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Metaleitura

Como Aprender a Ler Melhor

Sérgio Luís Boeira


(2010)
Da Metacognição à Metaleitura
A metacognição é definida como conhecimento do
conhecimento, cognição da cognição, ou simplesmente
aprendizagem reflexiva e significativa. Está fundamentada no
autoconhecimento. Trata-se do autoconhecimento de quem
aprende.

A metaleitura é uma das várias dimensões ou faces da


metacognição. Outras dimensões são a metacompreensão, a
meta-atenção, a metamemória e a metaescritura (BURÓN,
2006).
Leitura
A leitura pode ser definida de forma ampla como
compreensão de textos escritos, o que supõe a decodificação
dos signos, incluindo as unidades e seus contextos.

Por exemplo: a letra tem como seu contexto imediato a


sílaba, que tem como contexto a palavra, que tem como
contexto a frase, que tem como contexto o parágrafo, que tem
como contexto o capítulo ou livro.
Lexicologia, Sintaxe e Semântica
Lexicologia: estudo das palavras individuais, do vocabulário, do que
consta em dicionários. Trata do significado das palavras em si
mesmas.

Sintaxe: parte da gramática que estuda as palavras como


elementos de uma frase. Estuda as relações de concordância, de
subordinação e de ordem das palavras nas frases, no contexto de
uma língua determinada.

Semântica: um ramo da linguística que estuda a significação como


parte dos sistemas das línguas naturais. Inclui diversas categorias,
como coesão proposicional, coesão estrutural, consistência
externa, consistência interna e claridade informativa (BURÓN,
2006).
Metaleitura

A metaleitura é uma leitura ou compreensão das formas de


leitura, um estudo dos modos ou hábitos de leitura.
A metaleitura pressupõe a compreensão das finalidades ou
objetivos da leitura, que por sua vez condicionam os recursos
ou meios empregados na leitura.
Assim, por exemplo, a leitura de um texto por quem pretende
compreendê-lo e ensiná-lo a outras pessoas é muito diferente
da leitura de quem pretende apenas memorizá-lo.
Hábitos de Leitura
As noções a seguir, de Bom e Mau Leitor, são “tipos ideais” (na
terminologia de Max Weber). O texto foi adaptado a partir de
Bastos e Keller (2005) e Burón (2006).

O bom leitor consegue ler rapidamente e entende bem o que lê.


Tem o hábito de ler com um objetivo determinado, por
exemplo, aprender sobre um tema, revisar detalhes, responder
questões, obter autonomia reflexiva sobre determinado assunto.

O mau leitor, ao contrário, só consegue ler vagarosamente e


entende mal o que lê. Tem o hábito de ler sem finalidade. Não
sabe por que lê.
O bom leitor lê unidades de pensamento. Abarca, num relance, o
sentido de um grupo de palavras encontradas numa frase ou
num parágrafo.

O mau leitor lê palavra por palavra. Procura encontrar o


sentido da palavra isoladamente (como vocábulo), sem
considerar o contexto. Esforça-se para juntar os termos e
entender a frase. Frequentemente tem de reler as palavras.

O bom leitor tem vários padrões de velocidade. Ajusta a


velocidade da leitura ao assunto, conforme o grau de
densidade do texto.
O mau leitor só tem um ritmo de leitura. Seja qual for o
assunto, lê vagarosamente.
O bom leitor avalia o que lê enquanto lê. Pergunta a si mesmo:
que sentido tem isso para mim? O autor é qualificado? Escreve
bem? Apresenta apenas um ponto de vista do problema? Qual
é a principal ideia deste parágrafo? Isso tem fundamento?

Ao finalizar a leitura de um parágrafo, procura fazer


uma síntese mental, uma representação conceitual, com suas
próprias palavras, do que leu.
O mau leitor acredita em tudo o que lê. Acha que se algo está
impresso deve ser verdadeiro. Não confronta o que lê com
suas experiências ou com outras fontes. Nunca julga
criticamente o escritor ou o ponto de vista que ele defende.

O bom leitor possui bom vocabulário. Usa frequentemente os


dicionários. É capaz de perceber o sentido das palavras novas
observando o contexto (frases, parágrafos). O mau leitor, ao
contrário, tem preguiça de consultar dicionários, tem
vocabulário pobre e despreza o contexto das palavras.
O bom leitor tem habilidades para conhecer o valor de um livro.
Observa itens como título, subtítulos, sumário, edição, lista de
obras do autor, prefácio, bibliografia, editora. Sabe selecionar
o que ler.

