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Capítulo 124
Repercussão socioeconômica do
câncer de próstata
Dados do Censo 2000 revelam que a população Na década de 1970, a maioria (cerca de 70%)
brasileira total atinge 169.799.170 habitantes. Destes, dos casos tinha diagnóstico em fase avançada. Atual-
86.223.155 são mulheres e 83.576.015 representam a mente estes números estão bastante modificados,
população masculina. Considerando-se que homens tendo 80% dos pacientes o diagnóstico ainda com
acima de 40 anos de idade se encontram na faixa de a doença localizada.
screening (detecção precoce), temos 28.401.347 homens Entretanto, de acordo com o Censo de 2000,
em avaliação médica de rotina, anualmente. apenas 25,7% de todos os homens no país possuem
Em 1995, a incidência do câncer de próstata (CAP) planos de saúde. O restante teria avaliações cobertas
aumentou e atingiu níveis epidêmicos. Utilizando dados de forma particular ou por meio do Sistema Único
do CDC de Atlanta (1999), temos a informação de de Saúde (SUS). Dos que dependem desta última
que a incidência CAP nos Estados Unidos atingiu 160 forma, 42% consultam em postos ou centros de saú-
novos casos a cada 100 mil homens dentro do grupo de e 21,5% em ambulatórios de hospitais conve-
de risco (≥ 40 anos). Extrapolando estes dados para a niados. Aqueles que procuram atendimento por meio
população brasileira, teríamos 45.400 novos casos de de consultas particulares representam 5% da popu-
CAP, anualmente. lação. Outros homens não têm nenhum tipo de ser-
O número de óbitos por CAP, na Alemanha, é de viço de saúde para detecção precoce. Esta é uma
9 mil/ano (para uma população de 80 milhões de população predominantemente rural.
habitantes). Este número aumentou 16%, se compa- Com os dados disponíveis atualmente se torna
rado com a mortalidade pela mesma doença, em 1976. extremamente difícil estabelecer os reais custos do
No Brasil, este número, atualmente, é de 8.200/ano. CAP no Brasil. O que procuramos apresentar neste
Devido à não notificação compulsória em nosso país, capítulo são estimativas acerca desta doença, em
este pode estar subestimado e o número real seria de nosso país.
18 mil óbitos/ano. Vale ressaltar que apenas um terço Consideremos o valor de screening (básico) pelos
dos homens com CAP morrem especificamente de- planos de saúde. A consulta médica, hoje, tem o valor
vido ao seu tumor. bruto de R$ 30. A determinação do antígeno prostático
Esta doença acomete cerca de 17% dos homens. O específico (PSA) custa R$ 25. O exame de urina
risco de ela se apresentar, durante a vida de um homem, adiciona R$ 15 ao custo e a ultra-sonografia de próstata
é de 24%. Enquanto sua incidência para homens entre por via abdominal, R$ 40. Assim, temos o valor de
45 e 49 anos de idade é de sete novos casos/100 mil custo básico, via convênio, de R$ 110.
homens/ano, para aqueles com mais de 80 anos o nú- Caso todos os brasileiros com idade igual ou supe-
mero é de 1.200/100 mil homens/ano. rior a 40 anos e inferior a 80 anos de idade fossem
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submetidos aos exames de rotina uma vez ao ano, Esta, se realizada sob orientação de ultra-sonografia e
seriam examinados anualmente 21.136.213 homens. sedação, teria o custo estimado de R$ 1 mil.
O custo total destas avaliações, considerando-se Em relação ao tratamento da doença localizada,
apenas o diagnóstico precoce do CAP, seria de estima-se que cerca de 80% dos pacientes serão
R$ 2.324.983.430 (2 bilhões e trezentos milhões). submetidos à prostatectomia radical, o que, por sua
Nesta avaliação, não estão compreendidos pacientes vez, apresenta custo unitário (convênio) na ordem
com mais de 79 anos de idade (731.350), os quais de R$ 7.000. Em Curitiba, capital do Estado do
não são submetidos, de rotina, à avaliação do PSA. Paraná com perto de 2 milhões habitantes, cerca de
Se todos fossem considerados, teríamos o custo de 200 prostatectomias radicais são realizadas ao ano.
avaliação estimada em R$ 3.124.148.170. Assim, cerca Assim, o custo anual total seria de R$ 1.400 mi. Este
de R$ 3,1 bilhões seriam investidos anualmente para raciocínio poderia ser extrapolado, com reservas, para
o diagnóstico desta doença. todo o Brasil. Assim, poderíamos estimar que apenas
Há inúmeras possibilidades de raciocínio. Pode- para o tratamento cirúrgico deveriam ser gastos
se, por exemplo avaliar o custo cumulativo durante R$ 119 milhões de reais/ano.
anos de avaliação sistemática. Além disso, não é A estas informações podem ser somados os custos
incomum o mesmo paciente ter necessidade de avaliar de tratamentos radioterápicos para doença localizada
o PSA mais de uma vez ao ano, sem mencionar a e antiálgicos, hormonioterapia, tratamento da dor
determinação do PSA livre. (inclusive bisfosfonatos), internamentos por intercor-
Os valores de custo para diagnóstico não param por rências diversas e quimioterapia. Devem-se considerar
aí. Ainda temos valores associados à biópsia da próstata. também os dias de ausência ao trabalho, o que
determina custos indiretos da doença.
Tabela 1: População de homens brasileiros de acordo com a faixa Em resumo, os custos de diagnóstico precoce e
etária (IBGE - Censo 2000)
tratamento do CAP são enormes. O custo de trata-
mento da doença avançada é extremamente maior
que para a doença localizada. Uma política econômica
planejada especificamente para esta doença, poderia
reduzir os seus gastos. A obtenção de recursos para
campanhas de diagnóstico precoce e tratamento, a
partir do governo ou da sociedade organizada ou,
ainda, a contratação de médicos com esta única
finalidade, deveriam ser avaliadas e discutidas.
Leitura recomendada
1. Altwein JE. Prostatakarzinom. Epidemiologie, Ätiologie,
Pathologie, Diagnostik, prognostische Faktoren. Em: Rübben
H (editor). Uro-Onkologie. Springer-Verlag Berlin
Heidelberg New York, pp. 169-232, 2001.
2. Bendhack ML, Miller S, Ackermann R. Surgical therapy of
locally confined prostate carcinoma. Schweiz. Rundsch.
Med. Prax. Nov 12; 86 (46): pp. 1819-1824, 1997.
3. Censo IBGE 2000.
4. Walsh PC, Retik AB, Vaughan Jr ED, Wein, AJ. Campbell’s
Urology. Oitava edição, Philadelphia, 2002.
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Capítulo 125
Epidemiologia e história natural
O câncer de próstata é o tumor sólido não-cutâneo O câncer de próstata surge em geral na zona
de maior incidência em homens acima de 50 anos periférica (15% em outra parte da glândula). Os
de idade, representando mais de 40% dos tumores tumores da zona transicional produzem em torno de
que atingem o sexo masculino nessa faixa etária. quatro vezes mais PSA que os da zona periférica, embora,
Segundo a American Cancer Society, em 2002 nos em geral, sejam biologicamente menos agressivos.
EUA, foram diagnosticados 198.100 novos casos e Após o advento do PSA, 20% dos tumores de
35.200 homens morreram em decorrência da doença, próstata têm metástase no momento do diagnóstico.
enquanto na Europa 134 mil diagnósticos foram Dos pacientes em tratamento hormonal, 80% fica-
realizados e 32.100 foram a óbito. Desses pacientes, rão hormônio-resistentes entre 18 e 36 meses e 85%
20% tinham história familiar. terão metástases ósseas. Nos pacientes em que sur-
A incidência varia de acordo com a raça e a gem metástases ósseas, o tempo de sobrevida, em
localização geográfica. Os países escandinavos e o geral, é de 20 a 30 meses. Dos pacientes que recebem
Canadá apresentam a maior incidência mundial do tratamento curativo para o câncer de próstata loca-
câncer de próstata, enquanto nos países orientais a lizado, 30% reincidem.
freqüência é até 25 vezes menor (a incidência na China A disseminação linfática atinge, em geral, os gân-
é de 0,8/100 mil e nos EUA é de 100/100 mil). glios obturadores e ilíacos, e a hematogênica, os ossos
Segundo as estatísticas americanas, a incidência em do esqueleto axial.
negros é maior que em brancos (proporção de 2:1), O câncer de próstata tem uma expressão clínica
fato não observado no Brasil. Segundo Thomas e pequena em relação à incidência, pois em 30% das
colegas (2002), quanto à incidência de câncer de próstata autópsias encontram-se câncer de próstata e somente
em homens mais jovens, os negros têm 60% mais que 1% a 2% da população manifestará a doença. Em
os homens brancos, com 200% a mais de mortalidade. torno de 40% dos homens entre 60 e 80 anos de idade
Stamey e Kabalin verificaram que o tempo de têm foco microscópico de adenocarcinoma bem-
duplicação tumoral do câncer de próstata é lento, diferenciado, e esses tumores, quando menores que
variando entre dois a quatro anos. Esses dados são 0,5 cc, são muito pouco agressivos, e denominados
confirmados em estudos clínicos de pacientes com de latentes.
câncer de próstata localizado e não-tratado. A Entre 3% e 5% dos homens morrerão de câncer
progressão local foi observada de 42% a 83% dos próstata e 10% desenvolverão doença clínica. Esse
pacientes em seguimento de seis anos e só 6% a 16% fato tem implicações médicas e éticas, pois pode estar
morreram do tumor. As metástases ósseas podem havendo um excesso de detecção e de tratamento
ocorrer em até 12 anos após o diagnóstico. com todos os efeitos colaterais.
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Alguns fatores podem influenciar na evolução do próstata por provocarem maior biodisponibilidade
câncer prostático, como o grau histológico, o volume do hormônio masculino. Dietas com baixo teor de
tumoral e o estádio na ocasião do diagnóstico. Quan- gordura podem provocar queda de até 30% dos
do o volume do tumor primário é menor que 3 cc, níveis de testosterona plasmática. A testosterona tem
as metástases raramente acontecerão e, quando tiver um papel importante no câncer de próstata, provo-
mais que 12 cc, quase sempre ocorrerão. cando a proliferação da célula neoplásica. Os homens
Histologicamente, quando o Gleason é de 2 a 4, castrados antes da puberdade, têm incidência muito
80% dos pacientes sobrevivem 15 anos, de 5 a 7, menor do câncer de próstata.
40% sobrevivem os 15 anos e de 8 a 10, mais de Elementos como o zinco, selênio, os betacarotenos,
90% morrerão antes desse prazo. Com o aumento a vitamina E e a soja seriam fatores protetores contra
da taxa de diagnóstico mais precoce nos últimos o câncer prostático.
anos, a incidência de metástases ganglionares caiu de Não existem comprovações científicas de outros
20% a 40% nas décadas de 1970 e 1980 para 4% a fatores que possam influenciar no câncer de próstata,
6% nos últimos anos. como, por exemplo, os vírus, a vasectomia e outros.
Fatores genéticos também são relevantes na O câncer de próstata é, portanto, uma doença com
ocorrência do câncer prostático. Homens com pa- um complexo comportamento biológico e com alguns
rente próximo (primeiro grau) que tenha câncer de fatores que, às vezes, podem prever sua evolução clínica.
próstata têm 2,5 vezes mais chance de desenvolver
a doença. Se tiverem dois parentes próximos, o
risco aumenta em cinco vezes, e com três parentes Leitura recomendada
aumenta para 11 vezes. Nos casos hereditários, o
1. Jemal A, Thomas A, Murray T, Thun M. Cancer Statistics,
câncer de próstata pode manifestar-se mais precoce-
2002. CA Cancer J Clin, 52: 23, 2002.
mente, muitas vezes antes dos 50 anos de idade, 2. Catalona WJ, Antenor JAV, Roehl KA. Screening for
porém não existem trabalhos que impliquem isso Prostate Cancer in High Risk Populations. J Urol 186:
como doença mais agressiva. 1980-1984, 2002.
3. Berruti A, Dogliotti L, Bitossi R, Fasolis G, Gorzegno G,
Os genes implicados e mapeados são HPC1
Bellina M, Torta M, Angeli A. Incidence of skeletal
(1q24-25), HPCX (xq27-28), CAPB (1p36), HPC20 complications in patients with bone metastatic prostate
(20q13) e HPC2/ELAC2 (17p). cancer and hormone refractary disease: Predictive role of
As dietas ricas em gordura animal podem estar bone resorption and formation markers evaluated at baseline.
J Urol, 164: 1248-53, 2000.
relacionadas com maior incidência do câncer de
4. Green Lee RT, Murray T, Bolden S. Cancer Statistics, 2000.
American Cancer Society, January/February 50: 6-11, 2000.
