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Trata-se da análise dos aspectos relacionados à avaliação pedagógica do parecer de

reprovação e do recurso de obra literária reprovada, após etapa de avaliação pedagógica,


no Edital 01/022 - CGPLI - PNLD 2024-2027.
A obra literária “O pequeno Príncipe em cordel foi reprovada na etapa de avaliação
pedagógica pelo não atendimento dos seguintes critérios eliminatórios comuns,
conforme Edital 01/022 - CGPLI - PNLD 2024-2027:
A análise geral da ficha de avaliação e do parecer demonstram que os argumentos para
o não atendimento dos itens eliminatórios resultaram na reprovação da obra.
De acordo com a análise descrita no decorrer deste instrumento avaliativo, a obra está
reprovada por descumprir o previsto no Edital de Convocação 01/2022 – CGPLI –
PNLD 2024-2027, conforme os itens especificados a seguir:

- Questão 2.1.5 (Lei nº 8.069/1990)? (Anexo VI, 2.2.4.1) - A obra não está de acordo
com o Estatuto da Criança e do Adolescente, especialmente com relação ao Art. 79, pois
no capítulo “ O bêbado”, há ilustrações de garrafas de bebidas alcoólicas, o que ocorre
nas páginas 81 e 83. Em outro momento da narrativa, há uma ilustração de um homem
com uma espingarda no ombro (LLI, p. 133) e, também, há, na página 157 do LLI, um
verso que faz referência ao uso de arma de fogo. - Questão 6.1.3 A obra respeita o
Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA (Lei 8.069/1990)? (Anexo III - Item 2.1.1,
c) – A obra não respeita o Estatuto da Criança e do Adolescente, pois apresenta
representação imagética de garrafas de bebidas alcóolicas (LLI, p. 81 e 83) e de arma de
fogo (LLI, p. 133).

Argumento - A obra respeita as legislações presentes no edital, particularmente, as


determinações dos artigos 78 e 79 do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº
8.069/1990)? (Anexo VI, 2.2.4.1) e 6.1.3 A obra respeita o Estatuto da Criança e do
Adolescente - ECA (Lei 8.069/1990)? (Anexo III - Item 2.1.1, c)".
Contra-argumento: (...) “Parte do sucesso da obra se deve, entre outras razões, à
maneira poética, filosófica e acessível com que trata temáticas universais e muito
próprias da existência humana como, por exemplo, a importância do
autoconhecimento; a importância de saber enxergar o mundo com olhos de criança,
cultivando a capacidade de questionar, imaginar e sonhar; a valorização do cuidado,
respeito, amor e amizade. É um livro que dispensa apresentações e que nunca, em 80
anos, foi considerado inadequado para crianças e adolescentes, no que diz respeito ao
seu texto e às suas ilustrações, muito pelo contrário: é leitura tratada como obrigatória
quando o assunto é a formação de leitores e cidadãos”... “O livro “O pequeno
príncipe” aprovado no âmbito do PNLD 2020 é, portanto, o clássico com todos os seus
elementos: texto e ilustrações originais de Antoine de SaintExupéry, exatamente os
mesmos que serviram de inspiração para a adaptação “O pequeno príncipe em
cordel”. (....) Ao ler isoladamente este parágrafo, é possível acreditar que o PARECER
se refere a uma obra potencialmente violenta, que incita condutas violentas, que faz
propaganda e apologia ao consumo de bebidas alcoólicas. E, sem dúvidas, esse seria
um tipo de conteúdo que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) gostaria, com
razão, de deixar longe das crianças e adolescentes brasileiros. Com o Art. 79, o ECA
visa garantir que crianças e adolescentes não sejam expostos a publicações que fazem
Rua Senador Teixeira da Costa, 180 – Bairro Floramar – Belo Horizonte – Minas
Gerais – Tel.: 31 3435 1024 propaganda ou, como escrito no texto do próprio artigo,
“anúncios de bebidas alcoólicas, tabaco, armas e munições”. Mas esse,
definitivamente, não é o caso da obra literária “O pequeno príncipe em cordel”. (...)
Os artigos 78 e 79 da Lei estão relacionados à publicidade direcionada ao público
infanto-juvenil. Este esclarecimento é feito pela doutrina de forma unânime, sendo
possível citar os seguintes trechos: (Acerca da interpretação do art. 79) “A violação
desta regra importa, em tese, na prática da infração administrativa prevista no art.
257, do ECA. A própria Constituição Federal, em seu art. 220, §4°, impõe restrições à
propaganda comercial de tais produtos, que devem conter, sempre que veiculada,
advertência sobre os malefícios decorrentes do seu uso. Vide Lei nº 9.294/1996, que
dispõe sobre Restrições ao uso e à Propaganda de produtos fumígeros, bebidas
alcoólicas, medicamentos, terapias e defensivos agrícolas.” 1 “Publicações
infantojuvenis e conteúdo indevido: não há dúvida de que as revistas e demais
publicações voltadas ao público infantojuvenil não devem conter qualquer tipo de
anúncio, ilustração, foto, legenda, crônica ou material similar referente a bebidas
alcoólicas, tabaco, armas e munições, além de drogas e outros produtos semelhantes.
Infringir esse dispositivo gera sanção administrativa (art. 257, ECA). Porém, há de se
convir que essa tendência não existe. As empresas não têm interesse algum em fazer
propaganda de bebidas, cigarros ou armas em revistas infantis. Esse público não é
consumidor direto de tais produtos. (DIGIÁCOMO, Murillo José; DIGIÁCOMO,
Ildeara de Amorim. Estatuto da Criança e do Adolescente Anotado e Interpretado.
Curitiba: Fundação Escola do Ministério Público do Estado do Paraná, 2017.)” (...)
“Nesse passo, atendendo à finalidade da norma, que busca a proteção psíquica e moral
da criança e do adolescente, preservando o direito ao respeito, à dignidade,
considerando, ainda, sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, não se
pode impor interpretação literal, muito menos restritiva, da norma em análise. Aliás,
nenhuma regra pode ser entendida com a sua simples e mera leitura, porque o
significado dos seus termos somente adquire efetividade e eficácia no contexto de cada
caso concreto controverso. Quando se aplica qualquer regra simplesmente fazendo
incidir o seu enunciado, se está negligenciando a importância insubstituível dos fatos
aos quais se destinam e a dos valores éticos que pretendem realizar.” (BRASIL.
Superior Tribunal de Justiça. Resp n. 1.610.989/RJ, Relator Ministro Napoleão Nunes
Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 20/2/2020, DJe de 5/3/2020.)

