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TRANSMISSÃO DE COMPETÊNCIA

Caso 16 (transmissão de competência) (art. 16.º e 17.º/1 CC)


Determine a lei aplicável à sucessão mobiliária de um francês que morreu, em 2014, com último
domicílio na Alemanha, admitindo que:
• a norma de conflitos (de fonte interna) francesa sujeita a sucessão mobiliária à lei do
último domicílio do de cujus;

• a norma de conflitos (de fonte interna) alemã sujeita a sucessão à lei da nacionalidade
do de cujus no momento da morte;

• e que na França e na Alemanha se pratica, de acordo com as normas de devolução de


fonte interna, o sistema de devolução simples.

Exclui-se o RRIV (âmbito temporal).

Aplica-se o art. 62.º CC, que remete para a lei pessoal (31.º/1: nacionalidade).

L1 pt  L2 nac: Fr (DS)  L3 RH: Alem (DS)  L2 fr  L3 alem

L2 aplica L2, apesar de a L2 remeter para L3

L3 aplica L3, apesar de remeter para L2

L1 aplica o quê?

Requisitos 17.º/1:

L2 aplique Ln

Ln se aplique a si própria

Aplica-se o art. 16.º: L1 aplica L2, por RM.

L2 aplica L2, L3 aplica L3 (ambas aceitam o retorno que é operado pela lei para a qual
remetem).

Assim sendo, L1 pt aplica a L2, nos termos do art. 16.º do CC (referência material). O art. 17.º/1
não se aplica.

Sub-hipótese E se o francês tivesse falecido em 2016? Aplica-se o RRIV, em particular, o art.


21.º, que remete para a LRH (Alem). Não se aplica o art. 34.º, pois a Alemanha não é um Estado
terceiro, pelo que L1 aplica L2, sem reenvio.

Caso 17 (17.º/2 CC)


Determine a lei aplicável à sucessão de um francês que morreu, em 2014, com último domicílio
no Brasil e deixando bens imóveis na Dinamarca, admitindo que:
• as normas de conflitos brasileiras e dinamarquesas submetem a sucessão mobiliária e
imobiliária à lei do último domicílio do de cujus;

• as normas de conflitos (de fonte interna) francesas sujeitam a sucessão imobiliária à lei
do lugar da situação do imóvel;

• os tribunais franceses praticam, de acordo com as normas de devolução de fonte interna,


devolução simples;

• na Dinamarca e no Brasil, a referência a uma lei estrangeira é geralmente entendida


como uma remissão para o seu Direito material.

Não se aplica o RRIV.


Art. 62.º CC + 31.º/1: L2 é a Lnac, ou seja, Fr.

L1 pt  L2 nac FR (DS)  L3 LRS (Din) RM  L4 RH BR (RM)  L4

L4 aplica L4
L3 aplica L4
L2 aplica L4
Logo, L1 aplicará L4, porque o art. 17.º/1 se aplica. O 17.º/2 não se aplica, pois a L1
remete para a lei pessoal, mas a LRH não. Logo, há reenvio. L1 aplica L4.

Sub-hipótese
• E se o francês tivesse falecido em 2016?

Aplicação do RRIV.

Art. 21.º: lei da última RH do falecido (BR).

Logo: L1 (PT)  L2 (BR: RH).

Aplica-se o 34.º? À partida, aplicar-se-ia, pois o Brasil é Estado terceiro. Logo, olha-se não só
para as suas normas materiais, mas também para o seu DIP (normas de conflitos ou também
normas do sistema de devolução? Segundo LLP, também relevam as normas sobre reenvio).

Contudo, acaba por não se aplicar nenhuma das alíneas, pois a LBr aplica-se a si própria. Logo,
não há reenvio. L1 aplica L2 (referência material).

Caso 18 (17.º/2 e 17.º/1 – transmissão em cadeia)


Determine a lei aplicável à sucessão de um argentino que morreu, em 2014, com último
domicílio na França, deixando bens imóveis situados no Paraguai, admitindo que:
• as normas de conflitos argentinas e paraguaias submetem a sucessão mobiliária e
imobiliária à lei do último domicílio do de cujus;

• as normas de conflitos (de fonte interna) francesas sujeitam a sucessão imobiliária à lei
do lugar da situação do imóvel;

• todos os ordenamentos jurídicos envolvidos praticam, no caso, devolução simples.

Art. 62.º + 31.º/1: L1 pt  L2 nac Arg (DS)  L3 RH FR (DS)  L4 LRS Parag (DS)  L3
RH FR  L4

L4 aplica L4

L3 aplica L3

L2 aplica L4

Logo, L1 aplicará L4, de acordo com o art. 17.º/1. O n.º 2 não se aplica, pois a LRH FR aplica-
se a si própria, não à lei da nacionalidade (Arg.).
Sub-hipótese:
E se o argentino tivesse falecido em 2016?
RRIV (art. 84.º).

Art. 21.º - lei da última RH do de cujus: Lei francesa.

Não se aplica o 34.º. Referência para a lei francesa é, portanto, material.

Caso 19
Alain e Beatrice são cidadãos franceses, casados um com o outro sem convenção antenupcial, e
residem habitualmente em Lisboa. Beatrice tinha adquirido, antes do casamento, uma casa no
Luxemburgo e vendeu-a, depois do casamento, a Charles. Determine qual a lei reguladora do
regime de bens deste casamento admitindo que:
• os órgãos aplicadores do Direito competentes são os portugueses;

• quer no ordenamento jurídico francês quer no luxemburguês vigora a


Convenção da Haia de 1978 sobre a lei aplicável ao regime de bens do casal;

• de acordo com as normas de conflitos previstas nesta Convenção, a lei aplicável


para regular o regime de bens do casal será a do país onde os imóveis do casal
se encontrarem, desde que os cônjuges assim o acordem. Alain e Beatrice
celebraram, aquando do casamento, um tal acordo, determinando que, no que
respeitasse às questões suscitadas pelos imóveis próprios ou comuns sitos no
Luxemburgo, seria aplicável ao regime de bens a lei luxemburguesa;

• no âmbito da referida Convenção da Haia de 1978, é excluído o reenvio,


praticando-se, pois, referência material.

Aplica-se o Regulamento 2016/1103 (regimes matrimoniais) desde 2019: art. 26.º/1/a – aplica-
se a lei da primeira RH dos cônjuges após a celebração do casamento. Suponha-se que é
Portugal. Nos termos do art. 32.º, está excluído o reenvio. Assim, Lpt aplicaria Lpt.