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Capítulo 126
Prevenção do câncer de próstata
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Capítulo 127
Rastreamento – prós e contras
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Tabela 1: Estimativas da incidência e taxa de mortalidade (por 100 mil habitantes do mesmo sexo) das neoplasias mais comuns no
Brasil, segundo a localização primária (ano de 2003)
é dispendioso e associado à morbidade expressiva. Mas prospectivo, randômico, adotando para compa-
parece não ser esta a extensa experiência dos rastrea- ração um grupo controle sem tratamento, usando
mentos usando o PSA e o toque retal, pois a maioria como parâmetros a mortalidade específica e a
dos tumores diagnosticados não se enquadra na categoria morbidade ao final do período de observação.
de indolentes. A explicação provável é que, devido ao Estudos em larga escala dessa natureza estão em
pequeno volume do carcinoma indolente, seu impacto andamento. Um estudo de rastreamento randômico
sobre o PSA total não seria tão relevante e também recente realizado no Canadá mostrou mortalidade
porque esse tumor atinge, mais freqüentemente, homens específica pelo câncer ao final de oito anos de
acima dos 70 anos de idade, já fora da faixa mais seguimento de 48,5/100 mil homens/ano no grupo
recomendável para o rastreamento. controle (não submetido aos testes) contra 15/100
As principais causas de morte no Brasil no ano 2000 mil homens/ano no grupo sujeito aos testes e
estimadas pelo INCA foram: aparelho circulatório – tratamento. Há, pois, fortes evidências da eficácia
27,5%, neoplasias – 12,7%, causas externas – 12,5%, do rastreamento e tratamento radical curativo. As
aparelho respiratório – 9,3% e outras – 33,2%. Desta dúvidas maiores surgem dos estudos não-randô-
forma, o carcinoma prostático concorre sobretudo micos ou demonstrativos que analisam o impacto
com as doenças dos aparelhos circulatório e respiratório do rastreamento sobre a mortalidade específica de
com taxas elevadas de mortalidade. Mas os avanços maneira indireta, ou seja, pela comparação com
no tratamento dessas doenças (assim como das registros históricos. Assim, a mortalidade por câncer
neoplasias) estão elevando a sobrevida da população prostático em relação à prevalência nos Estados
com aumento da importância do câncer prostático. Unidos variou de 35 mil/85 mil (41%) em 1985 a
O óbice das doenças concomitantes é enfraquecido 41 mil/317 mil (13%) em 1996, o que causa a falsa
ao se condicionar o rastreamento a homens com impressão de melhora no prognóstico. A
expectativa de vida superior a dez anos. Os principais interpretação alternativa é a introdução do teste do
problemas representados por essas doenças referem- PSA a partir de 1986-7, que antecipa o diagnóstico
se à interferência na história natural da neoplasia e na em cinco anos (tumores de menor estádio), além
interpretação dos resultados do tratamento. de também detectar carcinomas indolentes. No
O padrão ouro para comprovar a eficácia do período 1990-5, o NIH referiu queda de 12% na
rastreamento e do tratamento consiste no estudo mortalidade por câncer da próstata naquele país,
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considerada muito precoce para ser justificada pelos após esclarecimentos sobre os riscos e benefícios, em
rastreamentos. Novos casos de câncer no final da homens que o requeiram ou aceitem, com idade
década de 1990 eram estimados em 145/100 mil superior a 50 anos (ou a partir dos 45 anos de idade
homens nos Estados Unidos e 65/100 mil homens em situações especiais) e com expectativa de vida igual
na Europa, enquanto a mortalidade pelo câncer se ou superior a dez anos, pois o médico que se negar a
assemelha em ambas regiões, variando de 20 a 30 fazê-lo estará correndo riscos legais e éticos.
mortes/100 mil homens/ano. Tem-se interpretado
a discrepância entre a incidência e a mortalidade
nas duas regiões como conseqüência do uso mais Leitura recomendada
intenso dos rastreamentos nos Estados Unidos, sem
1. Barry MJ. Prostate-specific-antigen testing for early diagnosis
que haja convicção dos benefícios destes. No of prostate cancer. N Engl J Med 2001; 344: 18.
exterior, não há consenso sobre o rastreamento do 2. http://www.inca.gov.br
câncer prostático e, mesmo as entidades que o 3. Hugosson J. Early diagnosis: state of the art in clinical routine
apóiam, como a AUA e a American Cancer Society, and screening studies. In: Kurt KH, Mickisch GH, Schröder
FH. Renal, bladder, prostate and testicular cancer –
recomendam que seja efetuado somente com o un update. Ed. The Parthenon Publishing Group. New York.
consentimento do voluntário ou paciente após 2000, p. 91.
esclarecimentos sobre o risco/benefício. 4. Labrie F, Candas B, Dupont A, Cusan L, Gomez JL, Suburu
Acreditamos que os rastreamentos ativos devam RE, Diamond P, Levesque J, Belanger A. Screening
decreases prostate cancer death: first analysis of 1988
se restringir aos projetos de pesquisa, e seu emprego Quebec prospective randomized controlled study.
em larga escala, com objetivos assistenciais, deve Prostate 1999; 38: 83.
aguardar o surgimento de evidências mais sólidas, 5. Standaert B, Denis L. Prostate cancer screening. In: Kaisary
favorecendo o denominador da equação custo+risco/ AV, Murphy GP, Denis L, Griffiths K. Text Book of
Prostate Cancer – Pathology, Diagnosis and
benefício. Não obstante, recomendamos que o Treatment. Ed. Martin Dunitz. London. 1999; p. 103.
rastreamento passivo deva ser realizado rotineiramente,
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Capítulo 128
Genética e câncer de próstata
Nelson Gattás
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Capítulo 129
PSA – importância no diagnóstico
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da glândula prostática. A correlação pode ser obtida ao ano e projetam com este fato um aumento de
dividindo o valor do PSA pelo volume da glândula 17,1% de valor preditivo positivo na detecção do
prostática (em cm 3 ). Apenas 2% de HPB câncer. A velocidade de crescimento acima de 200%
apresentam valores de PSA acima de 10 ng/mL e ao ano pode representar a presença de prostatite.
25% dos pacientes com PSA entre 4 e 10 ng/mL Alguns investigadores têm demonstrado elevações
podem apresentar histologia benigna. A relação PSA biológicas do PSA com a ejaculação, massagem
livre/PSA total tem efetivamente melhorado a prostática, cistoscopia, sondagem vesical, biópsias da
especificidade do PSA quando aplicado no screening. próstata, ultra-som endorretal e exercícios de ciclismo.
Níveis maiores que 25% representam crescimento
benigno e níveis inferiores a 10% estão relacionados
em 60% com o adenocarcinoma. Homens utili- PSA e o tratamento do câncer
zando finasterida podem apresentar 50% de redução da próstata
do PSA em três meses.
Vários estudos sugerem que o PSA-nadir, após a
prostatectomia radical, deve permanecer abaixo de
PSA e idade 0,2 ng/mL, o que caracteriza a não-evidência de
recorrência. Níveis de PSA acima de 0,4 ng/mL
O PSA tende a aumentar seus valores com o apresentam recorrência em 100% dos pacientes. No
avanço gradual da idade, isto possivelmente com tratamento radioterápico, o PSA decresce nos próxi-
desenvolvimento de HPB. Os valores referenciados mos 1,4 a 2,6 meses seguintes à terapia. Após a
na literatura, em homens de 40 a 79 anos de idade, irradiação, 25% dos pacientes apresentam valores de
poderão ser utilizados em screening com 95% de PSA de 2,5 ng/mL ou menos. Apenas 11% apresentam
intervalos de confiança (Tabela 1). O uso da tabela remissão em níveis indetectáveis. O PSA-nadir é um
de valores de PSA específico poderá em screenings importante indicador de resposta à terapia hormonal.
aumentar a sensibilidade de detecção de câncer da Na terapia hormonal, acima de dois terços apresentam
próstata em homens jovens. uma remissão duradoura de PSA, 31% decrescem em
níveis normais e 9% apresentam níveis indetectáveis.
Tabela 1: Relação idade screnings PSA
Conclusão
O PSA é o mais importante marker tumoral em
oncologia urológica. Sua análise permite aferir
com sucesso o comportamento biológico do cân-
cer da próstata. Pode ser usado com segurança no
Oesterling e colegas (CI 95%) screening diagnóstico e na análise de estadiamento,
monitorar a evolução e as respostas às várias
modalidades de tratamento.
Velocidade de PSA
A velocidade de PSA é a mudança de seus valores Leitura recomendada
ao longo do tempo. O crescimento da próstata pode
ser aferido e monitorado anualmente pelos valores de 1. Ernstoff MS, Heaney JA, Peschel. RE- Prostate Cancer,
PSA. A velocidade de PSA é utilizada com um mínimo Ed. Blackwell Science Inc., USA, 1998.
de três títulos com intervalos de dois anos. As 2. Belldegrun A, Kirby RS, Oliver T. New perspectives in
prostate cancer. Ed. Isis Medical Media Ltd, 1998.
publicações e conceitos atuais na velocidade do PSA 3. Kaisary AV, Murphy GP, Denis L, Griffiths K. Prostate
projetam o aumento máximo de 20% ao ano e/ou cancer – Pathology, Diagnosis and Treatment. Ed.
0,75 ng/mL/ano. Trabalhos recentes evidenciam que Martin Dunitz, 1999.
o câncer apresenta crescimento do PSA de 50% a 100% 4. Campbell’s Urology – 8a edição.
5. Guideliness of American Urological Association, 2003.
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Capítulo 130
O exame físico na avaliação do
câncer de próstata
O exame físico permanece como uma ferramenta disso, durante este momento da anamnese e exame
relevante para o diagnóstico do câncer de próstata (CaP), físico, podem ser dadas explicações sobre quais sinais
mesmo com a evolução dos métodos complementares, estão sendo procurados durante o exame físico, e
como o PSA, o USG, e as biópsias guiadas por USTR, quais podem ser indicativos de câncer.
que auxiliam em uma detecção cada vez mais precoce. Na fase inicial, os sintomas podem estar comple-
Deixado muitas vezes para um segundo plano, por tamente ausentes, o que faz muitos homens não procu-
médicos que preferem realizar somente a investigação rarem o urologista por não estarem sentindo nada.
laboratorial e de imagem para a próstata, o exame físico, Além disso, a maior parte dos sintomas urológicos
especificamente o toque retal, ainda é de suma impor- que acometem o homem, na faixa etária em que o
tância no dia-a-dia do urologista. CaP predomina, correspondem a sinais e sintomas de
No caso do toque retal, a probabilidade de um hiperplasia prostática benigna e não ao câncer. Por isso,
homem com o toque retal suspeito ter câncer é de uma busca ativa deve ser realizada em todos os casos.
quase um em três (valor preditivo positivo – VPP = O toque retal se torna, assim, uma etapa importante
22% a 34%). A probabilidade aumenta quando esta no exame físico na avaliação do CaP.
suspeita é encontrada em homens com hiperplasia Antes de realizar o toque, devemos fazer uma
prostática benigna, geralmente mais idosos. Da inspeção da região perianal, para afastar patologias
mesma maneira, o VPP é maior em homens da raça hemorroidárias ou carcinomas anais, que podem ser
negra do que na branca (38% versus 22%). Vários uma causa de dor e prejudicar o exame adequado.
estudos nos últimos dois anos concordam que, para A maioria dos casos de CaP está localizada na
valores de PSA maiores que 4 ng/mL, o toque retal zona periférica da próstata, e pode ser detectada
combinado ao PSA serve efetivamente para a investi- durante o toque retal, quando o seu volume é maior
gação do diagnóstico precoce do CaP, por suas altas que 0,2 cc3. A presença de anormalidades no toque
taxas de detecção. retal significa câncer em 15% a 40% dos casos, de
Como parte da consulta inicial, o exame físico, acordo com a experiência do examinador. O pri-
além de sua função diagnóstica, complementa o meiro sinal pode ser um nódulo endurecido, lem-
vínculo na relação médico-paciente, pois transmite brando que nem todo nódulo endurecido significa
confiança a este no momento em que é examinado, câncer de próstata, podendo ser também um
e não são apenas solicitados exames. Da mesma nódulo de hiperplasia prostática benigna, cálculo
maneira, o contato, associado a explicações, ajuda a prostático, tuberculose, prostatites, áreas de infarto,
quebrar tabus e a difundir a importância da consulta anomalias do ducto ejaculatório, anomalia da
urológica e do diagnóstico precoce do CaP. Além vesícula seminal, flebolitos da parede retal, pólipos
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ou tumores retais. Geralmente, nos nódulos neoplá- Na fase avançada da doença, o CaP pode manifestar-
sicos, há uma consistência firme e bordo nítido, sem se com dores ósseas decorrentes de metástases à distância,
elevações da superfície, ao contrário do que acon- alteração do fluxo urinário com evolução para retenção
tece em patologias infecciosas. urinária, havendo globo vesical palpável, hematúria,
A consistência da próstata, que normalmente é a linfoadenopatias, edema de membros inferiores e queda
da borracha ou da região tênar da mão, pode do estado geral com caquexia concomitante.
encontrar-se endurecida ou pétrea, com perda dos Quanto à faixa etária para realizar o toque retal,
limites laterais ou com as vesículas seminais em casos recomenda-se realizar o exame em todo homem
avançados. Estas, por sua vez, normalmente não- acima de 50 anos de idade. No caso dos homens com
palpáveis, podem estar endurecidas ou pétreas, casos de CaP nos familiares de primeiro grau, esta
significando metástases. A perda da mobilidade e idade deve ser reduzida para os 40 anos. Em todos os
fixação da próstata à parede do reto também é um casos, o exame deve ser realizado anualmente.
sinal de doença avançada.
Por causa do risco significativo de CaP, reco-
menda-se a biópsia de próstata para todo paciente Leitura recomendada
com toque retal suspeito, independente do valor do
1. Aus G, Abbou CC, Pacik D, Schmid HP, van Poppel H,
PSA, porque 25% dos homens com CaP têm valores WolffJM, Zattoni F. EAU. Guidelines on Prostate Cancer.
de PSA abaixo de 4 ng/mL. Nestes valores de PSA, Eur Urol. 2001 Aug; 40(2): 97-101.
há controvérsia sobre se o toque retal é importante 2. De la Rosette JJ, Alivizatos G, Madersbacher S, Perachino
M, Thomas D, Desgrandchamps F, de Wildt M. EAU
na detecção do CaP, pois o VPP do toque diminui à
Guidelines on Benign Prostatic Hyperplasia (BPH). Eur
medida que diminui o valor do PSA; entretanto, a Urol. 2001, Sep; 40(3): 256-63.
importância do toque permanece independente do 3. Netto Jr NR: Urologia Prática. São Paulo, Atheneu Ed. 4a
valor do PSA. Uma das justificativas para isto é que ed. 1999; pp. 81-95, 237-47.
4. Carter HB, Partin AW. Diagnosis and Staging of Prostate
cerca de 20% dos CaP crescem fora da zona periférica Cancer. In: Walsh PC, Retik AB, Vaughan Jr ED, Wein AJ,
da próstata, que pode ser detectável ao toque, Campbell’s Urology. Philadelphia, W.B.Saunders Company.
crescendo na zona de transição. 1998; pp. 2519-38.
438
Capítulo 131
Biópsia – quando e como?
A biópsia prostática (Bxptt) teve grande impulso gues aos pacientes, contendo referências em caso de
com o advento da ultra-sonografia transretal (USTR). emergência, telefone ou bip.
Associado ao melhor conhecimento da anatomia zo- Deve-se dar preferência para o posicionamento
nal da glândula prostática, descrita por Mc’Neal, este do paciente em decúbito lateral esquerdo, em lugar
método atualmente é considerado o “padrão ouro” da inconveniente posição de litotomia.
para diagnóstico do câncer de próstata. Possui indi-
cação precisa nos casos de elevação do antígeno pros- Preparo intestinal
tático específico (PSA) ou exame digital retal (EDR)
Os defensores do preparo intestinal afirmam que
suspeito. Devido à baixa especificidade, as alterações
as fezes podem interferir mecanicamente no estudo,
texturais encontradas no exame ultra-sonográfico não
além de aumentar o risco de complicações infec-
constituem, isoladamente, indicação para biópsia. ciosas, enquanto outros autores discordam total-
Achados histopatológicos de neoplasia intra-epitelial mente. Lindert e Terris acusaram bacteremia em 16%
e atipia celular indicam re-biópsia, embora o intervalo das biópsias; destas, 87,5% não tiveram preparo intes-
entre os procedimentos não esteja bem-estabelecido. tinal. Já Carey e colegas não evidenciaram diferença
Idealmente, devemos ter a biópsia prostática diri- significativa de complicações importantes entre os
gida por USTR como método simples, eficaz e se- grupos, em um estudo com 410 pacientes. Apesar
guro, entretanto não existe um consenso em relação de controverso, Soloway e colegas mostram que 79%
ao preparo e técnicas empregadas para sua realização, dos urologistas americanos prescrevem rotineira-
como veremos. mente algum tipo de enema.
