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Centro de Ensino, Avaliação e Pesquisa de Goiás


Faculdade Delta
Programa de Pós-Graduação Lato Sensu

JOYCE MARIA MORAIS DA ROCHA


MARIANE MIRANDA SILVA
PAULA BRIELLE PONTES SILVA

ABORDAGEM NUTRICIONAL E MODULAÇÃO INTESTINAL EM CRIANÇA NO


TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA): UM RELATO DE EXPERIÊNCIA

GOIÂNIA
2022
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Centro de Ensino, Avaliação e Pesquisa de Goiás


Faculdade Delta
Programa de Pós-Graduação Lato Sensu

JOYCE MARIA MORAIS DA ROCHA


MARIANE MIRANDA SILVA
PAULA BRIELLE PONTES SILVA

ABORDAGEM NUTRICIONAL E MODULAÇÃO INTESTINAL EM CRIANÇA NO


TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA): UM RELATO DE EXPERIÊNCIA

Trabalho de Conclusão de curso


apresentado a CEAPG em cumprimento
ao requisito para obtenção de pós
graduação de Nutrição com Foco em
TEA, T21 e TDAH.

GOIÂNIA
2022
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SUMÁRIO

1. Resumo ....................................................................................................................... 4

2. Palavras-chave ............................................................................................................ 4

3. Introdução ................................................................................................................... 5

4. Materiais e métodos .................................................................................................... 6

5. Resultados ................................................................................................................... 7

6. Discussão .................................................................................................................... 10

7. Considerações finais ................................................................................................... 13

8. Referências ................................................................................................................. 14
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1. Resumo

Introdução: Transtorno do espectro autista (TEA), caracteriza-se como um transtorno invasivo do


desenvolvimento que envolve distintas áreas e dificuldades no decorrer da vida, nas habilidades
sociais e comunicativas, com comportamentos e interesses limitados e repetitivos. Estudos recentes
mencionam o eixo intestino-cérebro como um fator relacionado à gravidade das comorbidades
associadas ao TEA. Objetivo: relatar a experiência de atendimento nutricional em paciente no
espectro, verificando os resultados obtidos à luz da literatura científica. Materiais e métodos: relato
de experiência de atendimento nutricional e modulação intestinal em paciente no TEA, embasado
em referências nas bases de dados SCIELO, PUBMED, EBSCO e LILACS sendo selecionados os
artigos científicos publicados entre os anos de 2004 e 2021. Resultados: O paciente atendido
apresentou melhoras significativas nos sintomas gastrointestinais e também nos fatores
comportamentais e sociais. CONCLUSÃO: De acordo com os achados clínicos relatados, bem
como os artigos revisados, parece haver uma relação positiva entre a saúde gastrointestinal e o
agravo dos sintomas de TEA.
2. Palavras-chave: autismo, nutrição, intestino
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3. Introdução

