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Beatriz Teixeira 2020/2021

Direito Constitucional I
Resumo Semipresidencialismo I – Jorge Reis Novais
CAP.I- SISTEMA DE GOVERNO: CONCEITO E
PERSPETIVAS DE ANÁLISE
-Até à década de 70, o Direito Constitucional e a Ciência Política só reconheciam
2 sistemas de governo: o parlamentar (democracias europeias) e o presidencial
(E.U.A). Este quadro manteve-se linear e simples até ao primeiro quartel do Séc.
XX. O próprio conceito de sistema de governo era relativamente negligenciado
em detrimento de outras formas políticas, como o Tipo Histórico de Estado,
Regime Político, a Forma de Estado ou a Forma de Governo.

-É de notar a mutabilidade destas expressões, estes não são conceitos com


definições únicas e inequívocas - e.: Jorge Miranda trata por ‘’forma de
governo’’ aquilo a que Jorge Reis Novais designa por ‘’regime político’’.

1. FORMAS POLÍTICAS E SISTEMAS DE GOVERNO


-As formas políticas que podem e devem ser distinguidas são as seguintes: tipo
histórico de Estado; regime político; Sistema de governo; forma de Estado; forma
de governo; e Sistema político:

1. Tipo Histórico de Estado – manifestação que o Estado assume ao longo da


história, tomando como critérios de diferenciação os fins do Estado e a relação
Estado/indivíduo (direitos do indivíduo face ao Estado). São exemplos de tipos
históricos de Estado; o Estado Estamental; o Estado Absoluto; o Estado de
Direito; e o Estado Autocrático (matriz conservadora, matriz revolucionária,
matriz fundamentalista religiosa).

2. Forma de Estado – diferenciação da estrutura vertical interna do ordenamento


jurídico-constitucional e do poder político (Estado Unitário; Estado Unitário
com Regiões Autónomas; Estado Federal).

3. Forma de Governo – prende-se unicamente com o fator temporal (caráter


vitalício ou temporal do exercício do cargo) e modo de sucessão na chefia do
Estado (via hereditária ou não). São exemplos a Monarquia e a República.

4. Regime Político – diferentes modalidades de exercício do poder político,


tendo em consideração o relacionamento institucional entre governantes e
governados, a existência e peso das instituições representativas do poder, bem
como a titularidade e exercício do poder. São exemplos as Democracias
Representativas, os Regimes Ditatoriais e os Regimes de Transição.

Tipo 5. Sistema de Governo – referente às diferentes


Histórico
de Estado
1
Forma
Sistema
de
Político
Estado

Formas
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modalidades de relacionamento institucional entres os vários órgãos de exercício


do poder político, sendo as designações mais conhecidas o Sistema Presidencial,
Parlamentar e Semipresidencial.

6. Sistema Político – abrange as restantes formas políticas e tem em conta todos


os fatores (jurídicos, institucionais, políticos, culturais) que relevam na vida
política de uma comunidade, tais como os sistemas partidários (bipartidarismo,
multipartidarismo), sistemas eleitorais (sufrágio universal, sufrágio restrito,
sistema de representação proporcional), ou os grupos de interesse (lobbies,
corporações).

2. SISTEMAS DE GOVERNO: CONCEITO E DIFICULDADE DE CONSTRUÇÃO DE


UMA TIPOLOGIA
-No caso de Portugal esta designação traduz-se na relação entre Presidente da
República, Governo e Assembleia da República. O Sistema de Governo prevê
apenas o que se passa com as relações entre os órgãos e agentes ativos e
institucionalizados de exercício do poder político.

-Neste plano são considerados fatores diferentes, mas análogos: conjunto de


competências de cada órgão, natureza do poder que exercem, designação dos
seus titulares, as vicissitudes que podem afetar um mandato, e, sobretudo, as
relações de responsabilidade e confiança entre órgãos. Em suma, consideramos
sempre e apenas as relações internas ao corpo de governantes e às instituições
governamentais.

-Não é possível compreender um Sistema Político de um dado Estado tendo em


conta apenas o seu Sistema de Governo, uma vez que ficam aquém fatores como
a participação e direitos fundamentais dos governados, se há ou não
descentralização do poder, etc..

-É de ressalvar que a avaliação e estudo dos sistemas de governo só interessa


verdadeiramente para os regimes políticos inseridos em contextos democráticos
e de Estado de Direito, uma vez que em regimes ditatoriais, a arbitrariedade e
concentração do poder numa única pessoa impossibilita e invalida o
relacionamento entre os órgãos de exercício de poder. Isto é, esta questão não
tem qualquer interesse científico em ditadura. Ainda que o relacionamento entre
órgãos fosse cordial, em última instância, o ditador concentrava e exercia todo o
poder.

-Tendo em conta os sistemas de governo próprios da democracia representativa,


distinguem-se genericamente três tipos: sistema parlamentar, sistema
presidencial, e sistema semipresidencial.

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3. PERSPETIVA JURÍDICA E PERSPETIVA POLÍTICA D E ANÁLISE DOS SISTEMAS


DE GOVERNO: UMA DICOTOMIA MAL CONSTRUÍDA
-Urge compreender que no cerne do conceito de sistema de governo está uma
base jurídico-constitucional. Em Estado constitucional, como são os Estados de
democracia representativa, é a Constituição que define, normativamente, o
quadro das relações entre os órgãos de exercício de poder. O Estado de Direito
dos nossos dias é um Estado Constitucional e a Constituição fixa o estatuto
jurídico do poder político estatal.

-Assim, a Constituição dá-nos a primeira resposta à questão de saber qual o


sistema de governo de determinado país (salvo de regimes ditatoriais). Ainda
assim, em vez de partir exclusivamente do plano constitucional para a definição
do sistema de governo, é necessário deslocar também o foco da análise para o
plano da realidade política, ou, no mínimo, combinar os dois planos – o sistema
de governo define-se simultânea e conjuntamente, atendendo ao plano jurídico-
constitucional e ao plano da realidade política.

-Ainda que a realidade prática pareça ou possa ser desfasada da Constituição,


dizer que a Constituição para nada serve em detrimento dos acontecimentos
políticos do quotidiano é uma ilação errónea. Esta crítica confunde aquilo que a
Constituição diz, com aquilo que a Constituição dita. Uma coisa é ler a
Constituição, outra muito diferente é compreendê-la no seu sentido normativo.

-Ver exemplos do direito à habitação condigna (art.º 65) e ensino gratuito (art.º
74) – Pág. 30-31.

-Para que não restem dúvidas para os céticos, a partir do momento em que se
reconhece que é na Constituição que as alterações devem ser processadas para
que possam, posteriormente, realizar-se na prática, então reconhece,
implicitamente, que o momento decisivo definição de um sistema de governo é
a Constituição e o momento constituinte.

