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BIOMECÂNICA DOS

ESPORTES
Biomecânica
aplicada aos
esportes individuais
Eliton da Silva Vasconcelos

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

>> Descrever as principais técnicas dos movimentos dos esportes individuais,


divididas em membros superiores e inferiores.
>> Relacionar vantagem mecânica com a técnica de execução dos movimentos
nos esportes individuais.
>> Aplicar a avaliação de aceleração à modalidade corrida do atletismo.

Introdução
Neste capítulo, você vai aprender que, ao aplicar a biomecânica durante o
movimento humano em provas individuais, você pode ter um aumento no
desempenho, uma maior economia de energia, e ainda prevenir lesões. Vai
compreender que o uso correto das alavancas corporais em modalidades
como lançamento de dardo, salto em distância, natação, judô, salto mortal e
levantamento olímpico está diretamente relacionado com o bom desempenho
e, consequentemente, o sucesso nessas modalidades. Além disso, verá as
variações de velocidade que ocorrem durante a corrida, o tipo de pisada ideal,
assim como avaliar a aceleração nessas provas.
2 Biomecânica aplicada aos esportes individuais

Principais técnicas dos movimentos


dos esportes individuais divididas em
membros superiores e inferiores
Basicamente duas fases fazem parte da corrida, a fase de apoio (ou de posi-
cionamento) e a fase de suspensão (ou aérea). A fase de apoio começa quando
o pé tem o seu contato inicial com o solo, e termina quando os dedos do pé
perdem o contato com o solo, conhecido também como toe off (do inglês
toe off, retirada dos dedos do pé). O corredor realiza o contato com o solo
utilizando o terço anterior do pé (antepé, metatarsos), e simultaneamente
ocorre a semiflexão dos joelhos. Uma característica importante da fase de
apoio é que a velocidade horizontal diminui imediatamente quando ocorre
o contato do pé no solo, e continua a diminuir durante a primeira parte do
período de apoio. Já quando a perna do corredor se estende na parte final do
período de apoio, a velocidade aumenta (HAMILL; KNUTZEN; DERRICK, 2016).
Quando o corredor realiza o contato no solo com o calcanhar, a diminuição
da velocidade no início da fase de apoio tende a ser maior em comparação à
pisada com o antepé (LIEBERMAN et al., 2010). Veja a Figura 1.

+
Fase de Fase de Fase de
não apoio não apoio
horizontal (m/s)

apoio
Contato Elevação
Velocidade

com o solo dos dedos

Velocidade Redução Aumento Velocidade


constante da velocidade da velocidade constante
0

Figura 1. Mudanças na velocidade durante a fase de apoio de uma passada de corrida.


Fonte: Adaptada de Hamill, Knutzen e Derrick (2016).
Biomecânica aplicada aos esportes individuais 3

A fase de suspensão é iniciada quando os dedos do pé perdem o contato


com o solo, e termina quando o pé entra em contato com o solo novamente.
De acordo com a velocidade, os períodos da fase de suspensão e de apoio
mudarão, ou seja, à medida que a velocidade aumenta, a duração da passada
diminui, e consequentemente haverá uma redução do tempo de apoio.
Alguns autores incluem a fase de impulsão durante a corrida, que se inicia
logo após a fase de apoio. Nessa fase, o corpo é projetado à frente pelo
sistema de alavanca dos músculos extensores do quadril, joelho, tornozelo
e dedos do pé, nesta ordem, e agindo atrás do centro de massa (CM) em uma
ação de empurrar. Ao aumentar o comprimento da passada, aumenta-se a
projeção do corpo à frente e a velocidade linear da corrida. Nessa fase de
impulsão, o corredor deve ter a sensação de estar empurrando o chão para
trás (TARTARUGA et al., 2012).

A pisada retropé, ou seja, a entrada do calcanhar direto no solo,


pode levar a um aumento do impacto cerca de três vezes o peso do
corpo, de acordo com a velocidade da corrida.

