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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM FILOSOFIA

LUCIANO CARVALHO CARDOSO

A Generalidade Lógica no Pensamento tardio de Frege

Pré-Projeto de pesquisa apresentado ao


Programa de Pós-Graduação de
Doutorado em Filosofia da Universidade
Federal de São Paulo.
Prof. Orientador: Marcelo Silva de
Carvalho

LINHA DE PESQUISA:
Metafísica, Ciência e Linguagem

Guarulhos
2015
Resumo

Gottlob Frege desenvolveu, durante toda sua vida, o projeto logicista, projeto este que

tinha como propósito definir a aritmética como um campo de verdades analíticas.

Posteriormente, Frege recua em sua posição, reconhecendo que a aritmética seja sintética a

priori. Nosso objetivo é demonstrar como o pensamento fregiano utiliza a generalidade como

eixo que favorece essa ruptura e busca preservar as características essenciais do logicismo. A

tensão existente entre o princípio de composicionalidade e o princípio de contexto demarcam

a trajetória de Frege no desenvolvimento da generalidade e do amadurecimento de sua lógica

de forma aproximativa às mudanças centrais de seu pensamento.

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Justificativa Filosófica e Desenvolvimento do Tema

O estudo da generalidade em Frege propicia uma visão privilegiada sobre o

desenvolvimento e desdobramento da lógica e da filosofia analítica. Presente desde o

princípio das obras de Frege (na Conceitografia, de 1879, Frege já apresenta um quantificador

aplicado à variável para expressar generalidade), o tema evolui junto com o pensamento do

autor, ganhando relevância em seus textos de maturidade e adquirindo novas dimensões na

medida em que Frege empreende uma grande mudança em suas concepções a respeito da

filosofia analítica. O principal fundamento desta consiste na concepção de que as verdades

derivadas da aritmética seriam analíticas, em oposição direta à concepção kantiana, que as

considerava sintéticas a priori. Tomando esse princípio como base, Frege empreendeu um

longo projeto no intuito de demonstrar o fundamento lógico e analítico da aritmética,

constituindo o que ficou conhecido como logicismo.

Todavia, em seus escritos póstumos, Frege redefine sua posição e realiza uma

concessão a Kant, ao reconhecer que as verdades oriundas da aritmética seriam sintéticas a

priori. Essa situação, entretanto, não significou a total descaracterização do logicismo, pois as

principais características dele, o pensamento, a relação entre função e argumento, conceito e

objeto, relações de primeiro e segundo níveis, permaneceram como pressupostos válidos em

suas investigações.

Como mudar um paradigma fundamental da filosofia analítica, isto é, sua

analiticidade, e ainda manter os principais fundamentos do logicismo?

Embora os escritos póstumos datados de 1920 sejam muito incipientes, acreditamos

que a mudança paradigmática de Frege, explicitamente assumida nesses textos, indicam que

são enunciados de maturidade, frutos de um processo reflexivo intenso, e que não surgiram

apenas em seus últimos anos de vida. Frege desenvolve um conjunto de reflexões a partir das

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Leis Básicas da Aritmética (1902) que lentamente conduzem para as concepções de ruptura

com sua ideia da aritmética ser analítica, fundamentada na lógica e ser estruturada pela teoria

dos Conjuntos. E o que percebemos e pretendemos evidenciar é que, nesse processo, a

generalidade torna-se protagonista das reflexões fregianas. Como um eixo fixo que torna

possível sua guinada para o campo do conhecimento sintético a priori sem, entretanto,

convergir todo seu pensamento ao de Kant, Frege contextualizará os principais pilares do

logicismo à luz da generalidade, em uma possível tentativa de resolução de alguns pontos de

tensão presentes nos desdobramentos do logicismo.

O ponto de tensão inicial que identificamos é evidenciado por Klement (2004), em seu

artigo intitulado Putting Form Before Function: Logical Grammar in Frege, Russell and

Wittgenstein, que sinaliza dois movimentos contrários no pensamento fregiano e, até certo

ponto contraditórios, no qual, de um lado, Frege defende a ideia de que a totalidade de

significado de um pensamento é dada pelos significados de suas partes constitutivas

(composicionalidade); e, por outro lado, a ideia oposta de que o significado das palavras só

pode ser conhecido no contexto em que elas aparecem (princípio de contexto).