Profilaxia antibiótica
Preparo da pré-biópsia
Estudos mostram uma redução das complicações
Exames laboratoriais não são realizados rotineira- infecciosas quando antibióticos são administrados
mente, e jejum somente é necessário se estiver progra- profilaticamente. Novamente, não existe uma unifor-
mada sedação. midade na escolha do medicamento e sua dosagem.
Pacientes em uso de anticoagulantes, ácido acetil- Taylor e colegas reportam uso de 13 antibióticos dife-
salicílico, devem ser orientados a suspender o medica- rentes, em 48 regimes distintos, adotados pelos urolo-
mento com uma semana. gistas no Reino Unido. Importante é que o antibiótico
Consentimento informado sempre deve constar tenha amplo espectro de ação, particularmente para
na rotina pré-biópsia. Orientações sobre os descon- bactérias do grupo Gram-negativo, e tenha boa pene-
fortos e complicações pós-biópsia devem ser entre- tração no tecido prostático. Por estas características, as
439
fluoroquinolonas têm grande aceitação, podendo ser estudos não obtiveram o mesmo sucesso. Peters e
administradas na véspera do procedimento ou horas colegas defendem a sedação usando propofol, mas com
antes. Vários estudos recentes enfatizam os convenientes inconveniente da maior complexidade do método.
da profilaxia em dose única, sem comprometer sua Nossa experiência concorda com a literatura que a
segurança. Cuidado especial deve ser empregado em injeção de lidocaína no feixe periprostático reduz
pacientes portadores de valvulopatia cardíaca que drasticamente a sensação dolorosa do procedimento,
necessitam de profilaxia para endocardite bacteriana, enquanto a aplicação de lidocaína gel intra-retal não difere
assim como pacientes imunodeprimidos, diabéticos. do grupo placebo (Tabela 1).
Analgesia
Apesar da biópsia de próstata ser bem-tolerada pela
Material necessário
maioria dos pacientes, a dor e o desconforto do Figura 1.
procedimento não devem ser negligenciados, como
mostra o estudo de Irani e colegas, em que 19% dos
pacientes recusariam repetir a biópsia sem anestesia. Em Estratégias
1996, Nash e colegas já descreviam importante redução
da dor injetando lidocaína 1% no feixe vasculonervoso Em 1989, Hodge e colegas introduziram o con-
periprostático. Resultados semelhantes foram ceito de biópsias sistemáticas, em que a próstata era
comprovados por vários outros autores. Usando dividida em seis sítios (sextantes), vindo substituir as
método simples, Issa e colegas defendem o uso de biópsias dirigidas e tornar-se técnica padrão mun-
lidocaína gel intra-retal, alcançando diferença significativa dialmente. Algum tempo depois, novas estratégias
da dor comparado com grupo placebo. Vários outros foram propostas, evidenciando níveis de falso-
440
negativo na ordem de 25% com a técnica em sex- transição e uma da linha média, acrescentando cinco
tantes. Eskew e colegas somaram aos sextantes quatro fragmentos aos sextantes; conhecido como “método
biópsias nas bordas laterais (duas de cada lado) e dos 11 sítios”, conseguiu um acréscimo de 33% sobre
três biópsias da linha média, totalizando 13 frag- a técnica dos sextantes.
mentos e melhorando a sensibilidade do método em Presti e colegas também defendem biópsias das bor-
35% – técnica que ficou conhecida como das “cinco das laterais somadas aos sextantes. Retirando duas
regiões”. amostras de cada lado, alcançaram uma sensibilidade
Babaian e colegas, baseados em modelos simu- de 96% com o método. Mais tarde, estes autores re-
lados de reconstrução computadorizada de espécies portam uma variação da técnica desconsiderando o
de prostatectomia radical, propuseram a retirada de fragmento da linha parassagital da base prostática de
dois fragmentos das bordas laterais (que denomi- cada lado, diminuindo para oito fragmentos, e
naram “corno anterior”), duas biópsias da zona de mantendo a sensibilidade no nível de 95% (Figura 2).
Figura 2: Estratégias
441
* Retenção urinária simples (sem sinais de prostatite aguda, febre) – cateterismo vesical + antibioticoterapia por 7 dias
Leitura recomendada
1. Hodge KK, McNeal JE, Terris MK, Stamey TA. Random 2000; 163: 163-7.
systematic versus directed ultrasound guided transrectal core 3. Matlaga BR, Eskew LA, McCullough DL. Prostate biopsy:
biopsies of the prostate. J Urol, 1989; 142: 71-5. Indications and technique. J Urol, 2003; 169: 12-9.
2. Presti JC, Chang JJ, Bhargava V, Shinohara K. The optimal 4. Terris MK. Ultrasonography and biopsy of the prostate. In:
systematic prostate biopsy scheme should include 8 rather Walsh PC, Retik AB, Vaughan Jr ED, Wein AJ. Campbell’s
than 6 biopsies: results of a prospective clinical trial. J Urol, Urology. 8th ed. 2002.
442
Capítulo 132
Re-biópsia – por que e como?
Até 34% das biópsias sextantes habituais (Hodge primeira vez, com exceção de neoplasias de pequeno
e colegas, 1989) são falsas-negativas. Isso ocorre volume (< 0,5 cm3) encontradas após três ou quatro
porque a técnica interessa apenas à região parassagital exames. Djavan e colegas, não demonstraram diferença
da próstata não removendo fragmentos da zona estatística significativa em 1.051 pacientes quanto ao
transicional, das regiões mais laterais e anteriores à estádio Gleason e a evolução clínica entre tumores
uretra (com até 10% a 20% de positividade). Um diagnosticados no primeiro exame versus na re-biópsia.
fragmento sextante remove apenas 1/500 da glân-
dula, limitando a acurácia principalmente em grandes
A morbidade da re-biópsia
próstatas (> 50g). Não se registra aumento da morbidade em re-
Existem dúvidas a respeito da realização de re- biópsias comparadas ao exame inicial.
biópsia prostática.
Profilaxia
Positividade da re-biópsia Na manhã do exame é realizado um enema e
inicia-se o uso de fluoroquinolonas por três a cinco
Até 96% dos cânceres são detectados nas duas
dias. As complicações agudas mais comuns são: hema-
primeiras biópsias.
túria, reflexo vagal, sangramento retal e retenção e as
A positividade na segunda, terceira e quarta
crônicas: hematúria, hemospermia, disúria, infecção/
biópsias varia respectivamente entre 10% a 20%, 5% bacteremia, retenção. Após a terceira biópsia, a morbi-
a 9% e 2% a 4%. Removendo-se 23 fragmentos em dade pode ser maior.
média, sob anestesia na Mayo Clinic, encontrou-se
31% e 20% de positividade nos quarto e quinto Quem deve ser re-biopsiado
exames respectivamente. Casos de forte suspeita
Pela chance de positividade entre 2% e 20% em
podem requerer até mais biópsias. Casos de menor
novas biópsias, a maioria dos pacientes submetidos à
risco podem ter as biópsias evitadas após dois ou
primeira biópsia é candidata a pelo menos mais um
três exames negativos.
exame. Tentativas de selecionar pacientes de “baixo
Importância clínica de uma neoplasia risco” para a re-biópsia (PSA < 10 ng/mL; PSAd
diagnosticada através da re-biópsia < 0,15 ng/mL/cc; PSAV < 0,75 ng/mL/ano; ausência
de NIP, história familiar, toque e ultra-sonografia
Tumores diagnosticados em re-biópsias têm a normais) são infrutíferas, pois 23,8% destes indi-
mesma importância clínica daqueles diagnosticados na víduos têm diagnóstico de câncer em novo exame.
443
Leitura recomendada
1. Fleshner NE, O’Sullivan M, Fair W R Prevalence and
Figura 1: Esquema de indicação de uma segunda biópsia de predictors of a positive repeat transrectal ultrasound guided
acordo com Djavan e colegas. Algoritmo: PSA e re-biópsias. biopsy of prostate J Urol 158: 505-8, 1997.
444
2. Allen EA, Kahane H, Epstein JI. Repeat biopsy strategies for 4. Stewart CS, Leibovich BC, Bradley C et al. Prostate
men with atypical diagnoses on initial prostate needle biopsy. cancer diagnosis using a saturation needle biopsy technique
Urology 52: 803-7, 1998. after previous negative sextant biopsies. J Urol: 166: 86-
3. Djavan B,Waldert M, Zlotta A et al. Safety and morbidity of 92. 2001.
first and repeat transrectal ultrasound guided prostate needle 5. Djavan B, Renzi M, Schulman CC et al. Repeat prostate
biopsies: Results of a prospective European cancer detection biopsy: who, how and when? A review. Eur Urol:
study J Urol 166:856-60, 2001. 42(2):93-103, 2002.
445
446
Capítulo 133
O estudo histopatológico da
biópsia prostática
As biópsias prostáticas são realizadas para detectar Os principais critérios citológicos são núcleos volu-
carcinomas em pacientes com manifestações ao mosos, nucléolos proeminentes e ausência de células basais.
exame físico e/ou alterações do PSA. No adenocarcinoma da próstata, devemos consi-
A próstata é uma glândula constituída por ductos derar, como fator prognóstico, o componente histo-
e ácinos, situados em meio a um estroma fibromus- lógico que predomina na lesão. É neste aspecto que
cular. Os ácinos e ductos prostáticos, exceto nos seg- se baseia a gradação de Gleason.
mentos periuretrais imediatos, são revestidos por uma A gradação histológica de Gleason considera cinco
dupla população de células, representada por uma graus de diferenciação. Devem constar, no laudo da
camada interna colunar secretora e uma camada biópsia, o grau predominante e o grau secundário. A
externa formada por células basais. soma dos dois graus totaliza uma contagem final que
As células basais são reativas para citoceratina de alto varia de 2 a 10.
peso molecular (34-beta), na reação de imunistoquímica. O grau de Gleason mais freqüente em biópsias
A presença de células basais exclui o diagnóstico por agulha é o 3. Os graus 2 e 1 são muito raros e
de adenocarcinoma da próstata; por outro lado, a dificilmente detectados.
sua ausência, como critério único, não pode ser consi-
Contagem final de 2 a 5 = neoplasia de baixo grau;
derada para o diagnóstico de câncer. Outros fatores
Contagem final 6 = neoplasia de grau intermediário;
devem ser observados, tais como desarranjo arqui-
Contagem final 7 a 10 = neoplasia de alto grau.
tetural e alterações citológicas.
As biópsias obtêm material especialmente da zona
Pelo menos três glândulas atípicas são necessárias
periférica. Nesta região, predominam os carcinomas,
para fazer o diagnóstico de câncer. Em casos difíceis,
as neoplasias intra-epiteliais, inflamações crônicas e
devem ser feitos cortes seriados (três níveis). O termo
atrofias. A hiperplasia e a adenose nesta topografia
proliferação atípica de pequenos ácinos é utilizado
são achados ocasionais. em caso de dúvida.
Carcinomas da próstata O envolvimento de gânglios nervosos na biópsia
por agulha não necessariamente significa que há
Em 98% dos casos, o carcinoma origina-se nos ácinos. disseminação extraprostática. O carcinoma de prós-
O diagnóstico é feito baseado no desarranjo arqui- tata se dissemina pelos espaços neurais, porque esta é
tetural e nas características citológicas. a via de menor resistência.
O desarranjo arquitetural é representado predo- Lesões consideradas como neoplasias insignificantes
minantemente pela infiltração do estroma. são aquelas com Gleason de baixo grau ou grau
447
Prostatites
Infiltrados inflamatórios são freqüentes em biópsias
de próstata e não significam necessariamente prostatite. Figura 1: Neoplasia intra-epitelial
O diagnóstico de prostatite tem valor quando são obser-
vados granulomas, exsudatos purulentos ou abscessos.
Causas de prostatite Nos laudos anatomopatológicos, devem ser
Bacteriana, tuberculose, secundária ao uso de BCG, registrados apenas os casos de NIP de alto grau.
sarcoidose e idiopáticas. As alterações citológicas da NIP são semelhantes
às do adenocarcinoma de próstata. O que a diferencia
Hiperplasia nodular do adenocarcinoma é a ausência de desarranjo
Crescimento não-neoplásico, decorrente da hiperplasia arquitetural e a presença de células basais.
do estroma e do tecido glandular, em graus variados. Em casos de NIP, o paciente deve ser acompa-
Geralmente origina-se em glândulas internas, não nhado, considerando-se também a possibilidade de
sendo detectada habitualmente em espécimes de uma nova biópsia.
biópsia periférica. A freqüência do encontro de adenocarcinoma
Assim sendo, nas biópsias prostáticas por agu- numa segunda biópsia é de 26% a 53%.
lha, o diagnóstico de hiperplasia nodular da prós-
tata é excepcional.
448
Atrofias
Atrofia é usualmente vista após a sexta década,
podendo ser detectada focalmente a partir da terceira
década; geralmente resultante de inflamação, isquemia,
radiação ou hormonioterapia.
Histologicamente pode ser de forma errada inter-
pretada como adenocarcinoma.
Apesar do caráter aparentemente infiltrativo, sua
disposição conserva a estrutura lobular da glândula
prostática.
449
450
Capítulo 134
Classificação, patologia e
estadiamento do câncer de próstata
Renato Scaletscky
451
452
Continuação Figura 1
simples do abdome, podem ainda ser utilizadas em Vem sendo estudado o uso do PSA complexado, cujo
casos selecionados, mas não são de uso rotineiro. ensaio é mais preciso que seu cálculo a partir do livre
Todas possuem valor clínico limitado devido à sua é total, além de outros marcadores, tais como a HK2,
incapacidade de detectar doença extraprostática. outra calicreína, como o PSA.