A movimentação dos braços, independentemente da velocidade empre-


gada, deverá ser realizada no sentido anteroposterior, com flexão do cotovelo,
de modo que braço e antebraço formem um ângulo aproximado de 90º.
O movimento deve ocorrer compensando o movimento das pernas e inver-
samente a elas, ou seja, o braço correspondente à perna que avança vai para
trás e vice-versa. A intensidade do movimento das pernas e braços, assim
como a sua amplitude, é diretamente proporcional à velocidade da corrida.
A movimentação dos braços é importante para o auxílio do equilíbrio do
corredor (TARTARUGA et al., 2012).
Na fase de apoio, o toque com o solo é realizado com o terço anterior
do pé (antepé; metatarsos), com o centro de gravidade (CG, ou CM), sendo
colocado sempre à frente do pé. De acordo com a velocidade empregada
durante a corrida, a área de apoio será menor ou maior e, assim, o calcanhar
estará mais afastado ou mais próximo do solo.
4 Biomecânica aplicada aos esportes individuais

A biomecânica da corrida está diretamente relacionada à economia


de corrida (ECO). A ECO é definida pelo consumo de oxigênio a uma
velocidade de corrida submáxima e fixa, sendo consensual a sua importância
para a performance dos atletas (DI MICHELE; MERNI, 2014).

Além disso, durante a corrida, o trabalho mecânico desenvolvido durante


as contrações isométricas corresponde a cerca de 1/3 do trabalho desen-
volvido em contrações dinâmicas. Dessa forma, quanto maior for o trabalho
isométrico da musculatura responsável pelo gesto motor na corrida, menor o
trabalho dinâmico; logo, maior a ECO. Essa relação está associada à oscilação
vertical do CM durante a corrida, que está fortemente relacionada ao ângulo
do joelho durante a fase de suporte. Portanto, quanto maior a variabilidade
do ângulo do joelho na fase de apoio, maior será a oscilação do CM e, conse-
quentemente, maior o gasto de energia (ROSE; GAMBLE, 1998). Desse modo,
conforme explicam Pereira e Lima (2010), o fortalecimento da musculatura
também está relacionado a uma maior ECO.
Nas modalidades de saltos, o principal objetivo dos atletas é obter o
máximo de deslocamento de seu CM de acordo com a modalidade. Para o
salto em distância, por exemplo, o maior deslocamento deve ser na direção
horizontal. Já para o salto em altura, deve ser na direção vertical (HAY, 1981).
Na prática do salto em distância, temos quatro etapas, que são apresentadas
como corrida de abordagem, impulsão, fase aérea e aterrissagem. Na corrida
de abordagem, o principal objetivo é obter uma grande velocidade horizontal
no início e no meio da corrida, porque no final será necessária uma diminuição
na velocidade devido à transição da corrida de abordagem para a fase de
impulsão vertical, dando início à fase aérea.

As forças que atuam sobre o corpo são classificadas como: força


externa, que são a força da gravidade, a força de reação do solo e
as forças de resistência dos fluidos, devido à ação da gravidade; e força interna,
que são as forças geradas pelos músculos e transmitidas pelos tecidos corporais,
as forças de tensão transmitidas pelos ligamentos e as forças transmitidas por
meio das áreas de contato articular. Essas forças são transformadas em rotações
dos segmentos, que, por sua vez, produzem o movimento destes.
Biomecânica aplicada aos esportes individuais 5

O instante em que o pé do atleta faz contato com a tábua de impulsão é


definido como touchdown. E o instante em que o pé do atleta perde contato
com a tábua de impulsão é definido como decolagem ou takeoff. Para uma
máxima projeção horizontal no salto em distância, o atleta deverá deslocar
seu centro de gravidade a um ângulo em relação ao solo de 18 a 27° (HAY,
1986). Na fase aérea, logo após o seu início, o deslocamento do CM não poderá
ser alterado, portanto, o movimento dos membros se torna necessário para
evitar as rotações do corpo (HAY; NOHARA, 1990).
A última fase do salto é a aterrissagem, que é o momento em que o atleta
toca o solo. É nessa fase que o atleta procura retardar ao máximo o toque dos
calcanhares no solo. Para isso, o saltador deve manter suas pernas estendidas
e o mais elevadas possível, inclinando o tronco para a frente e levando suas
mãos próximo aos pés. Essa movimentação é característica do salto grupado,
mas é uma movimentação que está presente em todas as técnicas. Porém,
se na fase anterior os movimentos não foram bem executados e a técnica de
queda na caixa de areia não for bem realizada pelo saltador, o resultado final
poderá ser prejudicado (LEES; GRAHAM-SMITH; FOWLER, 1994).
As principais técnicas utilizadas pelos atletas profissionais são salto gru-
pado, arco e passadas no ar. A técnica mais elementar na fase aérea é o salto
grupado, também conhecido como Knee-Tuck, onde ocorre a movimentação
de grupamento, ou seja, o ato de aproximar as extremidades, mãos e pés,
tão logo termine a fase de flutuação. Na técnica do arco, também conhecida
como Hang, recebe este nome em decorrência da movimentação e do posi-
cionamento do corpo durante a fase aérea, pois ocorre o adiantamento do
quadril e o atraso das pernas e dos braços (LEES; GRAHAM-SMITH; FOWLER,
1994). O adiantamento do quadril, onde se localiza o CM, causa um deslo-
camento mais livre de cargas, contrariando sua inércia. Este adiantamento
favorece uma maior parábola e a ação de fechamento para o salto (BARROS;
DEZEM, 1990) (Figura 2).
6 Biomecânica aplicada aos esportes individuais