Quando consideramos os textos nos quais essa dicotomia aparece, surgem inúmeras

nuances que se estendem para além de uma simplista consideração de datas.

Como o princípio de contexto aparece ainda muito cedo nas obras de Frege, em 1884,

em Os Fundamentos da Aritmética, autores como Klement procuram conceber uma certa

unicidade entre esses elementos. No referido caso, encontramos uma distinção na qual,

quando Frege afirmaria o princípio de contexto, estaria fazendo com relação aos fragmentos

insaturados do pensamento, isto é, conceitos e expressões funcionais. Ao fazer o processo de

conciliação dos dois elementos, entretanto, percebemos uma balança pendendo para a

composicionalidade do pensamento.

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Haddock (2006) apresenta um cenário complementar, no qual, embora o princípio de

contexto ainda apareça em seus textos maduros, surgiria de forma restrita, aplicando-se

apenas a variáveis.

De acordo com Haddock:

O Princípio de Contexto de Die Grundlagen der Arithmetik, o qual era aplicado a

cada expressão, está agora reduzido à trivialidade na qual as variáveis só têm

significado no contexto de uma declaração, enquanto, por outro lado, os nomes

próprios e expressões relacionais também têm significado - tanto sentido quanto

referência - quando ocorrem isolados, isto é, fora do contexto das declarações.

(HADDOCK, G. E. R. A Critical Introduction to the Philosophy of Gottlob Frege,

pg. 75.)

A posição de Haddock pode ser confirmada quando recorremos a passagens

específicas de Frege que parecem evidenciar o Princípio de Composicionalidade. Em Sobre o

Sentido e a Referência (1892), Frege afirma:

Se tudo quanto importa fosse apenas o sentido da sentença, fosse apenas o

pensamento, então seria desnecessário preocupar-se com a referência de uma parte da

sentença; pois para o sentido da sentença somente importa o sentido desta parte, e

não a referência desta parte [da sentença]. O pensamento permanece o mesmo se o

nome "Ulisses" tem referência ou não. O fato de que nos preocupamos com a

referência de uma parte da sentença indica que admitimos e exigimos uma referência

para a própria sentença. O pensamento perde valor para nós tão logo reconhecemos

que a referência de uma de suas partes está faltando. (FREGE, G. Sobre o Sentido e a

Referência, 2009, pg.138).

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Aqui temos uma preocupação de Frege em identificar as referências das partes de uma

sentença completa, pois “exigimos uma referência para a própria sentença”. A ideia que

permeia a passagem é a de que as partes de uma sentença, bem como seus sentidos e

referências específicas, são fundamentais para a apreensão da sentença. Pensamento

semelhante encontramos no texto Lógica na Matemática (1914), onde lemos:

(...) “Étna é mais alto que Vesúvio”. Com esta sentença nós associamos um sentido,

um pensamento; nós o entendemos, nós podemos traduzi-lo em outras línguas. Neste

sentido, nós temos o nome próprio “Étna” que contribui para o sentido da sentença

inteira, para o pensamento. Esta contribuição é parte do pensamento, ele é o sentido

da palavra “Étna”. (FREGE, G. Logic in Mathematics, in Posthumous Writings, pg.

225)

Embora essas considerações sugiram que o princípio da composicionalidade defina o

pensamento de Frege, existem algumas considerações relevantes que precisamos abordar,

para um maior esclarecimento da problemática apresentada. É relevante observar que o

princípio de contexto, apresentado pela primeira vez em Os Fundamentos da Aritmética,

tenha um caráter de generalidade sobre a multiplicidade. Frege, ao apresentar esse princípio,

combate precisamente o princípio agregacionista acondicionado a John Stuart Mill. A

comparação feita por Frege é a de que não é uma soma agregativa que nos fornece a

compreensão de um dado número. Segundo Frege: “isto não prova que os números se formem

de modo particularmente mecânico, mais ou menos como um monte de areia é formado de

grãos de quartzo” (FREGE, G. Os Fundamentos da Aritmética, pg. 200-201).

