É fundamental questionarmos as interpretações
preconceituosas e estereotipadas, buscando uma compreensão mais ampla e inclusiva das
representações dos corpos. Somente por meio de uma análise sensível e aberta, considerando
as complexidades e diversidades das identidades de gênero, poderemos avançar em nossa
compreensão do passado e promover uma arqueologia mais inclusiva e diversificada.

O corpo cadavérico, alegórico e performático: as arqueologias cemiteriais em lugares


católicos no Recife histórico, Pernambuco8

A Arqueologia enquanto conhecimento científico tem se dedicado em diversas áreas aos


estudos das respostas humanas ao fenômeno da morte. Trata-se de um importante campo de
pesquisa que infere questões a respeito das relações dos seres humanos em suas
representações socioculturais. A partir dos vestígios materiais analisados pela Arqueologia
dos ritos funerários, é pertinente analisar como os grupos tanto no passado como no tempo
presente, denotam aspectos simbólicos sobre a morte e quais papéis esses mortos
ressignificam nos seus lugares no chamado mundo dos vivos (MAYS, 2002)9.

Ao considerarmos o corpo humano também como ecofato10, pois tal conceito está
associado aos processos de transformações de materiais em objetos/artefatos no qual são
atribuídos formas, funções e significados; na materialidade arqueológica construída pelos
vivos para o morto, esse corpo assume também papéis de representações na trama social em
suas relações de pertencimento, tornando-se matéria das instâncias operacionais das práticas

8
Texto elaborado em 2023 por Vanessa Sial.
9
Simon Mays dedicou todo um capítulo para o trabalho arqueológico em cemitérios. Além de evidenciar a
importância de técnicas e protocolos de escavação em sítios com remanescentes humanos, Mays destacou as
sutilezas no olhar arqueológico de modo que o corpo pudesse ser percebido em estreito diálogo com os vivos que
foram partes integrantes das atitudes diante da morte.
10
O ser humano em si mesmo, no contexto arqueológico pois também resultante de um processo da cultura
material. (SILVA, 2014).
23
funerárias. Sendo assim, o corpo também carrega consigo registros da sua existência
psicossomática, sociocultural. Até mesmo a ausência do corpo pode conter uma gama de
significados. Os corpos sejam em vida ou na morte nos contam narrativas, fatos e histórias.
Os estudos cemiteriais, sobretudo as pesquisas acadêmicas que trataram de analisar a morte
no Brasil Oitocentista, evidenciaram como marco político o processo de proibição dos
enterros realizados no interior ou em cemitérios anexos das igrejas católicas para a
implementação do novo modelo de cemitérios, em espaços afastados do convívio cotidiano e
íntimo com os vivos; provocou de forma decisiva uma série de transformações e adaptações
dos costumes fúnebres11.

Foi durante o século XIX, em relação ao corpo humano, na persona do morto, que o
saber médico científico higienista introduziu na sociedade brasileira um novo conceito:
cadáver. Se antes o corpo morto estava em consonância em suas rede de relações humanas,
quando poderia ser tocado, ungido, receber maior tempo nos rituais de práticas funerárias;
esse mesmo corpo, nesse novo conceito de corpo-cadáver passou a ser objeto de medo; pois
esse corpo biológico em processo iminente de decomposição, de acordo com o pensamento
científico da época, seria um potencial risco para a eclosão e contaminação do ar provocando
doenças epidêmicas letais. A chamada Teoria dos Miasmas, que já era uma relevante corrente
de pensamento no final do século XVIII na Europa Ocidental, no Brasil, assumiria seu
protagonismo a partir da consolidação das faculdades de Medicina no Rio de Janeiro e na
Bahia (CASTRO, 2007).

Machado de Assis (1994), em seu romance originalmente publicado em folhetins e a


partir de março de 1880, na Revista Brasileira, a personagem Brás Cubas, dentro das suas
memórias íntimas, dedica sua obra: “Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu
cadáver dedico como saudosa lembrança estas Memórias Póstumas”. O defunto-autor dessas
memórias adotou uma terminologia específica para o seu corpo-cadáver. “Brás Cubas inicia a
história narrando sua morte, ocorrida numa sexta-feira de agosto de 1869, às 2 horas da tarde
Cemitério no Catumbi Cemitério de São Francisco de Paula - data oficial de inauguração: 20
de maio de 1850”, aos 64 anos, motivada por pneumonia. Seu féretro foi acompanhado por 11
amigos12. Tratava-se de um membro da elite patriarcal brasileira no Segundo Reinado. As
11
Sobre os estudos cemiteriais no Brasil Oitocentista destaco os pesquisadores Sandra Paschoal (1987), João
José Reis (1991), Tânia Andrade Lima (1994), Cláudia Rodrigues (1997; 2005), Renato Cymbalista (2001),
Alcineia dos Santos (2011), Felipe Machado (2017), Ana Cláudia Magalhães (2018), Viviane Comunale (2020).
12
Memórias póstumas de Brás Cubas. Núcleo Interinstitucional de Linguística Computacional - NILC,
Universidade de São Paulo - USP. Disponível em:
<http://www.nilc.icmc.usp.br/nilc/literatura/mem.riasp.stumasdebr.scubas1.htm#:~:text=Br%C3%A1s
%20Cubas%20inicia%20a%20historia,%C3%A9%20acompanhado%20por%2011%20amigos>. Acesso em: 09
24
práticas funerárias narradas por Machado de Assis, revelam na figura de Brás Cubas uma
persona que simbolizava a “morte civilizada”, com requinte condizente à sua classe social e
que ainda foi possível conciliar as tradições católicas, cujo campo santo 13 era administrado
pela Irmandade da Ordem Terceira de São Francisco. Nesse novo modelo de cidade dos
mortos, os cemitérios da Corte inaugurados no cenário crise epidêmica de Febre Amarela em
fins do ano de 1849-1850 estavam em conformidade com os saberes dos médicos higienistas
defensores da Teoria dos Miasmas14(RODRIGUES, 1997). Diante da persona de Brás Cubas,
cabe-nos a pergunta: como o corpo/morto/alma de Brás Cubas se transfigurou em cadáver de
“frias carnes”?