O transtorno do espectro autista (TEA), é um transtorno do neurodesenvolvimento


caracterizado principalmente por dois prejuízos, sendo eles: a comunicação social e comportamento
repetitivo e restritivo. É chamado de espectro pois se apresentam de formas diferentes em cada
indivíduo, podendo ser de forma mais leve, moderado ou severa, comprometendo o
desenvolvimento e autonomia do indivíduo (AMI, 2006). Atualmente vemos uma crescente na
prevalência de autismo nos EUA, em 2004 a proporção era 1 em 166 pessoas, já em 2020 é de 1 em
44 crianças (CDC - Centers for Disease Control and Prevention, 2020).
Em muitos casos o diagnóstico de TEA se dá na primeiríssima infância, que é quando a criança tem
o desenvolvimento de forma acelerada, mas os pais começam a ver sinais de pouco contato visual,
isolamento social, não dar função aos brinquedos, problemas na fala, dentre outras características
marcantes do autismo. O diagnóstico é feito por meio de entrevista com os pais e observações
clínicas para confirmação da hipótese, podendo até mesmo solicitar relatório de avaliação de outros
profissionais para conclusão (SILVA, 2009).
Existe um consenso dentro da comunidade científica de que há fina relação entre o cérebro com a
modulação do intestino, e do sistema imunológico, de modo que um intestino disfuncional poderia
gerar cascatas neuroendócrinas que implicaram na piora de morbidades mentais, sendo uma delas o
transtorno do espectro autista (TEA), além disso, a microbiota intestinal parece também exercer um
papel nas desordens do autismo (GOMES,2016; ZORZO, 2017).
Os estudos em Nutrição associando a modulação intestinal no TEA estão crescendo
exponencialmente, uma vez que são comumente observadas no paciente autista disfunções
gastrointestinais, como a redução da produção de enzimas digestivas, inflamação da parede
intestinal e alterações na permeabilidade intestinal, razões essas que favorecem as desordens no
perfil nutricional desses indivíduos (GOMES,2016; ZORZO, 2017). Entretanto, estudos envolvendo
o eixo-intestino cérebro na modulação dos comportamentos em pacientes com TEA ainda são
controversos.
Diante do exposto, o presente estudo objetiva relatar a experiência de atendimento nutricional em
paciente no espectro, verificando os resultados obtidos à luz da literatura científica.
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4. Materiais e métodos

A Prática Clínica ocorreu em dois momentos, o primeiro no dia vinte e seis(26/06) e o segundo
no dia vinte e sete de junho do ano de dois mil e vinte e um(26/06/21), via plataforma online. A
prática foi realizada em grupo, estando presentes as Nutricionistas pós graduandas Carla
Bertocini, Joyce Rocha, Kalione Lima, Mariane Miranda e Paula Brielle e a Familia Rossini,
composta pelos pais K.P.L. (33 anos) ,A.M.R.F. (32 anos) e o Paciente avaliado J.L.P.R, 4 anos
(19/06/2017).
No primeiro momento foi realizado acolhimento da mãe K.P.L. e do paciente J.L.P.R, 4 anos e
feita anamnese detalhada a respeito do histórico pregresso dos pais, parto, amamentação,
introdução alimentar, rotina da família, investigação, diagnóstico do Transtorno do Espectro
Autista(TEA), terapias e principais queixas da família. Durante a prática clínica foi realizada a
observação do comportamento da criança, levando-se em consideração as observações da mãe,
como também foi realizada uma prática para avaliar a função mastigatória do paciente. Após a
realização da consulta, a equipe se reuniu para decidir a conduta a ser traçada e fazer avaliação
nutricional do paciente através dos dados relatados pela mãe. Foi utilizada a curva do
desenvolvimento infantil da Organização Mundial de Saúde(OMS) para avaliação do estado
nutricional da criança e software Dietbox para calcular as necessidades calóricas da mesma,
como também para a elaboração do plano alimentar adequado. Além disso, decidimos a
suplementação e orientações individualizadas e solicitamos exames que contribuíssem para uma
avaliação mais detalhada.
No segundo momento a equipe se reuniu com a família para apresentar e explicar a conduta a ser
aplicada, desde a entrega do mapa alimentar proposto com receitas, prescrição de suplementação
individualizada para ajudar nas queixas da família e comportamentos observados, solicitação dos
exames especificando a importância de cada um para investigação de possíveis causas
metabólicas, como também orientações no que diz respeito ao ambiente, além de uma proposta
de atividades lúdicas que ajudassem na ampliação da variedade alimentar aceita pelo paciente.
Foi programado com a família um retorno com data agendada para o dia vinte e um de agosto do
ano de dois mil e vinte e um(21/08/2021).
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5. Resultados

