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Professor: Sugerimos que esta seção seja trabalhada oralmente.

As cantigas trovadorescas em terras


portuguesas
ENTRE
SABERES
Se a presença de trovadores occitânicos na Península é ante-
rior ao aparecimento do reino de Portugal, somente a partir de
finais do século XII se torna visível sua influência na nobreza
HISTÓRIA • ARTE
portuguesa. E essa influência efetivou-se [...] em virtude do aco-
lhimento daqueles autores em algumas cortes senhoriais e ré-
gias do norte peninsular. No Nordeste, em primeiro lugar, junto
do magnata castelhano D. Rodrigo Dias dos Cameros, e em Leão,
em segundo lugar, quando alguns trovadores demandaram a
Entre os séculos XII e XIV, as
corte de Afonso IX. A partir daí o movimento irradiará para as
cantigas trovadorescas estive-
terras galegas e portuguesas, onde, até cerca de , prevale-
ram no centro da vida cultural
cerá, em ambiente senhorial, a sua vertente erótica associada
e das manifestações literárias [...] às cantigas de amor e de amigo. Reflexo das dificuldades de
na área galego-portuguesa, acesso à mulher que começavam a vigorar nos meios nobiliár-
tendo a modalidade mais com- quicos portugueses, a atenção que a literatura lhes passava a
plexa dessas produções, a can- dedicar já foi interpretada por Georges Duby como um ritual
tiga de amor, sido cultivada de substituição de comportamentos mais violentos dos jovens
primeiramente por trovadores nobres, que passavam pelo rapto da mulher [...].
provençais.
(José Mattoso, dir. História da vida privada em Portugal — Idade Média. Lisboa:
Como essas cantigas che- Círculo de Leitores e Temas e Debates, 2010. p. 326.)
garam à nobreza portuguesa?
Como se organizava a socie-
dade nessa época? De que
As relações feudais
modo essas cantigas refletiam Ser «o homem» de outro homem: no vocabulário feudal, não
a estrutura social desse perí- existia aliança de palavras mais difundida do que esta, nem mais
odo? Que outras artes se ma- rica de sentido. Comum aos falares românicos e germânicos, ser-
nifestavam então? Para refletir via para exprimir a dependência pessoal, em si. E isto, fosse qual
sobre essas questões, leia os fosse, aliás, a natureza jurídica exacta do vínculo e sem ter em
conta qualquer distinção de classe. O conde era «o homem» do rei,
textos a seguir.
tal como o servo o era do senhor da sua aldeia. Por vezes, era até
no mesmo texto que, com poucas linhas de intervalo, condições
nobiliárquico: relativo à nobreza. sociais radicalmente diferentes eram assim evocadas, uma após
normando: habitante da
Normandia, região do noroeste outra: tal como, cerca do final do século XI, a petição de monjas
da França. normandas que se queixavam de que os seus «homens» — isto é,
occitânico: relativo à Occitânia, os seus camponeses — fossem obrigados por um alto barão a tra-
região do sul da França na qual,
entre os séculos XII e XIV, falava- balhar nos castelos dos «homens» deste: entenda-se, os cavaleiros,
se uma série de dialetos, entre seus vassalos. O equívoco não era chocante, pois, apesar do abismo
eles o provençal.
petição: pedido por escrito;
entre as camadas sociais, a acentuação exercia-se sobre o elemen-
requerimento. to fundamental comum: a subordinação de indivíduo a indivíduo.
românico: o mesmo que (Marc Bloch. A sociedade feudal. Lisboa: Edições 70. p. 169.)
romance, estágio do português
posterior ao latim vulgar e anterior O primeiro dever do bom vassalo, naturalmente, é saber mor-
ao galego-português.
rer pelo seu chefe, com a espada na mão: sorte digna de inveja
entre todas, pois é a de um mártir e abre as portas do paraíso.
Quem fala deste modo? Os poetas? Sem dúvida, mas a Igreja
também. Um cavaleiro havia sido obrigado a matar o seu senhor:
«Deverias ter aceitado a morte em lugar dele — declara um bis-
po, em nome do concílio de Limoges, em  — a tua fidelidade
teria feito de ti um mártir de Deus.»
(Idem, p. 241.)

46 UNIDADE 1 RUMORES DA LÍNGUA E DA LITERATURA


O renascimento das cidades

LITERATURA
A cidade medieval, centro ativo de produção econômica, é também um centro de intensa
produção cultural. Ela o é, em primeiro lugar, porque criou uma função intelectual nova, di-
ferente daquela do mosteiro ou da catedral da Alta Idade Média, baseada na ideia da ciência,
difundida por profissionais, por especialistas, e dirigida a uma população mais largamente
alfabetizada. Ela foi uma cidade do ensino, do primário ao superior, como diríamos hoje, e
levou ao nascimento da Universidade. Centro de trocas, ela permitiu à cultura popular das
camadas rurais, encerrada nos campos, e à cultura erudita dos clérigos, fechada nas escolas
eclesiásticas e nos scriptoria, reencontrar-se, e mesclou a realidade e o imaginário a ponto
de implantar em si o teatro e de The Bridgeman Art Library/Keystone Brasil/ Museo de Firenze Com'era, Florença, Itália

tornar-se ela própria um teatro. No


domínio artístico essencial da Ida-
de Média, o dos edifícios religiosos,
ela criou uma arte urbana logo du-
plamente encarnada em produções
sagradas e em produções profanas:
a arte gótica.
(Jacques Le Goff. O apogeu da cidade medieval.
São Paulo: Martins Fontes, 1992. p. 124.)

Mapa de 1490 mostrando


um panorama de Florença.

Agora, discuta com os colegas as seguintes questões.

1. No texto extraído do livro História da vida privada em Portugal – Idade Média é sugerido
que as cantigas líricas trovadorescas desempenharam certo papel no comportamento dos
jovens da nobreza portuguesa. Qual foi esse papel?
O de ter levado os jovens nobres a atenuar o comportamento violento que tinham diante da dificuldade
de acesso à mulher.
2. Na Idade Média, a sociedade feudal, organizada em três estamentos — o clero (os que
oravam), a nobreza (os que lutavam) e os camponeses (os que trabalhavam) —, tinha
uma estrutura hierárquica de relações sociais e políticas baseada na subordinação de um
indivíduo a outro, bem como nos laços de fidelidade (vassalagem). Considerando essas in-
formações e com base no texto “As relações feudais”, responda: De que modo as relações
de subordinação e de vassalagem estão presentes nas cantigas de amor?
Estão presentes na concepção do amor cortês, que pressupunha nas cantigas de amor a subordinação e a vassalagem do eu lírico
à dama (a “senhor”).
3. As cantigas trovadorescas são uma expressão cultural que se desenvolveu na Baixa Idade
Média, sobretudo nos meios aristocráticos e cortesãos. Paralelamente a elas, com o renasci-
mento das cidades, outras expressões de arte e de cultura se manifestaram no período. De
acordo com o texto “O renascimento das cidades”, quais foram os elementos culturais que
floresceram, então, em decorrência da vida citadina? A universidade, o teatro e a arte gótica.

Literatura na Baixa Idade Média: o Trovadorismo. Variedades linguísticas. O poema CAPÍTULO 2 47

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