De acordo com o professor Dr. Francisco Carlos Félix Lana, da Escola de Enfermagem
e coordenador do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de
Minas Gerais (UFMG), em aula magna para o ano letivo de 2015 sobre o tema Determinantes
Sociais de Saúde (DSS) da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venancio -
(EPSJV/Fiocruz), nos lembrou que o conceito de miasma não foi concebido na modernidade.
Há 2.500 anos, o médico grego Hipócrates explicava o processo saúde-doença por meio do
que ele chamou de Teoria dos Miasmas, que dizia que as doenças são transmitidas pelo ar,
águas e outros locais insalubres. Segundo o professor [Francisco Lana], Hipócrates foi o
primeiro a dar uma explicação racional para as doenças e não considerá-las como um
fenômeno sobrenatural. Ele foi o primeiro a usar a palavra epidemia para diferenciar as
doenças epidêmicas, que nos visitam, das endêmicas, que têm um curso longo de duração 15
[grifos meus]

O professor Dr. Lana ainda nos apontou que os corpos estão diretamente relacionados
aos espaços nos quais os vivos interagem. Em suas palavras “o processo saúde-doença por
meio do que Hipócrates16 denominou-se em Teoria dos Miasmas, dizia que as doenças são
transmitidas pelo ar, águas e outros locais insalubres.” 17 Se a Teoria dos Miasmas, pré-

jun 2023.
13
Campo Santo [ad sanctos apud ecclesiam] - denominação aos cemitérios que receberam bênção solene de
autoridade eclesiástica. O Império do Brasil professava no catolicismo a religião oficial do Estado.
14
Sobre a reforma cemiterial da Corte e o papel decisivo da epidemia de Febre Amarela, recomendo Rodrigues
(1997).
15
Disponível em: https://www.epsjv.fiocruz.br/noticias/acontece-na-epsjv/determinacao-social-da-
saude#:~:text=H%C3%A1%202.500%20anos%2C%20o%20m%C3%A9dico,%C3%A1guas%20e%20outros
%20locais%20insalubres. Acesso em: 09 jun 2023.
16
Hipócrates nasceu em 460 a.C na ilha de Kós ,uma das ilhas gregas do Dodecaneso, localizado no leste do mar
Egeu. Considerado o Pai da Medicina científica. "Sua fama como clínico teria começado em 430-429 a.C. Nesta
época, Atenas sofria com uma peste que assolava a população. A epidemia foi derrotada depois que Hipócrates
mandou acender fogueiras pela cidade. Ele teria feito isso a partir da observação de que os artesãos, obrigados
pelo ofício a se manter perto do fogo, pareciam imunes ao contágio da doença."Disponível em:
https://grupomedcof.com.br/blog/hipocrates-pai-da-medicina/ Acesso em: 10 jun 2023.
17
Disponível em: https://www.epsjv.fiocruz.br/noticias/acontece-na-epsjv/determinacao-social-da-
saude#:~:text=H%C3%A1%202.500%20anos%2C%20o%20m%C3%A9dico,%C3%A1guas%20e%20outros
%20locais%20insalubres. Acesso em: 09 jun 2023.
25
advento Louis Pasteur e suas descobertas sobre a existência de formas de vida microbiológica,
considerava que os odores pútridos se propagavam no ar e que o corpo vivo, ao respirá-los,
contrairia doenças. Deste modo, seja no século XIX ou no século XXI, o corpo que vive em
condições com baixos níveis de DSS, é, por si, fator de risco. O Dr. Lana vai mais longe e
torna explícito para o nosso tempo histórico, ao evidenciar os trabalhos produzidos pelo Dr.
Jaime Breilh, médico epidemiologista equatoriano, cujos trabalhos têm ênfase em relacionar
História Política e Epidemiologia Social. O pensamento de Breilh é pragmático a respeito da
importância não somente na descoberta das causas das doenças epidêmicas; mas sobretudo
enquanto nós seres humanos somos responsáveis e vítimas de como nos relacionamos com o
meio ambiente (biomas) e consequentemente, os níveis de distribuição das doenças
(PEREIRA DE SOUZA et al, 2019).

Para analisar o processo de transfiguração do corpo morto de Brás Cubas ao corpo


cadavérico, é necessário pontuar alguns princípios e tradições culturais resultantes do
processo de conquista do Novo Mundo pelas monarquias ibéricas no período moderno. De
acordo com a cosmogonia católica brasileira, resultante da dominação colonial portuguesa,
era predominante enquanto mentalidade na primeira metade do século XIX, que o corpo
católico, mortal e perecível, era o invólucro da alma imortal 18. Do nascer ao morrer, tal
existência formada de corpo e alma deveria ser regida pelos preceitos da Igreja e realizar o
constante exercício da vigilância com o intuito de afastar-se dos pecados. O corpo católico
carrega consigo desde o nascimento o Pecado Original - desobediência à Deus por Adão e
Eva no Paraíso (DOCUMENTOS DO VATICANO, s.d.).

Sendo assim, os vivos adultos possuem o protagonismo para que esse novo corpo-alma
recebesse o Primeiro Sacramento - Batismo. Quanto antes fosse realizado o ritual, menos
riscos teria essa existência de ser condenada ao Inferno (CASTRO, 2007). Para Castro (2007),
durante o século XIX, em Pernambuco, se utilizava o termo “Innocente” para corpos humanos
do nascimento até por volta dos 4 meses de vida. Se o recém-nascido viesse a falecer, o
destino dessa alma seria o Limbo. O Limbo era na cosmogonia católica um lugar no pós-vida
privilegiado que carregaria consigo somente o Pecado Original cometido por Eva e Adão. Do
ponto de vista biológico o marco dos 4 meses é o período que o corpo humano começa a
desenvolver a capacidade de sustentar seu tronco e cabeça, passando a ter a habilidade de
sentar-se. A partir dessa fase, esse corpo já poderia ser considerado Pagão. O conceito de

18
Na cosmogonia católica, após a morte existem noções de condenação/absolvição dos pecados (Primeiro Juízo)
e a plena crença na promessa da ressurreição do corpo e sua alma no Juízo Final. Temos, portanto, um sistema
específico de práticas funerárias que não se encerram com a morte biológica.
26
infância, de acordo com os Regulamentos do Cemitério Público do Recife eram de óbitos de
até 7 anos de idade. Estes recebiam a denominação de Párvulo. Após essa idade, não há
distinção entre o corpo infantil ao corpo adulto.