-Desde já, a conclusão é clara: se é o sistema de governo que se procura alterar,


é a Constituição e a lei que estão em causa, é aí que se tem de mexer
primariamente para induzir alterações na realidade.

-De modo a conferir alguma racionalidade ao estudo dos sistemas de governo, é


necessário aceitar algumas destas 3 premissas:

a) num Estado Constitucional, é a Constituição que determina o sistema de


governo, pelo que conta na sua definição é a estrutura e distribuição
constitucional dos poderes e as relações entre os vários órgãos;

b) é preciso saber ler a Constituição;

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c) uma coisa é o sistema de governo, aquilo que ele é (a sua definição) – e


tudo isso é dado pela Constituição -, outra coisa é a forma como num
sistema de governo o padrão de funcionamento varia em função de fatores
de ordem conjuntural.
4. A CONSTITUIÇÃO DETERMINA O SISTEMA DE GOVERNO
-É a Constituição que, primária e superiormente, define normativamente o
sistema de governo, isto é, diz qual deve ser o quadro do relacionamento
institucional entre os órgãos que, num dado país, exercem o poder político. Se a
Constituição cumpre o seu objetivo, se é uma Constituição normativa, então o
sistema só muda e só pode mudar através da revisão constitucional ou de uma
nova Constituição.

-Tomando a proposta de Duverger, vamos considerar, para distinguir os vários


sistemas de governo no plano constitucional, os dois seguintes principais fatores
respeitantes aos poderes e relacionamento institucional entre os órgãos de poder
político. É através da consideração desses dois elementos que distinguiremos os
sistemas de governo entre si:

a) a posição relativa que o Chefe de Estado ocupa no plano do exercício de


poder político;

b) a responsabilidade política do Governo (executivo) perante o


Parlamento.

-Sistema Parlamentar › o Chefe de Estado é uma figura politicamente apagada,


sem poderes significativos, com funções meramente simbólicas e de
representação nacional; o Governo responde politicamente perante o
Parlamento. Nenhum sistema deve ser qualificado como Parlamentar se não
reunir estas duas características. O maior ou menor peso do Parlamento ou de
qualquer outra instituição é totalmente indiferente para a classificação dos
sistemas.

-Sistema Presidencial › o Chefe de Estado tem poderes importantes,


designadamente a liderança do executivo; o Executivo não responde perante o
Parlamento, no sentido em que não pode ser demitido por este. Não importa se o
Congresso (Parlamento) é forte ou fraco, desde que aquelas duas características
estejam reunidas, o sistema de governo é presidencial.

Sistema de Governo ≠ Funcionamento do Sistema de Governo

4.1. SABER LER A CONSTITUIÇÃO


-Existe uma distinção fundamental entre enunciado (ou texto) normativo e norma
(comando ou sentido normativo). Por vezes, o sentido normativo diverge
significativamente do sentido literal do texto onde está contida.

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-Neste sentido, mediante leitura do Artigo 65.º (direito à habitação, a conclusão de


que todos têm o direito de reivindicar do Estado uma habitação condigna é errónea.
Esta norma constitucional significa apenas que o Estado está juridicamente
obrigado a atuar no sentido de, a prazo, garantir que todos possam ter uma
habitação condigna, e obrigado a não praticar qualquer ato que se traduza em
prejuízo desta garantia.

-Há que distinguir o enunciado normativo e a norma. Em democracia representativa


todo o poder vem do Povo, sabemos que a legitimidade dominante e exclusiva é a
legitimidade democrática fundada no voto, na livre escolha dos eleitores. Diz-se
então, que um órgão eleito está investido de legitimidade democrática que lhe
possibilita o exercício dos poderes que a Constituição lhe atribui. Contudo, se a
Constituição atribui a mesma competência a um Chefe de Estado não eleito (ex: Rei
de Espanha), e que, portanto, não contraiu a tal legitimidade democrática, pode-se
inferir que a competência que lhe foi formalmente atribuída por um determinado
enunciado normativo, na verdade impende a outro órgão (Pág. 50-51, exemplo
espanhol).

-Assim, de modo a bem interpretar os enunciados normativos respeitantes às


relações entre os órgãos que exercem o poder político, é crucial ter em conta alguns
fatores determinantes e inelimináveis (questão da legitimidade, grupos
parlamentares, mediação dos partidos políticos, etc.). Toda a realidade
constitucional tem de ser considerada.

CAP.II- OS SISTEMAS DE GOVERNO PARLAMENTAR


E PRESIDENCIAL
1. SISTEMAS DE GOVERNO NA HISTÓRIA DAS DEMOCRACIAS REPRESENTATIVAS
-Durante muito tempo, o Presidencialismo e o Sistema Parlamentar gozavam de
exclusividade no domínio dos sistemas de governo adotados pelos diferentes
Estados (Parlamentarismo na Europa e Presidencialismo na América).

-Na Grã-Bretanha, o sistema de governo consolidou-se no seio de uma


sedimentação histórica. Isto é, teve uma evolução do Tipo Histórico de Estado
singular e adversa à maioria dos países europeus (que conheceram a longa fase
dos Estados Absolutos), caracterizada pelo progressivo afastamento do Monarca
do exercício do poder executivo em favor do Primeiro-Ministro e do seu
Gabinete, apoiados por uma maioria parlamentar. Assim, afirmaram-se dois
polos de exercício de poder – o Parlamento e o Gabinete liderado pelo Primeiro-
Ministro.

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-Este modelo tendia a ser reproduzido nas restantes democracias europeias.

-Em contrapartida, na América reinava o Sistema Presidencial. Todavia,


enquanto que o Sistema Parlamentar se desenvolvera empiricamente através de
um lento e gradual processo de evolução e sedimentação institucional (Glorious
Revolution na Grã-Bretanha), o Sistema Presidencial terá sido um produto
artificial construído pela teoria política (Founding Fathers).

-Ambos os sistemas registam dois polos de exercício de poder político. Onde no


Sistema Parlamentar tínhamos Parlamento e Governo, agora temos Presidente e
Parlamento (Congresso) no Presidencial. Esta é uma contraposição substancial,
na medida em que, imperando a legitimidade democrática como fonte do poder
político, um sistema baseado na existência de um único órgão com legitimidade
democrática (Parlamento no Sistema Parlamentar), e outro assente na existência
de uma dualidade de legitimidades eletivas (Parlamento e Presidente no Sistema
Presidencial) denotam uma estruturação do poder político é essencialmente
diferente.

-Note-se que uma vez que o Presidente (Executivo) e Congresso na América


resultam de eleições diferentes e têm por isso cada um uma legitimidade própria,
então não há lugar para existirem entre eles relações de dependência e confiança
política, ao contrário do que acontece na Europa entre um Parlamento e um
Governo que dele saía.

