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Empreender para compreender:

educação financeira na prática


Área(s): Matemática.
O objetivo desta prática foi possibilitar aos alunos o desenvolvimento de atitudes
conscientes e uma relação saudável com o dinheiro no dia a dia e a disseminação desse
conhecimento às famílias.

Ficha técnica
Componente(s) curricular(es) envolvido(s):
Matemática.

Quando:
Ao longo do ano letivo, com duração aproximada de um bimestre.

Materiais:

 materiais de uso cotidiano;


 recicláveis;
 dinheiro de mentirinha;
 sala de informática com acesso à internet (desejável).

Habilidades trabalhadas:
EF04MA03; EF04MA04; EF04MA06; EF04MA13; EF04MA25

Créditos
Professor(a) responsável:
Priscila Brandão Casado.

Escola:
Escola Estadual Professor Francisco Portugal, Aracaju (SE).

O que é:
O presente projeto foi desenvolvido com uma turma do 4º ano do Ensino Fundamental,
num total de 25 alunos, com idades entre 8 e 12 anos.

Com base nos diálogos dos alunos sobre mudanças na situação financeira de suas
famílias, vitimadas pelo desemprego, e sobre o impacto dessa nova realidade na vida
escolar da turma, surgiu o projeto “Empreender para compreender: educação financeira
na prática”.

Como fazer:
Foi a partir de 2017 que começamos a observar mudanças no perfil dos alunos
matriculados na escola. Gradativamente, ingressavam estudantes provenientes de
instituições particulares de ensino, em virtude da impossibilidade dos pais de manterem
o pagamento das mensalidades.

Essa mudança no perfil das turmas gerou algumas disparidades nas salas de aula, com
níveis de aprendizagem diversos, participação e comprometimento das famílias de
forma diferenciada e realidades sociais e culturais distintas.

À medida que fui conhecendo a turma, consegui observar, por meio de avaliações
diagnósticas, que uma parcela significativa dos alunos apresentava dificuldades
significativas em Matemática, principalmente sobre noções e conceitos básicos,
interpretação de problemas matemáticos e resolução de cálculos.

O que chamou bastante a atenção foi o fato de dificuldades permearem todas as


realidades naquele espaço. Tanto alunos oriundos da rede particular quanto os da rede
pública se igualavam nas dificuldades com a Matemática.

O trabalho foi pensado para ser desenvolvido entre setembro e novembro de 2017.
Alguns meses antes, eu havia buscado apoio da representação de Sergipe do Serviço
Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae).

A instituição disponibilizou alguns materiais gráficos e didáticos para crianças sobre


empreendedorismo. No entanto, essa era apenas uma pequena parte do que eu precisava.
Como não tinha muito conhecimento sobre a temática, necessitava de meios para
adequar o assunto à faixa etária e à realidade da turma.

O ponto de partida foi a aquisição de um cofrinho. Nele, guardaríamos o dinheiro


arrecadado para a compra de materiais para a culminância do projeto, no mês de
novembro.
Em conversa com a turma, chegamos ao acordo de que todos colaborariam com a
quantia de R$ 1,00 por semana, e que essa quantia seria utilizada como investimento.
Enviei pedido de autorização aos pais explicando o intuito da arrecadação. Todos
concordaram com a proposta.

Num segundo momento, após trabalharmos alguns conceitos norteadores como


poupança, investimento e rendimento, propus à turma que pensássemos em alternativas
para fazer o dinheiro render.

Durante as discussões, surgiu a ideia de vender algo na escola. Era necessário que fosse
algo simples e prático, além de criado pelos próprios alunos.

Depois de várias propostas, definimos o “Geladinho Gourmet” como produto para


comercialização no ambiente escolar.

Tudo foi previamente acordado com a equipe diretiva e explicado aos outros professores
e respectivos alunos.

A proposta visava estimular o empreendedorismo, com os alunos ampliando o


relacionamento com a comunidade escolar e desenvolvendo estratégias criativas para
atrair "clientes".
Fazia parte desta etapa também aprender a calcular e a ter noções de custo, lucro e
prejuízo. Isso era importante porque, a cada dia de venda, fazíamos o somatório dos
gastos com base em notas fiscais de compra. Também contávamos o dinheiro
arrecadado e finalizávamos com os cálculos para verificar se tínhamos alcançado lucro
ou prejuízo.

Esta foi uma das etapas de maior envolvimento e empolgação. A cada jornada de
vendas, era uma euforia para saber quem seriam os próximos sorteados para vender o
produto. Foram formados pequenos grupos, que se alternaram ao longo das semanas.

Nas equipes, havia função para todos: um realizava a venda, o segundo ajudava a
conferir o dinheiro e a passar troco e um terceiro auxiliava com a divulgação, atraindo
os clientes.

Alguns alunos mais tímidos se recusaram nas primeiras tentativas, mas o envolvimento
da escola foi tão grande que os colegas das outras turmas começaram a vir todos os dias,
bem cedo, à nossa porta para “reservar” os geladinhos, que eram vendidos, sempre, no
horário do recreio, e acabavam em poucos instantes.