Se não se aplicasse o Regulamento:

Art. 53.º + 31.º/1 CC:

L1 pt  L2 nac: Fr (RM)  L3 LRS: Lux (RM)  L3

L2 aplica L3, que se aplica a si própria. Logo, 17.º/1 está verificado.

Porém, o 17.º/2 também está verificado, pelo que o reenvio cessaria. Todavia, o n.º 3 vem
permitir o reenvio, pois estamos perante relações patrimoniais entre os cônjuges e a Lnac aplica
a LRS e esta considera-se competente.

Caso 20
Determine a lei aplicável à sucessão de um súbdito do Reino Unido residente em Londres até
1993, data em que mudou a sua residência para Roma, cujo património, à data da morte (em
2014), era constituído por um imóvel situado na França, supondo que:
• o Reino Unido tem um ordenamento jurídico complexo e não dispõe de Direito
interlocal unificado, nem de Direito Internacional Privado unificado;

• as normas de conflitos (de fonte interna) francesas e inglesas sujeitam a sucessão


imobiliária à lei do lugar da situação da coisa;
• a norma de conflitos (de fonte interna) italiana sujeita a sucessão à lei da nacionalidade
do de cujus no momento da sua morte;

• os tribunais franceses praticariam devolução simples;

• os tribunais ingleses praticam dupla devolução;

• os tribunais italianos praticariam referência material.

Não se aplica o Regulamento 650/2012.


Aplica-se o art. 62.º CC:
L1 pt  L2 nac: RU (art. 20.º/2: Inglaterra, não Roma - divergência) DD  L3 LRS: Fr DS 
L3 LRS
L3 aplica L3, logo, L2 aplica L3.

O art. 17.º/1 está verificado, havendo reenvio. Quanto ao 17.º/2:


LRH Itália RM  Lnac RU (Ing.)
Logo, a lei da RH aplica a lei da Nacionalidade. Assim, o reenvio estaria impedido.
17.º/3 vem permitir o reenvio: sucessão + LRS aplica-se.

L1 aplica L3.

Sub-hipótese: E se o britânico tivesse falecido em 2016?

Aplicação do RRIV.
Art. 21: L1 pt  L2 RH Itália
Não se aplica o art. 34.º, logo, não há reenvio, pois a L2 pertence a um EM.

Caso 21

Carlos, nacional suíço com última residência habitual no Estado da Luisiana (EUA), falece em
15 de setembro de 2015, deixando bens imóveis no Brasil. Determine qual a lei reguladora da
sucessão imobiliária, considerando que:
• os tribunais portugueses são internacionalmente competentes;

• o Direito de conflitos suíço determina que a lei reguladora da sucessão


imobiliária é a do último domicílio do autor da sucessão e pratica o sistema de
devolução simples;

• os EUA não dispõem de Direito Internacional Privado e de Direito interlocal


unificados;

• o Direito de conflitos do Luisiana determina que a lei reguladora da sucessão


imobiliária é a lex rei sitae e pratica o sistema de devolução dupla;

• o Direito de conflitos brasileiro regula a sucessão pela lei da última residência


habitual do de cujus e estabelece que a remissão feita pelas suas normas de
conflitos a ordenamentos estrangeiros abrange apenas as normas de Direito
material destes;

• no Direito brasileiro, quando a norma de conflitos remeta, sem ser em razão da


nacionalidade, para ordenamentos complexos, o elemento de conexão da norma
de conflitos brasileira define não só o ordenamento soberano como o
ordenamento jurídico local.

Aplica-se o RRIV (art. 84.º - desde agosto de 2015, um mês antes da morte de C).
Art. 21.º manda aplicar a lei da RH ao momento do óbito: EUA. Os EUA são OJ complexo,
pelo que aplicamos o art. 36.º/2/a do RR: releva a específica unidade territorial em que o
interessado tinha residência habitual no momento do óbito (Luisiana).

Logo: L1 (pt)  L2 (RH: Luisiana)

Aplica-se o reenvio (art. 34.º)? Há reenvio quando a remissão do Regulamento seja para lei
de Estado terceiro (é o caso) e esta remeta para lei que se considere competente. Vejamos:

L1 (pt)  L2 (RH: Luisiana) (DD)  L3 (LRS: Br) (RM)  L2 (RH: Luisiana)

L3 aplica L2 e L2 também aplica, portanto, L2. Logo, não há reenvio. Aplica-se a regra
geral da referência material:

L1 (pt) aplica L2 (Luisiana).

Caso 22 (retorno)
Andrea e Berta são dois nacionais romenos que se casaram na França e fixaram residência
habitual comum em Portugal. Determine qual a lei reguladora dos efeitos pessoais do
casamento, considerando que:
• os tribunais portugueses são internacionalmente competentes;

• a norma de conflitos francesa determina que a lei aplicável aos efeitos pessoais
do casamento é a lei da nacionalidade comum dos cônjuges;

• a norma de conflitos romena determina que a lei aplicável aos efeitos pessoais
do casamento é a lei da residência habitual comum dos cônjuges;

• os Direitos de conflitos francês e romeno adotam o sistema de devolução


simples.

Qualificação: efeitos pessoais = relações entre os cônjuges.

Não se aplica a “convenção concernente aos conflitos de leis relativos aos efeitos do
casamento sobre os direitos e deveres dos cônjuges nas suas relações pessoais e sobre os
bens dos cônjuges”, pois, apesar de ter sido celebrada precisamente por Portugal, Itália e
Roménia, não foi idoneamente ratificada (art. 8.º/2 CRP) e é inconstitucional.

Logo: Art. 52.º CC remete para a lei nacional comum: L1 (pt)  L2 (nac: Roménia)

L1  L2 (nac: rom) (DS)  L1 (RHC: Pt)  L2 (nac: rom)

• Assim: L2 aplica L2

• L1 aplica L2, por via de RM (art. 16.º CC), visto o 18.º/1 não se aplicar, pois a lei
romena aplica-se a si própria, apesar de remeter para a lei portuguesa, uma vez que
adota um sistema de DS.

