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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO

UNIVERSIDADE ABERTA DO SUS

MICHELLE REGINA MOMESSO

PRÁTICA DE ATENÇÃO PLENA (MINDFULNESS) EM PACIENTES COM


TRANSTORNO MENTAL COMUM NA ATENÇÃO PRIMÁRIA

SÃO PAULO
2020
MICHELLE REGINA MOMESSO

PRÁTICA DE ATENÇÃO PLENA (MINDFULNESS) EM PACIENTES COM


TRANSTORNO MENTAL COMUM NA ATENÇÃO PRIMÁRIA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado


ao Curso de Especialização em Saúde da
Família da Universidade Federal de São Paulo
para obtenção do título de Especialista em
Saúde da Família

Orientação: MARIANA CRISTINA LOBATO DOS SANTOS

SÃO PAULO
2020
Resumo

Este trabalho tem a finalidade de contribuir com a melhora da saúde mental, física e
emocional dos pacientes da Unidade Básica de Saúde da Vila Carioca, localizada no Distrito
do Ipiranga, Zona Sul da cidade de São Paulo, estado de São Paulo, Brasil. Foi identificado por
meio das consultas agendadas e acolhimentos de demanda espontânea uma grande
quantidade de pacientes que sofrem de Transtorno Mental Comum (TMC) ou qualquer
sofrimento psíquico, como sintomas de ansiedade e depressão, níveis elevados de estresse,
reatividade excessiva às situações cotidianas, frequentes autocriticas e autopunições
prejudiciais à saúde. Identificando os malefícios que o sofrimento psíquico pode causar na
vida dos pacientes e a alta procura por atendimento médico com queixas inespecíficas e
excessivas, bem como com a dificuldade do sistema em absorver a demanda desses
pacientes, esta médica procurou estudar os benefícios dos programas de Mindfulness e
implementar um grupo psicoeducativo no espaço da Igreja Santo Antônio, onde será
realizado o protocolo com oito sessões, além de atividades realizadas em domicílio. As
práticas de Mindfulness são fruto da união de saberes de tradições contemplativas e
conhecimentos da medicina, psicologia e educação. Estudos científicos têm mostrado como
os exercícios dessa prática são poderosas ferramentas para saúde mental, física e emocional,
além de ser uma estratégia de baixo custo, de caráter autossustentável, pois a prática tem
como princípio o desenvolvimento de autonomia, e empoderamento das pessoas por meio do
treinamento da atenção plena e também pode ter um efeito de empoderamento individual e
comunitário

Palavra-chave

Transtornos de Ansiedade. Terapia Comportamental. Saúde Mental. Práticas Integrativas e


Complementares. Depressão. Transtornos Mentais. Meditação.
PROBLEMA/SITUAÇÃO

Foi observada a alta prevalência de pessoas que sofrem Transtorno Mental Comum (TMC)
nos atendimentos das unidades de atenção básica. Sintomas como ansiedade, estresse,
desanimo, sintomas depressivos, são frequentemente relatados durante as consultas, além
de sintomas psicossomáticos. Além disso, foi encontrada dificuldade de atender a demanda
desses pacientes com algum tipo de sofrimento psíquico. Embora o profissional de psicologia
seja um componente do Núcleo de Apoio a Saúde da Família (NASF), a consulta individual e a
realização de psicoterapia e uma atenção mais focada, é limitada em virtude da quantidade
de casos, sendo necessário realizar seleção dos casos. Neste contexto, o recurso mais viável
encontrado pelos médicos na tentativa de amenizar o sofrimento do paciente é a terapia
medicamentosa.

Com isso se faz necessária a criação de ferramentas que ajudem as pessoas a melhorarem
os níveis de estresse, ansiedade, como por exemplo implementar sessões de Mindfulness
(atenção plena) no grupo de Saúde Mental para auxiliar os indivíduos na redução dos
sintomas, e evitar a "medicalização do problema".
ESTUDO DA LITERATURA

Transtorno Mental Comum (TMC) é caracterizado por sintomas depressivos, ansiedade,


irritabilidade, fadiga, insônia, problemas de memória e concentração e queixas somáticas. As
pessoas que sofrem desses fenômenos acima, também apresentam queixas como mudança
no sono e apetite, dores, cansaço, palpitações, tontura ou mesmo alterações gástricas e
intestinais (Parreira, et al., 2017; Lucchese et al., 2014).

A ansiedade, por exemplo faz parte da rotina de muitos moradores de grandes centros
urbanos. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, o Brasil é o país mais ansioso do
mundo. Tais transtornos representam alto custo social e econômico, constituindo uma causa
importante de absenteísmo no trabalho, além de elevarem a demanda nos serviços de
saúde.