Durante a prática clínica realizada em grupo, a mãe K.P.L.(33 anos) relatou que o paciente
J.L.P.R, (4 anos) foi amamentado exclusivamente até os 6 meses e apresentou todos os sinais de
prontidão para a idade. Aos 8 meses com a introdução da fórmula, a mãe relata que ele teve sua
primeira crise respiratória(bronquiolite), fazendo uso pela primeira vez de antibióticos, o qual
apresentou reação alérgica. Após este episódio ele apresentou crises de otite e fez uso de antibiótico
mais três vezes até os dois anos de idade. Com 12 meses foi introduzido fórmula milnutri. Paciente
apresenta histórico de distensão abdominal e cólicas e apresenta fezes do tipo 3, segundo a escala de
Bistrol, mas que geralmente são aeradas e flutuam. Queixa de eructações e flatulência. Apresenta em
algumas situações irritabilidade e agitação, principalmente quando exposto a alimentos que
contenham glúten e leite. Queixa de sudorese noturna, relata sono tranquilo e às vezes acorda devido
episódios noturnos de congestão nasal. A mãe relata ainda que há 6 meses iniciou a retirar leite e
glúten da rotina alimentar da criança, o que diminuiu os episódios de irritação e o deixou menos
agitado, mas a criança acaba tendo contato aos finais de semana na casa dos avós. E que após a retirada
destes alimentos da rotina houve uma melhora na qualidade das fezes do mesmo, que passaram a
afundar e houve uma diminuição dos episódios de eructações e flatulência e melhora da sudorese
noturna. Durante a prática clínica, pudemos observar também uma dificuldade de lateralização de
língua, que necessita de investigação mais detalhada. Segundo a mãe, a criança consegue mastigar
alimentos (carne, frango) e não se queixa de dor ao deglutir. Observamos ainda rigidez de
comportamento, consome quase os mesmos alimentos diariamente, seletividade alimentar,
principalmente por verduras e legumes, ele só consome os mesmos dentro da sopa de abobrinha,
exceto na sopa, só come brócolis e tomate. Possui uma boa aceitação por Frutas. Possui certa
compulsão alimentar quando exposto a bolo, mas quando fica sem rotina apresenta episódios
compulsivos e come tudo que tem disponível, independente de ser doce ou salgado.
J.L.P.R(4 anos) está em psicoterapia ABA, fonoterapia e terapia ocupacional. Foram
observadas olheiras e episódios de inflamação do trato respiratório com frequência e mãe relata
episódios de auto estimulação que teve início há 4 meses, o que tem atrapalhado nas terapias e que
terapeutas tem falado frequentemente em tratamento farmacológico, mas a mesma busca tratamento
nutricional visando resolver as implicações biológicas que interfiram no comportamento. Mãe nega
tratamento farmacológico. Recentemente passou por avaliação pela Gastropediatra que solicitou
exames para investigar alergias alimentares e está em tratamento vermífugo e irá iniciar após
tratamento para fungos. A médica também prescreveu suplementação de fitoterápicos e vitamina para
diminuir a agitação e irritabilidade. Além de prescrever o uso de pára probióticos(Bio Mamps) e
Ômega 3 para melhora da função intestinal.
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Apesar da Mãe vir diminuindo a exposição a leite de origem animal e do glúten, há uma
moderada ingestão de farináceos sem glúten e fórmulas vegetais nas receitas, mesmo que a mãe opte
por produtos com menos ingredientes possíveis, sem conservantes, o consumo ainda é bem
significante. Diante do que foi observado e do histórico do paciente, o grupo optou por uma
abordagem Nutricional com Modulação Intestinal mantendo a retirada do leite animal e glúten, além
de orientar a família quanto a importância de uma alimentação mais natural.

Adequação no plano alimentar, solicitação de exames laboratoriais e suplementação, que foi


passado a mãe, por vídeo consulta, no dia seguinte a consulta, como segue:
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Devido a rigidez de comportamento foram entregues orientações quanto a trabalhar de maneira


