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A questão sobre se o consenso pode ser considerado uma fonte de justificação, é

discutida por muitos autores da epistemologia. A defesa é a de que o consenso pode ser
considerado responsável tanto pelo surgimento e estabelecimento de novos conhecimentos
quanto pela manutenção de conhecimentos antigos. Graças ao consenso, preservam-se tanto a
continuidade do conhecimento, como a natureza cumulativa do seu desenvolvimento e a
aprovação de novos conhecimentos que podem destruir velhas ideias. Um objeto de pesquisa
numa “comunidade epistêmica" é influenciado tanto pela experiência individual, quanto pelas
condições históricas e socioculturais existentes que predeterminam as possíveis áreas de
aplicação do esforço intelectual. Premissas teóricas, experiências, métodos reconhecidos de
interpretação dos dados obtidos podem ser exemplos de fatores essenciais que determinam a
dinâmica do conhecimento (“forma totalmente racional numa situação epistêmica ideal”).
Além disso, nenhum dos fatores listados permanece essencialmente inalterado; todos eles, em
maior ou menor grau, são o resultado do acordo coletivo.

A ciência, por exemplo, não representa uma única comunidade científica que partilhe
completamente os mesmos objetivos e utilize os mesmos meios para o conhecimento
científico. Também é pouco provável que os cientistas estejam unidos por uma forma
unificada de perceber o mundo. Os cientistas tem a oportunidade de se auto organizar em
grupos de pessoas com ideias semelhantes que partilham uma certa compreensão dos
objetivos e meios da atividade científica, bem como diferentes formas de perceber o mundo.
Os cientistas também são capazes de desenvolver métodos mutuamente aceitáveis de
comunicação de informações e rejeitar aqueles que não concordam com as suas opiniões, as
“marginalizadas” (e aqui está presente uma perspectiva de Boaz Miller, sobre dissidência).
Toda essa atividade visa obter e estabelecer novos conhecimentos. Como resultado do fato de
diferentes equipes de cientistas estudarem problemas científicos semelhantes, é possível obter
resultados, às vezes parcialmente incompatíveis. Por um lado, isto leva à criação de teorias
concorrentes (e grupos de cientistas que as criaram) e, por outro lado, proporciona
uma oportunidade para avaliação crítica mútua: e é o que John Stuart Mil argumenta e defende
desde o século XIX.

Em “Sobre a liberdade” (1859), Mill discute a importância, seu valor e os limites da


liberdade dentro de uma sociedade: Primeiro, se uma pessoa exerce sua liberdade (mesmo que
isso faça mal à ela mesma) sem prejudicar ninguém, o filósofo defende que ela tem o direito
de fazer. Segundo, se essa pessoa age de forma que prejudique os outros, então ela deve ser
punida. Mill se coloca totalmente a favor da liberdade individual de expressão e via o Estado
e a sociedade (a opinião pública) como formas de opressão à medida que agem para produzir
opiniões consensuais e universais sobre as coisas, uma tentativa de impor regras e costumes
que limitam o indivíduo; é o que ele chama de “tirania da maioria” (MILL, 2011, p.20).

Para Stuart Mill, a individualidade permite que as pessoas tenham a liberdade de expor
seu ponto de vista, e nessa interação de diferentes pensamentos, novas ideias podem surgir ou
uma afirmação que antes era vista como absoluta sobre algo pode ser revista. Censurar uma
opinião não leva ao progresso pois “esquece-se não apenas os fundamentos da opinião, mas
também bastante frequentemente o significado da própria opinião” (MILL, 2011. P.44). Mill
enfatiza a importância dessa liberdade e defende ela a partir dos argumentos do
“dogma morto" e da “falibilidade”:

1. Uma opinião silenciada pode ser a verdade. Negar a possibilidade disso significa
reconhecer-se como infalível.

2. Embora uma opinião privada da oportunidade de ser expressa seja um erro, ela pode conter
parte da verdade, como na maior parte o faz, e uma vez que a opinião normalmente aceita ou
predominante quase nunca contém toda a verdade, então somente quando opiniões diferentes
colidem entre si, é que a verdade não reconhecida pode ser reconhecida.

3. Mesmo que uma opinião geralmente aceita seja verdadeira (contém toda a verdade) mas se
ao mesmo tempo não se deixa contestar e não é efetivamente sujeita a críticas sérias e
sinceras, então na consciência ou no sentimento da maioria das pessoas perde a racionalidade
e se transforma em dogma.
4. Não só isso: ao tornar-se inacessível à crítica, a opinião que prevalece expõe-se ao perigo
de perder o seu próprio significado, enfraquecendo a sua influência sobre o caráter e as ações
das pessoas, e até mesmo perdendo completamente essa influência.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

MILL, John Stuart. Sobre a Liberdade. Trad. Pedro Madeira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
2011.

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