Com a finitude desse corpo católico, a alma faria um longo percurso metafísico no pós-
morte em busca de sua salvação. Deste modo, o corpo devoto católico precisava estabelecer
relações de reciprocidades com os vivos, sobretudo fazendo parte de irmandades e confrarias
leigas, com o intuito de garantir o chamado Bem Morrer (QUINTÃO, 1997). Ter uma vida
regrada pelos Sacramentos e em constante vigilância para não cometer pecados e contar com
suas redes de sociabilidade, garantiria que esse corpo-alma não caísse em esquecimento. A
crença católica na imortalidade da alma era uma constante preocupação sobre as incertezas de
uma condenação sumária ao Inferno ou se essa alma passaria a cumprir penas no Purgatório.
Mais do que temer a morte propriamente dita, esse corpo-alma fomentava o medo do Além.
Portanto, era nesse temor que se estreitavam as relações entre os vivos. Criava-se assim, a
expectativa de que os fiéis cuidassem uns dos outros, tanto do corpo pecador como da alma
pecadora (RODRIGUES, 2005).

Segundo Rodrigues (2022), na configuração urbana do Rio de Janeiro no período da


eclosão da epidemia de Febre Amarela, o Cemitério de São Francisco de Paula, também se
configurou como a performance da classe social que a personagem Brás Cubas pertencia:
Devido a esta localização mais favorável, o Cemitério do Catumbi ocuparia, doravante, o
centro das atenções no que se refere às medidas de controle da epidemia. Sua construção se
iniciara em novembro de 1849, um pouco antes de a epidemia chegar ao Rio de Janeiro e
fez parte do projeto de expansão do espaço para sepultamento dos irmãos da Ordem
Terceira de São Francisco de Paula em virtude de as catacumbas de sua igreja serem
recorrentemente procuradas para sepultura das “pessoas mais notáveis” da cidade
(RODRIGUES, 2022, p.305-306) [grifos meus]

No artigo de Rodrigues (2022) a autora incluiu a seguinte nota de rodapé: “Na dinâmica
das associações religiosas, as ordens terceiras reuniam membros da elite social desde o
período colonial”. A este respeito, ver Martins (2009).

A Medicina Higienista no Recife do século XIX ao longo de disputas e negociações


sociais, políticas e econômicas permitiu que o discurso científico prevalecesse no cenário
epidêmico, criando pouco a pouco o afastamento do corpo vivo em relação ao corpo morto.
Ao transmutar o corpo em cadáver foi determinar que a carne fria desse corpo, cujos odores
se antes eram tolerados passaram a ser repulsivos. Afirmar que os mortos que emanam
vapores nocivos para a saúde pública, esses os odores resultantes da decomposição corpórea,
resultava em que se tornasse fundamental sua transferência para espaços afastados na
27
configuração urbana e social. O medo ao corpo cadavérico tornou-se concreto. Os ritos
funerários que antes eram longos e complexos precisaram se adaptar para essa nova realidade.
O tempo de preparação do corpo foi reduzido, os preparativos para o velório em celeridade, o
ritual de missa e encomendação da alma, o cortejo fúnebre com número de pessoas reduzido 19
em silêncio até o novo espaço destinado ao cadáver - o cemitério extramuro é a síntese morte
salubre (CASTRO, 2007).

De acordo com Silva (2014), Saxe (1970) procurou estabelecer relações entre as
práticas funerárias e quais níveis de entrelaçamento com o objetivo de diagnosticar a
complexidade da organização social em um determinado universo cultural. Para Saxe (1970):
Quando os arqueólogos cavam um conjunto de sepulturas não estão escavando somente
indivíduos, mas uma persona social coerente, não somente engajada em relacionamento
entre outra personas sociais, mas que estava de acordo com as regras sociais ditadas com
amplitude no sistema social. (SAXE, 1970, p.4, apud SILVA, 2014, p. 60) [grifos meus]

Silva (2014) percebe em Saxe (1970) que o conceito de Persona Social “ é entendida
como um conjunto de várias identidades como apropriadas para uma dada interação social”.
Para os estudos arqueológicos históricos sobre os cemitérios resultantes das políticas de saúde
pública no Brasil no Segundo Reinado, o corpo é também intangível, pois nem sempre é
possível realizar pesquisas de escavação. Contudo, toda a necrópole como as materialidades
apresentadas em cada jazigo, cada lápide ou mesmo uma cova rasa, são representações de
papéis sociais que dialogam muito mais com os vivos do que com os mortos. Por mais que o
corpo católico em vida no passado reservasse recursos para o seu ritual funerário, o morto
dependia dos vivos para que suas vontades fossem atendidas. Deste modo é pertinente pensar
que o resultado dessa interlocução no imaginário católico é a simbiose que fomenta o
benefício mútuo, tanto dos mortos como dos vivos.

As pesquisas arqueológicas nos cemitérios trazem, do ponto de vista da cultura material,


quais performances estariam relacionadas aos corpos sepultados. Temos, portanto, um sistema
específico de práticas funerárias que não se encerra com a morte biológica. Desta forma, tais
constructos simbólicos são tangíveis (mesmo o corpo sob as lápides) tanto quanto as

19
No Recife do século XIX os rituais funerários noturnos, os cortejos fúnebres para os enterros, foram proibidos
a partir da regulamentação do Cemitério Público do Bom Jesus da Redenção [Cemitério de Santo Amaro]. No
ano de 2022, em virtude do fenômeno climático que provocou altíssimo índice pluviométrico para o mês de maio
e persistiu até o mês de junho, afetando a capital, toda Zona Metropolitana, municípios vizinhos, Zona da Mata e
Agreste pernambucanos ocorreram 132 mortes. O Instituto de Medicina Legal (IML no mês de maio chegou a
receber mais de 50 corpos em um único dia de plantão para dar os encaminhamentos necessários. O Estado de
Calamidade fez com que o Cemitério de Santo Amaro tivesse seu funcionamento de 24 horas.
Disponível em: https://g1.globo.com/pe/pernambuco/noticia/2022/07/05/sobe-para-132-numero-de-mortes-
provocadas-pelas-chuvas-em-pe-obitos-sao-confirmados-no-agreste-e-mata-sul.ghtml Acesso em: 10 jun 2023.
28
representações culturais na complexidade de um determinado modo de existir. A paisagem
edificada da cidade do Recife é fruto da colonialidade portuguesa no Recife que se constituiu
ao longo de quatro séculos, desde o Período Colonial e continua a existir/resistir no espaço
urbano do século XXI. O resultado dessa interlocução é a simbiose entre os vivos e os mortos,
bem como a evidenciação dos contrastes estamentais em que esse os corpos ocupam na trama
social.