Todos os dias de venda eram marcados por muita expectativa; os alunos disputavam
para contar até as moedas arrecadadas.

No entanto, em dias mais chuvosos, as vendas caíam, e a turma passou a visualizar a


ocorrência de prejuízos.

Mas eram necessárias persistência e perseverança para empreender, mesmo diante de


adversidades. Assim, demos continuidade ao projeto.
Concomitante a essa etapa, outras atividades foram sendo realizadas. Com uma parte do
dinheiro, comprei cédulas de brinquedo para dar suporte às atividades em sala de aula
(problemas, cálculos matemáticos etc.).

Foi possível verificar que o trabalho com base no "concreto" gerou uma experiência
mais significativa e efetiva. O uso do dinheiro tornava as atividades uma verdadeira
brincadeira, e a aprendizagem começou a ocorrer de forma gradativa e leve.

Jogos como “O Pequeno Empresário”, uma versão simplificada do "Banco Imobiliário",


agregaram mais significado às atividades matemáticas, estimulando noções de soma e
subtração de valores e aguçando o raciocínio, a concentração e desenvolvendo a
tolerância à frustração.

Aliando o trabalho a outras disciplinas, fizemos ainda uma "viagem histórica" para
compreender a origem do dinheiro, sua evolução e produção no mundo e no Brasil.
Falamos sobre escambo, processo de cunhagem e evolução cronológica do dinheiro no
Brasil. Para isso, utilizei vídeos como recurso para as atividades.

Assim, os alunos conheceram um pouco do trabalho desenvolvido na Casa da Moeda,


além de um passo a passo sobre como identificar cédulas falsas.

A história do dinheiro aguçou bastante a curiosidade das crianças, principalmente


porque a maioria não conhecia as cédulas de R$ 1,00.

Pedi que conversassem em casa com os familiares sobre o tema. Muitos alunos
acabaram descobrindo que os pais guardavam essas notas antigas, e as trouxeram para a
escola para compartilhar o conhecimento com os outros colegas.

Em outro momento, partimos do questionamento “Dinheiro Nasce em Árvore?” para


uma reflexão na roda de conversa sobre a importância do dinheiro em nossa vida e os
sonhos que ele não compra. Temas como ética e valores também foram englobados nas
discussões.

Fé, saúde, paz e felicidade foram palavras apontadas pela turma.


Os alunos interagiram, discutiram, discordaram e, por fim, escolheram uma palavra que
deveria ser colocada numa nuvem representando os sonhos que o dinheiro não compra.
Fé, saúde, paz e felicidade foram palavras apontadas pela turma.

Trabalhamos ainda com as temáticas da economia doméstica e da economia sustentável,


por meio das quais abordamos questões sobre reciclagem, sustentabilidade etc.

A culminância do projeto foi pensada para ser realizada na "Mostra do Conhecimento"


da escola, evento muito esperado pelos alunos e pela comunidade escolar.

Por essa razão, demos início à organização e produção de materiais cerca de um mês
antes do evento. Mesmo com as produções voltadas para a culminância, a venda dos
geladinhos continuou até o encerramento do projeto.

A proposta para a culminância foi elaborada para que os alunos pudessem transmitir
tudo aquilo que haviam aprendido e também para que mostrassem, na prática, como o
empreendedorismo é possível e a educação financeira é a chave para um futuro melhor.

Na "Mostra do Conhecimento", os visitantes passaram por uma primeira etapa de


exposição e explanação teórica. Em seguida, eram convidados a sacar dinheiro em
nosso “caixa eletrônico”, para que pudessem interagir comprando produtos dos grupos
de empreendedores.

Cada grupo teve de pensar no seu negócio, respeitando gostos e interesses. Coube a eles
elaborar todas as etapas de criação, desde o nome até a forma de organização,
distribuição das tarefas e execução. Os negócios ficaram assim divididos:

 "Oficina Sustentável": produção de cofrinhos com garrafas PET.


 "Bazar da Economia": roupas, brinquedos e acessórios que as crianças não
usavam mais.
 "Lanchonete Coma Mais e Pague Menos": alimentos preparados pelas crianças,
e suas mães.
 "Supermercado Ki Barato: os alunos ficaram responsáveis por confeccionar toda
a estrutura do supermercado com material reciclado, além de fazerem estantes
com caixas de papelão e construírem o caixa eletrônico.Também juntaram
embalagens, colocaram os preços.

Este foi o negócio que mais recebeu a participação dos pais, já que alguns trabalhavam
em supermercados da região e auxiliaram os filhos trazendo anúncios, placas de preço,
folhetos e estantes.

O dia da culminância foi o momento em que os alunos visualizaram, de forma ampla e


interligada, tudo o que tinha sido abordado e trabalhado durante os dois meses.

Para muitos, era a primeira experiência de falar em público, o que gerou bastante
ansiedade e nervosismo. Para outros, o momento era de euforia.
À medida que relatavam as experiências vivenciadas e executavam as atividades de
compra e venda, eram nítidos o envolvimento, o comprometimento e a felicidade de
todos.