lúdica, envolvendo atividades que visam aumentar a intimidade da criança e também quanto a
importância da rotina alimentar e do sentar à mesa e do espelhamento dos alimentos presentes na
alimentação dos Pais buscando ampliar o cardápio do mesmo. No plano Alimentar proposto
sugerimos a elaboração de receitas com menos ingredientes industrializados e o acréscimo de
nutrientes naturais para enriquecer estas, visto que a mãe é bem participativa nos preparos, o que
contribui para a aplicação da rotina alimentar. Visando ainda a melhora das implicações biológicas
prescrevemos suplementação para somar aquela já prescrita pela gastropediatra. Sugerimos a
suplementação de um composto antioxidante para melhorar a metilação, além da reposição de
vitaminas lipossolúveis e ácidos graxos essenciais. Solicitamos também exames para investigação de
possíveis causas metabólicas para os sintomas clínicos e comportamentais observados.
Após dois meses da consulta, houve a consulta de retorno do paciente para verificação sobre a
adesão ao tratamento e ajuste dos objetivos e condutas. Toda a família aderiu a dieta sem glúten e sem
caseína e sem soja (SGSCSS). A mãe relatou que não conseguiu realizar os exames, pois não
conseguiram colher o sangue do paciente. Seguiu com a suplementação proposta, mas sentiu uma
certa dificuldade para seguir o plano alimentar proposto devido a criança não demonstrar interesse
por alimentos salgados. O leite animal e o glúten foram retirados totalmente da rotina alimentar da
família. Relatou ainda que seguindo as orientações propostas acrescentou nutrientes naturais(legumes
e verduras) nos alimentos aceitos por ele como por exemplo no feijão usando este como reforçador e
que mesmo alterando a cor, houve aceitação por parte da criança, e que após a criança ver a mãe
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comendo alimentos como o mamão por repetidas vezes, despertou a curiosidade em provar e voltou
a fazer parte da alimentação, ampliando assim as opções aceitas pela criança. Houve quebra da rigidez
de comportamento após as orientações propostas como rotina de sentar a mesa e espelhamento dos
alimentos ingeridos pelos pais.

Desde a retirada total do leite animal e glúten da rotina da família e com a suplementação proposta
pela equipe de Nutrição, a mãe observou que J.L.P.R(4 anos) está mais concentrado, melhorou o foco
nas atividades e está explorando mais o ambiente. Observou também melhora na regularidade
intestinal, com horários mais fixos de evacuação e melhora da qualidade das fezes, se aproximando
do tipo 4 segundo a escala de Bristol. Paciente ainda tem contato esporadicamente com laticínios e
glúten nas casa de familiares, mas mãe relata que com a alteração na alimentação e suplementação
houve melhora dos episódios de irritação e agitação quando exposto a estes alimentos. A mãe relatou
ainda aumento da concentração e diminuição da irritabilidade, maior atenção ao ambiente e às
conversas ao redor. A fala está mais próxima do neurotípico, com menos respostas em terceira pessoa.
Voltou a brincar com brinquedos não eletrônicos e os terapeutas elogiaram a concentração e
coordenação motora. O suor noturno não foi mais observado

A queixa que ela trouxe na primeira consulta, que foi quanto à auto estimulação, diminuiu,
mas ainda acontece o que a incomoda e há desconfiança de que seja algo comportamental e está sendo
trabalhado em terapia.

6. Discussão

O paciente analisado no presente estudo, apresenta diversos sintomas gastrointestinais, que


pareciam interferir no comportamento da criança e nível de irritabilidade. Após a mudança nos hábitos
alimentares e suplementação, a sintomatologia regrediu e foram observados avanços na questão
comportamental. Os sintomas gastrointestinais em crianças portadoras do espectro autista se mostram
comuns, variando o grau da gravidade em cada criança. Os sintomas mais comumente apresentados
são: dor abdominal, constipação, diarréia, os quais causam grandes desconfortos e podem gerar
problemas de comportamento, diminuição da capacidade de aprender o treinamento no banheiro,
levando a maiores frustrações (DIAS, 2016).