Estudos nacionais, apontam que tanto no contexto rural, quanto no urbano, diversos fatores
sociais, culturais e comportamentais podem estar relacionados aos TMC e ainda,
identificaram a prevalência de TMC em mulheres e idosos, a pessoas de baixos níveis de
escolaridade, de baixa renda (Parreira, et al., 2017; Lucchese et al., 2014).

A identificação precoce e a assistência individualizada na atenção primária de saúde, e a


adequada intervenção, são essenciais para diminuir as complicações referentes a esses
transtornos. Entretanto, nem sempre o serviço de atenção básica apresenta condições para
oferecer suporte a essa demanda, apesar de o Ministério da Saúde, através da Portaria nº
154/2008, recomendar a contratação um profissional da área de saúde mental para cada
NASF. Como proposto pelo Ministério da Saúde a Unidade Básica Saúde (UBS) deve realizar
consultas individuais para os usuários, para os que apresentam sofrimento mental e
demandam intervenção individual (Correia, Barroz, Calvero, 2011).

A formação de grupo caracteriza-se como mais uma ferramenta na tentativa de amenizar


esse problema. Atividades podem ser organizadas sob a forma de um espaço comunitário
que possibilita a troca de experiências e de sabedorias de vida. A Terapia Comunitária, por
exemplo, visa trabalhar de forma importante ao propor que cada um que participe da sessão
seja corresponsável no processo terapêutico e que produz efeitos tanto grupais quanto
individuais. O processo grupal, desde que bem pensado em sua finalidade, estrutura e
manejo, permite uma rica troca de experiências e transformações (Fernandes, 2018).

Em 2006, foi aprovada a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC)


para o SUS, pela Portaria nº 971, de 03 de maio de 2006, que normatiza e incentiva a
utilização dessas práticas no Brasil, abrangendo terapias físicas, psíquicas e espirituais.
Recentemente a meditação foi incluída na PNPIC sendo usada cada vez mais na área da
saúde, na prevenção e no tratamento de diversas doenças e condições clínicas. Essa prática
está associada ao aumento da qualidade de vida e à redução dos níveis prejudiciais de
sintomas de estresse, de ansiedade e de depressão (Ministério da Saúde, 2015; Ministério da
Saúde, 2018).

O termo Mindfulness é uma tradução inglesa da palavra sati no idioma Pali ( língua original
dos ensinamentos de Buda). Para a língua portuguesa é traduzido como Atenção Plena.
Encontrada em diversas tradições culturais, religiosas e filosóficas, como, por exemplo, no
budismo e na filosofia grega antiga (em especial, no estoicismo), Mindfulness (atenção
plena), praticada de forma secular, tem sido cada vez mais integrada na prática clínica
contemporânea (Girard, Feix, 2016).

Meditação não é religião. A atenção plena é apenas um método de treinamento mental que
auxilia a criação de consciência profunda podendo gerar uma mudança comportamental.
Essa prática ajuda a reconhecer sentimentos, como o medo, a tristeza, a fadiga, o
desconforto, a exaustão, e o encoraja a se voltar para aquelas emoções desconfortáveis e
saber enfrentá-las (Demarzo, Garcia-Campayo, 2017; Williams, Penman,2015).

Sintomas de TMC geralmente estão ligados ao processamento do passado ou futuro


(depressão - ansiedade). O Mindfulness ajuda a sair dessa dicotomia. Por meio de técnicas
que levam o indivíduo a tornar-se menos responsivo, consciente, desperto, reconhecer o que
está acontecendo no momento presente. As intervenções baseadas em Mindfulness
envolvem mecanismos ligados à regulação da atenção, da emoção e consciência corporal
(Girard, Feix, 2016).

Existem diferentes protocolos de práticas de atenção plena reconhecidos, tais como


Mindfulness based stress reduction (MBSR), Mindfulness based Cognitive Therapy (MBCT),
Body in Mind Training (BMT), Mindfulness Based Eating Awareness Training (MB-EAT), Mindful
self- compassion (MSC). Respaldados por pesquisas e importantes instituições, como a
Universidade de Massachussets, Oxford, King’s College entre outros (Demarzo, Garcia-
Campayo, 2017).

Em geral, os programas de Mindfulness são desenvolvidos em grupo, ao longo de oito


semanas, com uma sessão presencial por semana de aproximadamente duas horas, na qual
são ensinados e praticados os exercícios de Mindfulness (Mouzinho et al., 2018). Já existe
evidência de impacto em protocolos mais curtos de cinco ou seis sessões. Pode existir
variações quanto à carga horária, formato, frequência semanal. E os efeitos dependem
também do perfil do público (Demarzo, Garcia-Campayo, 2017).