Tomar o cálculo como um pensamento agregativo implica em considerar que os

números são representações de objetos empíricos e que, portanto, o número dois represente

duas coisas, como duas pedras, por exemplo, ao invés de representar duplicação. O número

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um representa uma coisa, e não unidade. E assim por diante. A mesma crítica ocorre no que

diz respeito à linguagem. Para Frege, uma palavra isolada não pode ser totalmente conhecida.

Somente no contexto seu significado pode aparecer. Isso significa que uma proposição é mais,

em termos de significado, do que a simples soma (agregação) de seus termos isolados. Ela

tem que ser tomada em seu todo.

“Deve-se – diz Frege – perguntar pelo significado das palavras no contexto da

proposição, e não isoladamente.” (Idem, pg. 204).

O que percebemos, por essa oposição, é que o princípio de contexto possui uma

proximidade com a generalidade, pois nos apresenta um sentido geral da proposição que

escapa aos termos isolados, e também porque, ao analisarmos a definição de número,

evidencia-se que, qualquer que seja o número dado, suas propriedades compreendem uma

definição de generalidade que permite com que ele caia sob uma função que o solicite, como

“o número que convém ao conceito F é a extensão do conceito ‘equinumérico ao conceito F’”

(Idem, pg. 142).

Considerando essa aproximação entre o princípio de contexto e a generalidade

quantificacional, Ricketts (2010) nos apresenta um quadro interessante referente à

generalidade em Frege. Ricketts defende que:

Generalidade quantificacional e identidade estão interligados para Frege.

Generalidade quantificacional é generalidade sobre uma multiplicidade de distintos,

objetos determinados, quanta determinados, por assim dizer. Diferenciação é, assim,

incorporada à concepção de Frege de um objeto: não há entidade sem identidade

(RICKETTS, T. op. cit., pg. 156).

Essa passagem corrobora a ideia de Frege, onde dizer que o princípio de contexto se

sobrepõe ao caráter agregativo de elementos isolados somados para gerar uma proposição é

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equivalente a dizer que a generalidade quantificacional é generalidade sobre uma

multiplicidade de distintos.

No olhar de Ricketts, a generalidade quantificacional não apenas manteve a importância

no trabalho tardio de Frege, mas ainda é determinante do contexto lógico de identidade dos

objetos.

Essa relação entre generalidade e multiplicidade, na qual a identidade se revela,

encontra-se presente em Generalidade Lógica (pós 1923), quando investigamos a função

atribuída à generalidade presente na linguagem. Para o autor, a generalidade não se apresenta

como recurso próprio da linguagem, mas sim do pensamento. De acordo com Frege:

A linguagem pode aparecer para oferecer um meio para que, por um

lado, as sentenças sejam percebidas pelos sentidos e, por outro, elas

expressem pensamentos. Como veículo para as expressões do

pensamento, a linguagem tem que modelar a si mesma sobre o que

acontece ao nível do pensamento. (FREGE, G. Logical Generality, in

Posthumous Writings, pg. 259)

Dessa maneira, Frege concebe a linguagem como “uma ponte do perceptível para o

imperceptível” (Idem). É a partir dessa ponte perceptível que podemos chegar ao pensamento,

em geral presente na linguagem. Como a parte visível aos sentidos consiste nas sentenças, a

partir delas podemos, como que por um espelho, chegar até o próprio pensamento. Acerca

disso, Frege afirma:

Aqui, não é uma questão de entender a linguagem do dia-a-dia, de

considerar os pensamentos expressos nela; é uma questão de considerar a

propriedade de pensamentos que eu chamo generalidade lógica (FREGE,

G. Idem).

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A generalidade lógica, parte presente nos pensamentos, pode ser expressa na linguagem

por meio de diferentes quantificadores, como todos, todo, nenhum, etc., e também por

indicadores indefinidos da sentença, como alguém, ou letras, como a, b, ou c. Essa estrutura

de generalidade, Frege denomina linguagem-objetiva, a forma de expressão do pensamento

enquanto generalidade, em contraposição à forma usual na qual escrevemos ou falamos, que o

autor denomina meta-linguagem.

Essa forma de generalidade pertencente ao pensamento encapsula os particulares que

surgem na meta-linguagem, como Napoleão, César e toda a multiplicidade indiferenciada na

forma de linguagem-objetiva.

