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Parasitoses tropicais

– Malária –
A malária é a doença parasitária com maior prevalência mundial. A mortalidade anual é de 1 a
2%, e quem morre são as crianças com menos de 5 anos, as grávidas, e os indivíduos não semi-
imunes. Os indivíduos que vivem e crescem em áreas endémicas têm semi-imunidade (ou seja,
as reativações são menos sintomáticas). Esta imunidade exige viver num país endémico
durante 3-6 anos e passa ao fim de 1 ano fora desse país.

Também se chama paludismo.

Pode ser provocada por Plasmodium falciparum, vivax, ovale, malariae. Os mais frequentes
são o P. falciparum e vivax.

África  P. falciparum/P. ovale/malariae

América/sul da Ásia  P. vivax

Áreas endémicas mais referidas no nosso pais - África, África subsariana, São Tomé, Guiné, Moçambique (mais africa
subsariana) Outras: América do sul, central, asia

A transmissão é pela picada de mosquito Anopheles, sendo a fêmea quem infeta, e tendo
hábitos noturnos. O mosquito fica infetado quando pica outro ser humano com malária.

O parasita tem tropismo para o hepatócito, e faz divisão binária até ao estado de merozoíto.
Neste estado, já pode infetar GV circulantes. Assim, tem uma fase hepatocitária e outra fase
eritrocitária (hemólise).

Os indivíduos com défice do marcador “Duffy” e anemia falciforme têm maior resistência à
infeção por malária.

Glicoproteina duffy: receptor para o segundo estágio de invasão dos eritrócitos por P. Vivax.

 Espécies

A espécie mais agressiva é o Plasmodium falciparum, porque replica mais rápido, dá origem a
parasitémias maiores, induz alterações na membrana dos GV (que ficam com maior
adesividade, formando rosetas e induzindo trombos na microcirculação, o que vai causar
défices renais, cerebrais e pulmonares), e infecta tanto GV jovens como maduros. Além disto
tem elevada resistência aos fármacos.

As espécies vivax e ovale não causam malária grave, infectam apenas GV jovens e dão origem
a parasitémias menores. No entanto, podem causar recidivas (se o tratamento não for o
adequado), pois ficam latentes no hepatócito sob a forma de hipnozoítos.

A espécie malariae causa uma infeção assintomática, infecta apenas os GV maduros (com
funções menos importantes), e persiste por algumas décadas. A infeção por esta espécie pode
estar associada a algumas glomerulonefrites na infância.
NOTA: a parasitémia é grave se houver mais de 3-5% de GV parasitados circulantes

Portugal foi área endémica de Malária até ao início do século XX, principalmente ao nível das
bacias hidrográficas do Sado, Mondego e Guadiana. As espécies mais prevalentes eram a vivax,
ovale e malariae. Assim, a primeira causava a febre terçã benigna (com picos febris a cada 48
horas); a terceira causava a febre quartã; ainda, o P. falciparum causava a febre terçã maligna.

Actualmente, não há na Europa casos de Malária (à exceção da Sicília e regiões do Sul da


Grécia).

 Clínica

A clínica inicial é de arrepios violentos inicialmente, seguidos de febre elevada (39-40ºC),


seguida da fase de defervescência, com calor intenso, sudorese profusa e vasodilatação com
rubor cutâneo. Às vezes o desencadeante para a sintomatologia é a diminuição da
temperatura. Muitas vezes a fase inicial da sintomatologia confunde-se com uma sépsis
bacteriana. Também há cefaleias intensas, mialgias generalizadas, vómitos, convulsões febris,
e pode haver por vezes nas fases iniciais dejeções diarreicas (portanto muitas vezes faz-se o
DD com gastroenterite ou diarreia do viajante).

Quando há casos em pequeno número (como é o caso da malária dos aeroportos), têm o
nome de “anedóticos”.

A principal causa de morte nas crianças é a malária cerebral, que induz alterações do estado de
consciência, desde convulsões até ao coma, acompanhadas de EEG que mostra encefalopatia
difusa. É um diagnóstico de exclusão, não sendo acompanhado de outras alterações ao exame
físico ou laboratorial. No seu tratamento, está contra-indicada a corticoterapia (pode-se
confundir com meningite…)

 Bioquímica

Há trombocitopenia; os leucócitos podem estar N ou ligeiramente aumentados;

A PCR e a LDH estão ligeiramente aumentadas; a BRB aumenta progressivamente; Provas de


função hepática com alterações mínimas (transaminases)

A anemia pode só surgir ao 3º dia da doença (porque a desidratação e os vómitos mascaram a


diminuição dos GV); a função renal está preservada.

 Diagnóstico

Em termos clínicos, é muito importante a história epidemiológica (exposição/viagem recente-


semanas ou meses, não mais de um ano).
O diagnóstico faz-se por exame parasitológico do sangue periférico: ou através de um
esfregaço de sangue (que permite identificar a espécie), ou através de análise de gota espessa.
Pode-se também fazer um teste rápido com tira-teste, na urgência, que identifica todas as
espécies e dá os resultados em minutos. Prox. passo – quantificar parasitémia.

Há também técnicas de biologia molecular e testes serológicos (que não se podem usar para
diagnóstico na fase aguda, só servem para estudos epidemiológicos).

A coloração do esfregaço de sangue é com Giemsa, e dá-nos informação sobre a morfologia do


GV, parasita e gâmetas, assim como identifica a espécie. No entanto, o esfregaço não dá para
ver muitos GV por campo, logo não é bom para parasitémias baixas. Nestes casos, deve ser
associado a um teste com gota espessa.