A detentora do direito autoral alega que a obra “O pequeno príncipe” foi aprovada no
PNLD 2020 e contém as mesmas gravuras. E que as ilustrações não têm o intuito de
promover a violência ou a consumo de bebidas alcoólicas. A obra em análise é
conhecida mundialmente pela sua qualidade literária e sempre foi indicada ao público
infanto-juvenil. A ficha de avaliação do PNLD 2024-2027 da obra deixa claro isso, com
diversas referências elogiosas à obra e às ilustrações. No entanto, as ilustrações das
páginas 81, 83 e 133 estariam em desacordo com o Estatuto da Criança e do
Adolescente, mais precisamente no disposto no art. 79, que veda a ilustrações com
referências a bebidas alcoólicas e armas de fogo. No entanto, como demonstrado pela
recorrente, tal vedação se dá no âmbito publicitário, cujo o objetivo seria incentivar a
compra de tais produtos. Traz o entendimento do Procurado de Justiça do Estado do
Paraná, Murilo Digiácomo, que expressa esse entendimento. Assim, entende-se que não
há nas ilustrações publicidade ou apologia ao uso de bebidas alcoólicas ou mesmo a
ideia que tal prática seja expressada como virtuosa ou benéfica. Quanto a ilustração que
contém uma arma de fogo, também não há que se falar em apologia ao uso de armas e a
imagem está dentro do contexto da obra, pois retrata um caçador, elemento importante
para o texto. Não há apologia ao uso de armas ou publicidade nesse sentido, apenas a
retratação de um personagem do texto. Importante mencionar a decisão do STJ trazida
pela recorrente que explicita esse ponto. Segundo o Ministro Napoleão Nunes Maia
Filho “nenhuma regra pode ser entendida com a sua simples e mera leitura, porque o
significado dos seus termos somente adquire efetividade e eficácia no contexto de cada
caso concreto controverso”

PARECER FINAL:
Apesar de conter ilustrações que retratam bebidas alcoólica e arma de fogo, tais figuras
não devem ser interpretadas literalmente à luz do art. 79 do ECA, que em seu sentido
primário veda a sua inserção de ilustrações com tal teor afim de se evitar que crianças e
adolescentes sejam expostos à influência indevida.
Assim, consideramos procedente o Recurso, recomendando a alteração do Parecer de
Reprovação da obra, orientando a SEB para que seja revertido o resultado da avaliação
pedagógica para APROVADA COM FALHA, para correção de falhas pontuais.

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