Percebemos que Frege, nesse e em outros registros do mesmo período, parece traçar

uma arquitetura do pensamento alicerçada na generalidade. No caso acima, encontramos a

identidade subsumida na generalidade lógica e expressa na linguagem-objetiva. Mas também,

no mesmo manuscrito, encotraremos outro fator preponderante para Frege, relativamente ao

juízo: “Segue-se do que foi dito que as sentenças da linguagem-objetiva nunca conferem força

assertórica.” (Idem, pg. 261).

A generalidade expressa na linguagem-objetiva não possui força assertórica, pois ela

não apresenta nomes próprios e nem pode atuar como premissa para inferência. Isso é

relativamente importante para indicar que sentenças que contém ou expressam generalidade

na forma de linguagem-objetiva não possuem valor de verdade, mas conferem condição para

a geração de sentenças com valor de verdade.

A força assertórica referenciada nesse artigo não consiste em uma novidade em Frege.

Já em Sobre o Sentido e a Referência (1892), o autor já referenciava que de nada adianta

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acrescentar o termo “é verdadeiro” a uma sentença, pois o pensamento expresso continua

sendo apenas um pensamento expresso, e não pensamento asserido. No referido texto, lemos:

De fato, poder-se-ia dizer: “O pensamento de que 5 é um número primo

é verdadeiro”. Porém, um exame mais acurado mosta que essa sentença

nada acrescenta ao que é dito na simples sentença “5 é um número

primo”. A asserção da verdade reside, em ambos os casos, na forma da

sentença assertiva. E quando a asserção perde sua força usual, digamos,

na boca de um ator no palco, mesmo a sentença “O pensamento de que 5

é um número primo é verdadeiro” contém apenas um pensamento, a

saber, o mesmo pensamento da simples sentença “5 é um número

primo”.

No presente caso, a força assertiva reside no fato de que uma sentença deve possuir

referência. Na voz de um ator de palco, onde tudo o que se diz é ficção, não existe força

assertiva. Mas também não existe essa mesma força assertiva na generalidade lógica. Os

motivos, entretanto, seguem de maneira diferente. No primeiro caso, o motivo deve-se ao fato

da ficção, da simulação, da representação que não investiga a verdade das proposições e nem

tampouco se ocupa das referências que poderiam ou não possuir. O segundo caso deve-se ao

fato de a generalidade lógica tornar indistinta a identidade, mas prescrever condições para que

essa identidade seja asserida por um processo de inferência e reconhecida em seu valor de

verdade pelo juízo, embora, em sua forma de generalidade, não possua força assertórica e,

portanto, valor de verdade. Essa força assertórica que aqui mencionamos e que nada tem de

relação com a adição da expressão “é verdadeiro” à sentença, tem relação com outro elemento

importante na obra de Frege, que consiste na definição ostensiva, parte fundamental da

dinâmica presente em Função e Conceito (1891) e Sobre Conceito e Objeto (1892). Esse

processo, no qual a extensionalidade se torna presente na mecânica de subsunção dos objetos

aos conceitos, parece ser contextualizada na dinâmica da generalidade, na medida em que

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esta, ao se particularizar, abre a entrada para a multiplicidade, sem a qual não pode haver uma

referência.

Mas isso implicaria em uma concepção filosófica da linguagem orientada da

generalidade para a particularidade? Essa teoria que parece divergir da concepção da tradição

de comentadores de Frege, como Dummet e Haddock, que partem das estruturas inanalisáveis

e irredutíveis, conceito e objeto, no campo da referência, para a construção do pensamento,

por meio da construção da linguagem fundamentada sobre a estrutura da função/argumento.

Esse fundamento estruturante da linguagem, que se assenta sobre a dinâmica de uma

relação de saturação, consiste no motor da lógica extensional. É o movimento da linguagem

no eixo dessa lógica que origina os critérios de verdade para o juízo, uma vez que é no núcleo

intrínseco a essa lógica de extensionalidade entre conceitos e objetos que obtemos os valores

de verdade aplicados às sentenças.

Esse pensamento, presente nas obras mais difundidas do autor, desde Os Fundamentos

da Aritmética, de 1884, até Sobre o Sentido e a Referência, de 1892, entram em contraste com

seus trabalhos mais tardios e maduros, expressos pelos arcos de cartas e textos que delimitam

o que ficou conhecido como Os Fundamentos da Geometria, a partir de 1904, e seus textos

escritos a partir de 1919.