Os cemitérios oitocentistas são promissores campos de estudos para a Arqueologia.


Trata-se desde de como esses espaços foram escolhidos e de que modo transformaram a
paisagem ou foram transformados por ela ao longo do tempo. Se no século XIX eles estavam
distantes dos vivos, no século XXI, estes estão novamente próximos dos vivos em função das
pressões sociodemográficas por ocupação no território urbanos. As classes sociais mais
pobres muitas vezes não são somente apenas vizinhas de um cemitério; o próprio muro
externo do cemitério é a base de construção das suas próprias moradias. Eis o caso do
Cemitério da Várzea, Pernambuco. Esse cemitério foi inaugurado em 1868 para atender uma
das áreas de arrabaldes do Recife. No tempo presente, esse cemitério é parte integrante da
comunidade, mais que um vizinho, é o elemento simbiótico para a construção das habitações.

Enquanto as elites do século XIX ocuparam os espaços privilegiados nas alamedas


centrais do Cemitério Público do Recife e investiram da arte da marmoraria e metais,
compondo na paisagem cemiterial as representações de poder e dominância numa sociedade
de contrastes - do mausoléu em grandes dimensões ao sepultamento em cova sem direito a
uma mínima noção de identidade; a mesma elite também conseguiu encontrar soluções para
enfrentar o discurso higienista e voltar para as suas Velhas Igrejas históricas. No final da
década de 1860 a nobiliarquia pernambucana usou o princípio judaico-cristão dos ossuários
para retornar aos lugares sagrados das igrejas. Pouco a pouco as igrejas foram recebendo mais
ossuários pelo ritual de sepultamentos secundários e terciários. Foi a resposta de manter a
cosmogonia católica do repouso dos mortos em lugar santo eucarístico, o melhor lugar para
voltar a ficar perto dos vivos. Muitos desses vivos são Devotos das Almas, cujos sujeitos
históricos são de classes sociais modestas, que em sua fé rezam pelos mortos para que estes
que estão em sofrimento no Além possam purgar seus pecados. Estas almas, em gratidão,
concedem graças. Muitas vezes as graças alcançadas são cura para doenças, uma
oportunidade de trabalho ou mesmo um lugar de morada.

Em minha pesquisa de Mestrado em História (CASTRO, 2007), estudei o processo de


proibição dos enterros nas igrejas do Recife e como tais políticas públicas impactaram os os
29
costumes fúnebres; bem como na relação entre os vivos e os mortos. O estudo de caso do
Recife revelou peculiaridades nas estratégias de negociação das irmandades e confrarias com
o poder público. Os políticos pernambucanos revelaram-se bastante amedrontados, seja por
partilhar da mesma mentalidade devocional católica, como em executar a Reforma Cemiterial
de tal forma não provocasse um levante popular de proporções ainda mais sérias que o
episódio baiano em 1836 - A Cemiterada.

Foi nessa pesquisa que me deparei com o uso sistemático do ritual do sepultamento
secundário pelo uso dos ossuários nas igrejas com datações nas lápides em menos de uma
década, a contar com a data de inauguração do Cemitério Público do Recife em 1º de março
de 1851. Compreender as dinâmicas para o retorno dos mortos nas igrejas é o atual tema de
minha pesquisa de doutoramento em Arqueologia pelo Programa de Pós-Graduação em
Arqueologia da Universidade Federal de Pernambuco. Quais performances e personas sociais
estão representadas nesses ossuários das igrejas do Recife Histórico? Como foi possível o
processo desse retorno para os lugares mais sagrados na materialidade terrena católica,
apresentado em quantidade de mortos e sem intervalo de décadas até o tempo presente? Cada
igreja secular, em sua maioria com mais de três séculos de construção, são também cemitérios
arqueológicos. Por que retornar para essas Velhas Igrejas? Esta pergunta é a questão que
levanto em meu projeto de pesquisa. Como as materialidades arqueológicas apresentadas nos
ossuários podem responder quais alegorias os mortos realizam o diálogo com o mundo dos
vivos?

Também cabe-nos questionar se esse retorno dos corpos mortos para as igrejas foi
específico do catolicismo pernambucano ou se tal estratégia também foi pensada em outras
cidades históricas brasileiras. Quais foram suas especificidades no âmbito de uma arqueologia
funerária? Como foi possível tal retorno? Deixo aqui essa provocação acadêmica e espero
instigar novos projetos tratem do tema e ofereçam mais sutilezas da tão complexa relação de
proximidade e reciprocidade entre os vivos e os mortos; pois é na hora da morte que esse
corpo-alma em partilha devocional os contrastes sociais se igualam. Enquanto os ricos
precisam dos pobres do mesmo modo que em vida também os exploravam, os pobres
continuam na fé, mantendo os laços da trama da história social da cultura.

Arqueologia Histórica no Seridó Potiguar: o processo de interiorização a partir do corpo