-Ao contrário do terceiro Sistema de Governo que é o foco do objeto de estudo, a


natureza tão distinta destes dois sistemas invalidou o debate por uma definição
rigorosa da essência de cada um dos sistemas.

2. SISTEMA PARLAMENTAR E SISTEMA PRESIDENCIAL: A DEFINIÇÃO


-Sistema Parlamentar: Chefe de Estado é uma figura sem poderes efetivos,
presente no sistema de forma passiva, meramente simbólica; Governo
(Executivo) é politicamente responsável e a sua confiança política depende do
Parlamento; dois polos de exercício de poder político (Governo liderado por um
Primeiro Ministro, e um Parlamento); a dependência política prevê a interrupção
do mandato do Governo ou legislatura Parlamento por razões políticas (ex:
Governo pode decidir a dissolução do Parlamento e Parlamento pode pedir a
demissão do Governo).

-Sistema Presidencial: Chefe de Estado (Presidente) é eleito, é o órgão-chave da


cena política, tem poderes significativos, designadamente a liderança do
executivo; Governo (Executivo) não responde politicamente perante o
Parlamento, isto é, a sua subsistência não depende da confiança do Parlamento
(Congresso), não existe essa dependência política; a autonomia política
concedida por legitimidades democráticas autónomas impede a cessação do
mandato do Presidente ou legislatura do Congresso por motivações de

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discordância política1.

-Ambos têm como objetivo comum a construção de uma relação equilibrada


entre os demais órgãos de poder, harmonioso que salvaguarde o princípio da
divisão e separação de poderes. Esta construção passa muito pela forma como o
sistema regula a questão da responsabilidade política.

-A questão da responsabilidade política não se resolve da mesma maneira nos


dois sistemas. No Sistema Parlamentar esta responsabilidade é garantida graças à
recíproca possibilidade/ameaça de dissolução que o Executivo pode fazer
impender sobre o Parlamento, enquanto que no Sistema Presidencial o Presidente
só deve responder politicamente perante o Povo, pelo que não há nem pode haver
responsabilidade política do Executivo perante o Parlamento.

-Em Sistema Presidencial (particularmente no dos E.U.A.) a relação equilibrada


entre órgãos é condicionada através de um complexo sistema de poderes e
contrapoderes (comumente designado por checks and balances). Parafraseando
Lowenstein, enquanto que a relação Parlamento/Governo do Sistema Parlamentar
é uma relação de equilíbrio por integração, a relação entre
Congresso/Presidente o Sistema Presidencial é uma relação de equilíbrio por
coordenação entre órgãos independentes2.

3. SISTEMAS DE GOVERNO PARLAMENTAR PRESIDENCIAL: O FUNCIONAMENTO


PRÁTICO
3.1. SISTEMA PARLAMENTAR
-Há todo um espetro de possibilidades de funcionamento prático deste sistema.
Basta olhar para as democracias europeias para denotar que não há um único
padrão de funcionamento do sistema parlamentar, existindo padrões
significativamente ou até radicalmente diferentes.

-Então por que funcionam os sistemas parlamentares de forma tão diferenciada?


O que faz o Governo de sistema parlamentar forte ou fraco? Como saber quando
se vai verificar uma ou outra situação?

3.1.1. SISTEMA PARLAMENTAR DE GABINETE E SISTEMA PARLAMENTAR DE


ASSEMBLEIA
-Novamente, a chave para a compreensão deste tipo de questões recai no fator
responsabilidade política do Governo perante o Parlamento.

-Sistema Parlamentar de Gabinete/Parlamentarismo Maioritário: Governo


dispõe à partida e durante o mandato de um apoio parlamentar sólido e

1
Impeachment entra no plano, não da responsabilidade política, mas da responsabilidade criminal.
2
Em Semipresidencialismo, dada a sua natureza mais complexa, o equilíbrio é projetado com outras e
diferentes alternativas de ‘’separação e interdependência’’ – CRP Art. 2.º e Art. 111.º

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maioritário – maioria absoluta; consequente predominância do Gabinete/Governo


que governa com total liberdade e condições de eficácia durante toda a
legislatura; tende a criar, a prazo, uma situação de persistente bipartidarismo.

-Sistema Parlamentar de Assembleia/Parlamentarismo Minoritário:


inexistência de maioria absoluta sólida; sobrevivência do Governo mediante
indulgencia das oposições; Governo fraco com permanente risco de
inviabilização; Parlamento domina e decide com efetividade a subsistência ou
demissão do Governo.

-Não é pelo facto de um sistema funcionar conjunturalmente de uma maneira ou


outra, que isso altera a sua natureza estrutural como sistema de governo
parlamentar. A identificação parlamentar, presidencial ou semipresidencial não
depende da conjuntura, da realidade política, mas sim da definição
constitucional.

-Posto isto, um país, por exemplo o Reino Unido, não é parlamentar de Gabinete
ou de Assembleia, antes funciona assim num terminado momento.

3.1.2. SISTEMA PARLAMENTAR CLÁSSICO E SISTEMA PARLAMENTAR


RACIONALIZADO
-Há fatores de ordem jurídica que influenciam a tendência de funcionamento de
um sistema de governo em moldes de gabinete ou em moldes de assembleia. Isto
é, regras jurídicas potenciam a presença ou ausência de determinadas
consequências de ordem prática, pelo que surge uma tentação para, através da
engenharia constitucional, procurar orientar o funcionamento prático de um
determinado sistema num ou noutro sentido.

-Sistema Parlamentar Clássico: prevalência absoluta do Parlamento sobre o


Governo;

-Sistema Parlamentar Racionalizado: a influência do Governo contrabalança


os poderes do Parlamento; racionalização do plano jurídico-constitucional de
modo a atenuar as tentações ou tendências desestabilizadoras, através da adoção
de mecanismo jurídico-constitucionais tendencialmente geradores de maior
estabilidade governativa, por exemplo:

› moções de censura construtiva ou positiva (para provocar a demissão do


Governo, esta moção deve ser aprovada em simultâneo com um novo
Primeiro Ministro e Governo ou programa de governo);

› fixação de barreiras eleitorais, por exemplo a exigência de obtenção de


um mínimo nacional de 5% dos votos para se poder obter representação

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parlamentar;

› possibilidade de aprovar lei decisivas sem acordo parlamentar (não existe


em Portugal).

3.2. SISTEMA PRESIDENCIAL


Sistema Presidencial puro/clássico ≠ Sistema Presidencial Adaptado
-O ponto nodal do sistema presidencial centra-se na existência de um Chefe de
estado eleito que é, simultaneamente, chefe do executivo, e a referida
consagração de uma particular separação e interdependência entre executivo e
legislativo (check and balance). Essa relação assenta na ideia de um equilíbrio
entre os dois órgãos que se traduz na institucionalização de mecanismo de
interdependência em termos de possibilidades de interferência reciproca nas
respetivas atuações e poderes, mas também de uma rígida separação em termos
de relações de responsabilidade politica › garante-se a absoluta independência
dos dois órgãos em termos de subsistência dos respetivos mandato e legislatura.