Caso 23
Anthony, cidadão dos EUA residente habitualmente em Itália (tendo anteriormente vivido no
Estado de Nova Iorque), pretende casar-se em Lisboa. Diga qual a lei que o conservador do
registo civil deve aplicar à capacidade matrimonial de Anthony, considerando que:
• os EUA não têm Direito interlocal e Direito Internacional Privado unificados;

• o Direito de conflitos nova iorquino regula a questão pela lex loci celebrationis,
considerando, no caso concreto, que a sua norma de conflitos remete, única e
exclusivamente, para as normas de Direito material de ordenamentos jurídicos
estrangeiros;
• o Direito de conflitos italiano regula a capacidade matrimonial pela lei da
nacionalidade do nubente; no caso concreto, pratica o sistema de referência
material; e, na falta de Direito interlocal ou Direito Internacional Privado
unificados, entende-se a remissão para um ordenamento jurídico complexo
como sendo feita para o ordenamento jurídico local que possui a conexão mais
estreita.

cidadão dos EUA residente habitualmente em Itália (tendo anteriormente vivido no Estado de
Nova Iorque), pretende casar-se em Lisboa. qual a lei que o conservador do registo civil deve
aplicar à capacidade matrimonial de Anthony?

Art. 49.º + 31.º CC – lei da nacionalidade

L1 pt  L2 (nac: EUA  art. 20.º/2 CC: LRH – itália ou NY? NY – conexão mais estreita) RM
 L1 (LLC: PT)

Art. 18.º/1: sim. L1 aplicaria L1.

Art. 18.º/2: estatuto pessoal + direito italiano (RH) aplica a Lpt?

Litaliana RM  Lnac (NY)

Logo, 18.º/2 não está verificado, pelo que não se aceita o retorno. L1 aplica L2 (NY).

Caso 24
Discute-se perante tribunais portugueses a capacidade matrimonial de Alberto, cidadão
argentino com domicílio em Portugal. Alberto casou-se no Paraguai. Determine qual a lei
reguladora da capacidade para contrair casamento, considerando que:
• a regra de conflitos argentina estabelece que a capacidade para contrair
casamento é regulada pela lei do lugar da celebração do casamento;

• a regra de conflitos paraguaia regula a questão pela lei do domicílio do nubente


e considera Alberto domiciliado em Portugal;

• os Direitos de conflitos argentino e paraguaio praticam, no caso, o sistema de


devolução simples;

• segundo o Direito material argentino, Alberto não teria capacidade para se


casar;

• segundo o Direito material português, não existiriam quaisquer impedimentos


ao casamento.

capacidade matrimonial de Alberto, cidadão argentino com domicílio em Portugal. Alberto


casou-se no Paraguai.

• Art. 49.º + 31.º: L1 pt  L2 (Nac: Argentina) DS  L3 (LLC: Paraguai) DS 


L1 (RH: PT)  L2 (nac: arg)

• L2 aplica L1, L3 aplica L2.

• L1 aplica que lei, há retorno indireto? FC exclui à partida o retorno indireto.


LLP não: 18.º/1 e 18.º/2 estão verificados, pelo que se aceita o retorno. Não se
aplica o 19.º, que impediria o retorno, pois Alberto tem capacidade à luz do
Direito material português.
Caso 25

Em 1998, A, súbdito do Reino Unido residente em Londres, fez, em Londres, um testamento no


qual deixou à sua amiga B uma casa situada em Sintra. Em 2009, data da sua morte, o
património de A era somente constituído por este bem. C, único filho de A, vem requerer,
perante os tribunais portugueses, a redução por inoficiosidade do testamento por ofender a sua
legítima. Aprecie a procedência do pedido de C, admitindo que:

• no Reino Unido vigora um ordenamento jurídico complexo e não existe Direito


interlocal unificado nem Direito Internacional Privado unificado;

• as normas de conflitos inglesas sujeitam a sucessão imobiliária à lei do lugar da


situação do imóvel;

• o Direito Internacional Privado inglês consagra a teoria da dupla devolução.

• (Diz-se no sumário do ac. da Relação de Évora de 28 de Outubro de 1993, CJ, tomo V,


1993, p. 276: “I - Remetendo a lei portuguesa, em caso de sucessão de inglês falecido
em Portugal, para a lei nacional deste, esta remissão é para o respectivo direito material
e não para as suas normas de conflitos. II - O direito dos filhos à legítima não é um
princípio de ordem pública internacional do direito português.”)

Lei aplicável às sucessões: art. 62.º + 31.º. L1 pt  L2 (nac: RU  art. 20.º/2: Inglaterra) DD
 L1 (LRS: PT)

Há retorno? A lei inglesa, por dupla devolução, aplicará a lei que a lei portuguesa aplicar, só
aplicando a lei portuguesa se ela se aplicar a si própria. Para LLP a questão acabaria aqui: não
se aceitaria o retorno, mas sim a regra geral do art. 16.º (já para BM, seria de aceitar o retorno).

Se considerássemos ser de aceitar o retorno por via do 18.º, seria ainda de o impedir por via do
art. 19.º, visto que a lei portuguesa não permitiria a validade do testamento?

- 1.º: não permitiria a validade do testamento, mas permitiria o estado de sucessível…

- 2.º: FC, BM e DMV defendem uma interpretação restritiva do art. 19.º de modo a
limitar o seu alcance às situações já constituídas e não à sua constituição em Portugal
com a intervenção de uma autoridade pública, e desde que a situação esteja em contacto
com a OJpt ao tempo da sua constituição (só neste caso poderiam os interessados ter
confiado na válida constituição da situação segundo a lei designada pela nossa NC).

- LLP discorda: o que os outros AA defendem acaba por ser uma redução teleológica, que
teria de ser justificada à luz do fim da norma ou outros princípios ou valores do sistema
de Direito de Conflitos. Segundo LLP, o legislador quis dar primazia ao princípio do
favor negotii relativamente à harmonia internacional, para além de que a posição
daqueles AA parece pressupor que os indivíduos se podem guiar pelas normas de
conflitos mas não pelas normas sobre devolução.

- Mas novamente: a lei prefere a validade do testamento ou a legitimidade dos


estados? Parece que dependerá do caso; aqui, releva a sucessão testamentária,
pelo que parece que a situação relevante seria o testamento (não está em causa,
por exemplo, a matéria da capacidade para herdar).

- Em ambos os casos, como a situação (testamento) já está constituída e como há ligação


com a OJpt (LRS), aplicar-se-ia o art. 19.º e não haveria retorno.

- 3.º: de qualquer modo, estamos perante uma questão de reserva de OPI? Há que apreciar
a aplicabilidade do art. 22.º CC, à luz dos seus requisitos.
Sub-hipótese: E se o britânico tivesse falecido em 2016?

• Aplicação do RRIV. Artigo 21.º/1.

• Lpt  LRH (LRU  Ling: 36.º/2/a – unidade territorial da RH ao tempo da morte:


Inglaterra) DD  Lpt.

