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Texto: Maria Amanda Capucho da Silva

A FILOSOFIA E UM POUCO DAS SUAS FASES

Para que Filosofia? A pergunta feita no início do livro “Convite à Filosofia”, de Marilena
Chauí, já pode conduzir ao caminho da resposta: para questionar. A Filosofia tem como
objetivo inspirar a realização de indagações, fazendo com que nada seja aceito como óbvio
sem que antes haja uma investigação. A atitude de indagar sobre crenças, sentimentos, coisas
e ideias leva a um distanciamento da vida cotidiana, e recebe o nome de atitude filosófica.
Falar de Sociologia e não recordar do sociólogo Karl Marx ou citar o nazismo sem tocar
no nome do atroz führer alemão Adolf Hitler é praticamente impossível, bem como falar de
Filosofia e não lembrar de seu patrono, o filósofo ateniense Sócrates, que possui uma das
mais famosas frases filosóficas da história atribuída a si, por meio das narrativas de seu
discípulo Platão, “Sei que nada sei”. Nessa célebre expressão pode-se identificar a face
negativa da atitude crítica — junção das faces negativa e positiva da atitude filosófica, em
que tudo se é negado. Já a face positiva, estimula uma interrogação sobre tudo.
Existem três indagações fundamentais na Filosofia: o que é?; como é?; por que é?.
Quando esses questionamentos se voltam para o próprio pensamento (“o que é pensar?”,
“como é pensar?”, “por que há o pensar?”), fazem o movimento de reflexão. A reflexão
filosófica está organizada em torno de três grandes agrupamentos de perguntas: por quê?; o
quê?; para quê?. Dessa forma, inferimos que a Filosofia é um pensamento sistemático, que
sempre busca apresentar lógica e coerência, usando procedimentos de demonstração e uma
fundamentação racional.
Quando embarcamos no estudo da Filosofia encontramos quatro definições gerais para
ela, que são: 1 - Visão de mundo; 2 - Sabedoria de vida; 3 - Esforço racional para conceber o
Universo como uma totalidade ordenada e dotada de sentido; 4 - Fundamentação teórica e
crítica dos conhecimentos e das práticas.
Tendo um breve resumo sobre o que é e para que serve a Filosofia, podemos partir para o
entendimento dos períodos da filosofia grega e de alguns filósofos. Todavia, antes é
necessário situar-se nas fases da Grécia, que é considerada o berço da Filosofia, uma vez que
praticamente todos os filósofos da antiguidade eram gregos. A antiga civilização grega pode
ser dividida em quatro grandes fases (Homérica, Arcaica, Clássica e Helenística), essas
divisões possuem influência nos períodos da filosofia, mesmo que as datas não correspondam
exatamente entre si.
A fase inicial da Grécia, a fase Homérica (nome relacionado a Homero, autor de Ilíada e
Odisséia), possui início por volta do ano 1150 a.C. e tem o fim aproximadamente em 800
a.C., com a ascensão das cidades-estados gregas. Esse período é marcado pelo surgimento de
colônias e dos genos, uma organização social familiar, de regime fechado, autônomo, com
independência econômica, em que o líder era o Pater. Os genos eram organizações
patriarcais, onde o Pater possuía autoridade religiosa, política e militar. Com a decadência da
sociedade gentílica ocorreu a fragmentação social e econômica e se pôs fim no período
homérico, dando início ao período arcaico.
Na Grécia Arcaica (século VII a.C. ao século V a.C.), com o crescimento populacional,
os, já em declínio, genos se tornaram polis (ou cidades-estados), que são sociedades que
apresentam autonomia política. A cidade-estado de maior importância foi Atenas, junto com
Esparta. É válido ressaltar também, que nessa época a economia urbana passou a ser
predominante e que ocorreu o surgimento da aristocracia, governo no qual o poder é detido
por um pequeno grupo de pessoas, que em sua maioria são nobres.
O período posterior ao arcaico foi a Grécia Clássica (século V a.C. até o século IV a.C.),
no qual a democracia começa a desenvolver-se. Um dos momentos notáveis da fase clássica
grega foi o “Século de Péricles” ou “Idade de Ouro de Atenas”, quando a polis foi governada
pelo estadista Péricles, que fez investimentos nas áreas política, cultural e econômica de
Atenas, além de aperfeiçoar a democracia da polis. Para o estadista, os méritos deveriam vir
pelos talentos, acreditando assim na meritocracia, Péricles era defensor da igualdade entre os
cidadãos - homens atenienses, maiores de 18 anos e não-escravos - indo contra a ideia de
apenas os mais ricos pudessem participar da política, ou seja, indo contra a aristocracia. Essa
fase também foi marcada pela mudança na educação, que antes era voltada para a formação
de guerreiros, e nesse período passou a ser focada na criação de bons oradores, com
capacidade de argumentar e persuadir.
A última grande fase da Grécia Antiga foi o Período Helenístico (datado a partir do final
do século IV a.C. até o ano 30 a.C), nesse período a Grécia ficou sob o domínio do Império
Macedônio, governado pelo rei Felipe II. Após o assassinato do rei a liderança foi passada