Após o advento do PSA, tem se observado que a A U/STR vem sendo empregada, de forma
cintilografia óssea, o melhor método para se detectar rotineira, na avaliação de próstatas suspeitas de
metástases ósseas, não costuma ser positiva em abrigarem carcinoma, há cerca de 15 anos. Seu papel
pacientes com PSA sérico menor que 10 ng/mL. Se é orientar a realização de biópsias transretais e
o escore de Gleason não colocar o paciente no grupo assegurar, ao examinador, que uma área ampla e
de pior risco, talvez este exame seja desnecessário. adequada está sendo a mostrada. Pode, também, por
O toque retal é de uso obrigatório para avaliar, vezes, fornecer uma idéia do estadiamento local, da
em casos de tumores palpáveis, sua mobilidade, extensão capsular ou extracapsular. No entanto, não
fixação e volume. No entanto, o toque retal isolado é um método preciso para se localizar um CaP inicial,
subestadia, significativamente, a possibilidade da nem deve ser usado como arma de rastreamento.
doença não estar mais restrita ao órgão. Por isso, qualquer paciente, com indicação de biópsia,
O PSA é o marcador mais útil no momento, mas, seja por toque retal alterado, elevação do PSA, ou
isoladamente, não pode precisar, com acurácia, o ambos, deve ser biopsiado, independente dos acha-
estádio da doença devido ao overlaping entre as diferentes dos ultra-sonográficos.
fases da neoplasia. Da mesma forma, seu uso para Tem havido considerável debate acerca do tumor
screening ou rastreamento é limitado pela presença de T1c, que não é palpável e cujo diagnóstico é feito
hiperplasia prostática benigna (HPB). O uso do valor pela biópsia motivada pela elevação dos níveis de
sérico total do PSA deu lugar a vários índices, tais como PSA. Originalmente, a classificação TNM de 1992
PSA ajustado para idade, PSA livre como uma fração considerava que, neste estágio, a doença não deveria
do total e, ainda, a velocidade. A densidade, calculada produzir imagem alterada ou nódulo ao U/STR, sob
a partir da divisão do PSA sérico pelo volume ultra- pena do mesmo ser re-estadiado para T2a. Atual-
sonográfico (transretal) da próstata, não consegue mente, no entanto, aceita-se que esses tumores, com
prever, de forma significativa, a real extensão pós- nódulo visível, mas não palpável, possuam um
operatória da neoplasia nem a possibilidade de comportamento semelhante ao T1c, sem alteração
recorrência bioquímica, tendo este cálculo perdido sua de imagem, devendo ser classificados como tal.
importância. A densidade, ajustada para a zona de Até o momento, não existem métodos inteiramente
transição, é melhor que a densidade calculada pelo confiáveis para se detectar doença extraprostática
volume total, mas ainda apresenta valor preditivo baixo. precoce. Pacientes de alto risco para doença N+,
453
cujos métodos usuais de imagem não revelam metás- próstatas com carcinoma, mas não necessita obrigato-
tases, podem, por exemplo, ser submetidos à amos- riamente estar presente para o carcinoma desenvolver-
tragem dos linfonodos por videolaparoscopia. O uso se. O risco de encontrar-se CaP, em biópsias subse-
de anticorpos monoclonais para a detecção de qüentes a uma com PIN somente, varia entre 25% e
doença linfonodal vem sendo estudado há alguns 35% e, é motivo para repetição do procedimento.
anos (ProstaScint), demonstrando um valor preditivo PIN, por si só, não causa elevação do PSA.
positivo de cerca de 50% a 60%. Estes ainda não A Figura 2 mostra a evolução das diversas etapas de
são empregados de forma rotineira, na prática clínica. transformação do epitélio prostático normal, passando
por fases de displasia, PIN, até o carcinoma invasivo.
O tipo histológico de CaP que mais interessa ao
Patologia do câncer da próstata urologista é o adenocarcinoma. Este deve ser graduado
pelo sistema de Gleason, baseado no padrão glandular
O papel do patologista adquiriu enorme impor-
do tumor, identificado sob microscopia com pouca
tância desde que o tratamento cirúrgico vem sendo
magnificação (Figura 3). Desta forma são identificados
empregado de forma mais criteriosa, desde o advento
os dois padrões histológicos predominantes dentre
do PSA e, em mudanças na classificação, que
os cinco indicados por Gleason. Estes variam desde
valorizaram de sobremodo o estadiamento local,
entre outros. um padrão bem-diferenciado (grau 1) até um padrão
A neoplasia intra-epitelial prostática de alto grau muito pouco diferenciado (grau 5). A soma dos dois
ou PIN é a lesão precursora do carcinoma invasivo tipos predominantes fornece o escore, que vai,
da próstata. Arquitetonicamente, observam-se portanto, de 2 até 10. O prognóstico, de acordo com
glândulas prostáticas benignas, revestidas com o escore, varia de bom (2, 3, 4), moderado (5, 6) a
camadas de células citologicamente atípicas. ruim (7, 8, 9, 10). O escore 7 pode ser obtido pela
Originalmente descrita por Bostwick e Brawer em soma dos graus 4+3 ou 3+4, sendo o primeiro número
1987, substituiu os termos usados para as alterações sempre o mais predominante. Alguns autores
patológicas descritas previamente como atipias e acreditam que estes deveriam ser diferenciados, sendo
displasia intraductal. PIN de baixo grau não deve que o tumor 4+3 permaneceria no grupo de pior
mais ser referido em laudos de anatomopatológicos prognóstico, enquanto que o 3+4 se associaria ao de
pela dificuldade em diferenciar-se HPB e PIN de prognóstico intermediário. É possível que esta distinção
baixo grau. Este, em achados de biópsias, não de comportamento entre os dois subtipos de 7 venha
aumenta o risco de encontrar-se CaP em biópsias a se confirmar em estudos com follow up mais longo.
subseqüentes. A designação de PIN, portanto, refere- O escore de Gleason, no entanto, é mais fidedigno
se ao PIN de alto grau, que agora reúne os grupos em espécimes de prostatectomia radical ou de
previamente chamados de PIN2 (displasia moderada) ressecção endoscópica, que em biópsias por agulha.
e PIN3 (displasia severa). PIN está presente em maior O subestadiamento é um fato relativamente freqüente
número, principalmente em zona periférica, em em avaliações de biópsias por agulha. Além disto, os
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Capítulo 135
Como estadiar o câncer de próstata
Valdemar Ortiz
Marcos Lima de Oliveira Leal
Inicialmente, o estadiamento do câncer da próstata Tabela 1: Classificação e estadiamento TNM para câncer de
era baseado exclusivamente em dados clínicos (co- próstata
mo o toque retal) e exames de imagem. A partir
destas informações, definia-se o estadiamento clí-
nico, cujo sistema de classificação é o TNM. Devido
às falhas que ocorrem com este método, surgiram
novos conceitos de definição de risco.
Atualmente, para melhor definição de risco,
combinam-se as informações da avaliação clínica
a critérios como nível de PSA sérico, grau de Glea-
son e interpretação dos dados da biópsia prostá-
tica. Os principais objetivos do correto estadia-
mento do câncer de próstata são predizer prog-
nóstico e selecionar terapia adequada.
A principal via de disseminação linfática é, para a
cadeia ilíaco-obturadora, ocorrendo em até 10% dos
casos da doença, inicialmente, considerada localizada.
Nos pacientes com metástase hematogênica, o principal
sítio acometido são os ossos do esqueleto axial. Em
caso de doença terminal, 85% dos pacientes têm
metástase óssea e 20% têm metástase visceral, sendo
fígado e pulmão os principais órgãos acometidos.
Métodos de estadiamento
Toque retal
Este método ainda é muito utilizado para avaliação
da extensão local do câncer. A partir dos achados, po-
demos iniciar o estadiamento clínico do TNM (Tabela 1).
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460
Capítulo 136
Doença localizada – opções
terapêuticas
As campanhas de detecção precoce do câncer de gica da PR, teve reduzida a alta incidência de compli-
próstata (CaP) trouxeram um novo panorama rela- cações (incontinência, disfunção erétil, perda exces-
cionado ao seu tratamento, pois cada vez mais vêm siva de sangue intra-operatória) para índices acei-
sendo diagnosticadas neoplasias em estádios iniciais, táveis e essa operação passou a ser empregada em
com maior potencial de cura. praticamente todos os centros urológicos. Tem
Embora o CaP tenha em geral evolução lenta, sua como vantagem erradicar, de maneira imediata
história natural é variável, apresentando, por vezes, metás- populações de células tumorais, inclusive as radior-
tases precoces, quando a cura é excepcional devendo a resistentes.
orientação terapêutica ser instituída sem demora. Estatísticas recentes mostram cerca de 80% dos
Fatores prognósticos permitem antever compor- pacientes com estádio T1-2 Nx M0 (A-B) tratados
tamento biológico mais agressivo desses tumores, pela PR sem evidência de progressão da doença após
tais como: cinco anos (Tabela 1) e 47% a 73% após dez anos
a) histologia desfavorável (Gleason 7-10); (pelas dosagens de PSA) (Tabela 2).
b) alterações da ploidia; Admite-se que pacientes submetidos a PR, uma
c) extensão local (estádio); e vez constatado envolvimento de linfonodos e/ou
d) PSA elevado. vesículas seminais, necessitam de tratamento hor-
Esse comportamento variável orienta condutas tera- monal complementar.
pêuticas totalmente opostas. Na atualidade admitem-se Fatores determinantes do sucesso terapêutico
duas modalidades de tratamento com potencial de cura: pela PR:
prostatectomia radical (PR); a) ausência de margens comprometidas e de infil-
radioterapia (Rdt). tração de vesículas seminais e/ou linfonodos;
O regime de “observação” (sem tratamento) tam- b) níveis séricos de PSA indetectáveis três meses
bém é aceito em casos selecionados. Não existe, até após a cirurgia; e
o momento, consenso na literatura sobre a melhor c) histologia tumoral favorável (Gleason < 7). Não
alternativa a ser empregada “em todos os casos”. existe consenso sobre quais limites séricos do PSA con-
Revisão da Associação Americana de Urologia (1995) tra-indicariam a cirurgia.
de 12.501 artigos sobre o tema considerou aceitáveis A hormonioterapia neoadjuvante é controversa,
apenas 165 (1,3%), o que mostra a falta de unifor- podendo alterar a interpretação do exame histológico,
midade dos dados divulgados. e sua eficácia em termos de intervalo livre de doença
A prostatectomia radical, após a notável contri- e sobrevida não está bem-estabelecida. A maioria
buição de Walsh (anos 1980) para a anatomia cirúr- contra-indica seu emprego.
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Tabela 3: Progressão livre de doença (PLD) após radioterapia. Resultados com períodos < 5 anos
Adaptada de Scardino
Tabela 4: Progressão livre de doença (PLD) após radioterapia. Resultados com períodos > 10 anos
Adaptada de Scardino
Radioterapia
O regime de observação tem seus adeptos (Johans-
son e colegas), os quais defendem a teoria de que o Pacientes com risco para o tratamento cirúrgico;
benefício do tratamento cirúrgico ou radioterápico Expectativa de sobrevida suficientemente longa
pouco acrescentaria em termos de sobrevida. A maior para que o tratamento se justifique;
crítica a esses estudos é a inclusão de elevado percentual Ausência de patologia colorretal que contra-
de pacientes idosos, com histologia favorável e baixo indique a irradiação;
estádio e de conhecido pequeno risco de progressão. Participação do paciente na decisão terapêutica.
Essa conduta pode ser recomendada para doentes com
as citadas características, mas não para pacientes mais Conduta expectante
jovens, com histologia e estadiamento menos favoráveis,
Expectativa de vida inferior a dez anos;
pois nessas condições os índices de progressão são muito
Histologia favorável (bem diferenciados ou
altos. Dados de história natural (Catalona e colegas)
moderadamente, Gleason 2 a 6);
mostram índices de progressão em cinco e dez anos,
Participação do paciente na decisão.
respectivamente, de 5% a 10% - A1 (T1a); 35% a 80%
O sucesso terapêutico das opções citadas depende
- A2 (T1b); 35% a 55% - B1 (T2a); 77% a 90% - B2
muito da seleção criteriosa dos pacientes, cuja participação
(T2b) e praticamente 100% - C (T3c).
é recomendável na escolha do método de tratamento.
463
464
Capítulo 137
Prostatectomia radical –
retropúbica versus perineal
versus laparoscópica
Os critérios de indicação da prostatectomia radical existem situações que podem fazer a cirurgia ser mais
já foram apresentados em outro capítulo. Atualmente difícil. Do ponto de vista anatômico, da mesma forma
temos três modalidades cirúrgicas: retropúbica, que ocorre na cirurgia aberta, nas próstatas pequenas
perineal e laparoscópica. (menores de 20 g), geralmente, a dissecção é mais difícil,
pois os limites da glândula ficam mais difíceis de serem
reconhecidos. O oposto também ocorre, pois em
Prostatectomia radical próstatas volumosas (mais de 80 g) a dissecção e a
laparoscópica mobilização lateral são mais difíceis, principalmente
quando a cavidade pélvica é profunda e estreita.
A prostatectomia radical laparoscópica foi primei- Outras condições, como obesidade, prostatite ou
ramente realizada em 1991 por Schuessler e colabo- cirurgia prévia da próstata, tornam a cirurgia mais
radores, cujos resultados obtidos em nove casos difícil, mas não representam contra-indicações para
foram publicados em 1997. Os resultados não foram a cirurgia, exceto quando relacionadas à anestesia.
encorajadores e os autores concluíram que a laparos- Terapia hormonal neoadjuvante pode causar maior
copia não era uma alternativa eficaz se comparada à dificuldade cirúrgica, em grande parte devido ao
prostatectomia aberta. A partir de janeiro de 1998, menor volume da glândula.
Guillonneau e Vallancien iniciaram no Instituto
Montsouris em Paris a prostatectomia radical Cuidado pré-operatório
laparoscópica, apoiados na larga experiência com a
Esses cuidados são gerais e os mesmos utilizados
prostatectomia radical retropúbica e cirurgia
nos outros procedimentos cirúrgicos.
laparoscópica. Atualmente, a cirurgia é praticada em
diversos países. Antibioticoterapia profilática
As principais vantagens do método são a redução Aplicação endovenosa de cefalosporina de terceira
da morbidade no intra e pós-operatório e a melhor geração duas horas antes da operação.
preservação das estruturas vasculares, musculares e
do feixe vasculonervoso conseguida com a ampliação Prevenção antitrombótica
ótica das imagens. É muito importante devido ao risco acumulado
de fatores: neoplasia, cirurgia pélvica e laparoscopia.