No contexto dessas obras, a generalidade ganha destaque, expressa nas relações de

segundo nível, nos quantificadores universais e no conceito de existência e, como foi indicado

acima, na generalidade lógica, inerente ao pensamento.

Segundo Frege, a generalidade expressa nos quantificadores é fundamental para as

relações de segundo nível, de subordinação entre conceitos, pois elas estabelecem as marcas,

notas desses conceitos que se tornarão, nas relações de subsunção, propriedades dos objetos,

em decorrência lógica das relações de generalidades estabelecidas. Esse tipo de orientação

que observamos sugere, por um lado, um condicionamento lógico de significado por contexto,

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uma vez que as relações de generalidade, dentre as quais as de existência, criam os contextos

condicionantes dos significados dos objetos e conceitos de primeiro nível, o que reflete na

estrutura da linguagem, fundada nos nomes próprios e nas expressões predicativas.

Por outro lado, parece haver duas orientações em rota de colisão onde, de um lado,

temos uma teoria de construção em blocos, partindo da relação objeto/conceito e, de outro,

por uma teoria da generalidade que condiciona os significados dessa construção ao próprio

contexto determinado pelos quantificadores.

Essa questão se reflete diretamente sobre o sentido e a referência atribuído aos nomes

próprios e termos conceituais. Em Digressões sobre o Sentido e a Referência (1892), Frege

afirma que tanto o nome próprio quanto o termo conceitual possuem, cada qual, sentido e

referência. Essa afirmação, no entanto, se torna carregada de problemas e ambiguidades

diante do conflito que expusemos.

O sentido é o modo de apresentação de uma referência. É também o correlato para o

pensamento. O nome próprio é um sentido, um modo de apresentação, ele refere. E sua

referência é um objeto. O mesmo vale para o termo conceitual, que refere um conceito. Se

partirmos do princípio que cada objeto e conceito são referências passíveis de muitos modos

de apresentação, as inúmeras combinações entre eles construirá a linguagem e o pensamento.

Seus sentidos possíveis e suas relações de saturação produzirão sentenças e valores de

verdade. Esse é o contexto da construção em blocos.

Se, em contrapartida, partimos do princípio da generalidade quantificacional, o sentido

de cada nome próprio e termo conceitual não será dado por aquilo que eles referem, em

primeira instância. Isso porque seus significados são dados a partir de uma relação de segundo

nível, entre conceitos de primeiro nível e conceitos superordenantes. Por essa relação,

conceitos superordenantes imprimem significado, notas, subordinam conceitos de primeira

ordem. É o caso, segundo Haaparanta (2011), do conceito já mencionado existência, que

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preserva sua significatividade enquanto conceito de segundo nível, mas torna-se vazio quando

surge como conceito de primeira ordem. A subordinação desses conceitos sobre os demais é

que definirá as características desses conceitos de primeiro nível em sua estrutura insaturada e

impingirá essas características na forma de propriedades quando da predicação de um objeto.

Nessas condições, os conceitos superordenantes é que orientariam as relações entre

conceitos e objetos ou, em outros termos, os contextos que definirão os significados possíveis

para os nomes próprios e os termos conceituais.

Acreditamos que essa tensão, produzida pelo principio de composicionalidade em

contraste com o princípio de contexto tenha ocupado espaços distintos no pensamento de

Frege e que, tanto quanto o paradoxo de Russell, tenham contribuído para a mudança de

paradigma que o autor apresentou em seus estudos finais.

O que depreendemos desses movimentos de Frege consistem no seguinte ponto: se o

que é verdadeiro não pode ser encontrado na linguagem, ao atribuirmos o termo “é

verdadeiro” à sentença, conforme formulado em Sobre o Sentido e Referência, e se também

não pode ser encontrado na forma lógica do pensamento, dada a generalidade lógica presente,

que não possui força assertórica (um movimento ampliativo ao que foi apresentado em Sobre

o Sentido e Referência), onde o que é verdadeiro pode ser encontrado? Onde residiria a força

assertórica? O verdadeiro existiria ainda na extensionalidade, evidenciada na relação conceito

e objeto? Ele, o verdadeiro, ainda é asserido no juízo, mas esses movimentos estabelecidos

por Frege não sinalizariam um deslocamento do verdadeiro que não seria mais evidenciado

em um juízo analítico, mas sim em um juízo sintético? A evolução da estrutura da

generalidade poderia ter contribuído para que Frege referenciasse o juízo sintético para o

interior da aritmética?