para o filho, o rei Alexandre, o Grande, que continuou a expansão das terras macedônicas.
Apresentadas as fases da Grécia Antiga, possuímos algumas informações importantes
para a compreensão dos períodos da filosofia grega, que são quatro: Período Pré-socrático ou
Cosmológico; Período Socrático ou Antropológico; Período Sistemático; Período Helenístico
ou Greco-romano. Observando a nomeação dos períodos, fica perceptível a notabilidade de
Sócrates, pois duas das quatro fases foram nomeadas tendo o patrono da filosofia como
referência.
O período Pré-socrático ou Cosmológico, é datado do final do século VII a.C. ao final do
século V a.C. (na Grécia Arcaica), nele se tem a preocupação de explicar sistematicamente e
racionalmente a origem, a ordem e as transformações da Natureza. Os principais filósofos
dessa época foram Tales de Mileto, Heráclito de Éfeso, Pitágoras de Samos, Zenão de Eléia e
de Demócrito de Abdera. Eles acreditavam no elemento primordial da Natureza - a physis -,
que é onde tudo nasce e para onde tudo volta, porém os filósofos escolheram diferentes
physis. Essa variação entre qual elemento primordial usar para justificar a origem da
Natureza, fez com que Sócrates e os sofistas concordassem em um ponto: a cosmologia não
era uma fonte confiável para adquirir conhecimento, pois apresentava ideias contrárias. Os
sofistas, assim como Sócrates, não eram do período cosmológico, e sim do período Socrático
ou Antropológico (final do século V a.C. e todo o século IV a.C. - Grécia Clássica). Como o
próprio nome diz (“anthropos” - ser humano, “logos” - conhecimento), nessa época da
filosofia grega o objeto de estudo se volta para as questões humanas. Segundo Marilena
Chauí, a democracia grega possui duas características importantes para a filosofia, são elas: a
igualdade entre os cidadãos e com isso o direito dos mesmos participarem do governo.
Para podermos realizar essa ligação, precisamos fazer uma breve introdução sobre os
sofistas. Sofistas eram homens que se apresentavam como mestres da retórica, a arte de falar
bem, e se diziam sábios. Eles cobravam para ensinar os jovens a debater e defender seus
pontos de vista na ágora, praça pública onde ocorriam as assembleias na Grécia Antiga. Dado
que todos os cidadãos (sempre ressaltando a exclusão de mulheres, estrangeiros, escravos e
menores de 21 anos) tinham igualdade na democracia grega, muitos jovens procuravam os
sofistas para aprender a retórica. Porém nem todos admiravam esses “professores da
filosofia”, um dos seus principais opositores foi Sócrates, que acredita que os sofistas não
eram filósofos, porque não tinham amor pelo conhecimento, dessa forma não representavam
a Filosofia (“philos” - amor; “sophia” - sabedoria). Diferente dos sofistas, Sócrates não
vendia certezas, ele propunha o autoconhecimento, fazendo indagações sobre ideais e valores,
e quando perguntado qual as respostas de suas perguntas, afirmava que nada sabia. Por ter
causado a arte do pensar na juventude, Sócrates foi visto como ameaça pelos cidadãos
atenienses mais poderosos e, depois de julgado, foi condenado a beber cicuta, o que o levou
ao suícidio.
Todo o conhecimento que detemos sobre o patrono da filosofia veio das narrativas feitas
por seu discípulo, Platão, isso causa a dúvida de sua existência em muitos historiadores.
Sobre Platão, é imprescindível citar a alegoria da caverna, cujo qual é metáfora para explicar
a diferença entre o mundo das ideias e o mundo dos sentidos ou mundo sensível. Nela o
filósofo mostra a caverna como o mundo dos sentidos, onde os homens estão aprisionados a
ideias erradas, já o mundo das ideias é o mundo exterior, no qual o prisioneiro que se liberta
enxerga a luz da verdade e após voltar a caverna tenta convencer os prisioneiros sobre a visão
errada que possuem por meio da dialética. Platão também teve um aluno extremamente
conhecido, Aristóteles, principal nome do Período Sistemático (final do século IV a.C. ao
final do século III a.C. — Grécia Helenística), fase em que há a sistematização de todo
conteúdo produzido até então. Aristóteles de Estagira, foi professor de Alexandre, o Grande,
e o responsável pela organização e separação do conhecimento filosófico. Além disso, é
considerado o criador da lógica como instrumento do conhecimento (a lógica não é uma
ciência, apenas um caminho para ela). Um conceito muito tratado pelo filósofo de Estagira
foi a metafísica. Aristóteles produziu um conjunto de livros para tratar desse assunto e no
quarto livro a metafísica é definida da seguinte maneira:
“Existe uma ciência que considera o ser enquanto ser e as competências que lhe
competem enquanto tal. Ela não se identifica com nenhuma das ciências
particulares: de fato, nenhuma das outras ciências considera universalmente o ser
enquanto ser, mas delimitando uma parte dele, cada uma estuda as características

dessa parte.” (ARISTÓTELES, 2002, p. 131.).