Contra-indicações específicas Recomenda-se o uso diário de heparina subcutânea,
Não existem contra-indicações anatômicas que de baixo peso molecular, cuja dose é estabelecida de
possam ser previstas antes da cirurgia. No entanto, acordo com o risco do paciente. Inicia-se três horas
465
antes da operação e mantém-se até 15 dias após a O inconveniente do método é a longa curva de
cirurgia. A deambulação a partir do primeiro dia pós- aprendizado, além disso, os resultados oncológicos,
operatório deve ser estimulada, como também o uso apesar de comparáveis atualmente, necessitam de maior
de meia elástica. tempo de seguimento para serem comprovados.
Não é necessária tricotomia ou preparo intestinal
de rotina.
Prostatectomia radical perineal
Alguns destaques da cirurgia
A prostatectomia radical perineal foi a primeira
A grande vantagem da cirurgia laparoscópica é a cirurgia usada para o tratamento do câncer da
qualidade da imagem do campo cirúrgico. A próstata. Descrita no século XIX por H. Young, foi
identificação e preservação do feixe vasculonervoso a técnica mais utilizada para o tratamento do câncer
é mais fácil que na cirurgia aberta, devido à da próstata até o final da década de 1970.
magnificação da imagem. Os pequenos vasos são Com a introdução das modificações e melhoria
cauterizados com bisturi bipolar com o intuito de técnica, a via retropúbica tornou-se mais popular.
evitar lesão térmica, porém não há confirmação Atualmente a cirurgia perineal é realizada em pou-
que este método seja superior aos demais. cos centros, sendo poucos os urologistas treinados
De modo geral, é preservado o colo vesical, mas nessa cirurgia.
não é necessária a eversão da mucosa vesical. A cirurgia é minimamente invasiva, com as vanta-
A anastomose uretrovesical deve ser cuidadosa, gens de atuar em uma região relativamente avascular,
podendo ser usada sutura contínua ou pontos permitindo boa exposição e facilitando a recons-
separados, ao redor de 12 pontos. O objetivo é não trução da anastomose uretrovesical. Os pacientes mais
haver extravasamento de urina e conseqüente fibrose idosos toleram muito bem esta via de acesso, fato
uretral. O vazamento de urina na anastomose pode, nem sempre verificado na via intraperitoneal, em
também, provocar íleo paralítico transitório. As lesões decorrência de limitações na expansibilidade pul-
da bexiga e ureter são muito raras. monar no pós-operatório.
A via de acesso extraperitoneal começou a ser Em suma, a prostatectomia perineal é associada
utilizada mais recentemente, como também os com pequena perda de sangue, pequena incisão, curto
robôs, facilitando a cirurgia, inclusive melhorando período de internação, pequeno desconforto pós-
os resultados. operatório e rápido retorno às atividades.
O cateter uretral é retirado entre quatro e dez dias, A principal crítica à cirurgia é quanto à linfadenec-
podendo ser removido a partir do segundo dia, desde tomia pélvica. Atualmente, quando indicada, ou seja,
que as condições da anastomose sejam adequadas. a tabela de Partin indicando a possibilidade de metás-
Complicações tase para linfonodos maior que 5%, a linfadenecto-
mia é realizada por via laparoscópica e deve
A taxa de conversão para cirurgia aberta está preceder o acesso perineal.
abaixo de 5%, com tendência para 0%. As compli- Outra desvantagem apontada é que a preservação
cações operatórias ocorrem raramente e diminuem do feixe vasculonervoso é mais difícil por via perineal
com a experiência do cirurgião. As complicações que retropúbica.
neurológicas ou musculares estão relacionadas à Contra-indicação à cirurgia pode ocorrer nos
posição do paciente e ao tempo de cirurgia. As lesões casos de anquilose coxofemoral e cirurgia prostática
da bexiga e ureter são muito raras. As maiores aberta, prévia. Na obesidade mórbida, a posição
complicações são as lesões do reto com incidência de litotomia forçada pode representar contra-indi-
menor que 1%. cação parcial em razão da limitação dos movi-
A continência urinária obtida é em torno de 75% mentos do diafragma.
após seis meses e de 87% após um ano. Estudos recentes mostram que os resultados são
A potência sexual é avaliada por intermédio de comparáveis com a retropúbica em termos de mar-
métodos diversos, alguns por interrogatório direto gens positivas, incisão capsular, continência e potência,
realizado pelo médico, outras vezes por questioná- bem como em relação ao controle do câncer a longo
rios enviados pelo correio, o que não permite ade- prazo. As complicações são as mesmas que as da
quada comparação e avaliação. prostatectomia retropúbica (Figuras de 1 a 4).
466
Prostatectomia radical
retropúbica
A prostatectomia radical retropúbica é a cirurgia
mais utilizada atualmente para o tratamento do câncer
da próstata localizado. A partir de 1982, com as modi-
ficações introduzidas por Walsh, a morbidade e a mor-
talidade da cirurgia diminuíram muito. Os objetivos
do cirurgião na ordem são: cura do câncer, pre-
servação da continência e preservação da potência.
Figura 2: Posicionamento do paciente – litotomia forçada Para conseguir esses objetivos, a indicação da cirurgia,
isto é, a seleção dos pacientes deve ser rigorosa.
467
É preconizado um intervalo de seis semanas entre feixe reduz a menos de 50% a chance de manutenção
a biópsia da próstata e a cirurgia e de 12 semanas da atividade sexual.
após ressecção transuretral da próstata. Este intervalo
permite a resolução do processo inflamatório e hema-
toma, tornando a cirurgia mais anatômica, permitindo Leitura recomendada
a preservação do feixe vasculonervoso e evitando lesão
1. Schuesler W, Schulam P, Clayman R et al. Laparoscopic radical
do reto. A taxa de mortalidade é de 0,2%, a necessidade prostatectomy; initial short-term experience. Urology 50: 854-7, 1997.
de transfusão diminui com a experiência do cirurgião 2. Guillonneau B, Cathelineau X, Barret E, et al. Prostatectomie
e sua equipe e as taxas de continência e potência são radicale Coelioscopique. Premiere evaluation après 28
variáveis nas diferentes séries publicadas, variando de interventions. Presse Medicale 27: 1570-4, 1998.
3. Walsh PC. Anatomic radical retropubic prostatectomy. In:
2% a 10% e de 30% a 60%, respectivamente. A prin- PC Walsh, AB Retik, ED Vaughan Jr. and AJ Wein Edit.
cipal causa de incontinência é a deficiência esfincteriana Campbell’s Urology 7th ed., Philadelphia, W.B. Saunders
intrínseca. A preservação da potência está relacionada Co., vol 2 Chapt 86, p. 2565, 1998.
a três fatores: idade, estádio clínico e patológico e 4. Weldon VE. Technique of modern radical perineal
prostatectomy. Urology, 60: 689-94, 2002.
técnica cirúrgica adequada, com preservação ou não 5. Guillonneau B. Laparoscopic radical prostatectomy: Here to
do feixe vasculonervoso. A preservação unilateral do stay? AUA news, vol. 8 issue 2, 47-8, 2003.
468
Capítulo 138
Análise crítica das manobras para
preservação da continência e da
função erétil
469
470
Tabela 1: Influência da idade e preservação dos feixes neurovasculares (FNV) na função sexual
Tabela 3: Recomendações técnicas para evitar complicações como incontinência urinária e impotência sexual, após prostatectomia radical
471
Continuação Tabela 3
472
473
474
Capítulo 139
O anatomopatológico da
peça cirúrgica
A correta análise histopatológica da peça cirúrgica prognóstico, pacientes com EEC associada a margens
da prostatectomia radical e sua interpretação, além de negativas e escore de Gleason menor que 7 se
critérios prognósticos na determinação de probabilidade comportam como pacientes com doença confinada.
de sobrevida livre de doença, também é determinante Por outro lado, a presença de EEC associada a tumores
para a instituição de tratamentos adjuvantes, como com escore de Gleason maior ou igual a 7 e/ou margem
radioterapia do leito prostático ou terapia hormonal. positiva está associada a pior prognóstico.
Os critérios prognósticos mais importantes na
interpretação do laudo anatomopatológico de uma Invasão de vesícula seminal
prostatectomia radical são: A invasão da vesícula seminal pelo câncer de
próstata é classificada no sistema TNM como pT3b.
Presença de doença Nesses casos a doença não está mais confinada ao
órgão e a possibilidade de sobrevida livre de doença
extraprostática em cinco anos está em torno de 34%. É importante
que sejam estabelecidos junto ao patologista critérios
Extensão extracapsular (EEC) exatos para determinação da invasão de vesícula
seminal. A invasão da chamada porção intraprostática
É a presença de tumor na gordura periprostática, da vesícula seminal pode na realidade ser carac-
nos espaços perineurais do feixe neurovascular ou terizada como invasão do ducto ejaculador e seu im-
formando um nódulo que se estende para fora dos pacto sobre o prognóstico é bem menor, já que ainda
limites prostáticos. É classificado como pT3a no sistema é considerado um tumor pT2. Outra fonte de con-
TNM. É importante que o patologista informe se a trovérsia é a invasão do tecido periprostático ao redor
EEC é focal ou extensa, já que esta diferença tem valor da vesícula seminal. Estes pacientes têm extensão
prognóstico. Para ser considerado pT3, é necessário que extracapsular e devem ser classificados como pT3a.
haja tumor fora da cápsula prostática, quando esta pode
ser reconhecida. A informação de que o tumor “invade
a cápsula prostática sem contudo ultrapassá-la” não tem Margens cirúrgicas
valor do ponto de vista prático e deve ser abandonada.
Outra consideração a ser feita é a diferenciação de A definição de margem positiva é a presença de
margem positiva com invasão EEC. Pode haver EEC tumor na superfície ressecada pelo cirurgião. Assim,
com margem negativa, assim como pode haver achados como “tumor próximo à margem” não de-
margem positiva sem EEC. Do ponto de vista vem ser reportados. No ápice prostático, local mais
475
freqüente de margem cirúrgica positiva, a incidência tumor geralmente se dá através de metástases à dis-
de margem positiva pode estar associada à forma tância e a radioterapia externa do leito prostático não
que o patologista processa a amostra. Quando é feito costuma oferecer resultados.
um shave do ápice prostático, há uma chance maior
de diagnósticos falsos-positivos de margem cirúrgica
comprometida. Uma causa iatrogência de margem Presença de metástase para
positiva é a incisão capsular, quando há transecção linfonodos pélvicos
de tumor intraprostático. A incisão capsular ocorre
mais freqüentemente na face posterolateral, geral- A incidência de comprometimento linfonodal tem
mente resultado de uma tentativa de preservação do diminuído nos últimos anos graças à possibilidade
feixe vasculonervoso. Do ponto de vista prognóstico, de diagnóstico mais precoce de câncer de próstata e,
a presença de margem cirúrgica positiva diminui as atualmente, está em torno de 1,5%. Congelação intra-
chances de sobrevida livre de doença em 5 anos de operatória de linfonodos só tem sentido se o cirur-
82% para 60%. Margens positivas extensas, multifocais gião tem a intenção de interromper a prostatectomia
ou associadas à EEC estão associadas a pior prog- radical em função do achado de linfonodo positivo.
nóstico. Pacientes com margem cirúrgica positiva Quando realizar a linfadenectomia, o cirurgião deve
geralmente estão mais propensos a recidivas locais exigir que toda a gordura que envolve os linfonodos
da doença e podem se beneficiar de radioterapia ex- seja incluída para estudo. Do ponto de vista prog-
terna no leito prostático, ficando a critério do cirurgião nóstico, o acometimento linfondodal é definido
definir se precoce ou tardiamente. como doença avançada.
Outros dados como presença de invasão peri-
neural, invasão vascular, volume tumoral, ploidia de
Grau de diferenciação tumoral DNA e densidade microvascular ainda têm valor
(escore de Gleason) controverso na interpretação dos resultados de uma
prostatectomia radical, e seu relato no laudo fica a
O escore de Gleason é o mais importante fator critério do patologista e do cirurgião.
prognóstico de progressão após prostatectomia
radical. O escore é a soma dos dois graus mais fre-
qüentes à amostra. Escores de 2 a 4 são raros e estão
geralmente associados a tumores de zona de transição
achados incidentalmente após ressecção transuretral da Tabela 1: Classificação e estadiamento TNM para câncer de próstata
próstata (estágios T1a e T1b). Escores de 5 e 6 têm
prognóstico relacionado com o de outras variáveis
como margem cirúrgica e EEC. Tumores com escore
de Gleason 7 têm prognóstico pior que os de escore
5 e 6, principalmente quando o componente dominante
é quatro (tumores 4 + 3 são piores que tumores 3 +
4). Escore de Gleason VII associado a outros achados
adversos como margem comprometida ou EEC tem
prognóstico ruim, com risco de progressão de mais
de 60% em 5 anos. Tumores com escore de Gleason
de 8 a 10 têm prognóstico muito ruim e geralmente
se apresentam em fase avançada, não sendo passíveis
de remoção cirúrgica. A recorrência deste tipo de
476
Leitura recomendada
2. Sakr WA, Grignon DJ. Practice parameters, pathologic staging
1. Epstein JI. Pathologic assessment of the surgical specimen. and handling radical prostatectomy specimens. Urol Clin
Urol Clin N Am. 2001, 28: 567-94. N Am. 1999, 26: 453-63.
