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CETOACIDOSE DIABÉTICA

DEFINIÇÃO

 Cetoacidose diabética (CAD) é um distúrbio metabólico caracterizado por hiperglicemia, cetonemia e


acidose metabólica com ânion gap elevado e representa uma das complicações agudas do diabetes
mellitus tipo 1 (DM1).
EPIDEMIOLOGIA:

 É a complicação mais grave do DM tipo 1,com uma mortalidade em torno de 100% senão tratada (e de 5% se
adequadamente tratada).
 Ocorre em até 30% dos adultos e entre 15 e 67% das crianças e adolescentes no momento do diagnóstico e é a
principal causa de óbito em diabéticos com menos de 24 anos de idade
 8% internações hospitalares de DM

 Pelo aumento de DM tipo 2 = aumento de complicações de CAD ( afrodescendentes)

 Entre alguns fatores de risco para cetoacidose, podemos citar: sexo feminino, doenças psiquiátricas, baixo nível
socioeconômico, episódios prévios de cetoacidose

09/06/2022
FISIOPATOLOGIA:
 Em condições fisiológicas normais, em episódios de hiperglicemia as células β das ilhotas pancreáticas secretarem insulina. A
insulina por sua vez, promove a captação de glicose e a formação de glicogênio, a captação de aminoácidos e a síntese de proteínas,
assim como a captação de ácidos graxos e a síntese de gordura.
 Na ausência de insulina, é estimulada a secreção do glucagon, dificultando a entrada de glicose nas células musculares e adiposas,
levando a uma hiperglicemia.
 De maneira compensatória, ocorre a lipólise caracterizada pela quebra de triglicérides em ácidos graxos livres e glicerol.

 A gliconeogênese hepática também é motivada pelo aumento das concentrações séricas de glucagon e pela hipoinsulinemia

 Os ácidos graxos livres produzidos pela lipólise são utilizados nos tecidos periféricos como substrato energético e podem também
ser convertida em acilCoA que é oxidada a acetil-coenzima A (acetil-CoA), pelo fígado. Desta maneira, em situações de
hipoinsulinemia, a acetil-CoA é condensada em acetoacetil-CoA, formando o ácido acetoacético, que é reduzido a ácido β-
hidroxibutírico ou origina a acetona.
 Devido à falta de tamponamento dos sistemas ocorrido na CAD, pela liberação exacerbada de íons gerada durante a produção
patológica de corpos cetônicos, a presença dos ácidos acetoacético e β-hidroxibutírico resultam na cetose e acidose metabólica.
 A hiperglicemia leva à diurese osmótica por ultrapassar a capacidade de reabsorção de glicose pelos rins, resultando em glicosúria,
juntamente, ocorre uma intensa perda hídrica e de eletrólitos como sódio, potássio, magnésio, cálcio e fosfato.
 A hipo-insulinemia também é responsável pela desidratação e perdas de eletrólitos, pois aumenta a excreção dos mesmos pelos
túbulos renais.
 A cetonemia provoca o agravamento do quadro clínico do paciente, pois os corpos cetônicos estimulam os centros
quimiorreceptores nervosos, induzindo náusea, anorexia, êmese e dor abdominal 09/06/2022
FISIOPATOLOGIA

09/06/2022
QUADRO CLINICO:

 O paciente frequentemente refere poliúria, polidipsia ou polifagia, associados a astenia e perda ponderal,
principalmente nos dias anteriores à instalação do quadro.
 Náuseas e vômitos por gastroparesia são frequentes e contribuem para a espoliação do paciente -> desidratação

 Dor abdominal, principalmente em crianças, por atrito ente os folhetos do peritônio desidratado e por distensão e
estase gástrica, pode estar presente e ser intensa a ponto de simular um abdome cirúrgico.
 O paciente tipicamente se apresenta hipo-hidratado, taquicárdico e hiperventilando (respiração de Kussmaul –
respiração rápida e profunda), como resposta à acidemia.
 Hálito cetonico

 Encefalopatia -> edema cerebral-> tremores, letargia e coma.