O estudo de Silva (2011), corrobora com esse argumento. Em sua pesquisa o mesmo verificou
que é evidente que a intensidade dos distúrbios comportamentais e déficit de aprendizado de crianças
com TEA se relacionarmos com a função intestinal e hábitos alimentares, O mesmo verificou
significativa melhora de comportamento e interação social em um grupo de criança que fazia uso de
probiótico regularmente, já o grupo que não fez uso de probiótico não verificou melhorias e alguns
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casos pode-se notar agravo no quadro clínico-comportamental, o que evidencia cada vez mais a
relação da microbiota com o agravo ou melhora do comportamento autista.

O estudo de BAPTISTA (2012) parece explicar parte dessa relação entre o intestino
fragilizado e o comportamento autístico. Segundo ele, a presença de sintomas gastrointestinais em
pacientes com TEA pode estar relacionada com a gravidade dos sintomas de autismo. As demais, as
taxas de sintomas gastrointestinais em crianças com TEA são maiores do que em crianças com
desenvolvimento típico e podem alterar os níveis normais de serotonina cerebral, uma vez que 95%
desse neurotransmissor é produzido no intestino. Esses altos níveis plasmáticos de serotonina em
indivíduos com autismos, são responsáveis por comportamentos repetitivos e agressivos e estão
relacionados ao aumento da motilidade intestinal, aumento de secreção, vasodilatação e aumento na
permeabilidade vascular, causando dismotilidade, acarretando aparência e consistência das fezes
(BAPTISTA, 2012).

Assim, sintomas gastrointestinais em indivíduos com TEA podem desencadear aumento de


irritabilidade, retraimento social, além de afetar na perturbação do sono, agressões, auto agressão, em
resposta às dores causadas pelo desconforto intestinal. Mesmo sendo vista como um fator comum que
acomete pacientes com TEA, esses sintomas podem apontar uma relação fundamental para o
desempenho do intestino a etiologia do TEA (DING et al., 2016).

Apesar de não estar bem acordado entre os pesquisadores a etiologia do autismo verificaram-
se que alguns portadores do TEA possuem a bactéria 1013 da microbiota como implicadora dos
problemas gastrointestinais que sendo correlacionados com a gravidades dos sintomas
gastrointestinais. Neste estudo foi feito uso de antibiótico e depois feito uma reposição seletiva da
microbiota e apresentou melhora no quadro clínico relacionado ao TEA por até 8 dias após a
finalização do tratamento (KANG, 2017).

Ainda sobre a relação entre saúde gastrointestinal e a etiologia do TEA, OLIVEIRA et al


(2021) analisaram a relação entre sintomas gastrointestinais nos primeiros meses de vida com o
surgimento do autismo. Os autores observaram que 89% a 100% das crianças TEA, apresentavam
histórico de cólicas e estresse durante os três primeiros meses de vida. Segundo Oliveira, essas
alterações intestinais podem ser fatores de risco para o desenvolvimento do autismo. Acredita -se que
fatores ambientais como infecções e também o uso de medicamentos na gestação tenha relação com
o desenvolvimento do transtorno do espectro autista.

A literatura também aponta que cerca de 56% dos portadores de TEA apresentam aumento da
permeabilidade intestinal (GOLDBERG, 2004). Essa hiperpermeabilidade pode fazer com que
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proteínas de alto peso molecular ganhem a corrente sanguínea e disparam reações inflamatórias que
podem influenciar também no comportamento. Esse fenômeno acontece por que essas proteínas não
metabolizadas adequadamente liberam citocinas que favorecem o aumento da liberação de peptídeos
opióides, que também aumentam os níveis de 5HT e portanto, alteram o comportamento. Esse
mecanismo ao avaliar as interações entre o consumo de glúten e caseína no comportamento autista e
observar além das desordens gástricas é evidente mudanças na gravidade dos sintomas
comportamentais (WHITELEY ET AL.,2010).