sertanejo20

20
Este tema do capítulo foi escrito por Igor Gadelha Soares (bolsista CAPES), em 2023.
30
Remontar o contexto histórico norte-riograndense é possível, tendo em vista a
quantidade de trabalhos produzidos a respeito. A interiorização do Rio Grande do Norte
completou-se entre os séculos XVIII e XIX, motivada em grande parte por atividades
econômicas, tais como a agricultura e a pecuária. Nesse contexto, passaram a ser construídas
casas de fazendas no Seridó Potiguar, que eram habitadas por seus proprietários, agregados,
trabalhadores e escravizados, possivelmente. Nas áreas dessas fazendas eram desenvolvidas
as crias de gado, atividades agrícolas e de manufatura. A partir disto, podemos compreender
que a região habitada passou a existir e a se desenvolver: nascem povoados e cidades através
de concentrações dessas populações advindas do processo de expansão, no qual o comércio
tornou-se um dos principais fatores de sociabilidade entre os sertanejos. Portanto, através da
materialidade produzida e vivenciada por essas populações, podemos entender um pouco mais
sobre as vivências de um passado não tão distante.
Apesar dos avanços nos estudos que compreendem o campo da Arqueologia, há uma
dificuldade de resgate na abordagem pelo pouco que se tem produzido, pois, na Arqueologia
Histórica Potiguar os primeiros trabalhos começam a ser desenvolvidos a partir dos anos
1990. Sendo assim, a quantidade de trabalhos ainda não é expressiva. Podemos dizer que a
maioria das pesquisas acadêmicas adotou uma maior circunscrição na região costeira ou
litorânea. O espaço sertanejo e a ocupação histórica da região semiárida tem sido pouco
abordados, isso, em meio a essa pequena quantidade de trabalhos ligados ao desenvolvimento
da Arqueologia Histórica nas terras potiguares.
Somente no final da década de 2010 e início dos anos 2020 é que surgiram trabalhos
cujo enfoque principal foram os sítios e evidências arqueológicas ligadas a ocupação histórica
no sertão do Rio Grande do Norte. Nesse sentido, podemos citar as dissertações de Oliveira
(2021), intitulada Escravidão e Terras de criar gado em um lugar denominado sertão: uma
arqueologia das moradas de casas e miudezas cotidianas do Seridó Potiguar, séculos XVIII e
XIX; e de Souza (2021), cuja dissertação se chama Sítio Culumins: um olhar sobre o sertão
do Seridó, séculos XVIII e XIX. Além desses trabalhos podemos ainda nos referir ao artigo
produzido por Silva, Souza e Batista (2021), em cujo texto são abordados os dados ligados ao
desenvolvimento de pesquisas arqueológicas desenvolvidas em fazendas instituídas no Seridó
Potiguar, entre os séculos XVIII e XIX.
Os dados que vêm sendo apresentados para essa região, caracteriza e indica diversas
possibilidades de pesquisa e de temáticas associadas, desde os elementos ligados às estruturas
construtivas até aos bens arqueológicos móveis, como cerâmicas utilitárias, faianças e
31
evidências arqueofaunísticas. Para além disso, há dados que vão no mesmo sentido do que o
observado em outras áreas sertanejas no Nordeste do Brasil, em relação à produção e
circulação de bens locais.
Esses espaços de moradias eram construídos nos locais mais altos do sítio, sempre
ficavam próximos de rios ou riachos, lugares que poderiam viabilizar a construção de açudes
para que as necessidades da fazenda fossem supridas. As casas eram construídas com
alicerces de pedras, paredes em que a espessura variava entre 30 a 60 centímetros, tijolos
medindo aproximadamente 20 centímetros, a argamassa utilizada era o barro, areia ou cal. Os
pisos eram compostos por placas de barro, alpendre feito de pedras, os vãos das portas e
janelas eram retos ou em formas de arcos, e vale destacar no caso das casas que também nota-
se a presença de sótãos, nesse caso, o piso é composto com madeira fixados por cravos e
pregos, sustentados por longas e firmes colunas de madeira, geralmente as portas da frente da
residência ficavam posicionadas para setor onde fosse possível visualizar as demais
construções, como: currais, casa de farinha, armazém, fábrica de rapadura. Essa visão era
estratégica para que o fazendeiro observasse tudo que estava acontecendo na sua propriedade
e demonstrar controle (DINIZ, 2008).

Na presente proposta de dissertação, tomaremos como lócus para a compreensão da


ocupação do sertão seridoense em períodos históricos, o sítio arqueológico Besta Braba 02,
localizado no município de São Fernando/RN. Este sítio foi identificado e abordado no
âmbito de projetos de pesquisa ligados ao licenciamento da Barragem de Oiticica, um
reservatório hídrico que está em construção na região Seridó do Rio Grande do Norte. O sítio
arqueológico Besta Braba 02 é de natureza multicomponencial e apresenta vestígios
arqueológicos, tais como: faianças, cerâmicas utilitárias, arqueofauna, pederneiras, vidros e
metais. O sítio está a cerca de 100 metros do atual curso do rio Seridó, assentado em uma
matriz areno-argilosa, em meio a qual houve a identificação de estruturas construtivas em
positivo e onde foram coletadas, entre bens arqueológicos móveis em superfície e em
subsuperfície, um total de 4.766 peças.
Na abordagem da Arqueologia Histórica, através da cultura material presente no sítio e
cruzamentos com documentações disponíveis, podemos trazer diversas discussões de
consumo, economia, alimentação, dentre outras. Outro viés que podemos abordar é a questão
do corpo do sertanejo, neste caso, não voltado ao biológico ou não somente ao físico, como
comumente é presente no imaginário popular/geral. Mas, segundo David Le Breton (1953), na
obra A Sociologia do Corpo, o corpo pode ser visto como um local de identidades, uma

32
construção social do indivíduo. No referido projeto, podemos questionar sobre quem são essas
populações sertanejas, de onde vieram, o que produziam e para quem. Essas questões podem
ser solucionadas, em parte, através da cultura material, documentações e História Oral.
Por exemplo, o corpo sertanejo é a expressão material e sociocultural do povo
seridoense, seja por meio do sotaque, gesticulação, modos de produção de queijos e outros
alimentos, as expressões artísticas, entre outras. Fortalecendo o conjunto identitário do corpo
pertencente ao lugar, pouco mencionado no cotidiano, assim como, nos trabalhos
arqueológicos contemporâneos, fazendo-se essencial a busca pelo resgate das raízes
arqueológicas do povo sertanejo, como também, das suas contribuições para o incremento da
Arqueologia Histórica Potiguar.

O corpo adoecido: estudos de remanescentes resgatados no contexto de uma fortificação


pernambucana sob o olhar da arqueologia da doença21.