-Tendo provado a sua eficácia nos E.U.A. e aplicabilidade noutros Estados


americanos (ainda que com alguns perigos de disfuncionamento), este é um
sistema totalmente impraticável na Europa. Porquê?

-O que justifica esta diferença essencial é a diferente natureza dos partidos


politicos e da vida política norte-americana quando comparados com o sistema
partidário e a política europeia. Na Europa a essência programática tão distinta
dos demais partidos impossibilitaria o consenso, o compromisso e a cedência
como mecanismos de resolução de conflito. Já nos E.U.A., não há uma base de
diferenças ideológicas e programáticas tão profundas ou estabelecidas que
dividam significativamente os partidos a ponto de gerarem uma oposição frontal
e sistemática entre os dois órgãos de poder. Os partidos norte-americanos são
meras máquinas de apoio a candidatos a eleições.

-Em geral, nos E.U.A., os deputados exercem o mandato com praticamente total
margem de autonomia relativamete ao respetivo partido. No periodo fora das
eleições o papel dos partidos politicos desaparece e dá lugar à influencia dos
lobbies e grupos de interesse.

-Assim, as maiorias no Congresso dependem não de uma inexistente disciplina


partidária, mas sim da vontade individualizada de cada deputado e da influência
externa que sobre ela possa exercer. É esta a razão pela qual o Presidencialismo
só é exportável para experiência política em que o risco de conflito ou bloqueio
com raiz partidária, ideológica ou programática, esteja excluído ou pouco
provável.

-Para o Presidencialismo funcionar plenamente é necessário que, por um lado


não existam possibilidades de bloqueio, e, por outro, que a separação de poderes
e o equilíbrio institucional estejam profundamente enraizados na comunidade

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política.

4. ESTRUTURAÇÃO JURÍDICA DOS SISTEMAS DE GOVERNO E DINÂMICAS DE


FUNCIONAMENTO PRÁTICO
-Apelar à presidencialização de sistemas semipresidenciais (maior peso e reforço
da margem de ação do Presidente relativamente ao Parlamento) é absolutamente
desprovido de sentido. Porquê? O sistema não necessita de qualquer
presidencialização ou adoção de presidencialismo para garantir a concentração
fáctica de poderes políticos na figura do Primeiro-Ministro e assim chegar ao
almejado reforço da ação executiva e consequente estabilidade: são vários os
exemplos de primeiros-ministros/presidentes em sistemas semipresidenciais ou
parlamentares que detém mais poderes que o Presidente americano.

Sistema de Governo ≠ Relações de força conjunturalmente


estabelecidas
-De novo, sistemas de governo são apenas diferentes configurações jurídico-
constitucionais do relacionamento entre os órgãos que exercem o poder político.

-O Sistema de Governo pode ser alterado na Constituição, mas a forma como vai
funcionar na prática já não depende só de fatores jurídicos, mas, sobretudo, de
circunstâncias políticas determinadas por condições objetivas ou por opções do
eleitorado que não são juridicamente pré-determináveis.

Presidencialismo Parlamentarismo

Centros jurídicos de Presidente Chefe de Estado


imputação de atos e Governo
políticos ao Estado Congresso Parlamento

Exercício fáctico do
poder Presidente Governo/Parlamento

CAP.III- O SEMIPRESIDENCIALISMO: UM NOVO


SISTEMA DE GOVERNO?

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1. A DESCOBERTA DOUTRINÁRIA DO SEMIPRESIDENCIALISMO


-A ideia de reconhecimento do semipresidencialismo data de 1970, quando
Maurice Duverger considera que, após a reforma constitucional de 1962, a
França da V República passou a viver sobre um tal sistema que vinha sendo
praticado desde 1958 sob a égide do General Charles de Gaulle. Esta não seria
uma novidade absoluta, uma vez que se podia inscrever na linha das tentativas de
transformação que o sistema de governo parlamentar vinha a experimentar nas
décadas que sucederam as Grandes Guerras.

-Estes novos mecanismos de ordem jurídico-constitucional que visavam induzir


maior estabilidade e eficiência ao exercício do poder podem assumir uma
natureza muito diferenciada. Assim podemos:

a) manter-nos estritamente no quadro parlamentar, introduzindo apenas


mecanismos de racionalização do relacionamento entre Governo e Parlamento
(moção de censura construtiva, barreiras eleitorais, etc.) - verificou-se nas
Constituições alemã de 1949, espanhola de 1978,

b) ou situar-nos numa linha de transformação mais abrangente que


introduz modificações na própria estruturação e natureza dos diferentes poderes,
através da revalorização do órgão Chefe de Estado (eleição popular do Presidente
da República que assim adquire legitimidade democrática que lhe permite
exercer poderes diretamente executivos) – verificou-se nas Constituições alemã
de Weimar, finlandesa de 1919, austríaca de 1929, e espanhola de 1931 e mais
tarde nas vagas de democratização do pós-guerra.

-Apesar da aversão da esquerda ao reforço de poderes na chefia do Estado


(receio histórico da metamorfose da figura do Presidente em Imperador como
acontecera em França com a II República), em todos os sistemas em que esta
solução foi adotada e pôde durar – Finlândia, Áustria, França e Portugal – a
esquerda pôde fazer prova que, em democracia representativa, não há nada de
politicamente enviesado no processo e no resultado de uma eleição direta de um
Presidente da República.

-Esta simples inovação na forma


Presidente dispõe
de poderes Presidente eleito
de eleição do Presidente da
próprios que por sufrágio
universal
República veio a alterar
permitem ações
politicamente radicalmente a natureza dos
independentes do
Governo poderes constitucionalmente
Primeiro-Ministro atribuídos ao Presidente. Assim,
e Governo
politicamente temos um sistema de
responsáveis
perante o
Parlamento
responsabilidade politica do
Governo perante o Parlamento, em
que a subsistência do Governo
depende da confiança parlamentar,
e temos também a configuração

SEMIPRESIDENCIALISMO
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constitucional de um órgão de Presidente da República a quem são atribuídos


poderes significativos que os respetivo titular pode exercer a titulo próprio,
independentemente da vontade do Governo ou do Parlamento.

2. O PROBLEMA DA DESIGNAÇÃO
3. - 3.3. A AUTONOMIA DO SEMIPRESIDENCIALISMO
-Quando se quer encontrar um sistema político, é para a Constituição que
devemos olhar e não para a realidade prática. Se tomássemos a realidade prática
como critério, então não haveria sistema semipresidencialista. Por isso, a crítica
de que os tipos de funcionamento prático do semipresidencialismo são muito
diferentes de país para país não tem o mínimo sentido do ponto de vista da
conclusão que dela se pretende retirar.