O teste da gota espessa tem maior sensibilidade do que o esfregaço, mas não identifica a
espécie… É importante sempre identificar a espécie para o tratamento (falciparum tem muitas
resistências, principalmente à cloroquina; se for ovale/vivax é necessário após tratamento
fazer esterilização e detetar hipnozoítos)

GOTA ESPESSA: pretende.se espalhar a goticula o max possovel p haver dispersao da luz mas tb haver mt quantidd de
gv por campo. Quando identificamos parasita na gota espessa temos de ter mais cuidado na gota fina. / Depois
diferentes tipos de corantes. Os da memb espessa removem o interior do citoplasma dos gv. A coloracao do esfregaco
fino cora todo o eritrocito e o proprio parasite.

NOTA: alguns dos parasitas que não se dividem, transformam-se em gâmetas


masculino e feminino; quando o indivíduo é picado, pode formar novo ovo
larvaetc.

 Tratamento

Depende da espécie!

O P. falciparum só é sensível à cloroquina na América Central e Médio Oriente.

Se forma ligeira (ovale/vivax/malariae):

 Cloroquina durante 3 dias – no 1º dia 4 comprimidos

12 horas depois mais 2 comprimidos

24 horas depois mais 2 comprimidos

24 horas depois mais 2 comprimidos

A cloroquina elimina os parasitas em circulação, mas não as formas


intrahepatocitárias, logo depois desta medicação acabar tem de ser feita:

 Primaquina durante 14 dias (tem ação intrahepatocitária)


ATENÇÃO porque está CI quando há défice G6PD… Neste caso tem de ser feito no final
da cloroquina um tratamento de consolidação.

Se formas graves (falciparum):

Se não tem critérios de gravidade, o tratamento é feito em ambulatório, num só dia,


com: mefloquina, malarone (associação de proguanil + atorvaquona), hemefantrina +
artemisina ou halofantrina.

CRITÉRIOS DE GRAVIDADE:

- malária cerebral (DD com meningite/ sépsis por Salmonella)

- IRA

- edema agudo pulmão

- acidose metabólica

- trombocitopenia grave (<60000/mm3)

- anemia (Hb<= 7,5 g/dL)

- parasitémias graves

- hipoglicémia (<60 mg/dL) o pp estado de malária é hipoglicemiante!

- hipotensão

- vómitos incoercíveis

- icterícia franca

- diarreias incoercíveis

Basta haver um destes critérios para o doente ser internado e o tratamento ser
hospitalar ev nos primeiros dias com:

 quinino endovenoso 10 mg/kg de 8-8 horas (até máx de 600 mg), nas
primeiras horas, e depois quando possível oral (quando pararem os vómitos, e
logo for possível esta via)/ 7-10 dias

OU

 associação de quinino endovenoso + doxiciclina (é antipalúdico para


algumas espécies e elimina as formas eritrocitárias)

OU
 derivados da artemisina (artemeter, artesunato, arteeter) + mefloquina/
doxiciclina

Como saber se está a haver resposta à terapêutica? Às 72 horas a parasitémia deve ser
negativa!

 Efeitos secundários:

O quinino provoca chinchonismo, principalmente se for administrado por via endovenosa. Este
quadro é caracterizado por vertigens, surdez, náusea, hipotensão, …

Provoca também perturbações cardiovasculares e hipoglicémia, logo é conveniente associar


uma via com soro glicosado.

(A quinidina- derivado do quinino - tem efeito antiarrítmico)

 Profilaxia

A profilaxia da malária só se realiza se se prevêem estadias inferiores a dois anos em áreas


endémicas, porque se considera que a relação risco-benefício não é favorável.

É uma quimioprofilaxia, que pode ser feita com cloroquina, mefloquina, doxiciclina, ou
atorvaquona + proguanil.

NOTA: avaliar se há défice da G6PD, porque confere resistência a alguns antipalúdicos,


como por ex. a primaquina…

 CLOROQUINA:

2 comprimidos por semana: 2 semanas antes de partir, durante a estadia, e 4 semanas


depois.

Se houver resistências à cloroquina:

 MEFLOQUINA:

1 comprimido por semana, sempre no mesmo dia da semana: 2 sem antes, durante
estadia e 4 sem depois.

Não ingerir bebidas alcoólicas depois de jantar. Esta medicação pode ser dada a
grávidas, mas no 1º T é mais prudente dar proguanil + cloroquina.

 MALARONE:

Pode-se começar na véspera/dia da partida, um comprimido por dia: manter durante a


estadia e 6 dias depois. É bom para estadias curtas, mas é muito mais caro e tem mais
reações secundárias (tonturas, falta de memória, perda de concentração)… É também
CI na epilepsia, submetidos a neurocirurgia e profissionais que precisem de máxima
atenção para a sua profissão.

NOTA: na Ásia há resistências à mefloquina e malarone, logo deve ser dada doxiciclina
100 mg/dia; esta medicação não deve ser dada, no entanto, a grávidas ou crianças, e
causa fotossensibilidade entre outras coisas.

 Prevenção

Usar inseticidas, evitar zonas de acumulação de águas paradas, vestuário coberto/não muito
leve, usar repelentes de insectos com permetrina (ex: TABARD®), redes de mosquiteiros, etc.

As quimiprofilaxias nunca são a 100%, portanto devem ser utilizados sempre associados os
cuidados de prevenção.

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