As concepções sobre o corpo humano têm sido ressignificadas e modificadas em todos


os tempos e sociedades, assim como o seu lugar na coletividade. Podendo, portanto, ser
pensado em sua complexidade, de acordo com Viana (2015), Mauss (2018) e Breton (2007),
por sua essência biológica, contexto histórico, sociopolítico e cultural em que esteja inserido.
Assim, o corpo biológico é moldado a partir de fatores socioambientais (alimentação,
trabalho, hábitos), genético (probabilidades de expressão ou supressão gênica). As doenças,
entre outros eventos que o acometem no decorrer de sua existência, muitas vezes podem
traduzir-se em sinais que, se analisados corretamente, funcionam como biomarcadores dos
processos envolvidos e resultantes da sua história natural. A paleopatologia, emergiu quando
os cientistas, transdisciplinarmente associaram o conhecimento médico às análises geológicas
e arqueológicas.
Esse corpo adoecido é lido, pelos profissionais da saúde, a partir de um estudo
semiológico. As informações são colhidas por uma anamnese, são realizados exames clínicos,
laboratoriais, imagiológicos, entre outros. A evolução do caso e o histórico médico do
paciente ficam arquivados em prontuários. São considerados aspectos da história familiar e os
conhecimentos das biociências para se chegar a uma proposição ou certeza diagnóstica. O
conhecimento antecipado da história natural da doença conduz a um prognóstico e a uma ou
mais modalidades terapêuticas.

21
Texto de autoria do doutorando de arqueologia, André Laurentino Silva, do Programa de Pós-Graduação em
Arqueologia da UFPE.
33
O exercício e as pesquisas nas ciências biomédicas exigem dedicação, prudência e
perícia no trato com um paciente/cliente, e as tomadas de decisões erradas ou um erro médico
pode agravar o quadro, produzir sequelas ou até causar a morte do cliente.
O mesmo corpo adoecido pode ser lido por olhares de outras ciências. Não seria
diferente com a arqueologia. Entretanto, assim como nas biociências e nas ciências
biomédicas, os seus modelos diagnósticos envolvem conhecimentos semiotécnicos próprios,
exigindo dos que se propõem enveredar por esta área, um aprofundamento em conhecimentos
específicos (MAYS, 2018; LAWLER, 2016).
Sob o olhar da Arqueologia da Doença, afirma Larsen (2015), o arqueólogo visa
construir narrativas sobre as doenças, os comportamentos humanos, estilos de vida e origens
dos grupos pretéritos. Ela possibilita, de acordo com Brickley, Ives e Mays (2020), uma
melhor compreensão, o estabelecimento de redes e ao nível de acometimento que as doenças
afetaram os seres humanos individual ou coletivamente, no passado. Assim, é possível inferir
sobre as doenças, a qualidade da vida humana e seu efeito no cotidiano dos nossos
antepassados, ressaltando o efeito anacrônico das interpretações e a individualidade de cada
pesquisador.
Por isso, cabe ao arqueólogo que lida com os remanescentes corpóreos, lembrar que
tomadas de decisões inadequadas, modelos de estudos insuficientes, pouco conhecimento das
ferramentas aplicadas, imperícia, imprudência e negligência podem destruir todo o seu
trabalho, descredibilizá-lo, induzirem à elaboração de inferências e construção de narrativas
inverossímeis.
O estudo do corpo sobre o olhar da arqueologia da doença possibilita o uso de
inúmeras ferramentas, inter-relacionadas às possibilidades apresentadas pelos remanescentes.
Desde os métodos mais tradicionais, osteoscópicos e osteométricos, passando por recursos
utilizados na prática médica, como a imaginologia, a microscopia e a biologia molecular
(ROBERTS; MANCHESTER, 2010; ORTNER; BUIKSTRA, 2019; BRICKLEY; IVES;
MAYS, 2020; CHHEM; BROTHWELL, 2007; MECO, 2021; BROWN; BROWN, 2011).
A existência humana psicossomática, evidencia-se na saúde ou na doença. Por isso, a
análise de remanescentes isolados ou em grupos, devem ser contextualizadas com aspectos
temporais, ambientais, sociais, históricos e culturais, visto que os mesmos nele se inserem
(SILVA, 2018).
Assim, os remanescentes ósseos de que trata este estudo foram resgatados por uma
campanha arqueológica realizada em 2017, coordenada pelo arqueólogo José Aylton Coelho
de Mello e sua equipe, por ocasião do processo de revitalização do Forte Santo Inácio de
34
Loyola (SILVA, 2018), município de Tamandaré, situado na Microrregião da Mata
Meridional Pernambucana (IBGE — INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E
ESTATÍSTICA, 2023).
Também conhecida como Forte de Tamandaré, a edificação original remonta ao
século XVII, do período da ocupação da Companhia das Índias Ocidentais (WIC) no
Nordeste, sendo edificado pelos portugueses em 1645. É tombado, pelo Governo do Estado de
Pernambuco, desde 1985, conforme a Lei Estadual n.º 7970/1979. Decreto n.º 6239/1980
(SILVA, 2018)
O Forte Tamandaré é citado em diversos episódios e movimentos da história
pernambucana, como Guerra dos Mascates (1710–11), a Revolução Pernambucana (1817), a
Confederação do Equador (1824), a Guerra dos Cabanos (1832–35) e a Segunda Guerra
Mundial (1939 a 1945). Em suas imediações foi construído um lazareto, utilizado para
quarentena aos recém-chegados do porto próximo e, como local de isolamento para pessoas
acometidas por doenças infectocontagiosas (SILVA, 2022).
Os dois esqueletos humanos, que norteiam estes trabalhos, foram encontrados
inumados, na área externa do terrapleno lateral direito nordeste da fortificação, em uma
deposição simples ― ou primária ― dupla, encontrando-se um deles, a quem denominamos
FSIL — I1, posicionado sob o outro, o FSIL — I2. Eles foram entregues para curadoria e
análises bioarqueológicas, ao Laboratório de Arqueologia Biológica e Forense — LABIFOR,
ambos com sinais de processos de degradação em campo. Para os estudos, foram consideradas
apenas estruturas anatômicas, devido à escassez de materiais contextuais, e, dentre elas, as
que propiciavam condições para as análises tradicionais ectoscópicas e osteométricas cujo
aprofundamento resultou em nosso trabalho de conclusão de curso (SILVA, 2018) e
dissertação de mestrado (SILVA, 2022) pelo Programa de Pós-Graduação em Arqueologia ―
UFPE.
Os atributos biológicos individualizantes de um esqueleto são para a arqueologia,
conforme White, Black e Folkens (2011), os componentes basilares do trabalho
bioarqueológico. Portanto, sexo anatômico, idade à morte, estatura ou ancestralidade
geográfica dependem de diversos fatores a serem considerados para cada método analítico e
devem atuar como estimativas probabilísticas e não como fatos, seja no estudo das práticas
mortuárias, nas pesquisas sobre doenças e/ou nas análises paleodemográficas.
Desta forma, as análises para as estimativas de sexo anatômico, ressaltando conforme
as inspeções visuais de cinco observadores distintos, em momentos diferentes, considerando-
se os dados obtidos por ocasião das análises para o trabalho de conclusão de curso e
35
extrapolando-os em relação a outros dois obtidos para as análises do mestrado. Baseados nos
descritores propostos por Buikstra e Ubelaker (1994 apud WHITE; FOLKENS, 2005, p. 390),
Krogman, Iscan e Steyn (2012), Mays (2002) e Serrula (2013, p. p. 62, Tab. 2), ambos os
indivíduos FSIL — I1 e I2 foram classificados como pertencentes ao sexo anatômico
masculino.
Em relação à estimativa da idade à morte, foi utilizado o método de inspeção visual
das suturas cranianas, de pelo método de Meindl e Lovejoy (1985). Os dados foram obtidos
em trios de observadores, sendo contrastados com o que havia sido obtido no TCC. Desta
forma, o FSIL — I1 teria uma idade à morte estimada de aproximadamente 45 anos, enquanto
o FSIL — I2, situava-se entre 53 e 56 anos.
Para a projeção da estatura dos indivíduos foram considerados ossos longos
capacitados, seus comprimentos máximos longitudinais e as respectivas médias, considerada a
tabela de Trotter e Gleser (1977) cujos dados são associados ao sexo anatômico e à afinidade
populacional. Assim, o FSIL — I1 poderia ter, em vida uma altura situada entre 1,66 m e
1,67 m, enquanto o FSIL — I2 teria em média, 1,65 m.
A pesquisa de ancestralidade foi melhor aprofundada e discutida na dissertação. Para
as inspeções morfoscópicas e craniométricas foram considerados os métodos apresentados em
Bass (2022) Byers (2016), sendo também acatados os dados obtidos pela tomografia
computadorizada, TC3D— considerados os descritores marcados — os quais foram
analisados pelo programa Ancestrees.
Para a proposição das regiões populacionais a partir das quais o programa pudesse
cruzar dados, foram consideradas as populações afins apresentadas nos resultados das análises
morfoscópicas e morfométricas preliminares. Assim, FSIL — I1 e FSIL — I2 apresentaram
uma provável ancestralidade africana.
Com esses dados em mãos, o conhecimento da semiotécnica clínica e arqueológica,
bem como a história natural das doenças, a pesquisa seguiu os passos indicados pelos
especialistas.
Em relação às regiões do esqueleto indicadas para análise de distribuição das lesões,
por Ortner (2003), Ortner e Buikstra (2019), foram considerados, do esqueleto axial, o
neurocrânio, o viscerocrânio com a mandíbula, sendo observadas remodelações ósseas. A
maxila, bastante porosa, na sua face palatina com perda post mortem dos dentes 1.1; 1.2; 1.7;
2.2 e 2.5 e antemortem do 2.2 e 2.7. Ausência da espinha nasal e remodelações interessantes
na abertura nasal anterior, podendo ser consistente com sindrome nasomaxilar / facies leprosa