O mau leitor não usa critério técnico para conhecer o valor de um


livro. Deixa-se influenciar pelo aspecto material da obra.
Quando lê começa pelo 1º capítulo, sem captar o sentido dos
subtítulos e dos temas tratados nos outros capítulos.
Geralmente desconhece o autor e suas obras. Não sabe
selecionar o que ler.
O bom leitor sabe quando deve ler um livro até o fim, quando
interromper a leitura em definitivo ou periodicamente. Sabe
quando e como retomar a leitura. Consegue equilibrar
atenção e concentração com momentos de descanso.

O mau leitor não sabe decidir se é conveniente ou não


interromper a leitura. Não tem critérios sobre atenção,
concentração ou descanso. Não presta atenção às condições
físicas adequadas à leitura (claridade, postura, distância).
O bom leitor discute frequentemente o que lê. Sabe distinguir
entre impressões subjetivas e valor objetivo durante as
discussões.

O mau leitor raramente discute o que lê. Quando o faz, fica preso
a impressões subjetivas, emocionais ou preconceitos. Apega-
se rigidamente a um ponto de vista por motivos que
desconhece.

O bom leitor adquire livros e tem biblioteca particular. Procura


qualificar suas fontes e conquistar uma cultura geral além da
profissional.
O mau leitor não possui biblioteca particular ou então costuma
comprar livros que não lê. Atualmente as bibliotecas estão
sendo ampliadas e acessadas virtualmente, com grandes
bancos de dados contendo centenas de periódicos
especializados nas mais diversas áreas. Mas para quem não
valoriza a leitura isso significa muito pouco.

O bom leitor lê livros, revistas, jornais. Gosta de vários assuntos,


enquanto o mau leitor está condicionado a ler sempre o
mesmo tipo de assunto.
Raramente lê um livro.
O bom leitor sente prazer na leitura. Tem uma atitude positiva
diante da vida. Gosta de desafios. Consegue assumir e
cumprir compromissos com a coletividade.

O mau leitor não sente prazer na leitura. Tem uma atitude


negativa diante da vida. Não gosta de desafios nem de
assumir compromissos com a coletividade.

Ambos são condicionados por suas crenças, valores, visões de


mundo, teorias, ideologias, representações. Enfim, são
condicionados por paradigmas.
Crenças, Metaleitura: a leitura da
Ideologias, Crenças,
leitura e sua ambivalência representações,
teorias, visão
de mundo, teorias, visão de
que formam mundo ou
esquemas de esquemas de
interpretação produção de
Leitor
e condicionam Autor ideias.
a leitura.

Texto
como
objeto
Paradigma
Paradigma Ambivalência do sujeito: ativo (não
objeto) e passivo (estar sujeito a
ideias, esquemas de interpretação e
de produção de ideias).
Da Metaleitura à Epistemologia

A metaleitura como leitura reflexiva, interpretativa, interrogativa


conduz à tomada de consciência do sentido lexical, sintático e
semântico do texto.

Mais profundamente, representa a possibilidade de


autoconhecimento tanto do leitor quanto do autor como
sujeitos e sujeitados. Como sujeitos que interpretam e
reinterpretam textos, mas o fazem sob a influência de
crenças, ideologias, teorias, visões de mundo, representações
e, em última análise, paradigmas (epistemologia).
Informação, Conhecimento e Sabedoria
A informação é o dado novo que leva à ação, a novidade que
desperta reflexão.
O conhecimento representa a estruturação das informações
por meio de critérios de seleção, de hierarquia, de conjunção,
de disjunção.
O conhecimento pode ser mais ideológico ou mais teórico, à
medida que se apresenta como sistema de ideias tendente ao
fechamento ou à abertura. Como ideologia, estrutura as
informações conforme sua conveniência e viés de
autorreforço. Como teoria, abre-se a testes intersubjetivos,
experimentais, análise lógica e epistemológica. Abre-se então
a possibilidade de sabedoria, sempre incerta (MORIN, 2005).
Paradigmas
Um paradigma contém, segundo Edgar Morin (2005), para
todo discurso sob sua influência, os conceitos
fundamentais ou as categorias de inteligibilidade, além do
tipo de relações lógicas de atração/repulsão (conjunção,
disjunção, implicação ou outras) entre os seus conceitos
ou categorias.
Assim, “os indivíduos conhecem, pensam e agem segundo os
paradigmas neles introjetados” (MORIN, 2005, p, 209).
Paradigma não é apenas modelo, mas conjunto de valores,
crenças, princípios, pressupostos geralmente inconscientes,
que condicionam todas as formas de saber, inclusive o saber
científico.
Referências
 BASTOS, C; KELLER, V. Aprendendo a aprender :
introdução à metodologia científica. 18ª edição. Petrópolis:
Vozes, 2005.
 BURÓN, J. Enseñar a aprender: introducción a la
metacognición. 7ª edición. Bilbao: Ed. Mensajero, 2006.
 MORIN, E. O método 6: ética. Porto Alegre: Sulina, 2005.

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