477
478
Capítulo 140
Margens comprometidas – conduta
Quando nos referimos a “margens comprome- seminais, das margens ou extensão extracapsular, e não
tidas”, na verdade estamos falando de tumores T3, existe na atualidade um método com acuidade suficiente
que podem ser T3a, quando existe extensão extra- para detectar invasão microscópica.
capsular bi ou unilateral ou T3b, quando existe invasão A conduta clínica nesses casos terá, portanto, que
das vesículas seminais. Ou seja: estamos nos referindo ser tomada após a cirurgia, quando o patologista
ao paciente que foi submetido a uma prostatectomia informar que as margens cirúrgicas estão compro-
radical e cujo espécime cirúrgico revelou tumor que, metidas ou que o tumor se estendeu às vesículas
avaliado pelo sistema TNM, apresentará uma das seminais, e essa conduta irá depender de vários fatores.
classificações acima. Os principais fatores a serem considerados são: o
Este diagnóstico, é claro, só pode ser feito a tipo do tumor e seu grau de diferenciação; o estado
posteriori, ou seja, após o exame da peça cirúrgica. geral do paciente e a sua recuperação pós-operatória;
Isto é ainda mais verdade, porque tanto a ultra- a idade do paciente; o comportamento do PSA sérico
sonografia transretal como a tomografia computa- no pós-operatório; e também o grau da penetração
dorizada pré-operatórias, exames freqüentemente capsular, pois uma margem positiva multifocal implica
empregados na tentativa de estadiamento do câncer em pior prognóstico que uma margem positiva soli-
de próstata, não são capazes de definir, com certeza, a tária, assim como uma extensa margem solitária tem
extensão extracapsular, especialmente se esta for pior prognóstico que uma margem focal solitária. Este
microscópica. tratamento também irá variar de acordo com a
O uso de ressonância magnética nuclear, um preferência do médico e da sua experiência com um
método ainda em estudo, parece ser superior aos dos métodos de tratamento.
outros dois exames, especialmente no que diz respeito Para que uma cirurgia radical tenha sucesso no que
ao diagnóstico de invasão das vesículas seminais. diz respeito à cura de um câncer de próstata, é neces-
Para isto, entretanto, é necessário utilizar bobinas sário que a lesão seja completamente ressecada, e que
endorretais e metodologia especial. Mesmo com esse não existam células neoplásicas fora da próstata.
método, contudo, não é possível predizer, com cer- De acordo com um estudo feito por Scardino,
teza, a extensão extracapsular de uma lesão neoplásica no Memorial Hospital de New York, EUA, quando
da próstata. as margens estão comprometidas, a probabilidade
Na opinião pessoal dos autores, um toque retal bem- de não progressão da bioquímica da doença nos dez
feito, por um examinador experiente, tem quase a anos que sucedem a operação foi apenas 35%.
mesma eficiência dos exames empregados anterior- Existe também um outro estudo multinstitucional
mente para detectar invasão macroscópica das vesículas demonstrando que pacientes com margens compro-
479
metidas tinham três vezes mais probabilidade de Várias séries contemporâneas confirmaram o valor
recorrência bioquímica da doença a cada ano, quando da radioterapia pós-operatória quando as margens estão
comparados aos que tinham margens negativas. comprometidas. Aproximadamente 50% dos pacientes
Este fato é verdadeiro, mesmo quando lidamos se beneficiarão desta forma de tratamento e esta
apenas com pequenas invasões das vesículas seminais. melhora, provavelmente, irá se traduzir por um intervalo
Uma revisão da literatura mundial recente mostra livre de doença maior e possivelmente maior sobrevida.
que em pacientes muito bem-selecionados e estadia- Caso se opte pela complementação terapêutica
dos no pré-operatório, as possibilidades de encon- com a radioterapia, é importante aguardar um pe-
trarmos comprometimento das margens é de apro- ríodo de três a seis meses após a operação para evitar
ximadamente 25% e, quanto maior o grau de Gleason a perpetuação da incontinência urinária e problemas
da neoplasia, maiores serão as probabilidades de haver relacionados à anastomose uretrovesical. A radio-
invasão ou perfuração capsular, a exemplo do que terapia também pode retardar ou inviabilizar a
ocorre quando falamos de metástases para linfonodos recuperação da potência sexual.
regionais. Durante a intervenção, extremo cuidado deve A maioria dos pacientes não morre de recidiva
ser tomado ao dissecar o ápice e a face posterior ou local e, sim, de metástases à distância, cujo controle
dorsal do colo vesical, na região do trígono, que são não é obtido com radioterapia local pós-operatória.
os locais onde mais comumente existe invasão extra- Não existe, na literatura mundial, um consenso sobre
prostática do tumor. É claro que a menor suspeita, o a melhor forma de tratamento dos pacientes com
feixe vasculonervoso homolateral deve ser sacrificado, margens positivas. Tal condição poderá ser tratada por
e a extensão da ressecção aumentada. meio de radioterapia, hormonioterapia ou combinação
As vesículas seminais são o primeiro ponto de de ambos. É importante, para a definição da terapêutica
extensão da neoplasia e, mesmo nos casos de invasão complementar adequada, estratificar os pacientes em
microscópica, mais de 75% dos pacientes apresentarão baixo e alto risco, levando em consideração diversos
recidiva ao longo dos anos. É importante lembrar, fatores, tais como idade, Gleason, PSA pós-operatório
contudo, que 25% deles serão curados apenas com a e extensão da penetração capsular.
cirurgia nos casos de invasão microscópica. Os pacientes de baixo risco, (PSA pré-operatório
Foge ao escopo desta obra a ilustração detalhada < 10, Gleason < 7 e com invasão focal da capsular),
da técnica cirúrgica e os leitores são remetidos às poderão ser apenas acompanhados com o PSA sérico
referências para aprofundarem seus conhecimentos e tratados conforme o comportamento do mesmo.
técnicos sobre o tema. A radioterapia pélvica complementar será utilizada nos
casos em que a invasão seja um pouco mais extensa.
Os pacientes de alto risco (PSA > 10, Gleason 8 a
Conduta terapêutica 10 e extensa invasão extracapsular) deverão ser tratados
de maneira adjuvante por meio hormônio e radio-
Inicialmente, foram feitas tentativas de diminuir a terapia, sem esperar que o PSA se eleve, pois os pacientes
incidência de margens comprometidas utilizando-se serão mantidos em hormonioterapia logo após a
terapia hormonal neoadjuvante. Embora seja real- cirurgia, e até a complementação do tratamento.
mente possível reduzir a incidência de margens
positivas e o tamanho da próstata com esse tratamento
em até 40% dos casos, esta melhora não se traduziu Leitura recomendada
por aumento da sobrevida global, nem de sobrevida
livre da doença. Além disto, a hormonioterapia 1. Davis BJ, Pisansky TM, Leibouich BC. Current Opinion In
Urology Vol. 13, Nº 02, pp. 117-22, March 2003.
neoadjuvante produz fibrose periprostática, torna mais
2. Steele GS, Richie JP. Understanding And Avoiding Positive
difícil a intervenção, aumenta os índices de impotência Margins In Prostate Cancer. Aua Update Series, Lesson 1,
definitiva e provavelmente não está indicada na vol. XX, 2001.
atualidade, exceto em pacientes que apresentem grandes
volumes prostáticos, a critério do cirurgião.
480
Capítulo 141
Comprometimento das
vesículas seminais –
significado clínico e conduta
Carlos Eduardo Corradi Fonseca
O acometimento das vesículas seminais pelo ade- A invasão das vesículas seminais é um importante
nocarcinoma de próstata ocorre, com freqüência fator prognóstico de progressão do câncer de
variável, dependendo da diferenciação tumoral e do próstata, assim como o PSA > 20 ng/mL, mesmo
estadiamento da doença (Tabela 1). na ausência de acometimento de linfonodos.
A grande maioria é diagnosticada pela anatomia
patológica no pós-operatório da prostatectomia radi-
cal, mas pode ser suspeitada ao ultra-som transretal Diagnóstico
ou outro método de imagem no pré-operatório.
A rota mais comum dessa invasão é por penetração O ultra-som transretal tem boa potencialidade para
tumoral na base da próstata, que cresce e se estende detecção da invasão das vesículas seminais pelo câncer
no tecido perisseminal e na glândula. Pode haver tam- de próstata, mas 15% a 40% de aparência normal têm
bém acometimento por extensão nos ductos ejacu- câncer. Quando há envolvimento, as vesículas aparecem
latórios e diretamente da base da próstata, na parede alteradas sonograficamente em até 90% dos casos.
das vesículas seminais e, menos comumente, pode Detecção de invasão microscópica pela biópsia
haver metástases diretamente no órgão. dirigida é muito menos subjetiva que o USTR ou o
Tabela 1: Probabilidade de acometimento das vesículas seminais no câncer de próstata (resumo Tabela de Partin)
481
Conduta
Figura 1: Assimetria da textura das vesículas seminais por CaP
A prostato-vesiculectomia radical deve ser indicada
nos casos de comprometimento das vesículas seminais,
quando houver outras indicações para a cirurgia.
Quando há acometimento das vesículas seminais
(pT3b N0), os pacientes podem estar livres de doença
com a cirurgia radical em 37% a 40% em cinco anos
e 25% a 37% em dez anos. A radioterapia na recidiva
tumoral, quando há acometimento da glândula, é
controversa, mas é o tratamento mais usado e
diminui o risco de recorrência, porém não parece
alterar em relação às metástases distantes ou sobre-
vida câncer-específico.
As taxas de controle em dez e 15 anos dos paci-
entes operados submetidos à radioterapia pós-opera-
Figura 2: Aumento de vesículas com infiltração dos ângulos tórios são de 92% e 82% respectivamente, comparados
vesico-prostato-seminais com 60% e 53% à prostato-vesiculectomia somente.
482
Detecção de metástases em vesículas é particular- 2. Epstein JI, Carmichael M, Walsh PC. Adenocarcinoma of
the prostate invading the seminal vesicle: definition and
mente importante na avaliação de pacientes que têm
relation of tumor volume, grade and margins of ressection
recorrência do câncer após radioterapia como trata- to prognosis. J Urol, 149: 1040, 1993.
mento primário e é considerada candidata para 3. Ohori M, Scardino PT, Lapin SL. The mechanisms and
prostatectomia de salvamento, pois é o principal fator prognotic significance of seminal vesicle involvement by
prostate cancer. Am J Urol Pathol, 17: 1252, 1993.
preditor de recorrência pós-operatória.
4. Jonathan S, Epstein JI. Pathologic of prostatic neoplasia.
Campbell’s 8th ed., vol. 4. Ed. Philadelphia: W.B. Saunders
Co., 2002, 3025.
Leitura recomendada 5. Partin AN, Mangold LA, Lamm DM, Walsh PC, Epstein JI,
Pearson JD. Contemporary update of prostate cancer staging
1. Scardino PT et al. The treatment of organ confined, nomograms (Partin tables) for the millenium. Urology, 58:
locallly advanced and metastatic prostate cancer. AUA 843, 2001.
- 98th Annual Meeting, Chicago: 3, 2003.
483
484
Capítulo 142
Importância da biópsia por
congelação no transoperatório
As principais indicações de se realizar uma biópsia tases para linfonodos. Nesses grupos, os nomogramas
intra-operatória no câncer da próstata diz respeito de extratificação preditiva mostram risco de acometi-
geralmente ao estado dos gânglios linfáticos, do ápice mento ganglionar por volta de 67%. Portanto, em casos
da próstata, da extremidade uretral, da área do feixe de maior risco, a biópsia intra-operatória pode ser útil
vasculonervoso, do colo vesical ou de qualquer área frente ao achado de linfonodos aumentados de volume
periprostática suspeita. O objetivo desejável é a cer- ou mesmo para estudo do produto da linfadenectomia
teza da não-invasão dessas áreas. A biópsia por conge- antes de se continuar a operação. Em duas séries
lação sofre algumas limitações. Tumores de escore alto estudadas, o índice de falsos-negativos da biópsia por
(8, 9 e 10) têm pouca precisão na análise do tecido congelação variou de 4,7% a 5,8%.
congelado, por não definição da morfologia celular
(geralmente são células sem arranjo glandular definido Ápice prostático
ou com a aparência em “anel de sinete”). Também o O ápice prostático é a zona crítica, em termos de
trauma cirúrgico intenso pode limitar a interpretação. margens positivas na prostatectomia radical, devido à
Várias particularidades envolvem as situações anatomia da glândula, localizada profundamente na
expostas: pelve. A técnica operatória inadequada, causando lesão
Gânglios linfáticos iatrogênica da próstata, é a principal causa de margem
positiva nessa região. A mobilização apical insuficiente é
Em pacientes classificados como de baixo risco uma das explicações para essa alta incidência. Além disso,
(estádio T1, baixo grau, pequeno volume e antígeno mais freqüentemente do que qualquer outro lugar na
prostático específico < 10 ng/mL), a incidência de próstata, foi descrita a ausência de uma cápsula definida
acometimento ganglionar é menor que 2% a 5%. O nessa região. Também, devido à tendência de o tumor
valor preditivo negativo na biópsia de congelação é se estender para os espaços perineurais, o curto pedículo
96,5% e o valor preditivo negativo, usando-se nomo- neurovascular nessa região pode tornar comum o
gramas de riscos, é 97,9%. Nessas situações, o estadia- envolvimento extraprostático de tumores pequenos,
mento clínico supera o estadiamento patológico, não localizados na periferia. Em um estudo em que se realizou
havendo, portanto, indicação da biópsia transoperatória biópsia por congelação de tecido periprostático da
dos linfonodos. região apical em 95 pacientes, foi encontrado adenocar-
Já pacientes com antígeno prostático específico cinoma em três deles. Esses casos tiveram a área de
> 10 ng/mL e/ou estádio T2a e escore de Gleason ressecção ampliada e os autores concluíram que a técnica
elevado, associados ao número de fragmentos posi- representa uma maneira efetiva de diminuir a incidência
tivos na biópsia, têm um progressivo risco de metás- de tecido prostático residual.
485
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488
Capítulo 143
Hormonioterapia neoadjuvante
na prostatectomia
Antonio Gugliotta
O câncer prostático é uma neoplasia com incidência Acredita-se que a THN resulta no aumento da
e prevalência aumentada, nestes últimos anos, em apoptose, na redução da proliferação de células neo-
homens acima dos 50 anos de idade. Na atualidade, plásicas e, portanto, na regressão tumoral. Muitos
em virtude da freqüente solicitação do PSA e das trabalhos mostram que margens positivas, invasão
técnicas modernas de diagnóstico, como a biópsia por das vesículas seminais e/ou linfonodos positivos caem
agulha dirigida pelo ultra-som transretal, aumentou de 57% para 29% quando a cirurgia é associada à
dramaticamente o número de casos de câncer prostá- THN. Além disso, sabe-se, também, que a THN pro-
tico detectado em estágios precoces da doença, isto é, voca alterações histológicas que impossibilitam o
câncer órgão-confinado (T1/T2). Nestes casos, a pros- diagnóstico e o Gleason.
tatectomia radical tem sido a melhor opção terapêutica Nestes últimos três anos, a literatura vem mos-
indicada pelos urologistas. trando falta de uniformidade dos dados divulgados.