-Uma coisa é o sistema de governo (o seu quadro jurídico-constitucional – onde


se revela a sua autonomia enquanto sistema -, aquilo que o identifica
estruturalmente como sistema de governo próprio) e, aí, todas as constituições
são muito semelhantes. Outra coisa é a forma como o sistema funciona, as
diferentes modalidades de funcionamento prático.

-Não há qualquer fundamento qualquer fundamento para confundir


semipresidencialismo com sucessão de fases pretensamente parlamentares ou
presidenciais. Pode haver é um sistema semipresidencial com maior ou menos
presença do Presidente, maior ou menor dominância do Governo, maior ou
menor influência do Parlamento.

-O Semipresidencialismo existe como sistema autónomo. É autónomo


relativamente ao Sistema Presidencial ou Parlamentar pp 127

4. GÉNESE E EXPANSÃO POLÍTICA DO SEMIPRESIDENCIALISMO


-PAREI AQUI

FORMAS POLÍTICAS - DESENVOLVIMENTO


1. TIPO HISTÓRICO DE ESTADO

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Monarca, com legitimação divina, gere o Estado como se


1ª Fase Patrimonial
de um feudo se tratasse
Tipo Hisórico de Estado

Estado Absoluto
Despotismo Iluminado; Monarca com obrigaao de
2ª Fase de Polícia esclarecer os sues subditos e controlar todas as áreas das
suas vidas

Estado Marxista

Leva ao surgimento dos


1ª Fase de Estado Liberal Estado Fascista
Estados Autocráticos
Estado de Direito
Estado Fundamentalista
2ª Fase de Estado Social
Islâmico

1ª FASE: ESTADO DE DIREITO LIBERAL (CRISE)


-Surge como insurgência face ao Estado Absoluto. Nesta linha, o Estado Liberal
procura minimizar-se. Esta minimização materializa-se na consagração de
Direitos Fundamentais, que são, na sua maioria, Direitos Negativos 3. Estes
Direitos Fundamentais garantem-se através de uma séride de mecanismos como a
Separação de Poderes (assembleias representativas) ou o Princípio da Legalidade
da Administração (atos da administração em função dos atos legislativos/leis).
Estado tinha como função a garantia da segurança interna e paz social de modo a
que os cidadãos pudessem exercer os seus direitos livremente, abstendo-se de
regular a vida social e económica › ideia de que a gestão autónoma da Sociedade
levaria a uma situação de equilíbrio e progresso.

-O Direito à Propriedade era o Direito Fundamental por excelência, na medida


em que condicionava a existência dos outros direitos. Ex.: Posse de Propriedade
condicionava o voto (restrição censitária) – só proprietários podiam votar pois
estes seriam os únicos a quem o voto podia afetar negativamente.

-Até quando se desenvolve o Estado de Direito Liberal? Até finais do Séc. XVIII,
quando a sociedade apercebe-se que a Lei da Oferta e da Procura gera
desequilíbrio profundo; Primeira Guerra Mundial e crises económicas dos anos
20 expuseram a debilidade de um Estado mínimo para responder às crises de
varia ordem que surgem. Este modelo esgota-se e temos a Revolução Russa
como momento inicial de procura de um novo modelo de organização
radicalmente diferente.

ESTADO AUTOCRÁTICO E AS SUAS DIFERENTES MODALIDADES


a) Estado Marxista/Soviético/de Matriz Revolucionária Anti-capitalista
3
Entendem-se por Direitos Negativos as garantias/direitos que se mantém através da abstenção, quer
do Estado quer de terceiros. Por exemplo, o Direito Fundamental da Liberdade de Expressão é garantido
graças à inação do Estado.

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-Inspirado na doutrina marxista, surge como resposta às sucessivas crises do


Estado de Direito Liberal (nomeadamente a Primeira Guerra Mundial e as crises
económicas dos finais dos anos 20). Neste modelo pretende-se dar o poder à
maioria da população em vez de a uma elite seleta, através da expropriação e
distribuição dos meios de produção.

-Plano Político > Princípios de recusa do Multipartidarismo (Partido


Comunista/Bolchevique como partido único; no auge do seu poder, o Partido
Bolchevique - depois Partido Comunista-, tinha apenas 25% dos votos para a
Assembleia Constituinte, pelo que foi necessário cessar aquilo a que chamavam
de Democracia Burguesa/Formal de modo a conservarem o poder a todo o custo),
centralismo democrático.

-Plano das relações Estado-Indivíduo > desenvolve-se uma teoria no tocante aos
direitos fundamentais do cidadão, na qual o Estado rejeita qualquer ideia de
limitação jurídica dos seus poderes. Isto é: uma vez que o Estado eram os
trabalhadores, e os trabalhadores eram o Estado, não fazia sentido reconhecer
direitos fundamentais dos cidadãos contra o Estado (‘’ninguém precisa de
direitos contra si próprio’’). A ideia de Direitos Fundamentais distingue-se
fundamentalmente da dos Estados de Direito por condicionar a possibilidade do
exercício de direitos e liberdades fundamentais aos interesses do regime.

-Estas conceções, que inicialmente eram justificadas como sendo ‘’dificuldades


conjunturais’’, acabaram por se tornar elementos estruturais indispensáveis ao
novo modelo de Estado Soviético (teoria marxista-leninista do Direito e do
Estado.

-Modelo perde força com a queda do Muro de Berlim em 1989.

b) Estado Fascista/Nacional-Socialista:

-A sua emergência surge, de certa forma, em linha/como resposta à Revolução


Russa. Estes Estados, temendo a internacionalização do Comunismo, abolem a
estrutura representativa, criando um Estado forte e presente, onde o governante
máximo (duce, fuhrer) exerce o poder de acordo com as suas próprias diretrizes.
Recusa dos mecanismos e instituições democráticas representativas, e negação da
possibilidade de oposição política ou doutrinária (recusa do Multipartidarismo e
anulação da liberdade de expressão).

Recusa-se o individualismo, privilegiando o conceito de Nação e coletividade.


Prática do culto da personalidade na imagem do chefe, que é visto como superior
e ‘’iluminado’’. A expressão eleitoral das massas/direito ao voto desaparece e dá
lugar a corporações.
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Beatriz Teixeira 2020/2021

As crises e abusos causados por este tipo de Estado culminam na Segunda Guerra
Mundial e na consequente derrota das forças fascistas › o modelo de Estado
Autocrático fascista desaparece como modelo, mas subsiste como ideologia,
ainda que disfarçado por características democráticas.

c) Estado Fundamentalista Islâmico

-Ssurge em finais do Séc. XX com a Revolução Iraniana dos anos 80; distingue-
se do Estado de Direito, especialmente, por ser um Estado
Confessional/Teocrático (domínio claro de uma religião) e possuir uma religião
oficial, que rege a maior parte das esferas sociais e políticas (colide com
princípio da laicidade/secularidade do Estado Moderno Ocidental).