09/06/2022
DIAGNOSTICO:
 O diagnóstico definitivo exige a presença de hiperglicemia, acidose metabólica e cetonemia ou cetonúria
significativa

09/06/2022
DIAGNOSTICO:

 Deve-se lembrar que o método habitualmente usado na pesquisa de corpos cetônicos na urina e no sangue utiliza a
reação do nitroprussiato, a qual detecta a presença de acetoacetato e de cetona, mas não de beta-hidroxibutirato, o
principal cetoânion produzido na cetoacidose diabética.
 Por esse motivo, a não detecção de corpos cetônicos não exclui a presença destes. Podemos repetir o exame de urina da
cetonúria adicionando peróxido de hidrogênio (água oxigenada), capaz de promover a conversão não enzimática do
beta-hidroxibutirato em acetoacetato, revelando, então, o diagnóstico.
 Uma forma mais confiável é a pesquisa indireta através do cálculo do ânion-gap: Ânion-Gap = Na+ - (Cl- + HCO3 - )

09/06/2022
DIAGNOSTICO DIFERENCIAL
 
A hiperglicemia no paciente diabético pode ter como diagnósticos diferenciais, além da CAD
  Omissão da medicação hipoglicemiante ou insulina
 Estado hiperglicêmico hiperosmolar
 Cetoacidose alcoólica
 Sepse
 Síndromes coronarianas Agudas
 Embolia Pulmonar
  Intoxicação por Salicilatos ou outro estado induzido por drogas
 Pancreatite Aguda
 Síndrome de Cushing
 Abdome Agudo cirúrgico
 Drogas: Glicocorticoides, diuréticos tiazídicos, anticonvulsivantes como fenitoína, contraceptivos orais e Betabloqueadores.

 A maioria dos casos de hiperglicemia na chegada do paciente à emergência se relaciona com o controle inadequado
ambulatorial do diabetes mellitus. Contudo, diversas etiologias podem descompensar um quadro de hiperglicemia, como sepse
e síndromes coronarianas agudas.
 A CAD tem também outros diagnósticos diferenciais relacionados: Cetose de jejum, cetoacidose alcoólica, acidose lática e
outras acidoses com aumento de ânion GAP como lesão renal aguda ou doença renal crônica.
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TRATAMENTO:

 Objetivo: restabelecimento da volemia, queda da glicemia até níveis aceitáveis, resolução da cetoacidose e a
correção dos distúrbios eletrolíticos.

 MOV

 Reposição Volêmica Vigorosa

09/06/2022
FASE DE EXPANSÃO: CAD MODERADO/GRAVE

 Depleção de volume sem choque: SF 0,9% 10-20 ml/kg em 1- 2 h. Rever de h/h.

 Se desidratação grave/ choque: SF 0,9% 20ml/kg em bolus a cada 20 min.

 Objetivos da reposição volêmica: repor o deficit de água, manter a pressão arterial, reduzir os níveis de glicemia e melhorar a
perfusão tissular e renal, o que contribui para a reversão da acidose.
 Após a primeira hora de hidratação, o ideal é a dosagem do sódio sérico, que deve ser corrigido pela hiperglicemia ( Na
medido + (1,6 x (glicemia -100) / 100)).

 Se o sódio corrigido for:

 - normal ou elevado (> 150 mEq/l)--> a reposição deve continuar com salina a 0,45%.

 - baixo--> a solução continua sendo o soro fisiológico a 0,9%.

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REPOSIÇÃO DE PERDAS HÍDRICAS E HIDRATAÇÃO DE
MANUTENÇÃO

 Nos pacientes com CAD leve, a fase de expansão pode não ser necessária, passando-se diretamente para a fase
de reposição das perdas e manutenção.

 Além de fornecer a necessidade hídrica diária (NHD), as perdas devem ser estimadas e repostas em 24h.

 Cálculo da necessidade hídrica diária (NHD) pelo método de Holiday Segar:

 a) até 10 kg de peso - 100 ml/kg/dia;

 b) 11 a 20 kg de peso - 1.000 ml + (50 ml/kg do peso que exceder 10 kg) no dia;

 c) 21 a 45 kg de peso - 1.500 ml + (20 ml/kg do peso que exceder 20 kg) no dia;

 d) acima de 45 kg de peso - 2.000 ml/dia.