36
moderadamente expressa, talvez por não se tratar de uma forma mais agressiva do mal de
Hansen.
Ainda sobre as indicações de Ortner e Buikstra (2019), Ortner (2003) referentes a
distribuição esquelética das lesões do esqueleto axial — o crânio e a mandíbula. Do esqueleto
apendicular foram observadas as extremidades dos membros superiores e a tíbia. Foram
observadas remodelações em muitos elementos ósseos.
O crânio de FSIL-I2 encontrava-se edentado, com generalizada perda dentária
antemortem, o que pode indicar aspectos relacionados aos hábitos nutricionais, higienização
bucal, doenças carenciais, infeções periodontais e/ou sistêmicas, durante a vida desta pessoa.
O palato duro apresentava-se bastante poroso com um interessante espessamento em seu
contorno, corroborando com a proposição de disfunções metabólicas e/ou carenciais
(ORTNER, 2003; ROBERTS; MANCHESTER, 2010; BRICKLEY; IVES; MAYS, 2020).
O esqueleto, que se encontrava em nossa bancada de análise no LABIFOR, não
apresentava as extremidades dos membros inferiores. A tíbia esquerda apresentou sinais de
alteração periosteais, talvez do osso compacto — o que sugeriria análise histomorfométrica
posterior — em seus terços médio e distal, podendo ser compatível com algum processo
infeccioso durante a vida ou podendo estar relacionada à orientação e distribuição irregulares
das fibras colágenas da matriz óssea, ou a um processo de hipervascularização da superfície
tecidual (ORTNER, 2003).
Algumas falanges proximais dos quirodáctilos apresentavam forames expandidos,
bastante frequente em estudos arqueológicos com portadores do Mal de Hansen em sua forma
Wirchoviana (ROBERTS; MANCHESTER, 2010), e porosidade na epífise distal do primeiro
metacarpal esquerdo, podendo estar associado tanto à primeira hipótese, quanto às doenças
articulares.
A necessidade de musealização do material, alguns problemas técnicos no seu
manuseio e o alto custo dificultavam pesquisas biomoleculares que poderiam auxiliar numa
maior compreensão do quadro clínico-arqueológico.