Figura 2. Salto em distância utilizando a técnica do arco.


Fonte: Adaptada de Barros e Dezem (1990).

A técnica de passadas no ar, ou Hitch-Kick, recebe este nome em de-


corrência das posições tomadas pelo corpo durante a fase aérea. Essa téc-
nica envolve o uso de movimentos angulares de braços e pernas para gerar
uma reação contrária do tronco, e então controlar a postura do atleta no ar.
Geralmente ocorre entre 2,5 e 3,5 passadas (HAY, 1993). Durante a fase aérea,
alguns atletas utilizam a associação de duas técnicas, a passada no ar e o
arco, mas esta última não é considerada propriamente uma técnica (BARROS;
DEZEM, 1990). Veja a Figura 3.

Figura 3. Salto em distância utilizando a técnica passadas no ar.


Fonte: Adaptada de Barros e Dezem (1990).
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O salto em altura é um evento de atletismo com uma técnica complexa.


Ao longo dos anos, foram utilizadas várias técnicas, mas a que é aplicada
atualmente é a Fosbury Flop, desde o seu surgimento, em 1968. Segundo
Dapena, Gordon e Meyer (2006), essa técnica é dividida em três partes:
a fase de corrida, a fase de chamada e a fase de voo ou de passagem da
barra horizontal (sarrafo).
A corrida é pendular e realizada com seu trecho final em curva. A distância
é variada entre os atletas e há uma curva nos 4 ou 5 passos finais, e o último
passo é ligeiramente menor e ocorre com o apoio do calcanhar. Em seguida,
ocorre a ação impulsora, que precisa ser bem verticalizada e terminar pela
ponta do pé. Ainda nessa fase, o braço contrário à perna de impulso deve ser
lançado para cima e em direção ao sarrafo, de modo que direcione o corpo e
facilite a ação do giro, fazendo com que o saltador transponha o sarrafo de
costas (DAPENA; GORDON; MEYER, 2006).
Neste momento, o corpo do atleta forma um arco caracterizado pela
elevação do quadril em relação aos ombros e às pernas. A manutenção do
arco até que o sarrafo fique além das coxas do saltador é de grande impor-
tância. Essa técnica permite uma pequena massa corporal acima do centro
de gravidade (BARROS; DEZEM, 1990). Desse modo, um bom atleta no salto
em altura é aquele que consegue conjugar da melhor maneira a velocidade
horizontal, a altura do centro de massa e o balanço dos braços (DAPENA;
MCDONALD; CAPPAERT, 1990).
Veja na Figura 4 a técnica do salto em altura.

Figura 4. Salto em altura.


Fonte: andreas N/Pixabay.com.
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A técnica da tesoura é a forma mais simples e natural de executar um


salto em altura e pode ser utilizada como um meio educativo para
a melhora da impulsão ou para praticantes iniciantes. Essa técnica consiste na
aproximação diagonal do sarrafo, em que o atleta passa uma perna por vez. No
entanto, essa é uma técnica considerada ultrapassada e não é utilizada para
saltos de alto rendimento (BARROS; DEZEM, 1990).

Vantagem mecânica e a técnica de execução


dos movimentos nos esportes individuais
Em esportes como o levantamento de peso, atletas com alavancas curtas têm
vantagem em relação àqueles com alavancas longas, pois o peso precisará
ser levantado a uma altura menor. Por outro lado, nadadores com alavancas
mais longas, desde que sejam acompanhadas pela potência muscular, são um
fator vantajoso. O mesmo pode ser dito para as modalidades de arremessos
e lançamentos (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011).

Kruger et al. (2005) verificaram que lançadores de dardo da classe


de elite, por exemplo, têm membros superiores longos, trazendo,
assim, uma grande vantagem para o atleta. Isso ocorre porque a velocidade
final do segmento no lançamento está diretamente relacionada ao produto da
velocidade angular do segmento e de seu comprimento.