-Plano Jurídico > shari’a é costumariamente considerada fonte de direito (Egito,


Líbia), a fonte de direito por excelência (Yemen), ou a fonte suprema de onde
imana todo o ordenamento jurídico (Irão).

-Plano Constitucional > em muitos destes Estados, o Corão é constitucionalmente


tido como a norma suprema a que toda a lei fica subordinada (Paqusitão), em que
o Corão é a própria Constituição (Arábia Saudita), ou em que uma ‘’clausula de
repugnância’’ dita a nulidade de qualquer norma que atente contra o Corão ou
contrarie os valores islâmicos (Iraque, Afeganistão). Não obstante, há Estados em
que, havendo um domínio claro do Islão, se tentam afirmar como Estados de
Direito Democráticos (Turquia).

-Soberania > Não existem eleições livres pois existe uma ideia de soberania
divina e de comunidade religiosa › prevalência da soberania e vontade divina que
se materializa na interpretação dos clérigos (peso político determinante do Estado
Islâmico). Rejeição da ideia de Nação privilegiando-se a comunidade de fiéis
como noção supranacional.

-Durante algum tempo, o Estado Islâmico foi percecionado como equilibrado


(limitação mútua do poder político pelo poder religioso), até à intervenção e
tentativas de modernização e laicização por parte do Ocidente › ingerência
externa levou, ao contrário do idealizado, a uma maior e mais pronunciada ação
da instituição religiosa.

2ª FASE: ESTADO SOCIAL E DEMOCRÁTICO DE DIREITO


-A 1ª Guerra Mundial expôs as fragilidades do Estado de Direito Liberal (o
Estado de Direito Liberal cumpriu o seu papel no passado, mas deixa de
responder às necessidades e às aspirações das pessoas; o modelo Liberal funciona
bem em épocas de crescimento económico, mas falha em tempos de crise, em

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Beatriz Teixeira 2020/2021

que o Estado deve intervir e não apenas assistir).

-Com a falência do modelo liberal, que considera a separação entre o Estado e a


Sociedade algo ideal e desejável, novas experiências políticas surgem e nasce o
Estado de Direito Democrático e Social, “alternativa que procura reatar ou
prosseguir o ideal de Estado de Direito nas novas condições do século XX”.

-O Estado social e democrático de Direito apresenta uma dinâmica bidirecional: -


> estadualização da sociedade: Estado “mete-se” em vários assuntos da
sociedade: política económica intervencionista, presta bens e serviços e
empenha-se na criação de infraestruturas requeridas pelo crescimento
económico) -> (recíproca) socialização do Estado: a sociedade tende a
“apoderarse” do Estado através da representação política, e da ação dos grupos
de interesse e das organizações sociais;

-Nesta fase, o que muda em relação ao Estado Liberal são os fins do Estado e a
relação Estado-indivíduos (“Significa isto que o Estado assume novos fins,
desenvolve uma intervenção social e económica quantitativa e qualitativamente
distinta da (não) intervenção do Estado liberal, mas continua a fazê-lo no mesmo
quadro de limitação jurídica e de respeito pelos direitos e liberdades individuais
pressupostos na existência de qualquer Estado de Direito”).

-No Estado de Direito Democrático e Social, empenhado na “criação das


condições materiais que permitam a cada um o livre desenvolvimento da sua
personalidade e uma existência condigna”, a conceção dos direitos fundamentais
muda:

› Os direitos deixam de ser apenas negativos (no Estado Liberal, todos os


direitos assentam na abstenção do Estado) e passam a ter uma dimensão
simultaneamente positiva (intervenção do Estado) e negativa;

› O direito de propriedade perde o seu carácter absoluto (no Estado de


Direito Liberal, o direito de propriedade era a medida de todos os outros direitos)

› Alargamento dos direitos políticos (enquanto que no Estado Liberal só uma


camada minoritária da população tem acesso ao poder político, no Estado Social
todos devem participar na vida política);

› Surgem como direitos fundamentais os direitos sociais, que incluem


direitos económicos, sociais e culturais (no Estado Liberal, em que a classe
dominante é a burguesia, o acesso à saúde e à educação não era que as pessoas
quisessem ver garantido pelo Estado);

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Beatriz Teixeira 2020/2021

› Os direitos fundamentais podem ser exercidos coletivamente, deixando de


ter uma dimensão meramente individual (direito à greve).

-Os direitos sociais requerem, não a abstenção do Estado (abstenção que vemos
no modelo liberal, onde o Estado intervêm só no estritamente necessário), mas a
intervenção positiva do mesmo › o Estado tem uma função reguladora e passa a
intervir mais, uma vez o seu leque de deveres aumenta exponencialmente. -
Estado deixa de ser abstencionista e ganha uma função reguladora, passando a
intervir no sentido de garantir direitos fundamentais e evitar crises.

-Ainda no âmbito dos direitos fundamentais: os direitos fundamentais passam a


ser vistos não só como direitos de defesa contra os abusos e violações praticadas
pela autoridade pública, mas também como direitos que devem ser protegidos de
eventuais agressões por parte de particulares e entidades privadas;

-Do Estado de Direito Liberal para o Estado de Direito Social e Democrático, o


princípio da separação de poderes sofre transformações:

1) Atribuição ao poder judicial do controlo da verificação da


conformidade constitucional dos atos legislativos e de alguns atos políticos (o
Estado de Direito liberal, a função legislativa estava isenta de qualquer controlo,
pois vigorava o Império da Lei - a lei era vista como sinónimo de justiça e não
havia qualquer controlo, podendo ser aplicadas leis racistas). Assim, para além de
controlarem a legalidade da Administração, os tribunais, independentes, passam a
ter a competência do controlo da constitucionalidade das leis (verificar que leis
ordinárias não vão contra leis constitucionais, situadas numa posição hierárquica
superior). É neste sentido, de verificação das leis por parte do poder judicial, que
surgem tribunais constitucionais.

2) Diluição de fronteiras entre o poder legislativo e o executivo - Aumento


da atividade legislativa dos Governos: -> crescente participação na iniciativa das
leis que o Parlamento aprova -> institucionalização de uma competência
legislativa governamental própria (o Governo passa a ter competência para
legislar sobre certos assuntos) - Parlamentos invadem a área tradicionalmente
reservada aos governos;

3) Novos mecanismos de limitação efetiva do poder (reconhecimento e


encorajamento do pluralismo, dos direitos da oposição e das minorias e do direito
de alternância política; regionalização e descentralização política e
administrativa, etc…).