09/06/2022
CÁLCULO DAS PERDAS DE ACORDO COM O GRAU DE DESIDRATAÇÃO:

 Cálculo das perdas = % estimada de desidratação x peso corporal x 10 (em ml) ou:

 a) leve (3 a 5% do peso)- 30 a 50 ml/kg;

 b) moderada (5 a 7% do peso)- 50 a 70 ml/kg;

 c) grave (não ultrapassar 10% do peso)- 80 a 100 ml/kg.

 O volume total calculado para 24 horas (NHD + perdas) é dividido em três partes, sendo ⅓ infundido nas
primeiras seis horas, ⅓ infundido nas seis horas seguintes e o último terço infundido nas últimas 12 horas do dia.
 A glicose deverá ser adicionada à solução quando a glicemia atingir valores entre 250 e 300 mg/dl, na proporção
de 1:1 , também chamada de solução glicofisiológica. A infusão deve variar entre 150-250 ml/h, mantendo-se a
glicemia entre 150-200 mg/dl.

09/06/2022
INSULINOTERAPIA

 A insulinoterapia só será eficaz se as medidas para restabelecimento da volemia estiverem em curso.

 O início da insulina antes da reposição volêmica pode agravar a hipovolemia e precipitar o choque hipovolêmico, pois a
insulina promove a captação celular de glicose, que provoca a entrada de água nas células, espoliando o intravascular.

 Na presença de hipocalemia (K < 3,3), a insulina não deve ser iniciada.

 A insulinização deve ser feita com infusão contínua venosa de insulina regular, na dose de 0,1 unidade/kg/hora. Deve-se
saturar o equipo com 50 ml da solução, desprezando esse volume e repetindo o procedimento a cada troca de solução, o
que deve ocorrer a cada seis horas.
 Sugestão para facilitar o cálculo: a solução preparada com 30 unidades de insulina regular mais 300 ml de SF 0,9% (0,1
unidade de insulina por ml de solução). Com essa solução, a dose de 0,1 unidade/kg/h de insulina corresponde a 1
ml/kg/h de solução, ou seja, basta colocar o peso da criança na velocidade da bomba infusora (por exemplo, um paciente
de 20 kg receberá essa solução em infusão a 20 ml/h).
 Objetivo: queda média da glicemia de 50 a 75 mg/dl/h.

 A dose da infusão deve ser dobrada caso esta queda não ocorra. Deve-se evitar quedas da glicemia acima de 100
mg/dl/h, devido ao risco de hipoglicemia e de edema cerebral.

 Quando a glicemia atinge valores ≤ 200-250 mg/ dl, a infusão de insulina deve ser diminuída (0,02-0,05U/kg/h).
09/06/2022
CRITÉRIOS DE RESOLUÇÃO DA CAD SÃO:

 -pH > 7,3;

 -bicarbonato > 15--18 mEq/l;

 - glicemia < 200-250 mg/ dl.

 Quando isto é alcançado, é possível liberar a dieta e iniciar o esquema de insulinização subcutânea conforme
valores de glicemia capilar a cada 3 ou 4h.

 A infusão contínua de insulina venosa só será suspensa após 1-2h da dose de insulina SC NPH/Glargina/Detemir.

09/06/2022
ESQUEMA DE INSULINIZAÇÃO SC

 Glicemia capilar:

 ≥ 160-200 mg/dl : 0,1 U/kg (máximo 4 U)

 ≥ 200-300 mg/dl valores intermediários;

 ≥ 300-500 mg/dl: valores intermediários;

 ≥ 500 mg/dl: 0,4 U/kg (máximo 14 U).

09/06/2022
REPOSIÇÃO DE POTÁSSIO

 Pode ser iniciada caso os níveis séricos estejam < 5 mEq/l, na presença de um fluxo urinário adequado.

 • Se <3,3 mEq/l de potássio: reposição com 40 mEq

 • Se ≥ 3,3 e < 5: adicionar 20 a 30 mEq de potássio por soro.

 • Se ≥ 5 mEq/l: não administrar potássio inicialmente, mas checá-lo de 2/2h.

09/06/2022
 Reposição de fosfato

 Em geral, sua deficiência não apresenta repercussões clínicas, mas as questões teóricas envolvidas são de que
deficiência de fósforo (< 1) pode levar à queda nos níveis de 2,3 difosfoglicerato (2,3 DPG), diminuindo a oferta de
oxigênio aos tecidos.