Considerando os pontos da investigação apresentados acima, nossa metodologia

consiste em:

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1. Identificar as principais tensões oriundas das concepções do princípio de contexto e

composicionalidade;

2. Evidenciar a cadeia de relações que esses princípios desempenham no contexto do

logicismo;

3. Investigar o papel da generalidade e o movimento que ela apresenta no pensamento de

Frege no sentido de solucionar a tensão resultante da implementação dos dois princípios;

4. Buscar estabelecer uma relação entre a predominância da generalidade e do Princípio

de Contexto com a preservação de alguns pilares do logicismo, apesar da recusa do mesmo e

o reconhecimento do conteúdo sintético da aritmética, constituindo um conjunto de

pensamentos que não convergem inteiramente à filosofia kantiana.

Cronograma

Para execução do presente projeto, propõe-se o cronograma abaixo, dividido em semestre e

focando as principais atividades necessárias para a eficácia da pesquisa:

Fase Descrição de Atividades Semestres


1 Pesquisa de referẽncias bibliográficas de Frege pertinentes ao tema 1º
1.1 Trabalho com material bibliográfico selecionado
2 Pesquisa de Referências Bibliográficas de Comentadores relacionados ao tema 2º
2.1 Trabalho com material selecionado
3 Análise dos temas centrais e correlacionados 3º
3.1 Participação nos grupos de estudo
4 Elaboração da estrutura central do trabalho 4º
4.1 Elaboração de artigos para publicação em revistas especializadas
5 Fichamento das principais obras no contexto do tema 5º
6 Elaboração da versão preliminar do trabalho 6º
6.1 Apresentação e debate do material em seminário nos grupos de pesquisa
7 Elaboração de artigos e apresentação em Congressos 7º
8 Elaboração da versão final do trabalho para defesa 8º

Referência Bibliográfica
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FREGE, Gottlob. Posthumous Writings. University of Chicago Press, 1979.
FREGE, Gottlob. Sobre o Sentido e a Referência in Lógica e Filosofia da
Linguagem. São Paulo: Cultrix/Ed. Da Universidade de São Paulo, 1978.

_____________. Digressões sobre Sentido e Referência in Lógica e Filosofia da


Linguagem. São Paulo: Cultrix/Ed. da Universidade de São Paulo, 1978.
_____________. Função e Conceito in Lógica e Filosofia da Linguagem. São Paulo:
Cultrix/Ed. da Universidade de São Paulo, 1978.
_____________. Conceito e Objeto in Lógica e Filosofia da Linguagem. São Paulo:
Cultrix/Ed. da Universidade de São Paulo, 1978.
_____________. Os Fundamentos da Aritmética. São Paulo: Nova Cultural, 1989.
GEACH, Peter; BLACK, Max, Translations from the Philosophical Writings of
Gottlob Frege. 2ª Ed.: Basil Blackwell Oxford, 1960.
KLEMENT, K.C. Putting Form Before Function: Logical and Grammar in Frege,

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RICKETTS, T.; POTTER, M. The Cambridge Companion to Frege. New York: Ed.:
Cambridge University Press, 2010.
KEMMERLING, Andreas. Thoughts Without Parts: Frege´s Doctrine, in
SCHNIEDER, Benjamin; SCHULZ, Moritz. Themes From Early Analytic Philosophy –
Essays in Honour of Wolfgang Künne. Nova Iorque: Editions Rodopi BV, 2011, pgs. 165-
188.
HADDOCK, G.E.R. A Critical Introduction To The Philosophy of Gottlob Frege.
England: Ed.: Ashgate Publishing Limited, 2006.
HAAPARANTA, L. Sobre a Existência em Frege, in Antologia de Ontologia –
Textos Selecionados. Florianópolis; Ed.: Rocca Brayde, 2011.
TEXTOR, M. Frege On Sense and Reference. London: Ed.: Routledge, 2006.

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