Associada ao desenvolvimento da técnica cirúr- A incidência da invasão de vesículas seminais e de
gica para preservação dos feixes vasculonervosos gânglios regionais não tem sofrido alterações, inici-
e, ainda, à redução da perda sangüínea, proporcio- ando questões do significado biológico em diminuir
nando menor morbidade, a prostatectomia radical tamanho do tumor e de margens positivas. Um outro
vem recebendo maior aceitação pelos pacientes. aspecto importante é a questão do PSA no pós-
Entretanto a literatura tem mostrado que 20% a operatório dos pacientes submetidos à prostatec-
30% dos casos com doença localizada antes da ci- tomia radical com THN ou somente cirurgia. Traba-
rurgia apresentam, no exame anatomopatológico lhos não têm mostrado diferença estatisticamente
da peça, margens positivas indicando extensão do significativa entre os dois grupos, isto é, diversos
tumor para fora da glândula. A experiência tem estudos recentes não demonstram, necessariamente,
mostrado, também, que muitos desses pacientes, a redução da progressão do PSA, o qual tende a ser
após certo período de tempo, apresentam alto índice semelhante nos dois grupos de pacientes (THN +
de recorrência quando comparados com aqueles cirurgia ou só cirurgia).
sem margens positivas. Outra consideração desfavorável a respeito da
Para tentar minimizar esse problema e melhorar THN é a associação com a morbidade do trata-
o valor da cirurgia radical, muitos autores iniciaram mento, custo associado e impacto na cirurgia. Efeitos
a utilização da terapia hormonal neoadjuvante (THN) adversos significativos realmente ocorrem com a
ou pré-operatória, já que é sabido o fato de o câncer terapia hormonal e muitos desses efeitos colaterais
prostático ser sensível à andrógeno-supressão. diminuem lentamente mesmo após o seu término.
489
490
Capítulo 144
Elevação do PSA pós-prostatectomia
491
492
493
494
Capítulo 145
Radioterapia externa –
eficácia versus dose
versus efeitos colaterais
Wladimir Nadalin
Rodrigo de Morais Hanriot
Inúmeros trabalhos vêm demonstrando que o tados em cinco, dez e 15 anos comparáveis aos
tumor de próstata é neoplasia responsiva à irra- índices de cirurgia, quando os pacientes são pa-
diação ionizante, com melhores índices de controle reados por estádio e graduação tumoral, confor-
tumoral proporcionalmente a doses mais elevadas. me comparação de nomogramas por Kattan (Fi-
Existem evidências de que a progressão tumoral guras 1 e 2).
local serve de origem para o desenvolvimento subse- Lamentavelmente, altas doses de irradiação com
qüente de metástases à distância e, em última análise, técnica de radioterapia convencional levam a taxas
comprometimento da sobrevida global. A radio- de complicações inaceitáveis. As limitações de dose
terapia com doses mais elevadas promove resul- habitualmente verificadas em radioterapia conven-
495
4a
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Capítulo 146
Radioterapia externa conformada 3-D
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Capítulo 147
Braquiterapia – eficiência versus
efeitos colaterais
503
Avaliação do pré-tratamento
padrão
Consta dos seguintes procedimentos:
Exames dígito-retais e testes de PSA;
Técnica
Antes de se realizar a braquiterapia, deve-se pro-
ceder uma ecografia transretal muito cuidadosa, com
a qual se calcula o volume da próstata e se configura
um mapa detalhado da anatomia da glândula que, é
analisado por um programa de ordenação que
determina com exatidão a localização das sementes
(diferente para cada paciente, dependendo do tama-
nho e da forma de sua próstata).
Sharkey e colegas publicaram estudo em mais de
400 pacientes, em que descrevem avanços da técnica Figura 2: Carregador – aplicador de sementes
de braquiterapia com Pd-103 usada para o trata-
mento de pacientes nos estágios T1 e T2 do adeno-
carcinoma da próstata, demonstrando que o refina-
mento da técnica resultou em melhor recuperação
dos pacientes. Essa metodologia difere da técnica
padrão nos seguintes termos:
Colocação de todas as agulhas de uma só vez para
504
Conclusão
Uma desvantagem muito considerada na literatura é
não se obter informação histológica que corrobore a
situação exata da enfermidade. Esta informação se
consegue melhor com a prostatectomia radical. A linfa-
Figura 8: Resultado final do períneo após o implante das sementes
denectomia pélvica por videolaparoscopia (VLP) alguns
dias antes da braquiterapia seria uma opção.
Haakon Radge e colegas (1999) publicaram resul-
tados dos seguimentos de 152 pacientes durante dez
anos. O índice de sobrevida total foi de 66%, 64% se-
guiam clínica analiticamente livres da doença e somente Acreditamos que seja importante para os resultados
2% haviam falecido pelo carcinoma da próstata. a longo prazo do câncer da próstata que o urologista
Considerando estes resultados, podemos acreditar tenha controle sobre todos os aspectos do tratamento
que a braquiterapia prostática é um tratamento tão desta doença. Se a terapia passar pelo teste do tempo,
válido quanto a prostatectomia radical nos pacientes os urologistas estarão munidos com uma arma de
com doença localizada na próstata. tratamento menos mórbida e bastante eficaz.
505
506
Capítulo 148
Câncer de próstata – doença
localmente avançada
Ronaldo Damião
Fabrício Borges Carrerette
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510
Capítulo 149
Doença disseminada –
quando iniciar hormonioterapia?
Pacientes com câncer da próstata avançado são Somente nos últimos anos é que poucos estudos
definidos como portadores de grandes tumores pél- randomizados foram realizados para a investigação
vicos (estádio C ou T3-T4 N0 M0), ou com de qual a melhor época para a introdução do trata-
linfonodos comprometidos e/ou comprometimento mento hormonal no câncer da próstata avançado e,
sistêmico (estádio D ou T3-T4 N+ M+). Uma vez mesmo assim, muitos destes estudos têm desenho
que a base terapêutica para estes pacientes é o blo- inadequado e um poder de análise estatística criticável.
queio androgênico, é possível que se deva incluir neste O problema com a realização destes estudos é que a
grupo de pacientes com doença avançada, aqueles necessidade de seguimento tardio destes pacientes
com câncer localizado que apresentem recidiva bio- implica, em muitos casos, que os resultados clínicos
química da doença após tratamento definitivo, tam- só se tornem evidentes cerca de dez a 15 anos após
bém aqueles com tumores de alto grau (Gleason 9 e o início do estudo, especialmente se são incluídos
10) e, eventualmente, até aqueles cujo diagnóstico nestas análises pacientes com elevação do PSA após
precoce molecular sugira a presença de células à dis- tratamento local curativo. Além disto, no mundo
tância. Embora a terapia hormonal possa ser utilizada todo, é incomum que os urologistas façam o diag-
em todas as fases do câncer da próstata, a época nóstico de câncer da próstata em seus pacientes e
ideal do seu início na presença de doença avançada é depois permitam que eles sejam selecionados para
motivo de controvérsia. serem “randomizados para não serem tratados à
Os estudos originais do Veterans Administation época do diagnóstico”. Isto torna o recrutamento
Cooperative Urological Research Group (VACURG) na de pacientes a estes estudos extremamente difícil.
década de 1960, além de identificarem que o uso de Segundo o Medical Research Council (MRC), na Ingla-
estrógenos em altas doses, para pacientes com câncer terra, em um estudo com 928 pacientes com doença
da próstata metastático, promovia maior mortalidade avançada, randomizados para o tratamento hormo-
pelo risco do desenvolvimento de fenômenos vasculares nal precoce (n = 469) ou instituído somente após
tromboembólicos, também introduziram o conceito sinais de progressão da doença (n = 469), não foram
de que o uso precoce da terapêutica antiandrogênica demonstradas diferenças em termos de sobrevida
não aumentava a sobrevida deste grupo de pacientes; para pacientes com doença metastática disseminada.
portanto não estava recomendada, devendo ser adiada Entretanto, o grupo tratado precocemente teve
até os pacientes tornarem-se sintomáticos. Entretanto menos complicações locais relacionadas ao cresci-
uma reanálise destes mesmos dados sugeriu que pacientes mento do tumor. Estudos com pacientes portadores
jovens com doença metastática apresentavam maior de câncer da próstata e metástases para linfonodos
sobrevida quando tratados precocemente. pélvicos, mas sem evidência de doença metastática
511
por via hematogênica, também demonstram não exis- 1) o período de doença assintomática pode ser
tir vantagem em relação à sobrevida global dos paci- longo, muitas vezes de vários anos;
entes tratados precocemente. Porém existiu um maior 2) há o potencial da seleção de clones de células
risco de progressão da doença, tanto local quanto à andrógeno-independentes;
distância, naqueles tratados tardiamente. 3) a presença de efeitos colaterais do tratamento,
Pode-se recomendar o tratamento hormonal tar- como disfunção sexual, hepatopatia, gineco-
dio para pacientes idosos, assintomáticos e com tu- mastia e osteoporose, pode prejudicar a quali-
mores bem diferenciados e oferecer a introdução dade de vida dos pacientes;
precoce da terapêutica antiandrogênica para pacientes 4) não existe tratamento realmente eficaz nas falhas.
jovens, com doença disseminada mínima, sintomá- Desta forma, revisando-se as informações exis-
ticos ou com tumores indiferenciados. Obviamente, tentes dos poucos estudos randomizados, chega-se
deve-se sempre levar em consideração os custos, à conclusão de que existe alguma vantagem quanto à
efeitos colaterais e a qualidade de vida desejada em progressão da doença e sobrevida específica para os
longo prazo com estas terapias. Recentemente, três pacientes tratados precocemente, em especial aqueles
estudos randomizados com placebo, em mais de 8 com doença residual mínima, caracterizados por
mil pacientes, demonstraram que o uso de mono- recidiva bioquímica e/ou com linfonodos compro-
terapia precoce com bicalutamida 150 mg promoveu metidos após tratamento radical com intenção cura-
uma redução de 42% na progressão da doença e tiva. Os efeitos colaterais adversos promovidos pelo
sobrevida específica daqueles com M1, com um uso da terapia antiandrogênica a longo prazo são
baixo índice de efeitos colaterais. importantes, mas presumivelmente podem ser redu-
Se realmente importa a época da introdução da zidos pelo uso de monoterapia com bicalutamida
terapia hormonal também é motivo de controvérsia. em doses altas. Entretanto resultados em longo prazo
Algumas autoridades referem que qualquer doença ainda se fazem necessários.
diagnosticada pelos métodos habituais já é, por defi-
nição, muito avançada se considerarmos o tempo
de duplicação celular desde o seu diagnóstico até a Leitura recomendada
morte, pois, na maioria dos casos, o tumor já cursou
1. Anderson JB. Early versus deferred hormone therapy. Eur
pelo menos três quartos da sua história natural. Urol. 1999; 36 Suppl 2:9-13.
As vantagens da introdução precoce do trata- 2. No authors listed. Immediate versus deferred treatment for advanced
mento hormonal são: prostatic cancer: initial results of the Medical Research Council
1) normalmente o paciente tem um melhor estado Trial. The Medical Research Council Prostate Cancer Working
Party Investigators Group. Br J Urol. 1997; 79: 235-46.
geral; 3. JordanWP, Blackard C, Byar DP. Reconsideration of
2) existe um menor volume tumoral e, portanto, orchiectomy in the treatment of advanced prostatic carcinoma.
menor instabilidade genética, que é uma das South Med J. 1977; 70: 1411-3.
causas de falência terapêutica; 4. Newling DWW. The palliative therapy of advanced prostate
cancer with particular referece to the results of recent
3) a identificação mais precoce das falhas permite European clinical trials. Brit J Urol., 1997; 79: 72-81.
a instituição de outras modalidades de trata- 5. See WA, Wirth MP, Mcleod DG, Iversen P, Klimberg I,
mento mais cedo; Gleason D, Chodak G, Montie J, Tyrrell C, Wallace DM,
4) presumivelmente, promove-se uma maior Delaere KP, Vaage S, Tammela TL, Lukkarinen O, Persson
BE, Carroll K, Kolvenbag GJ. Casodex Early Prostate Cancer
sobrevida. Trialist Group. Bicalutamide as immediate therapy either alone
Em contrapartida, o uso precoce da terapêutica or as adjuvant to standard care of patients with localized or
hormonal pode não ser vantajoso porque: locally advanced prostate cancer: first analysis of the early
prostate cancer program. J Urol. 2002; 168: 429-35.
512
Capítulo 150
Doença disseminada – bloqueio
androgênico completo
Ubirajara Ferreira
Rafael S. Mamprin
Há muitos anos tem sido reconhecido que os Analisou-se o tempo de progressão da doença e
andrógenos são a chave no controle do crescimento a sobrevida global, comparando os efeitos da mono-
e função da próstata. terapia com o bloqueio total e paralelamente a toxi-
O bloqueio hormonal deflagra uma série de eventos cidade e efeitos colaterais dos dois métodos.
moleculares e bioquímicos que levam ao dano Vinte e quatro dos 27 estudos não mostraram ga-
irreversível do genoma e à morte celular programada. nho de sobrevida com o bloqueio androgênico com-
Desde meados da década de 1980, o bloqueio pleto em comparação à monoterapia (análogo
androgênico completo com castração (cirúrgica ou LHRH ou orquiectomia) e apenas três deles eviden-
medicamentosa) mais antiandrogênico periférico tem ciaram pequeno aumento da sobrevida global com
sido postulado como tratamento de primeira linha bloqueio completo.
para o controle do câncer avançado da próstata. Crawford e colegas verificaram ganho de sobre-
Labrie e colegas relataram que o bloqueio, conco- vida de 35 meses com bloqueio total em comparação
mitante, dos andrógenos de origem adrenal (que com 29 meses da monoterapia. Já Bono e colegas
correspondem a 5% - 10% da produção dos hor- obtiveram 30 meses de sobrevida para ambas as
mônios masculinos) poderia favorecer a inibição do formas de tratamento.
crescimento tumoral e possivelmente acarretaria Tyrell e colegas, usando goserelina mais flutamida,
melhora dos sintomas e da sobrevida em compa- conseguiram 25 meses de sobrevida e 31 meses
ração com a monoterapia. usando apenas goserelina, mostrando o insucesso
A partir disso, muitos ensaios clínicos têm tentado desta combinação.
mostrar que o bloqueio androgênico completo traz Eisenberger e colegas seguiram por aproxima-
realmente vantagens de sobrevida e/ou melhor damente 50 meses os pacientes com 70% de mortes
qualidade de vida. neste período, e verificaram média de sobrevida de
Vinte e sete estudos com desenho randomizado e 33 e 30 meses com o bloqueio completo e orquiec-
duplo-cego, perfazendo 7.987 pacientes, foram tomia respectivamente.
analisados comparando: Zalcberg e colegas obtiveram paralelamente 23
a) Análogo LHRH somente com análogo LHRH meses de sobrevida com bloqueio completo e 31
mais agente antiandrogênico; meses com a monoterapia. Jorgensen e colegas
b)Orquiectomia apenas com orquiectomia mais obtiveram os mesmos 33 meses de sobrevida para
agente antiandrogênico; ambos os tipos de tratamento.
c) Orquiectomia apenas com análogo LHRH mais A EORTC (European Organization for Research and
agente antiandrogênico. Treatment of Cancer) conduziu um trabalho compa-
513
rando o uso de goserelina mais flutamida com queio androgênico simples como forma de tratamento
orquiectomia bilateral e obteve sete meses apenas de de primeira linha do câncer avançado de próstata.
diferença no ganho de sobrevida em favor do blo-
queio completo.