• A referência seria material, enquanto a Inglaterra fosse EM? Assim, a Lpt aplicaria a
Ling. LLP considera que não, que por “Estado terceiro” (art. 34.º) se deve entender
Estado terceiro ao Regulamento, e não apenas à UE. Assim, não sendo o RU parte do
RRIV (considerando 82), poder-se-ia aplicar o art. 34.º: como a Ling remete para um
EM (Pt), este nem teria de se considerar aplicável a si próprio. Logo, Lpt aplicaria Lpt.

• Mesma resposta agora que Inglaterra não é EM.

Caso 26
André, brasileiro com residência habitual em Lisboa, pretende casar-se em Portugal.
O Direito brasileiro sujeita a capacidade matrimonial à lei do domicílio, praticando
referência material. Segundo o Direito português, André não tem capacidade para se
casar. Mas tem capacidade à luz do Direito brasileiro. Qual a lei aplicável?
• brasileiro com residência habitual em Lisboa, pretende casar-se em Portugal.
Segundo o Direito português, André não tem capacidade para se casar. Mas
tem capacidade à luz do Direito brasileiro.
• 49.º+31.º CC: L1 (PT)  L2 (Nac: Br) RM  L1 (RH: PT)
• Arts. 18.º/1 e 2: aplicam-se. Haveria retorno.
• E o art. 19.º/1? Depende. Se sim, não há retorno. L1 aplica L2.
• 2.º: FC, BM e DMV defendem uma interpretação restritiva do art. 19.º de modo a
limitar o seu alcance às situações já constituídas e não à sua constituição em Portugal
com a intervenção de uma autoridade pública, e desde que a situação esteja em contacto
com a OJpt ao tempo da sua constituição (só neste caso poderiam os interessados ter
confiado na válida constituição da situação segundo a lei designada pela nossa NC).

• LLP discorda: o que os outros AA defendem acaba por ser uma redução teleológica, que
teria de ser justificada à luz do fim da norma ou outros princípios ou valores do sistema
de Direito de Conflitos. Segundo LLP, o legislador quis dar primazia ao princípio do
favor negotii relativamente à harmonia internacional, para além de que a posição
daqueles AA parece pressupor que os indivíduos se podem guiar pelas normas de
conflitos mas não pelas normas sobre devolução.

Caso 27
A, britânico domiciliado no Brasil (mas tendo vivido anteriormente em Londres),
faleceu em 2014, deixando todos os seus bens (móveis), por testamento feito na
Inglaterra, a favor de instituições brasileiras. Os filhos requerem, em Portugal, a
redução por inoficiosidade do testamento, invocando a violação do seu direito à
legítima. Os Direitos inglês e brasileiro remetem para a lei do domicílio do autor da
sucessão. Os tribunais ingleses praticam, no caso, o sistema da dupla devolução e no
Brasil entende-se a remissão para leis estrangeiras como sendo de referência
material. Segundo o Direito material inglês, a deixa testamentária era válida;
segundo o Direito material brasileiro, era inválida. Quid iuris?
• britânico domiciliado no Brasil (mas tendo vivido anteriormente em
Londres), faleceu em 2014, deixando todos os seus bens (móveis), por
testamento feito na Inglaterra, a favor de instituições brasileiras. Os filhos
requerem, em Portugal, a redução por inoficiosidade do testamento. Segundo
o Direito material inglês, a deixa testamentária era válida; segundo o Direito
material brasileiro, era inválida. L1 (Pt – 62.º+31.º CC)  L2 (nac: RU 
20.º/2: Inglaterra) DD  L3 (RH: Br) RM  L3 (Br)
• Há reenvio para a L3 (brasileira)? 17.º/1: sim. 17.º/2: não se aplica. Logo,
haveria reenvio. Contudo, aplica-se o 19.º/1? Sim. Logo, aplicar-se-ia a lei
inglesa.
• A menos que se aplicasse a reserva de OPI (22.º) – quais as consequências?

Caso 28
A, britânico com residência habitual em Londres, faleceu em 2016, sendo a sua
herança composta por bens imóveis situados na França. Admitindo-se que:
• as normas de conflitos inglesas sujeitam a sucessão imobiliária à lei do lugar
da situação da coisa;
• os tribunais ingleses praticam dupla devolução;
qual a lei aplicável à sucessão?

RRIV (21.º/1): L1 pt  L2 (RH: RU – 36.º/2/a: Inglaterra) DD  L3 (LRS: França)


(RRIV)  LRH (L inglesa)  Lfr.

L2 aplica a lei que L3 aplicar: Lfr aplica Lfr (se aplicar o art. 34.º do RRIV). Logo,
Lei inglesa (L2) aplicaria lei francesa (L3).
Aplica-se a lei inglesa ou o art. 34.º (e assim a francesa)?

Em 2016, o RU era ainda EM mas não era signatário do RRIV. Segundo LLP, seria
considerado Estado terceiro para os efeitos do art. 34.º do RRIV. Assim, aplicava-se
o 34.º e a lei portuguesa aplicaria a lei francesa? Segundo LLP e EDO, para a alínea
a) se verificar dever-se-á apenas aplicar as normas de conflitos (e não o sistema de
devolução) da L2, ficcionando-se que esta remete para L3 por referência material. O
mesmo não se aplica quanto à al. b).
Mesmo que não se aplicasse: artigo 30.º.

Sub-hipótese
E se todos os imóveis do património de A estivessem situados na República da
Irlanda, cujo Direito Internacional Privado sujeita a sucessão imobiliária à lei do
lugar da situação da coisa, com dupla devolução?
• Considerando 82: Irlanda não participa do RRIV.
• RRIV: L1pt  L2RH (LRU  Ling – 36.º) (DD)  L3 LRS (LIrl) (DD) 
L3 LRS (LIrl).
• Aplicando o art. 34.º RRIV, se se considerar que o RU é Estado terceiro face
ao regulamento e que isso desencadeia os efeitos da norma, então aplica-se a
LIrl, pois é Estado terceiro que se considera a si próprio competente (al. b)).
• Se não, há referência material, aplicando-se simplesmente a LIng.