 Sua reposição é controversa e em geral deve ser avaliada somente nas seguintes situações:

 (1) disfunção cardíaca; (2) anemia; (3) depressão respiratória; e (4) nível sérico de fosfato < 1,0 mg/dl.

 Quando necessário, 20-30 mEq/L de fosfato de potássio podem ser administrados, em velocidade não superior a
3-4 mEq/h.

 A reposição pode levar à queda de Ca e Mg.

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 Reposição de Bicarbonato

 Paciente Pediátrico: pH < 7,1 : dose a ser administrada pode ser calculada pela seguinte fórmula: HCO3
oferecido (mEq) = (HCO3 desejado (12 mEq) – HCO3 encontrado) x 0,3 x peso. O bicarbonato de sódio é diluído
em água destilada (1:1) e administrado em duas horas

 Complicações da administração de bicarbonato são: hipocalemia, arritmias cardíacas, sobrecarga de sódio,


diminuição da oxigenação tissular pelo desvio da curva de dissociação da hemoglobina e acidose liquórica
paradoxal.

09/06/2022
ACOMPANHAMENTO LABORATORIAL

 -A glicose plasmática deve ser medida a cada 1 hora.

 -Eletrólitos devem ser acompanhados a cada 2-4 horas dependendo do estado do paciente na apresentação e
dependendo da evolução clínica.

 -A não ser em casos graves ou raros, não há necessidade de repetir os níveis plasmáticos de cálcio e fósforo ou o
leucograma.

09/06/2022
CRITÉRIOS PARA INTERNAÇÃO INICIAL EM UTI:

 - CAD grave

 -Tempo de evolução prolongado

 -Alterações circulatórias ou choque

 -Alteração do estado de consciência

 -Risco acrescido de edema cerebral: Criança com idade ≤ 5 anos, pH < 7,1, pCO2 baixo, ureia elevada

09/06/2022
COMPLICAÇÕES
 Consequentes à doença: infecção, hipertrigliceridemia grave (triglicerídeos > 1.000 mg/dl) e a pancreatite aguda.

 Consequentes ao tratamento: SDRA, edema cerebral, acidose metabólica hiperclorêmica, murcomicose,


trombose vascular.

 Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo (SDRA)

 Ocorre pela queda da pressão coloidosmótica intravascular e o aumento da pressão capilar pulmonar, devido à
correção da volemia e ao aumento da permeabilidade do capilar pulmonar, permitindo a fuga de fluido e
proteína para o interstício e daí para o interior do alvéolo.

 Pode-se notar anormalidades da gasometria arterial, como a queda da PaO2 e o aumento do gradiente alvéolo-
arterial de O2.

 Pacientes com suspeita de SDRA devem ser monitorados com cateter de Swan-Ganz para confirmação
diagnóstica e orientação terapêutica.

09/06/2022
 Edema Cerebral:

 O estado de hiperosmolaridade sérica leva à produção de substâncias osmoticamente ativas no interior das
células do SNC (osmoles idiogênicos), na tentativa de manter um gradiente osmótico adequado.

 Durante a ressuscitação volêmica, há rápida queda da osmolaridade sérica e influxo de água e eletrólitos para o
meio intracelular, com lento desaparecimento dos osmoles idiogênicos.

 O consequente aumento do gradiente osmótico leva ao edema cerebral cuja intensidade é diretamente
proporcional à velocidade da reidratação e à quantidade de sódio ofertado.

 QC: piora do nível de consciência algumas horas após o inicio do tratamento, cefaleia súbita de forte intensidade,
incontinência esfincteriana, vômitos, agitação, desorientação, alteração dos sinais vitais, (sinais de hipertensão
intracraniana, como hipertensão arterial e bradicardia), oftalmoplegia e alterações pupilares.

 Confirma-se o diagnóstico por tomografia computadorizada ou ressonância magnética de crânio, caso a


gravidade justifique tal procedimento.

 Tratamento: consiste no suporte do paciente em depressão do sensório (que pode incluir uso de manitol e
ventilação mecânica) e na lentificação da correção do deficit hidroeletrolítico.
09/06/2022

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