Uma alavanca pode ser avaliada por sua eficácia mecânica, mediante
o cálculo de sua vantagem mecânica. Define-se vantagem mecânica
(VM) como a relação entre o braço de esforço e o braço de resistência. Ou seja
(HAMILL; KNUTZEN; DERRICK, 2016):
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Os movimentos prévios ao lançamento de dardo se caracterizam por ações


retilíneas (velocidade linear). A soma das forças que atuarão no lançamento
são as alavancas do corpo humano empregadas pelo atleta na utilização
de sua técnica e o movimento de frenagem após o lançamento do dardo.
Quanto maior for a velocidade da ação das alavancas do corpo, maior será a
velocidade imprimida ao dardo, e tal ação dependerá diretamente das habi-
lidades motoras, velocidade e explosão do atleta. No arremate (ou reversão),
a velocidade máxima é bruscamente freada por uma ação da perna dianteira
(HAMILL; KNUTZEN; DERRICK, 2016).

Segundo Hall (2017), a velocidade de um ponto de um corpo em ro-


tação é diretamente proporcional à distância entre ele mesmo e o
seu eixo de rotação. Portanto, no ato do arremate e na consequente rotação,
todas as partes do corpo acima do centro de gravidade (tronco do atleta) terão
maior velocidade.

Durante a fase de lançamento do dardo (Figura 5), todo o corpo funciona


como uma alavanca. Com o cotovelo à frente e o antebraço à retaguarda,
o atleta terá o maior arco do corpo pronto para o lançamento. Esse arco será
formado pelo pé-perna-quadril-ombro-braço-antebraço e punho correspon-
dentes ao lançamento. O tronco que estava voltado para fora e perpendicu-
larmente à direção de lançamento sofre uma rotação para o interior auxiliado
pela articulação tíbio-társica. Essa ação também auxilia o movimento futuro
do arremate (LEHMANN, 2010).
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Figura 5. Lançamento de dardo.


Fonte: Lançamento... ([20--], documento on-line).

Murakami et al. (2006) analisaram a biomecânica de atletas campeões e


finalistas mundiais e concluíram que o fator mais importante para alcançar
um alto desempenho no lançamento de dardo é a velocidade do lançamento.
As características que permitem obter uma velocidade de lançamento superior
à de outros lançadores são as seguintes.

„„ Eles se aproximam com velocidade maior antes do lançamento e man-


têm o ângulo do joelho dianteiro na posição estendida durante a fase do
lançamento, para, assim, mudar a velocidade de abordagem e realizar
a rotação para frente do tronco.
„„ Durante a rotação para frente do tronco, eles mantêm pequenos o
ângulo da articulação do cotovelo e ângulo de adução-abdução do
ombro, para ser capaz de transferir de maneira efetiva a velocidade
de rotação interna da articulação do ombro e, deste, obter maior
velocidade de lançamento.

Toda essa técnica faz com que o corpo todo funcione como uma única
alavanca em sintonia, trazendo, assim, maior desempenho ao atleta.
Biomecânica aplicada aos esportes individuais 11

O índice braquial demonstra o comprimento do antebraço em rela-


ção ao braço, e pode ser calculado da seguinte maneira (ACKLAND;
ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011):

Com relação às alavancas dos nadadores velocistas, esses atletas apre-


sentam índice braquial mais elevado em comparação a nadadores de média
e longa distância, por causa de seus antebraços mais longos e braços mais
curtos. Além disso, esses atletas têm segmentos significativamente mais
longos para envergadura dos membros superiores, comprimento das pernas
e comprimento dos pés entre nadadores velocistas (provas de 50 e 100 m) em
comparação a nadadores participantes de provas longas (ACKLAND; ELLIOTT;
BLOOMFIELD, 2011).
Por outro lado, segundo os autores, um nadador pode não ter grande parte
das variáveis essenciais para ser um campeão, como não ter as proporções
adequadas nem a força necessária para uma propulsão eficiente no estilo
nado crawl, mas essas desvantagens podem ser trabalhadas por meio de
treinos visando ao aumento da força e a modificação da técnica (Figura 6).
Por exemplo, o nadador pode encurtar a alavanca de propulsão mediante a
flexão do antebraço até um ponto além do normal para a maioria dos nada-
dores, diminuindo, assim, o momento de inércia e o esforço a ser realizado.

Figura 6. Encurtamento eficaz da alavanca na natação estilo nado crawl.