No evento, tivemos participação significativa das famílias, que vieram contemplar e


apoiar seus filhos. Em seus relatos, pais e professores demonstraram admiração por
verem as crianças explicando os conceitos com tanta propriedade, destacando que os
alunos estavam seguros de suas explicações. Nos relatos, diziam estar surpresos e que
aprenderam coisas que nunca imaginaram aprender com os alunos.

Esse apoio e incentivo foram de fundamental importância, tendo contribuído ainda mais
para a autoestima dessas crianças.

A avaliação esteve presente durante todo o processo de execução do projeto, pois


entendo que ela precisa ocorrer de forma processual e diagnóstica.

Sendo assim, a cada etapa desenvolvida, uma análise da aprendizagem dos alunos era
feita. Usava como base a observação dos relatos e o envolvimento da turma.

E, como avaliação final, a apresentação de todos os subtemas trabalhados e unificados


na Mostra do Conhecimento realizada na escola.

Foi possível verificar um grande engajamento da turma, principalmente no momento de


venda dos geladinhos. Essa iniciativa também despertou o interesse de alguns alunos,
que começaram a pensar em vender algo para que pudessem poupar dinheiro.

A iniciativa ganhou amplitude, e alguns alunos de outras turmas começaram a vender


outros produtos na escola, como palha italiana e brigadeiros.

O dinheiro sempre foi algo presente no cotidiano desses alunos. Muitos deles já
auxiliavam os pais indo a padarias, mercearias etc.

No entanto, o dinheiro até aquele momento não era visto como algo que lhes
pertencesse, pois a maioria não recebia mesada. Por isso, o processo de poupar e fazer
render o dinheiro arrecadado gerou um sentimento de pertencimento, cuidado e
responsabilidade.

Eram visíveis nas atitudes da turma a alegria e a euforia nos momentos em que
contávamos o dinheiro e víamos aquela quantia inicial aumentar.
A partir de pequenas atitudes dos alunos, como reduzir o consumo de balas para poupar
o dinheiro recebido dos pais ou a atenção com a economia de energia e de água em casa,
comprovou-se que os alunos passaram a compreender a importância do dinheiro em
suas vidas, mas, muito mais do que isso, passaram a perceber o impacto de suas atitudes
no futuro.

O projeto “Empreender para Compreender: educação financeira na prática” possibilitou


não só aos alunos, mas especialmente a mim, a vivência com uma temática pouco
comum na rotina da sala de aula, embora imersa por completo na vida pessoal.
Buscar alternativas para trabalhar este tema com as crianças foi um de meus maiores
desafios. Tive de sair de minha zona de conforto, da sala de aula e da frente do
computador para ir além.

Foram necessários muitos momentos de pesquisa, reflexão e de adaptação de conteúdos


à realidade da sala de aula. Discutir e praticar o empreendedorismo entre crianças era
algo que poucos acreditavam ser possível.

Dica!
O protagonismo dos alunos na decisão sobre quais produtos comercializar é
fundamental nesta atividade, por serem eles mesmos os potenciais consumidores.

A vivência do “negócio” implica aprendizagens significativas e contextualizadas que,


de outra forma, poderiam se perder com facilidade. Empreender, nesse contexto,
significa “envolver-se” na aprendizagem necessária para o sucesso do empreendimento.

Conceitos como lucro, prejuízo e investimento são difíceis até mesmo para alunos de
séries mais avançadas, mas podem ser compreendidos de forma concreta nesta prática.

O “dinheiro de mentirinha” pode ser facilmente produzido com um computador, acesso


à internet e uma impressora, não havendo a necessidade de comprar essas cédulas.

Muito sobre a história do dinheiro e o empreendedorismo na escola pode ser pesquisado


e encontrado na internet.

Este projeto sobre educação financeira pode ser executado por qualquer professor em
sua realidade de sala de aula. Trata-se de um tema que pode ser adaptado a realidades
diversas e que sempre será um assunto atual e importante, pois está intrinsecamente
ligado à vida de todos.

Sendo assim, é mais do que possível abordar este tema na Educação, inclusive nos Anos
Iniciais do Ensino Fundamental.

A proposta não requer altos custos. Ela deve ser feita de acordo com o que cada
comunidade tem a oferecer. O segredo é utilizar o potencial criativo de cada indivíduo e
as peculiaridades de sua região para empreender. Com certeza, esse é o ingrediente mais
importante para o sucesso do projeto.

Aos professores que utilizarem esta proposta como inspiração para desenvolver o
próprio projeto, tenham certeza de que estarão proporcionando aos alunos uma ocasião
para se tornarem protagonistas de sua aprendizagem, além de cidadãos conscientes das
próprias atitudes e disseminadores desses ideais dentro de casa e da comunidade.

 Protagonismo juvenil

 Matemática
 Reciclagem

 Escola e família

 Empreendedorismo

 Educação financeira

 Competência 6

 Susentabilidade

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