Com a interpretação desse trecho percebemos que Aristóteles definiu a Metafísica com
uma ciência geral ou a mãe das outras ciências.
Após o período sistemático, deu-se início ao Período Helenístico ou Greco-romano
(datado do final do século III a.C. até o final do século VI d.C. - Fase Helenística), nessa fase
da filosofia antiga a polis deixa de ser a principal referência para os filósofos, pois a Grécia
havia sido dominada pelo Império Romano e acaba sofrendo influência da cultura oriental.
Os principais pensadores dessa época foram: Zenon de Cítio (estoicismo - virtude para atingir
a felicidade); Epicuro (epicurismo — prazer, saúde do corpo e do espírito para atingir a
felicidade); Pirro (ceticismo - ataraxia para atingir a felicidade).
Saindo da filosofia antiga grega e indo para a filosofia medieval, iremos nos encontrar
como algumas modificações. Na filosofia medieval, desenvolvida na Idade Média, há uma
alta influência do cristianismo, inclusive alguns dos filósofos da época faziam parte do clero,
procurando-se unir fé e razão e buscar a verdade divina.
Dois períodos da filosofia medieval tiveram grande destaque, a filosofia patrística e a
filosofia escolástica. A Patrística ocorreu em um momento de transição de pensamento, dessa
forma se fez presente a preocupação em adaptar os ensinamentos da filosofia grega aos
ensinamentos cristãos. Já na Escolástica, situou-se em um momento de intensidade do
domínio católico na Europa, com isso houve a necessidade da criação de universidades para a
formação de pensadores e sacerdotes. A escolástica, além de ser uma corrente filosófica,
também é um método de pensamento, as disciplinas desse método foram divididas em dois
grupos: trivium e quadrivium. No trivium estavam as disciplinas de gramática, retórica e
dialética. No quadrivium as disciplinas eram aritmética, geometria, astronomia e música.
Houve também o surgimento da teologia, nela havia a necessidade de comprovar a existência
de Deus. Os filósofos que merecem destaque dessa época são: Santo Agostinho (principal
nome da patrística), São Tomás de Aquino (principal nome da escolástica), Santo Alberto
Magno (escolástica), Santo Anselmo (escolástica).
Uma coisa que ficou claro é que tanto a filosofia antiga quanto a filosofia medieval
sempre estiveram ligadas a política. Dessa forma, separar uma área para tratar de política foi
essencial. A Filosofia Política se dedica a estudar questões do ramo a partir do convívio
social e da organização dessa convivência. Diferente da ciência política, que interpreta o
mundo a partir da realidade, a filosofia trabalha mais com a problematização no plano das
idealizações, o que a faz ser um instrumento para a ciência.
Filósofos políticos procuram entender os elementos da política, Estado e governo, por
exemplo, além das noções éticas e econômicas relacionadas a mesma. O Estado, algo fixo, é
o conjunto da máquina pública, ou seja, o conjunto de mecanismos que compõem o público e
delimitam o que pertence ao coletivo. Governo é transitório, já que a mudança é necessária
(há variação no tempo de transição dependendo da forma de governo) e gere a máquina
pública. Principais pensadores: Platão, que desenvolveu a cidade perfeita, uma complexa
organização política, onde a aristocracia chefiada pelo mais apto, chamado rei filósofo, era o
ideal, o discípulo ateniense de Sócrates era avesso à democracia; Aristóteles, defensor do
regime democrático, com algumas mudanças se comparado a democracia ateniense;
Maquiavel, filósofo renascentista, autor do livro “O Princípe”, defendia a separação entre a
ética e a política, e dizia que o líder deveria ser um estadista estratégico e populista, sempre
buscando o apoio do povo.
Tendo em mente tudo que foi dito acima, fica clara a importância da filosofia, seja na
política, na busca pelo entendimento da Natureza, na explicação racional das coisas ou no
autoconhecimento. Desse modo, a pergunta feita no início do texto, ganha várias respostas,
além da resposta inicial, e mostra que o próprio significado da palavra “filosofia” já traz uma
conclusão. A Filosofia serve para alimentar o amor pelo conhecimento.
Referências

(ARISTÓTELES. Metafísica. 2ª ed. tradução, introdução e comentários de Giovanni Reale.


São Paulo: Edições Loyola,, 2002, p. 131.)
CHAUÍ, M. Convite à Filosofia. Ed. Ática, 2020.

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