Fonte: Adaptada de Ackland, Elliott e Bloomfield (2011).
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Durante o salto mortal para frente, o movimento das alavancas corporais


são fundamentais para o sucesso do salto (Figura 7). Durante a fase de voo,
o momento angular não muda, mas, por meio do movimento das alavancas,
o atleta pode modificar o momento de inércia e, desse modo, aumentar ou
diminuir a velocidade do giro em torno do eixo transversal.

Figura 7. Salto mortal para frente.


Fonte: WikiHow ([20--], documento on-line).

No início do salto mortal, o atleta se encontra com o corpo ereto, posição


conhecida como leiaute. Ao iniciar a corrida, o momento de inércia é relativa-
mente grande, e a frequência de giro ou a velocidade angular, relativamente
pequena. Na fase de impulsão, no início da saída (ou decolagem), o efeito da
força de reação do solo (FRS) move o centro de gravidade para cima e também
ligeiramente para frente, devido à inclinação do corpo (WATKINS, 2018).
Em seguida, ao assumir a posição encolhida, o momento de inércia diminui
e a velocidade angular aumenta proporcionalmente. Isso ocorre porque, ao
flexionar os braços e as pernas, a distribuição da massa fica mais próxima
ao centro de gravidade, onde se encontra o eixo transversal, e a resistência
à rotação é menor. Quando o atleta completar o giro e estiver na preparação
Biomecânica aplicada aos esportes individuais 13

para a aterrisagem, ele estende o corpo, assumindo novamente a posição de


leiaute, estendendo os braços e as pernas, consequentemente aumentando
o momento de inércia e, assim, diminuindo a frequência de giro (HAMILL;
KNUTZEN; DERRICK, 2016; WATKINS, 2018). Portanto, o movimento eficiente
das alavancas corporais durante o salto mortal para frente é fundamental.
Veja a Figura 8.

Figura 8. Efeito da FRS durante a decolagem no salto


mortal para frente.
Fonte: Adaptada de Watkins (2018).

No Judô, existem várias técnicas de projeção, como a de perna, a de braço


e a de quadril. A técnica de perna, chamada osotogari, é geralmente o pri-
meiro golpe a ser ensinado aos alunos, pois seus passos iniciais são de fácil
execução. Porém, o osotogari, quando implementado com a execução do
desequilíbrio, se torna mais complexo.
O golpe osotogari é uma junção das seguintes palavras da língua japonesa:
o – grande; soto – externa; gari – cortar. O golpe é classificado como ashi waza
(técnica de perna) e, nele, o kumi kata (modo de pegar), para um indivíduo
destro, se dá pela direita, ou seja, a mão direita na gola do judogi (roupa de
Judô) e a mão esquerda na manga. O osotogari tem como objetivo fundamental
situar o adversário, apoiado sobre a parte posterior do pé (calcanhar), para
depois elevá-lo (GOMES et al., 2009).
14 Biomecânica aplicada aos esportes individuais

O índice crural demonstra o comprimento da perna em relação a


coxa, e pode ser calculado da seguinte maneira (ACKLAND; ELLIOTT;
BLOOMFIELD, 2011):

Atletas que possuem alavancas corporais com baixo índice crural são
favorecidos por ter um baixo CM; com isso, seus oponentes terão dificuldade
em desequilibrá-los. As oscilações corporais durante o judô levam ao dese-
quilíbrio e à queda, portanto, ajustes corporais como uma pequena altura
do CM e uma base de suporte relativamente grande proporcionam maior
estabilidade (BANKOFF et al., 2006). Além disso, Nagata et al. (2010) verificaram
em atletas dos sexos masculino e feminino, ao aplicar o golpe osotogari, que
existe uma forte correlação entre o aumento da distância do CM e o ponto de
apoio com a diminuição da FRS, ou seja, ao aumentar a altura do CM ocorre
uma diminuição do equilíbrio. Portanto, durante a tentativa de aplicar do golpe
osotogari, uma estratégia interessante é tentar levantar o CM do adversário.
No levantamento de peso olímpico (LPO), o objetivo é levantar o maior
peso possível desde o chão até acima da cabeça, finalizando o movimento
com os braços estendidos (STONE et al., 2006). Os dois levantamentos que
caracterizam eventos de LPO são o arranco (Snatch) e o arremesso (clean and
jerk). No arranco, a barra é levantada em um único movimento, recebendo-a
em posição de agachamento. O arremesso consiste em levantar a barra em
dois tempos: desde o tablado até o peito, que consiste no primeiro tempo
(clean), e desde o peito até a completa extensão dos braços acima da cabeça,
que é o segundo tempo (jerk). Veja a Figura 9.
Durante o arranco, a trajetória da barra demonstra deslocamentos hori-
zontal e vertical. No plano sagital, essa trajetória parecida com uma curva
em “S”, conhecida como “S” estendida, permite ao corpo usar suas alavancas
mecânicas para transferir o momento para a barra (HO et al., 2014) (Figura 10).
O objetivo principal da execução é aproximar a linha de gravidade da barra
para a linha de gravidade do atleta, pois, assim, há um momento menor de
inércia e, consequentemente, facilita as alavancas corporais no momento da
execução, resultando em menor esforço do atleta. O movimento de flexão
de cotovelo é mínimo durante a execução. Atletas com alavancas curtas têm
vantagens nesse esporte (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011).
Biomecânica aplicada aos esportes individuais 15