2. REGIME POLÍTICO

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Beatriz Teixeira 2020/2021

Monarquia
Absoluta
Estado Autocrático

Regimes Políticos do
Ditadura
Regimes Políticos

Democracias Monarquia
Representativas
Limitada
Regimes Ditatoriais
Monarquia Monarquia
Regimes de
Constitucional Orleanista
Transição
Governo Monarquia
Estado de Direito Representativo Parlamentar

Partidos Políticos
Democracia
Representativa
Sistema Eleitoral

MODALIDADES DO REGIME POLÍTICO


a) Monarquia Constitucional

Monarquia Limitada Monarquia Orleanista Monarquia Parlamentar

› Legitimidade Monárquica – Rei é origem do › Legitimidade Monárquica e Democrática; › Legitimidade democrática (Constituição
fundamento do poder político; emana da Assembleia Constituinte e dos
› Maior equilíbrio entre funções e competências do Representantes do Povo nela representados);
› Constituição normativa que limita o poder do Rei Rei e Instituições;
(ainda que seja elaborada por ele) e consagra a › Promulgação pelo Rei é meramente formal;
divisão de poderes e a existência de instituições › Rei perde o Poder Moderador e funções das
representativas; Instituições são reforçadas. › Poder constituinte pertence apenas aos
Representantes do Povo.
› Poder moderador do Rei.

b) Governo Representativo

-É o regime típico do Estado Liberal do Século XIX, podendo existir quer sob
forma de governo monárquica quer sob forma de governo republicana.

-O regime assenta na legitimidade democrática: consequentemente, a


Constituição é exclusivamente aprovada por uma Assembleia Constituinte, que,
eleita pelo Povo, o representa.

-A legitimidade do exercício do poder é a legitimidade democrática, pelo que se


considera que o poder reside originariamente no Povo e deve ser exercido pelos
seus representantes. Ainda que exista legitimidade democrática, “esta não é
levada até às suas últimas consequências”: o Povo que elege tanto a Assembleia
constituinte, como o Parlamento, não inclui todos os cidadãos, pois existe um
sufrágio muito restrito (certas pessoas satisfazem determinado critério, podendo
votar, enquanto outras não têm direito ao voto)

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Beatriz Teixeira 2020/2021

-Enquanto instituição representativa nacional, o Parlamento, orgão onde se


manifesta a vontade geral, é o centro do poder político.

-O Chefe de Estado (rei, caso o regime se desenvolva numa forma de governo


monárquica, ou Presidente da República, caso se desenvolva numa república)
não é um orgão politicamente ativo: tem mais um carácter simbólico, sendo os
seus poderes muito reduzidos.

-O Governo, detentor do poder executivo, é um orgão cada vez mais sob


dependência política da Parlamento e perante ele exclusivamente responsável.

-No Parlamento os deputados têm um mandato nacional e representativo. Assim,


“cada deputado se considera representante de toda a coletividade nacional e não
apenas dos eleitores do círculo eleitoral por onde foi eleito”.

-Como referido, há legitimidade democrática mas, por força do sufrágio restrito,


os eleitores não correspondem a todos os cidadãos, mas antes a um conjunto
específico de pessoas: dentro deste conjunto de pessoas, temos principalmente
os proprietários.

-Como vemos, os eleitores são, quase sempre, indivíduos da mesma classe/


estatuto, pelo que não existem entre eles grandes diferenças em termos de ideais,
interesses económicos e formas de organização social. Isto condiciona as
eleições:

> Nas eleições, os eleitores não fazem uma escolha entre projetos ou
programas muito diferentes, uma vez que não existem grandes diferenças
ideológicas. A inexistência de grandes diferenças faz com que os partidos
políticos não tenham um papel relevante. –

> “A eleição tem o carácter de uma designação dos indivíduos que, de


entre as classes proprietárias, se consideram mais capazes de as representar”.
c) Democracia Representativa

-À semelhança do regime de governo representativo, a democracia


representativa assenta na legitimidade democrática e pode-se desenvolver em
qualquer forma de governo (monarquia ou república). No entanto, existem
diferenças significativas entre o governo representativo e a democracia
representativa:

a) No governo representativo, só uma minoria vota, uma vez que vigora o


sufrágio censitário. Na democracia representativa, o sufrágio censitário dá lugar
ao sufrágio universal, que faz com que todos os indivíduos adultos tenham o
direito ao voto (“só agora o Povo é considerado como povo de todos os
cidadãos, de todas as pessoas sob jurisdição do Estado, sem qualquer
discriminação”).

b) No governo representativo, as pessoas que votam têm conceções e


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Beatriz Teixeira 2020/2021

interesses muito semelhantes, pelo que a eleição representa a escolha das


pessoas que fisicamente vão exercer o mandato, e não a escolha entre vários
programas diferentes. Neste contexto de homogeneidade de ideais e interesses,
os partidos políticos não têm grande importância. Com o alargamento do
sufrágio a todos os cidadãos, o corpo eleitoral passa a ser atravessado por
diferentes ideologias e perspetivas. A heterogeneidade do conjunto de eleitores
faz com que os partidos políticos, que se distinguem em função de diferentes
programas e interesses, assumam um papel decisivo no exercício do poder
político —> existem “diferentes projetos de organização económica e social, a
que correspondem diferentes programas políticos que, assumidos pelos
diferentes partidos, são apresentados concorrencialmente ao eleitorado”

-Na democracia representativa:

> Os partidos políticos, detentores de programas de governo muito


diferentes, têm, de forma quase exclusiva, a competência para apresentar
candidaturas. Consequentemente, são eles que têm a quase exclusividade da
representação política.

> Sem a liberdade de formação de partidos políticos, não existe um


verdadeiro pluralismo político, assim como qualquer garantia da liberdade de
escolha e da existência de alternativas. Para além disso, a existência de partidos
torna possível que os cidadãos utilizem, de forma retributiva, o seu direito de
voto, isto é, se estiver descontente com o governo atual, e pretender substituí-lo
por outro, o cidadão penaliza o partido do governo e vota noutro - cidadão tem
peso eleitoral porque existem partidos.

> O sistema eleitoral é uma questão decisiva no regime de democracia


representativa. Sistema eleitoral em sentido lato: normas sobre a delimitação, o
número e a magnitude dos círculos eleitorais, sobre a capacidade eleitoral ativa
e passiva, sobre a apresentação de candidaturas, sobre a contagem de votos e
método eleitoral Sistema eleitoral em sentido estrito: método eleitoral (método
de transformação do número de votos obtidos por cada candidatura em
mandatos parlamentares).