Caso 29
Bernardo, nacional português residente na Inglaterra (Reino Unido), faleceu em 10
de novembro de 2016 tendo como bens sucessórios um imóvel situado em Portugal e
um imóvel situado no Quebeque (Canadá). Discute-se hoje, perante tribunais
portugueses, a sua sucessão imobiliária.
Determine qual a lei reguladora da sucessão imobiliária de Bernardo, considerando
que:
• os tribunais portugueses são internacionalmente competentes;
• no Reino Unido e no Canadá não existe Direito interlocal unificado
nem Direito Internacional Privado unificado;
• o Direito de conflitos inglês pratica o sistema da foreign court theory
e regula a sucessão imobiliária pela lex rei sitae;
• o Direito de conflitos do Quebeque pratica o sistema da referência
material e regula a sucessão imobiliária pela lex rei sitae.

Bernardo, nacional português residente na Inglaterra (Reino Unido), faleceu em 10


de novembro de 2016 tendo como bens sucessórios um imóvel situado em Portugal e
um imóvel situado no Quebeque (Canadá).
• RRIV (21.º) – L1  L2 (RH: Inglaterra – 36.º/2/a) DD  (34.º/1/a) LRS (L1
– PT)  34.º/1/a
• RRIV (21.º) – L1  L2 (RH: Ing – 36.º/2/a) DD  (34.º/1/b) L3 LRS
(Canadá – Quebeque - 36.º/2/c) RM  LRS (L3) - 34.º/1/b
• Artigos 21.º e 23.º, Considerando 37, próprio art. 34.º (“ou”) – é de aceitar o
dépeçage e aplicar a lei portuguesa ao imóvel aqui situado e a lei do
Quebeque ao imóvel aí situado? (princípio do tratamento unitário da sucessão
– discutir)
Fraude à lei

Caso 30

António, português, quer privar da legítima Bruno, seu filho, para deixar todos os
seus bens a Carla, sua segunda mulher. Com vista a obter este resultado, António
adquire a nacionalidade do Reino Unido e dispõe a favor de Carla, ao abrigo do
Direito inglês, dos bens imóveis que se situam em Portugal e que integram toda a
sua herança.
Todavia, António continuou a viver em Portugal e a comportar-se como português.
Atendendo a que:
a) António faleceu a 30 de maio de 2015;
b) Os tribunais portugueses são internacionalmente competentes
c) O Reino Unido não contém normas de Direito Internacional Privado ou de
Direito Interlocal unificados;
d) A lei inglesa remete para a lex rei sitae;
e) Os tribunais ingleses praticam a dupla devolução;

Determine qual a lei aplicável à situação em análise.

RRIV – não se aplica.


Art. 62.º+31.º/1: aplicação da lei nacional à sucessão.
Caso de dupla nacionalidade: art. 27.º LN – aplicação da lei portuguesa.
Requisitos da fraude à lei: intenção fraudulenta existe; sucesso? Não. Pois aplica-se
a lei portuguesa na mesma. Não se aplica o art. 21.º CC

Sub-hipótese 1
Quid juris se António tivesse renunciado à nacionalidade portuguesa?
Aí, já não se poderia aplicar o art. 27.º LN. Aplicar-se-ia o art. 21.º CC: haveria
fraude à lei e a consequência seria a aplicação do direito português.

Sub-hipótese 2
Quid juris se António tivesse renunciado à nacionalidade portuguesa e, depois disso,
passado a fazer a sua vida em Londres?
Neste caso, a fraude à lei sanar-se-ia e aplicar-se-ia a lei inglesa. Exceto, claro, por
motivo de ROPI (22.º CC).

Sub-hipótese 3
Resolva agora a hipótese principal, supondo que António faleceu em 2018 e o
testamento tivesse sido redigido em 2016, contendo uma disposição expressa de
escolha de lei inglesa.
Aplicação RRIV.
Poderia escolher a lei inglesa nos termos do art. 22.º.
O RRIV não prevê a hipótese de fraude à lei.
Contudo, tem duas disposições chave: arts. 30.º e 35.º (ROPI). Muito importante
também é o considerando 26, que permite a aplicação do art. 21.º CC.

• Como distinguir os institutos da reserva de ordem pública internacional e da


proibição de fraude à lei? Na OPI está em causa a compatibilidade do
resultado a que conduz a aplicação da lei estrangeira com a justiça material
da OJ do foro; na fraude à lei está em causa o afastamento da lei
normalmente competente e o desrespeito da norma imperativa nela contida,
ainda que o Direito do foro não tenha norma equivalente.
• Quais os tipos de fraude à lei?
• Manipulação do elemento de conexão
• Exemplo: quando a lei de Malta não admitia o divórcio, dois
malteses residentes em Portugal que pretendiam divorciar-se,
naturalizam-se portugueses, embora não se integrem na nossa
sociedade.
• Internacionalização fictícia de uma situação interna: para afastar o
Direito material vigente na OJpt, que é o exclusivamente aplicável a
uma situação interna, estabelece-se uma conexão com um Estado
estrangeiro, por forma a desencadear a aplicação desse Direito.
• Exemplo: dois portugueses residentes em Portugal pretendem
fugir aos limites fixados pela lei portuguesa à taxa de juros do
mútuo, pelo que celebram um contrato interno em Badajoz e
escolhem a lei espanhola para reger o contrato.
• Quais são os elementos da fraude?
• Elemento objetivo – manipulação com êxito do EC (o que exige uma
manobra contra a lei normalmente aplicável  exige-se que na lei
normalmente competente exista uma norma imperativa que seja objeto
da fraude e exige-se que a manipulação tenha êxito, no sentido de
desencadear o chamamento de uma lei diferente) ou na
internacionalização fictícia de uma situação interna.
• Elemento subjetivo/volitivo – vontade de afastar a aplicação de uma
norma imperativa que seria normalmente aplicável. É necessário dolo
(=/= negligência). O dolo incide sobre a modelação do conteúdo
concreto do elemento de conexão ou sobre a internacionalização
fictícia da situação interna. Este elemento tem de ser inferido dos
factos, com base em juízos de probabilidade fundados em regras de
experiência.
• Refira algumas medidas preventivas da fraude.
• 33.º/1 CC (lei pessoal de pessoa coletiva) – sede principal e efetiva da
administração da pessoa coletiva (=/= sede fictícia, e.g., “caixas de
correio”)
• Certos casos de imobilização do elemento de conexão em que se fixa
definitivamente o momento da sua concretização (exemplo: 55.º/2
CC)
• Art. 28.º LN
• Qual a sanção da fraude à lei? Quais as posições possíveis de seguir?
• Jurisprudência francesa + Fernando Olavo – princípio fraus omnia
corrumpit [todos os atos integrados no processo fraudulento,
incluindo, p.ex., a própria naturalização obtida no estrangeiro, são
nulos ou para todos os efeitos inoperantes]
• O Estado do foro não pode declarar inválida a aquisição de
nacionalidade estrangeira. O que o Direito de Conflitos pode fazer é
recusar a essa naturalização qualquer efeito na aplicação da norma de
conflitos  21.º CC: a sanção consiste em aplicar a lei
normalmente competente.
• Isto não significa que os atos praticados sejam irrelevantes, só a
manipulação ou internacionalização. Ou seja, se um português se
naturaliza no RU para afastar as normas sobre sucessão
legitimária e faz testamento onde deixa todos os bens a um amigo,
o testamento não é irrelevante, a naturalização é que é (e apenas o
é para efeitos da aplicação da norma de conflitos em causa).
• Quid iuris quanto à sanção da fraude à lei estrangeira?
• FC + BM: não diferenciam a sanção da fraude à lei do foro
e a sanção da fraude à lei estrangeira.
• IMC: a fraude à lei estrangeira só é sancionada em dois
casos: (i) se a lei estrangeira defraudada também sanciona
a fraude; ou (ii) se, na perspetiva do DIPrivado do foro,
estiver em causa um princípio mínimo ético nas relações
internacionais, que não se conforma com o desrespeito da
proibição contida na lei normalmente competente (aqui, a
sanção da fraude relacionar-se-ia com a reserva de OPI)
[LLP concorda que quando a fraude à lei estrangeira não
seja por esta sancionada, deverá ainda ser,
excecionalmente, sancionada pelo DIPpt quando seja
eticamente intolerável à face do Direito de Conflitos
português] a favor desta diferenciação pesa a harmonia
internacional de soluções: se não atendermos à posição da lei
estrangeira defraudada podemos arriscarmo-nos a sancionar
uma fraude que esta lei não sanciona.