Figura 9. Movimento do arranco no LPO.


Fonte: xamyak/Shutterstock.com.

Figura 10. Trajetória da barra durante o arranco.


Fonte: Adaptada de Garhammer (1984).

Avaliação de aceleração à modalidade de


corrida do atletismo
O comprimento e a frequência da passada são parâmetros cinemáticos lineares
importantes, e devem ser observados durante a corrida. A distância coberta
por uma passada é o comprimento da passada, e o número de passadas por
minuto é definido como a frequência da passada (FP). A velocidade da corrida
16 Biomecânica aplicada aos esportes individuais

é o resultado da relação entre frequência e comprimento da passada (CP)


(ZATSIORSKY, 2000).

Velocidade da corrida = comprimento da passada


(CP) × frequência da passada (FP)

Desse modo, a velocidade da passada pode ser acelerada pelo aumento


do comprimento da passada, pela frequência da passada, ou por ambos.
Ao acrescentar a distância percorrida, você irá encontrar a velocidade de
deslocamento (V):

V = FP * CP

Ao mensurar variáveis como a velocidade da corrida, da frequência e do


comprimento de passos e da aceleração do corredor, você terá parâmetros
cinemáticos definidores da performance do atleta, como o tempo final. Desse
modo, para correr em determinada velocidade, um indivíduo deve realizar
uma combinação específica entre CP e FP (HALL, 2017; ZATSIORSKY, 2000).
A aceleração obtida em m ∙ (s– 11)2 pode ser calculada pelo quociente entre
a variação da velocidade (DV) e a variação do tempo (DT) em um determinado
trecho da pista, por meio da seguinte equação:

A = DV/DT

Fink et al. (2010) aplicaram uma avaliação da aceleração média em


uma corrida de 100 metros rasos em estudantes, tendo os registros
obtidos a cada trecho de 20 metros. Foi verificado que os atletas apresentaram
valores positivos de aceleração até os 60 metros, e após essa distância a acele-
ração apresentou valores negativos, relacionados à diminuição da velocidade
da corrida.

A Força de Reação do Solo (FRS) é uma força externa que consiste da


resposta da superfície de apoio para as ações do corpo sobre ele.
Temos a FRS vertical e a horizontal na direção anteroposterior (FRS a-p), que
apresenta dois períodos distintos: a frenagem e a propulsão, representados
pela desaceleração e aceleração do centro de gravidade do corredor no apoio
Biomecânica aplicada aos esportes individuais 17

da corrida, respectivamente (HAMILL; KNUTZEN; DERRICK, 2016). À medida que


a velocidade da corrida aumenta, ocorre também um aumento da amplitude da
FRS e da taxa de desenvolvimento da força vertical, e a aterrissagem passa a ser
realizada com mais facilidade na parte mais anterior do pé (antepé) (HALL, 2017).

Para velocistas, a passada muito grande pode ser contraprodutiva, pois


passadas grandes tendem a produzir uma FRS com componentes horizontais de
retardo maiores. Um bom desempenho nos 100 metros rasos é caracterizado
pela capacidade do velocista em aplicar força para trás sobre a pista, gerando
uma FRS para a frente e, assim, minimizando os componentes horizontais
(HALL, 2017).

Referências
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Leituras recomendadas
McDOUGALL, C. Nascido para correr: a experiência de descobrir uma nova vida. 2.ed.
Porto Alegre: Globo Livros, 2020.
MATTHIESEN, S. Q. Atletismo: teoria e prática. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,
2017.

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