Antes de iniciar a intervenção nutricional, o paciente relatado no presente estudo de caso


apresentava certo grau de seletividade alimentar, muito comum em crianças no TEA, com tendência
a consumir alimentos ricos em trigo e ultraprocessados. Para tentar minimizar essa dificuldade
alimentar, foi utilizada além da modulação intestinal, suporte de micronutrientes e implementação de
atividades lúdicas, para auxiliar na aproximação com o alimento. No estudo de GOMES et al (2018)
também foi observada uma alta utilização de calorias de alimentos ultraprocessados, e limitação no
consumo de micronutrientes entre os portadores de TEA. Para os autores, a reeducação alimentar e
nutricional se caracteriza como uma possibilidade de controle da deficiência nutricional. Entretanto,
devido a rigidez de comportamento e as disfunções sensoriais comuns nesses pacientes, as
intervenções nutricionais sobre a criança com espectro autista (TEA), requerem uma abordagem
multidisciplinar, que inclua EAN associada com as terapias, além da modulação intestinal e
intervenção dietética sem glúten e caseína (GOMES et al, 2018).

MAGAGNIN (2019) corrobora com Gomes (2018) ao ressaltar a importância da atuação


precoce com uma equipe multiprofissional no tratamento de seletividade alimentar em portadores do
autismo. As equipes geralmente são de terapeutas, psicólogos, nutricionistas, enfermeiros e médicos.
Os autores utilizaram estímulos sensoriais na criança com músicas, cantos, para que desenvolvessem
as habilidades nas crianças e reforçassem o cuidado na seletividade alimentar, através de educação
nutricional. Os autores concluíram que para melhorar o padrão alimentar dessas crianças, é preciso
trabalhar as terapias, a educação nutricional e a abordagem clínica, para assim ter sucesso contra a
seletividade alimentar. Por fim, o grupo lembrou a importância de orientações aos familiares,
cuidadores, professores, para fornecer uma melhora na qualidade de vida das crianças e suas famílias.

O estudo realizado por GOULARTE et al (2020) corrobora com esse achado e ressalta a
importância de uma assistência nutricional apropriada ao público-alvo, visto que o maior número da
amostra (crianças TEA) se encontra em risco ou excesso de peso, além de ressaltar a existência de
hipersensibilidades alimentares relacionadas ao desconforto gastrointestinal. Entretanto, esse estudo
mostrou apenas a existência das comorbidades gastrointestinais, sem abarcar uso de dietas específicas.
Por isso, os autores ressaltam que é necessário ter cautela nas práticas das alimentações e de restrição
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e métodos para lidar com os sintomas gastrointestinais presentes, uma vez que sua eficiência até esse
momento não é consenso para todos os casos.

Diante do exposto, de acordo com os estudos avaliados e os achados clínicos relatados neste
estudo de caso, há fortes evidências da relação entre distúrbios gastrointestinais e a saúde cerebral em
portadores do transtorno do espectro autista. Dessa maneira, uma abordagem nutricional firmada em
um programa multidisciplinar, para auxiliar na melhoria dos pacientes se faz necessária, a fim de
melhorar a saúde gastrointestinal à medida que o paciente evolui nas terapias. Práticas dietéticas
específicas (como a dieta sem glúten e caseína) apresentam evidências de melhora dos sintomas
gastrointestinais e comportamentais. Diante disso, mais estudos necessitam ser conduzidos para
delinear a terapia nutricional mais adequada para os pacientes no transtorno do espectro autista.

7. Considerações Finais

O paciente relatado no presente estudo apresentou melhoras significativas na saúde


gastrointestinal, além de apresentar avanços no desenvolvimento social, comportamento e qualidade
de vida em geral, após programa nutricional de modulação dietética. Com base nestes resultados e
nos artigos selecionados, observamos que há evidências da relação entre o comportamento autista e
saúde gastrointestinal, inclusive com possíveis mecanismos envolvidos. Tais achados são importantes
para o desenvolvimento de novas abordagens de tratamento para o TEA, entretanto, são necessários
mais estudos, a fim de chegar numa possível terapia “padrão ouro”| de modulação intestinal, que possa
ser capaz de minimizar os comportamentos estereotipados no autista e aumentar assim, a sua
qualidade de vida.
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8. Referências

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