Segundo FC, BM, a norma de conflitos é o objeto da fraude. Segundo LLP, a


fraude visa afastar uma norma material, utilizando a norma de conflitos como
um instrumento. A norma de conflitos, portanto, não é objeto de fraude no
sentido de ser afastada pela manobra defraudatória, mas é objeto de fraude no
sentido em que há uma atuação sobre esta norma que conduz à frustração das
suas finalidades. A instrumentalização da norma de conflitos põe em causa a justiça
da conexão que ela veicula . Assim, para LLP, a fraude à lei em Direito de
Conflitos pressupõe que haja uma norma material defraudada mas tutela a
justiça da conexão e não a justiça material.

Não haverá, também, fraude à lei, nomeadamente, se a conduta fraudulenta consistir


na mudança de nacionalidade e o naturalizado se integrar seriamente na sua nova
comunidade (FC + LLP)  rectius: inicialmente há fraude à lei, mas esta acaba
sendo sanada.

Reserva de ordem pública internacional

 Quais são os requisitos de aplicação do art. 22.º do Código Civil? Violação


de princípios fundamentais portugueses + proximidade com o Estado
português. Características: relatividade temporal, relatividade espacial,
excecionalidade e a posteriori. E é concreto: o que releva não é o conteúdo da
norma estrangeira em si, mas antes se esta conduz, no caso concreto, a uma
ofensa de princípios fundamentais do Estado português.
 Quais são as consequências da aplicação daquele artigo? Art. 22.º/2 CC
(dizer que há quem defenda – DMV – que se deve procurar ainda conexão
subsidiária antes de aplicar o direito português).
Caso 38 – Obrigações contratuais
Em 30 de Janeiro de 2013, ABM, sociedade comercial com sede no Texas (EUA),
vendeu à BoaBase, sociedade comercial com sede em Portugal, 10 computadores. O
contrato foi celebrado em Portugal e os computadores foram entregues em Portugal.
No contrato, as partes incluíram a seguinte cláusula: “É aplicável ao contrato a lei
brasileira”. Qual a lei aplicável à questão, admitindo que a questão é colocada
perante os tribunais portugueses?

Aplica-se o RRI (âmbito temporal: arts. 28.º e 29.º; espacial: 1.º/1 in fine; territorial:
foro em Pt – 1.º/4 “os EM aos quais se aplica o Regulamento”; material: 1.º/1 e 2).
Para verificar se a escolha de lei é válida, devemos atentar sobre o art. 3.º -
nomeadamente, o n.º 5, que remete para os arts. 10.º, 11.º e 13.º, determinando o art.
10.º que se aplica a essa questão a lei que se aplicaria se a escolha fosse válida, ou
seja, a lei brasileira.
Quanto à lei aplicável ao contrato, a escolha foi expressa (embora nos termos do art.
3.º/1 pudesse também “resultar de forma clara das disposições do contrato ou das
circunstâncias do caso”. Não se aplicam os n.ºs 3 e 4 do art. 3.º (nem o art. 3.º/2,
claro). Assim, a escolha é em princípio de aceitar. L1 pt aplica L2 br.
O art. 2.º demonstra que nada obsta à aplicação da lei de um Estado terceiro.
Ver ainda arts. 12.º, 9.º e 21.º.
Nota: no caso, não sabemos qual o litígio.
Sub-hipóteses (as sub-hipóteses são totalmente independentes entre si, exceto se
expressamente disserem o contrário)
1. Imagine que as partes não tinham escolhido a lei aplicável. Qual é a lei
reguladora do contrato? Não se aplicando os arts. 3.º, 5.º, 6.º, 7.º, 8.º, aplica-
se o art. 4.º. Nos termos do n.º 1, al. a), sendo o contrato de compra e venda
de mercadorias, seria aplicável a lei do país em que o vendedor tem a sua RH
[RH da ABM é onde? Ver arts. 19.º/1 (administração central) +22.º/1
(designação direta) + 20.º (referência material)]: lei texana. Contudo, como
os demais elementos (celebração do contrato, RH do comprador, execução do
contrato) se situam em Portugal, é defensável a aplicação do art. 4.º/3 do
RRI, aplicando-se a lei portuguesa. Ainda que assim não seja: arts. 9.º/2 e 3 +
21.º.
2. Imagine que, nos termos do contrato celebrado, a ABM se obrigava a
entregar à BoaBase, para gozo temporário desta, 10 computadores, bem como
a prestar serviços de manutenção in site dos referidos computadores,
mediante o pagamento de uma renda mensal pela BoaBase . Os computadores
e os serviços de manutenção deviam ser entregues e prestados em Portugal.
As partes não escolheram a lei aplicável. Qual é a lei reguladora do contrato?
O contrato é misto, na medida em que corresponde cumulativamente a uma
prestação de serviços e a um aluguer de coisa móvel. Assim, não se
aplicando o art. 3.º, nem o 5.º, 6.º ou 7.º ou 8.º, ter-se-á que aplicar o art. 4.º.
A prestação de serviços insere-se na al. b) do n.º 1, mas o aluguer não consta
do número 1. Assim, aplica-se o art. 4.º/4? Não necessariamente, parece que
a ratio do artigo parece admitir que se aplique o 4.º/2 (apesar de não se inserir
literalmente no âmbito desta norma). O 4.º/4 apenas se aplica se o contrato
for totalmente atípico, ou seja, nEstão preencha nenhuma das alíneas em
causa. Assim, aplicamos o 4.º/2, que remete para a lei da RH do prestador da
prestação característica (ver considerando 19). O art. 4.º/1/b já nos diz qual a
prestação característica da parcela relativa à prestação de serviços: é esta
mesma, sendo portanto relevante a RH do prestador. Quando ao aluguer,
também assim será. Logo, aplica-se a lei da RH da ABM, ou seja, a lei texana
(arts. 19.º+22.º+20.º). Contudo, considerando que os demais elementos
apontam para Portugal, é defensável a aplicação do art. 4.º/3 (considerandos
16 e 20): conexão mais estreita (aplicação da lei portuguesa).
3. Imagine que, nos termos do contrato celebrado, a ABM se obrigava a
entregar os 10 computadores à BoaBase e a BoaBase se obrigava a entregar à
ABM 20 smartphones. Os computadores e os smartphones foram entregues
na Espanha. As partes não escolheram a lei aplicável. Qual é a lei reguladora
do contrato? Neste caso, temos um contrato de permuta. Não cabe em
nenhuma alínea do n.º 1 do art. 4.º e também não se aplica o n.º 2, pois não é
possível concretizar o elemento de conexão (não há prestação característica –
considerando 19 não resolve). Logo, aplica-se o 4.º/4: cláusula de exceção de
conexão mais estreita (considerando 21). Aplica-se a lei espanhola (execução
do contrato) ou a portuguesa (celebração do contrato). Em princípio, será
aplicável a lei espanhola.