Considerações finais

As reflexões apresentadas neste capítulo indicam as diversidades discursivas de


pesquisa arqueológica centrada no corpo na Arqueologia do Nordeste. Os vestígios de corpos
psicossomáticos na arqueologia aqui, reflete-se enquanto uma categoria de “objeto de cultura
material”.
37
Os corpos, os dentes modificados e as pulseiras do sítio Taperaguá-AL e do Engenho
Jaguaribe-PE, estudados por James Ferreira, foram considerados partes onde toda a energia
foi depositada por meio de rituais africanos, por meio de objetos, materiais biológicos e não
biológicos, as plantas e minerais, utilizados como poder nos objetos (ides) em ferro, que
desenvolveram a força no corpo de quem prepara o ritual e de quem está portando tais
artefatos. Concebe um processo de “interiorização e mobilização de elementos simbólicos ou
espirituais, individualmente ou coletivamente, que transformam o ser humano num verdadeiro
altar vivo no qual pode ser invocada a presença da divindade e dos antepassados”.
Para Juliane Guedes, etnias indígenas (povos originários) que vivem em regiões
próximas aos sítios arqueológicos. Os Kapinawá convivem ainda hoje com tais sítios, lugares
sagrados, com olhares diferentes em relação aos olhares de profissionais de arqueologia. Tais
profissionais deveriam conciliar suas pesquisas científicas, importantes para evidenciar
populações que viveram no passado, considerando sistematicamente em seus projetos e
intervenções de campo as relações com os povos indígenas que existem nos dias
atuais. Torna-se importante uma escuta metódica das populações que reivindicam a cultura
material escavada, coletada e analisada por profissionais da Arqueologia, através da História
Oral. Sobre essa relação, apresentou trechos de entrevistas, como a que foi feita com Dona
Roseana Prachenawá, líder da aldeia Ponta da Várzea, no dia 18 de Agosto de 2019, a partir
de visita técnica ao Sítio Arqueológico Alcobaça, Buíque, Pernambuco. Aqui importa o corpo
psicossomático dos representantes vivos dos povos originários da região de Buíque, seus
discursos e reivindicações sobre seus mortos, os remanescentes ósseos humanos dos antigos
habitantes-antepassados da região.

A presença de cachimbos em sítios arqueológicos, estudados por Severino Ribeiro, na


capitania de Pernambuco, são fortes indicadores do uso de cachimbos por determinado
seguimento social (holandês, luso-brasileiros e dos povos originários), revelando a relação de
identidades sociais com sua preferência pelo uso do artefato de fumar pelos corpos coloniais.
Cachimbos, aqui, são artefatos do corpo, para o corpo, suas extensões, vinculadas à
“identidade étnica, saúde, simbolismos, acordos, status, sexualidade, entre outras
performances socioculturais do corpo psicossomático”.
Itelmar Oliveira, em sua pesquisa de mestrado sobre as pinturas rupestres do Piauí,
alerta sobre a necessidade de questionamento sobre pesquisas com narrativas a respeito do
universo pré-colonial, baseadas em parâmetros de comportamento alinhados com a lógica
colonial, com os registros rupestres apresentados como uma “crônica” de uma realidade

38
ancestral em analogia com a modernidade colonial. Os estudos atuais sobre gênero e
sexualidade, estabelecem parâmetros críticos consistentes e problematizações capazes de
corrigir os pressupostos de identidades normativas interpretadas sobre os registros rupestres,
considerando as pesquisas construídas a partir de uma leitura exclusivamente binária, onde “
gênero equivale ao sexo, e o sexo é representado por meio de signos interpretados pela ordem
colonial”.
Sob uma perspectiva da arqueologia histórica cemiterial, associada à arqueologia do
corpo, Vanessa Sial, concorda que durante o século XIX, em relação ao corpo humano, na
persona do morto, o saber médico científico higienista introduziu na sociedade brasileira o
conceito de cadáver. Antes, o corpo morto estava dentro de rede de relações humanas, sendo
tocado, ungido, recebendo maior tempo nos rituais funerários. Com o surgimento do corpo-
cadáver, passou a imperar o medo: a decomposição cadavérica, para a teoria dos miasmas,
passou a oferecer risco para a “eclosão e contaminação do ar provocando doenças epidêmicas
letais”. A performance católica no Recife imperial e republicano relativa aos corpos mortos
passou a considerar técnicas de combate ao corpo decomposto de forma a modificar a
geografia da morte em Pernambuco.
O corpo sertanejo, um dos objetos da dissertação de Igor Gadelha é analisado sob a
perspectiva de uma expressão material e sociocultural do povo seridoense. Seriam
importantes os registros do “sotaque, gesticulação, modos de produção de queijos e outros
alimentos, as expressões artísticas, entre outras”. O conjunto identitário do corpo, um corpo
Potiguar, pouco visível na vida cotidiana, assim como nas pesquisas arqueológicas
contemporâneas, necessita de um resgate das “raízes arqueológicas do povo sertanejo, como
também, das suas contribuições para o incremento da Arqueologia Histórica Potiguar”.
Finalmente, para André Laurentino, as concepções sobre o corpo humano e seu lugar
social são constantemente ressignificadas e modificadas em todos os tempos e sociedades.
Ressaltou a importância da abordagem multicomposta, considerando as prerrogativas sociais
de Viana (2015), Mauss (2018) e Breton (2007), incluindo a sua essência biológica, os
contextos histórico, sociopolítico e cultural. O corpo biológico seria moldado a partir de
fatores socioambientais, como alimentação, trabalho, hábitos; e genéticos, como as
probabilidades de expressão ou supressão gênica. Entre os eventos que acometem os corpos
humanos durante as suas existências estão as doenças, deixando sinais, estigmas que, se
analisados corretamente, constituem biomarcadores dos processos envolvidos e resultantes da
sua história natural, sua biohistória. A própria paleopatologia surgiria quando os cientistas,

39
transdisciplinarmente, associaram o conhecimento anatomofisiológico às análises geológicas
e arqueológicas.
O estudo do corpo na arqueologia do Nordeste encontra-se em estágio inicial,
buscando nichos dentro de pesquisas com problemáticas ambientais, metodológicas, ou
pseudoproblemas, com hipóteses ad hoc que ainda expressam a dissociação entre a teoria
arqueológica interpretativa hegemônica da cultura material e a teoria tácita da
osteoarqueologia. A conexão é possível, mas existem alguns obstáculos: o foco ou a pesquisa
básica ou aplicada, centrada no problema do corpo físico, do corpo representado na cultura
material, nas performances sociais do corpo (técnicas corporais) e nos artefatos do e para o
corpo, como os adornos, vestimentas, habitações, embarcações e armas, por exemplo, ainda
aguarda resultados e engajamentos mais satisfatórios por parte de profissionais de
arqueologia; a pluridisciplinaridade representa um risco, considerando a necessidade do uso
de resultados de ciências afins para se estudar o corpo, em especial as prerrogativas
conceituais da própria arqueologia, da sociologia do corpo, antropologia do corpo e história
do corpo; a inobservância da possibilidade de se considerar o corpo como similar ao objeto de
cultura material durante a pesquisa arqueológica.

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