SISTEMAS ELEITORAIS

Sistema Maioritário Sistema Proporcional

› ›

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Beatriz Teixeira 2020/2021

3. FORMA DE ESTADO
-A distinção entre as formas de estado prende-se com a estruturação vertical do
poder do Estado. A diferenciação pode ser feita a partir das seguintes questões: -
Existe uma única Constituição ou mais do que uma? - Existe só um governo ou,
dentro do mesmo Estado, temos vários governos? - Existe uma única ordem
jurídica ou várias ordens jurídicas?
FORMA DE ESTADO

Estado Unitário Estado Federal Estado Unitário Regional

› 1 Governo, 1 Constituição, 1 Ordem › Vários Estados unitários agregam-se › Alguns Estados unitários
Jurídica; para constituir uma nova entidade estatal descentralizam não só funções
administrativas, como também funções
› Estados Federados subordinados às políticas
entidades estatais

-Diferenças:

> ESTADO FEDERAL: Estados Federados têm Constituições próprias


(ainda que obrigatoriamente subordinadas à Constituição Federal);

> ESTADO UNITÁRIO REGIONAL: Regiões Autónomas não têm poder


constituinte - têm “Estatutos de Autonomia”, que são estabelecidos ou
aprovados pelo poder central e que só entram em vigor através de lei aprovada
por orgão de soberania;

> ESTADO FEDERAL: os Estados federados têm os seus próprios


representantes no parlamento federal (Senado);

> ESTADO UNITÁRIO REGIONAL: as Regiões Autónomas não estão


representadas no parlamento nacional;

> ESTADO FEDERAL: Estado federado intervêm na reforma/revisão


constitucional (pode intervir no processo de modificar a Constituição do Estado
federal);

> ESTADO UNITÁRIO REGIONAL: Regiões Autónomas não participam


na revisão constitucional.

4. SISTEMA DE GOVERNO

HISTÓRIA DO CONSTITUCIONALISMO PORTUGUÊS

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Beatriz Teixeira 2020/2021

CRONOLOGIA DAS CONSTITUIÇÕES PORTUGUESAS


-Análise das Constituições Portuguesas de acordo com o tipo histórico de Estado:

1820 1826 1933 1976


(Consittuição (Constituição de (Constituição de
(Revolução 1822 1938 1911
Estado de Estado Estado Social
Liberal) Direito Liberal) Autocrático) Democrático)

-Constitucionalismo português tem 2 fases:

> 1ª Fase (1822 a 1842): período de grande instabilidade constitucional; A


grande instabilidade constitucional (vigência precária das Constituições) reflete o
período de luta entre liberais e absolutistas, vintistas (adeptos da Constituição de
1822) e cartistas (adeptos da Carta Constitucional); - Neste período, vemos os
vários regimes políticos da monarquia constitucional;

> 2ª Fase (1842 até hoje): período de estabilidade constitucional; Este


período inicia-se com a 3ª vigência da Carta Constitucional e nele vemos duas
formas de governo (monarquia e república) e vários tipos históricos de Estado.

CONSTITUIÇÃO DE 1822
-Representa a vitória do movimento constitucional sobre o regime absoluto,
sendo uma Constituição de Estado de Direito Liberal - divisão de poderes,
proclamação das liberdades e garantias individuais - A Constituição de 1822,
bastante radical para a época, instaura uma monarquia parlamentar;

-Legitimidade exclusivamente democrática: a soberania da Nação que, através


da eleição de deputados para uma Assembleia, está incumbida de elaborar uma
Constituição;

-Rei é uma figura sem intervenção política e constituinte - “a forma de governo


monárquica não reflete qualquer posição relevante do rei em termos de exercício
efetivo do poder político”;

-Parlamento unicameral (inovador para a época) e eleito por sufrágio direto e


censitário - A Constituição de 22 é a única Constituição Portuguesa que não
consagra um Estado unitário ("Reino Unido de Portugal e Brasil”).

CARTA CONSTITUCIONAL DE 1826


-A Carta Constitucional acaba com o regime de monarquia parlamentar,
consagrado pela Constituição de 1820, e institui uma monarquia limitada;

-Legitimidade exclusivamente monárquica: já não é uma Assembleia que detém


o poder constituinte - é o rei (neste caso, D. Pedro IV) que, por sua própria
vontade, decide autolimitar-se através da outorga de uma Carta Constitucional
Nação;

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-Não há uma verdadeira limitação de podes do rei - através do poder moderador


(que se junta ao executivo), o monarca tem competências que lhe permitem
controlar e intervir de forma decisiva em toda a vida política;

-Parlamento bicameral (2 câmaras: Câmara dos Pares, cuja composição é


determinada pelo rei, e Câmara dos Representantes, eleito por sufrágio indireto
e censitário).

CONSTITUIÇÃO DE 1838
-Um “meio termo” entre a Constituição de 1822 e a Carta de 1826 - A
Constituição de 1836 institui uma monarquia orleanistam;

-Compromisso entre legitimidade monárquica e legitimidade democrática no


momento de elaborar e aprovar uma Constituição (os representantes do Povo
elaboram e aprovam a Constituição, que necessita mesmo de ter o
consentimento monárquico), como no exercício do poder político (o rei perde o
poder moderador, deixando de controlar e intervir em todo o exercício do poder
político; Parlamento é bicameral, mas a composição das duas câmaras é
determinada por eleição, e o sufrágio é direto e censitário)

CONSTITUIÇÃO DE 1911
-Mudança da forma de governo: da monarquia passa-se para a república

-Não vigora ainda um regime de democracia representativa, mas o regime de


governo representativo liberal (essencialmente o grupo dos eleitores é muito
restrito)

-Presidente da República tem um papel muito pouco relevante, contrariamente


ao Congresso bicameral que, eleito por sufrágio direto, “é o verdadeiro centro de
toda a vida política)

-Presidente, detentor do executivo, está completamente dependente do


Parlamento, do Congresso (logo pelo facto de ser nomeado e de poder ser
destituído por este)

CONSTITUIÇÃO DE 1933
-Constituição de Estado autocrático conservador, com forte inspiração do
fascismo italiano;

-A elaboração e aprovação da Constituição revelam logo o seu caracter não-


democrático: a Constituição é elaborada não por uma Assembleia, mas por um
grupo restrito encabeçado por Salazar, e é sujeita a plebiscito nacional (a
ditadura faz com que o plebiscito não tenha carácter de decisão popular);

-Grande importância dada às corporações, que permitem que os indivíduos

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Beatriz Teixeira 2020/2021

participem na vida da Nação, fa surgir a Câmara corporativa (câmara onde estão


representados os vários organismos corporativos); -> Poder político: grande
importância dada ao chefe de Estado (Salazar), detentor de um grande leque de
poderes; desvalorização da “Assembleia Nacional”, assembleia representativa
dos cidadão.

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