Regulamento de Roma I

Em 3 abril de 2021, a sociedade comercial Caixas & Caixas, Lda., com sede em Lisboa,
decidiu divulgar a sua atividade – que consiste na venda de caixas decorativas em madeira – na
Internet e lançou um site, em língua portuguesa, com informações acerca da localização da sua
sede e contactos (todos em Lisboa), dos seus produtos e respetivos preços, bem como dos custos
de envio para Portugal e para Espanha, tudo fixado em euros.
Blanche, francesa, a residir habitualmente em França, acedeu ao site da Caixas &
Caixas, Lda. e encomendou uma caixa para colocar no seu quarto. Não tendo recebido a caixa
nem o reembolso do preço pago no prazo de 60 dias, Blanche alega a aplicação da lei material
portuguesa ao caso, com vista a receber o valor pago em dobro. Já a Caixas & Caixas, Lda.
alega ser aplicável a lei material francesa.
Admitindo que:
a) Os tribunais estaduais portugueses são internacionalmente competentes;
b) Blanche e a Caixas & Caixas não escolheram a lei que rege o contrato;
determine, fundamentadamente, qual a lei que deve reger este contrato.

RRI – aplicável (âmbitos de aplicação).


Aplicação do art. 6.º:
 Há um comerciante – Caixas & Caixas agiu no âmbito da sua atividade comercial;
 Há um consumidor – Blanche compra a caixa para colocar no seu quarto, não no seu
negócio;
 Logo, o n.º 1 está verificado;
 É necessário verificar ainda se a alínea a) ou a alínea b) se aplicam:
o Al. a) – não está verificada – a empresa não exerce a sua atividade em França;
o Al b.) – a empresa dirige a sua atividade para França (RH de Blanche) e o
contrato foi celebrado no âmbito dessa atividade? Necessário ver o
considerando 24: “atividade dirigida” não existe somente pelo facto de um
website ser acessível no Estado da RH do consumidor, é preciso que esse
website convide à celebração de contratos à distância e que tenha sido
efetivamente celebrado um contrato à distância por qualquer meio (website,
email, telefone, correspondência, fax, etc.). A língua e a moeda não são
elementos suficientes (ou seja, o website até podia estar em francês, que tal não
relevaria). Por exemplo, se um website convida à contratação para o Estado da
RH do consumidor mas o contrato é celebrado presencialmente, não se aplica a
alínea. Ou se o website está disponível mas não tem um botão ou informações
para a contratação e acaba por ser celebrado presencialmente, também não. No
presente caso, o website convida à contratação, mas não dirige a atividade para
França no âmbito do mesmo. Logo, não se aplica a al. b).
 Não se aplica o art. 6.º.
 Aplica-se o art. 4.º/1/a: aplica-se a lei da RH do vendedor, ou seja, da Caixas & Caixas.
Nos termos do art. 19.º/1, esta será em Portugal.
 Aplica-se a lei portuguesa e a Caixas e Caixas terá de pagar o valor em dobro (art. 9.º-
B, n.º 8, da Lei da Defesa do Consumidor).

Regulamento de Roma II (responsabilidade civil extracontratual)

Em meados de julho de 2016, Jeffree, cidadão inglês com residência habitual em


Inglaterra, encontrava-se de férias em Portugal. Uma noite, esquecendo-se que em Portugal
deveria conduzir pela direita, Jeffree conduzia pela faixa da esquerda quando embateu
frontalmente contra um automóvel que seguia em conformidade com as normas portuguesas.
Este automóvel era conduzido por Bernardo, cidadão português com residência habitual em
Portugal. Ambos os veículos ficaram danificados e viriam a ter de ser substituídos, sendo que o
de Bernardo valia três vezes mais do que o de Jeffree.
Na semana seguinte, celebraram um pacto de jurisdição a favor de tribunal português para
o caso de qualquer disputa relacionada com o acidente vir a surgir e estipularam que a lei
aplicável às obrigações extracontratuais potencialmente originadas pelo acidente seria a lei
inglesa.
Quer a integridade física de Bernardo, quer a de Jeffree ficaram intactas e, na verdade,
Bernardo e Jeffree tornaram-se amigos, motivo pelo qual cada um suportou os custos com o
respetivo veículo. Porém, em janeiro de 2021, cortaram laços e Bernardo instaurou ação no
tribunal eleito pelas partes, requerendo indemnização pelos danos patrimoniais que sofreu em
2016.
Jeffree contesta, com base em dois fundamentos: (i) o direito de Bernardo a receber
qualquer indemnização já prescreveu, nos termos da lei portuguesa, que Jeffree considera
aplicável à matéria da prescrição do direito; (ii) em qualquer caso, nunca seria responsabilizado,
pois considera que, ao ter tirado a carta de condução em Inglaterra, é ao Código da Estrada
inglês que está vinculado.