A utilização das práticas baseadas em Mindfulness é uma estratégia de baixo custo, de


caráter autossustentável, pois a prática tem como princípio o desenvolvimento de
autonomia, e empoderamento das pessoas por meio do treinamento da atenção plena e
também pode ter um efeito de empoderamento comunitário, ao melhorar as relações entre
as pessoas (Williams, Penman, 2015).
AÇÕES

Este projeto será aplicado na Unidade Básica do Vila Carioca, no distrito Ipiranga, zona sul de
São Paulo. O grupo de Mindfulness será composto por pessoas com mais de 18 anos
diagnosticadas em consulta com Transtorno Mental Comum e que tenham qualquer
sofrimento psíquico, como sintomas de ansiedade e depressão, níveis elevados de estresse,
frequentes autocríticas e autopunições.

O projeto será divulgado e oferecido nas consultas de médicos e equipe do Núcleo de Apoio à
Saúde da Família para aqueles pacientes que forem identificados com TMC. O grupo será
realizado por um profissional médico, psicólogo ou enfermeiro que tenha capacitação em
Mindfulness.

O programa realizará uso de diferentes atividades psicoeducativas nas quais o participante


será capaz de desenvolver habilidades de atenção, concentração e regulação emocional, por
meio de exercícios simples e acessíveis que envolvem o cultivo da intenção e das atitudes de
abertura, curiosidade e gentileza com a própria mente, emoções, corpo e relacionamentos.
Colaborando assim, com a saúde física, mental e emocional do indivíduo e de sua
comunidade.

O grupo será composto por um número de até 15 participantes. Serão realizados 8 encontros
semanais de 1:30h no espaço da Igreja Santo Antônio. Serão, também, oferecidos materiais
de apoio, como textos e áudios via aplicativo de Whatsapp ou por e-mail para que os
exercícios sejam praticados em casa, ao longo da semana e passem a fazer da rotina dos
participantes. A cada sessão, será abordado como foi a prática durante a semana,
explorando as experiencias individuais, assim como as dificuldades e os benefícios já
vivenciados. Após 1 mês do término da última sessão, será realizada uma reavaliação em
grupo com todos os participantes e individualmente para aqueles casos que sejam julgados
necessários.
RESULTADOS ESPERADOS

Por meio desse projeto, espera-se que os participantes criem habilidades de atenção,
concentração e regulação emocional, por meio de exercícios simples e acessíveis que
envolvam o cultivo da intenção e das atitudes de abertura, curiosidade e gentileza com a
própria mente, emoções, corpo e relacionamentos. Colaborando assim, com a saúde física,
mental e emocional do indivíduo e de sua comunidade. O protocolo de Mindfulness será
realizado em grupos em que serão elaboradas diferentes atividades psicoeducativas por um
determinado tempo de duração, mas o desenvolvimento das habilidades citadas está
baseado no cultivo contínuo de atitudes e exercícios cotidianos.

Além dos benefícios citados, espera-se diminuir o uso de psicofármacos para Transtorno
Mental Comum por vezes prescritos como alternativa para a falta de opções psicoeducativas
e diminuir agendamentos de hiperutilizadores do sistema com queixas inespecíficas.
REFERÊNCIAS

CORREIA, Valmir Rycheta; BARROS, Sônia; COLVERO, Luciana de Almeida. Saúde mental na
atenção básica: prática da equipe de saúde da família. Revista da escola de enfermagem da
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DEMARZO, M. M. P.; GARCIA-CAMPAYO, J. . Mindfulness Aplicado à Saúde. In: Daniel Knupp


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de Família e Comunidade. 1ed.Porto Alegre-RS: Artmed Panamericana, 2017, v. 12, p. 125-
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em
https://www.researchgate.net/publication/317225586_Mindfulness_Aplicado_a_Saude_Mindful
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FERNANDES, Mariana. Os efeitos de um programa de Mindfulness para profissionais da


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Ribeirão Preto, 2018. doi:10.11606/D.17.2018.tde-25072018-155917.

GIRARD, Tanize Viviane Gonçalves; FEIX, Leandro da Fonte. Mindfulness: Concepções


Teóricas e Aplicações Clínicas Revista das Ciências da Saúde do Oeste Baiano - Higia 2016; 1
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LUCCHESE, Roselma et al . Prevalência de transtorno mental comum na atenção


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