Admitindo que:
a) o tribunal português é internacionalmente competente, nos termos do art. 25.º/1 do
Regulamento 1215/2012;
b) no Direito português (art. 498.º do Código Civil), as obrigações extracontratuais
prescrevem no prazo de três anos;
c) no Direito inglês (art. 2.º do Limitation Act de 1980), uma ação judicial fundada em
responsabilidade extracontratual por danos patrimoniais não pode ser instaurada após
decorridos seis ou mais anos da data da ocorrência do facto danoso;
d) no Direito inglês (art. 264.º do Highway Code), os automóveis devem seguir pela faixa da
esquerda;
e) no Direito português (art. 13.º, n.º 1, do Código da Estada), os veículos devem mover-se
pela faixa da direita;

diga, fundadamente, se o pedido de Jeffree deve proceder.

A) É de ponderar a aplicação do Regulamento Roma II. a. Âmbito de aplicação do


Regulamento:
i. em razão da matéria: conceito de obrigação extracontratual civil apurado
autonomamente (art. 2.º e considerando 11); preenchido (art. 1.º);
ii. em razão do tempo: facto danoso ocorreu após 11 de janeiro de 2009;
preenchido (arts. 31.º e 32.º);
iii. em razão do espaço: situação implica um conflito de leis (art. 1.º/1);
ação proposta em tribunal de Estado-Membro vinculado pelo Regulamento (art.
1.º/4);
B) Para aferir a culpa e a ilicitude de Jeffree, aplicar-se-ia, a título de matéria
de facto, as regras de segurança e de conduta em vigor no lugar e no momento em que
ocorreu o facto danoso, nos termos do art. 17.º do Regulamento (considerando 34);
logo, aplicar-se-ia o Código da Estrada em vigor em Portugal;
C) A lei aplicada à prescrição corresponde à lei aplicável à obrigação
extracontratual (art. 15.º, al. h)), pelo que compete determinar qual esta é. Esta alínea
demonstra que a matéria em causa é tratada pelo Regulamento como substantiva,
não se inserindo no n.º 3 do art. 1.º;
D) Houve escolha de lei a favor da lei inglesa, expressa e posterior ao facto,
nos termos do n.º 1 do art. 14.º; apreciação da aplicação do n.º 2 e respetiva
rejeição;
E) A Inglaterra é um ordenamento local do Reino Unido que deverá ser
considerado um país para efeitos de determinação da lei aplicável, nos termos do
art. 25.º/1;
F) No Direito inglês, as regras relativas a limitation of actions têm natureza
processual. Não obstante, exercem a mesma função – estabelecimento de um limite
temporal ao exercício de um direito – que as normas substantivas portuguesas
relativas à prescrição, aplicando-se nessa medida;
G) Não há lugar a reenvio (art. 24.º); não há violação da ordem pública do
foro (art. 26.º);
H) Conclusão: a ilicitude da conduta de Jeffree é apreciada à luz do Código da
Estada português e o direito de Bernardo a receber indemnização ainda não
prescreveu, em conformidade com o Limitation Act em vigor na Inglaterra. Assim,
o pedido de Bernardo deve proceder.
Regulamento de Roma II (responsabilidade pré-contratual)

Álvaro, cidadão holandês com residência habitual em Lisboa, encontra-se em Londres. No dia
21 de maio de 2016, quando visitou a leiloeira Christie’s, conheceu Bruno, cidadão francês,
com residência habitual em Londres.
No dia seguinte, Bruno convidou Álvaro para sua casa e, enquanto lá estiveram, Álvaro gostou
muito do quadro que Bruno tinha pendurado na sala. Bruno apercebeu-se de que Álvaro
acreditou que o quadro tinha sido pintado por Rembrandt e, apesar de saber que tal não
correspondia à verdade, uma vez que o quadro tinha sido pintado pelo seu afilhado, não
divulgou esta informação e aceitou iniciar negociações com Álvaro para a venda do quadro.
Por força de compromissos vários de ambos, agendaram uma nova reunião para a semana
seguinte. Nessa altura, Álvaro fez-se acompanhar de Carlos, um seu amigo que trabalha no
Metropolitan Museum of Art, em Nova Iorque, tendo para o efeito custeado a viagem e o
alojamento deste em Londres.
Após uma breve análise do quadro, Carlos informa Álvaro de que este não é um original de
Rembrandt e que não havia qualquer hipótese de Bruno desconhecer tal facto. Álvaro decide
intentar ação em Lisboa contra Bruno, pedindo que este seja condenado a pagar-lhe 10.000
euros, o total das despesas que suportou com a deslocação e o alojamento de Carlos.
Determine a lei aplicável.

Aplica-se o RRII – CIC.


Não escolheram lei aplicável, logo, não se aplica o art. 14.º.
Aplica-se o art. 12.º.
Nos termos deste artigo, aplica-se a lei que seria aplicável ao contrato se este tivesse sido
concluído.
Ou seja, há que ir verificar as regras do RRI.
Não se aplica o art. 3.º. Não há indicação de que o Bruno fosse comerciante, logo, não se aplica
o art. 6.º. Aplica-se, sim, o art. 4.º/1/a (contrato de venda de bem). Ou seja, a lei aplicável é a ei
da RH do vendedor.
Ou seja, Inglaterra (art. 22.º - OJ complexo) e não há reenvio.

Sub-hipótese: Imagine que Álvaro tinha indicado que pretendia escolher a lei holandesa como
lei reguladora do contrato, mas esta questão ainda estava a ser ponderada por Bruno, sendo certo
que este também não pretendia a aplicação da lei inglesa.

Nesse caso, não se entende que há escolha de lei relativa à CIC, mas sim quanto ao contrato
possivelmente. Logo, não aplicamos o art. 14.º RRII, mas sim o art. 3.º do RRI. Nos termos do
n.º 5 deste artigo, a existência de acordo quanto à escolha de lei é regulada pela própria lei
escolhida caso esta existisse, ou seja, pela lei holandesa. Caberá à lei substantiva holandesa
determinar se há escolha de lei ou não; caso a resposta seja positiva, será esta a lei aplicável ao
potencial contrato e, assim, à responsabilidade pré-contratual.

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