Resultados contraditórios têm sido observados Leitura recomendada
quanto ao agente antiandrogênico utilizado. O uso
1. Labrie F, Dupont A, Belanger A, et al. Combination therapy
da flutamida resultou em vantagem na sobrevida with flutamide and castration (LHRH agonists or
quando associada a um análogo LHRH, comparando orchiectomy) in advanced prostate cancer: a marked
com a nilutamida. Esta se mostrou mais efetiva em improvement in response and survival. J Steroid Biochem,
combinação com castração cirúrgica. 23: 833, 1985.
2. Laufer M, Denmeade R, Sinibaldi VJ, Carducci MA,
Com relação aos efeitos colaterais e qualidade de Eisenberger MA. Complete androgen blockade for prostate
vida, foi verificado que com o uso prolongado do blo- cancer: What went wrong? J Urol 3-9 vol. 164 July 2000.
queio androgênico completo, houve maior incidência 3. Crawford ED, Eisenberger MA, Mc Leod D. et al. A
de perda da libido e potência, diminuição da massa controlled trial of leuprolide with and without flutamide in
prostatic carcinoma. N Engl J Med, 321: 419, 1989.
corporal, fadiga, ginecomastia, fogachos, alteração da 4. Bono AV, DiSilverio F, Robustelli della Cuna G et al.
função hepática, náuseas, diarréia, anemia e osteoporose. Complete androgen blockade versus Chemical castration in
Quase duas décadas após a introdução do bloqueio advanced prostatic cancer: Analysis of an Italian multicentre
completo, as conclusões se mostraram desapontadoras study. Urol Int suppl. 60: 18, 1998.
5. Tyrell CJ, Altmeir JE, Klippel F et al. A multicentre randomized
com esta forma de tratamento do câncer avançado da trial comparing the luteinizing hormone-relasing hormone
próstata. As evidências atuais demonstram que o bloqueio analogue goserelin acetate alone and with flutamide in the
androgênico completo não traz vantagens sobre o blo- treatment of advanced prostate cancer. J Urol, 146: 1321, 1991.
514
Capítulo 151
Bloqueio androgênico intermitente
Walter J. Koff
Desde a introdução do uso de estrógenos no trata- subcutânea; a massa muscular diminui de forma signifi-
mento do adenocarcinoma avançado de próstata na cativa, forma-se osteoporose generalizada, aparecendo
década de 1940, que valeu para a urologia, em 1946, astenia muscular, falta de concentração e memória e
o seu primeiro e único prêmio Nobel de Medicina, diminuição significativa do impulso masculino de
ganho por Huggins e Hodges, tem sido notado que o competição, com prejuízo do desempenho físico, inte-
bloqueio androgênico, realizado por qualquer meio, lectual e de trabalho.
seja orquiectomia bilateral, estrogenoterapia, análogos Por estas razões, há sugestões de que o uso de blo-
LH-RH ou antiandrógenos, é espetacularmente bem- queio intermitente poderia, de algum modo, prolongar
sucedido por algum tempo, às vezes longo, outras vezes a vida útil da supressão hormonal nas células tumorais,
curto, de menos de um a dois anos, após o qual o ampliando o tempo de evolução do tumor, e, por
tumor volta a crescer e suas células se tornam hor- outro lado, diminui-se os efeitos deletérios da ablação
mônio-resistentes, constituindo o que é denominado androgênica no organismo, propiciando a volta
escape hormonal. periódica da libido e permitindo vida sexual satisfatória
Vários mecanismos vêm sendo propostos e testa- nos intervalos da administração da medicação.
dos como responsáveis por esta independência das Vários estudos in vitro com células de adenocar-
células tumorais aos andrógenos. A causa mais estu- cinoma de próstata, ou observações em animais e
dada deste fenômeno é a proliferação e o desenvol- humanos, têm sugerido que, de fato, alguns dos efei-
vimento de células já andrógeno-independentes tos secundários citados acima são atenuados pelo
previamente existentes dentro do tumor, mas em bloqueio intermitente.
pequeno número. Outro mecanismo molecular já Muitos estudos clínicos estão sendo conduzidos
provado é a adaptação das células tumorais para vias nesta área, mas com baixo grau de evidência, pois
alternativas de sinalização dos receptores androgê- faltam estudos randomizados, controlados, e pros-
nicos. Mais recentemente tem havido evidência de pectivos com grande número de pacientes ou estudos
que as células tumorais se adaptam com auto-regu- multicêntricos. Muito menos existem estudos meta-
lação das proteínas andrógeno-reprimidas. nalíticos com esta conduta.
Por outro lado, a deprivação prolongada de andró- Na ausência destes, esta opção terapêutica pode
genos ocasiona efeitos indesejáveis no homem. O pri- ser uma opção razoável, desde que os pacientes
meiro efeito colateral importante é a perda completa sejam totalmente infor mados do seu caráter
da libido com efeito deletério também na ereção. Com investigacional e dos benefícios e riscos existentes.
o decorrer do tempo, ocorrem alterações de pele, que É lógico que a alternativa de retorno periódico da
se torna fina e frágil, com deposição de gordura atividade sexual, em homens previamente sexual-
515
mente ativos, é um fator muito importante na aos níveis obtidos pelos primeiros ciclos. Se isso repre-
tomada de decisão dos doentes. senta apenas a evolução natural da doença, que tende
Recomenda-se este tipo de terapêutica em a ser andrógeno-independente, ou então uma conse-
homens sexualmente ativos, com doença metastática qüência indesejável do tratamento intermitente, não
ou localmente avançada ou falha bioquímica após está claro no presente momento.
cirurgia ou radioterapia, que tenham respondido Este método terapêutico alternativo de bloqueio
muito bem ao bloqueio inicial, especialmente quando hormonal é uma estratégia ainda em investigação,
o nadir do PSA tenha sido < 0,04 ng/mL. mas possivelmente segura, que poupa os pacientes
O bloqueio pode ser mantido, inicialmente, até dos efeitos deletérios da deprivação hormonal, pelo
seis meses para se observar o nadir e, depois, suspenso menos em parte, e talvez prolonge a atuação terapêu-
até que o PSA atinja 50% do seu valor inicial pré- tica deste tratamento, que é considerado o mais efici-
tratamento ou taxas entre 4 e 5 ng/mL. ente existente para doença metastática ou refratária a
Temos notado que, quanto mais idoso o paciente, tratamento local curativo.
mais lentamente o PSA cresce após a interrupção do Um seguimento atento dos pacientes é recomen-
bloqueio, e a monitorização dos níveis de testosterona dado, tanto mais que este método ainda não de-
plasmática demonstra lenta recuperação dos níveis monstrou o seu valor específico em estudos de alto
deste hormônio através dos meses. Doentes com mais nível de evidência, como seria aconselhável em
de 70 anos de idade geralmente têm um tempo inter- qualquer terapêutica proposta.
bloqueio de seis meses a um ano em contrapartida
aos mais jovens, que geralmente não conseguem ficar
sem o bloqueio por mais de três a quatro meses. Após Leitura recomendada
a interrupção do bloqueio, os níveis de PSA plasmá-
ticos devem ser solicitados a cada um a dois meses e, 1. Reese DM, Small EJ, Alternative hormone approaches:
sempre que necessário, acompanhado de dosagem de intermittent, peripheral, triple. In: Kantoff PW, Carroll PR,
D´Amico AVD, Prostata Cancer, Principles and
testosterona plasmática. Practice. Philadelphia, Lippinncott, Willians & Wilkins,
Pacientes que apresentam um nadir de PSA acima 2002, pp. 541-48.
de 1 ng/mL são possivelmente maus candidatos a 2. Crook JM, Szumacher E, Malçone S et al. Intermittent
este tipo de tratamento, assim como aqueles com androgen supression in the management of prostate cancer.
doença muito avançada e sintomática. Urology 1999, 53: 530-4.
3. Kurek R, Rennemberg H, Lübben G, et al. Intermitent androgen
Com o decorrer do tempo, nota-se que em cada blockade in PSA relapse after radical prostatectomy an incidental
ciclo de tratamento os níveis de PSA já não caem prostate cancer. Eur Urol 1999, 35 (suppl): 27-31.
516
Capítulo 152
Escape hormonal – conduta
517
nos pacientes com escape hormonal oferecem pe- agentes quimioterápicos permitem maior segurança e
quenos benefícios, porém sem acrescentar relevantes eficiência no emprego da quimioterapia antineoplásica.
riscos aos pacientes. Portanto, acredita-se que a terapia Os melhores resultados baseados no PSA, publi-
hormonal não deva ser suspensa. cados por Picus, 1999, e Beer, 2000, com apenas um
agente citotóxico isolado (docetaxel), foram na ordem
de 45% a 47%. Vários estudos sugerem atividade da
Síndrome da retirada dos mitoxantrona associada aos corticosteróides. O efeito
antiandrógenos sinérgico entre o estramustine associado à vimblastina,
paclitaxel ou docetaxel apresenta efeitos mensuráveis
Em 1993, foi descrita a melhora clínica e dos níveis sobre o tumor de próstata hormônio-resistente em
de PSA com a retirada dos antiandrógenos na doença 45% a 74% dos pacientes.
progressiva em aproximadamente 20% dos pacientes. Outras associações como estramustine e etoposide
Esta estratégia pode ser utilizada nos doentes porta- via oral, ciclofosfamida e etoposide ambos via oral
dores de câncer de próstata hormônio-refratário em têm sido animadoras. Cisplatina e carboplatina apre-
que a quimioterapia não esteja justificada. sentam atividade contra o tumor prostático e a sinergia
com o etoposide ou paclitaxel encontra-se em estudos.
A combinação estramustine, etoposide e cisplastina
Terapia hormonal secundária apresenta atividade nos tumores indiferenciados e
no escape hormonal hormônio-refratários. Regimes com docetaxel-calcitriol
encontram-se em fase de testes.
Altas doses de bicalutamida (150 mg) apresentam
O suramin apresenta ação contra tumores hormô-
melhores efeitos sobre o PSA quando comparadas
nio-independentes inibindo fatores de crescimento,
à dose habitual de 50 mg. O acetato de megestrol
tem pequena atividade antitumoral nesses pacientes, entretanto seu mecanismo de ação não está comple-
entretanto, 20 mg duas vezes ao dia controla em 70% tamente elucidado.
os fogachos que habitualmente acompanham os Os tumores pouco diferenciados, anaplásicos e
indivíduos com ablação hormonal. Já o seu emprego neuroendócrinos, os quais geralmente apresentam-se
em altas doses (160-320 mg/dia) melhora o apetite com PSA baixo, crescimento rápido e alta incidência
e outros sintomas que acompanham os estádios de comprometimento visceral são acompanhados de
avançados do câncer de próstata. depósitos metastáticos ósseo-líticos. Pacientes porta-
Há evidências da ação citotóxica direta do dietilstil- dores destes tumores não respondem adequadamente
bestrol em altas doses sobre as células tumorais, po- à privação hormonal e devem ser selecionados preco-
dendo resultar em melhora clínica e da dor óssea em cemente para quimioterapia citotóxica.
alguns pacientes. Aproximadamente 10% dos andro-
gênios são produzidos nas adrenais e o bloqueio
da esteroidogênese com cetoconazol ou corticos- Tratamento suportivo do
teróides pode traduzir-se em resposta clínica. A res- câncer de próstata
sposta da hormonioterapia secundária não apresenta
resultados alentadores porque as células hormônio- A maioria dos pacientes com doença avançada e
sensíveis já se encontram suprimidas pelo bloqueio hormônio-refratária apresenta dores ósseas. Na dor
hormonal primário. óssea localizada, a radioterapia externa em baixas doses
tem se mostrado eficiente, entretanto, na doença
metastática disseminada, o emprego de radiofármacos
Quimioterapia no tumor (estrôncio-89 ou samarium-153) pode controlar a dor
hormônio-refratário parcial ou completamente em 70% dos pacientes.
Todavia, essas drogas são mielossupressoras, dificul-
A quimioterapia nos tumores hormônio-resistentes tando uma posterior quimioterapia. Há evidências de
tem retomado um papel importante baseando-se na muitos pacientes com dor óssea que se beneficiam do
queda do PSA e na qualidade de vida como parâ- emprego de bifosfonatos (análogos do pirofosfato
metro dos resultados. Novas combinações de drogas que bloqueiam a reabsorção e a mineralização óssea).
citotóxicas sinérgicas, antieméticos modernos, fatores Na fase terminal da doença, freqüentemente são
de crescimento hematológicos e o advento de novos utilizadas associação de analgésicos, antiinflamatórios
518
não-hormonais, glicocorticóides, opiácios e antidepres- terminais oferece um melhor atendimento aos doentes
sivos tricíclicos na tentativa heróica do controle da dor. portadores de câncer de próstata com independência
Outros sintomas como constipação, anorexia, náuseas, hormonal.
fadiga e depressão precisam ser clinicamente contor- Para o futuro, novos estudos envolvendo a terapia
nados. A abordagem multidisciplinar dos urologistas gênica, antagonistas da endotelina, oligonucleotídeos
com oncologistas clínicos, radioterapeutas, enfermeiras sintéticos, retinóides, derivados da vitamina D e
e psicólogos treinados em pacientes oncológicos butiróides são promissores.
519
520
Capítulo 153
Há espaço para quimioterapia
no câncer de próstata?
Apenas 30% dos pacientes com diagnóstico de (antiandrógeno). Isto favoreceria a progressão da
câncer da próstata (CaP) irão morrer em decorrência doença e somente a retirada do antiandrógeno po-
da doença. deria interromper este processo.
Os tratamentos quimioterápicos podem ser efe- Aspecto importante do tratamento do CaP hor-
tuados em diferentes fases do tratamento, com dife- mônio refratário (CaPHR) é a aceitação de que existem
rentes finalidades terapêuticas. Não existe tratamento vários – diferentes – fenótipos. O fenótipo sensível à
curativo para o CaP na fase de metástases à distância. hormonioterapia pode ser encontrado. Tratamentos
A terapia primária considerada padrão para estes como retirada de antiandrógenos, cetoconazol, dieti-
pacientes é a deprivação andrógena. lestibestrol (DES), PC-SPES, dexametasona, amino-
No final de uma deprivação andrógena contínua, glutetamida e altas doses de bicalutamida têm sido
encontra-se, na maioria dos casos, uma insensibilidade reportados em algumas ocasiões para pacientes com
hormonal das células cancerosas. O carcinoma resi- progressão, mesmo sob terapia antiandrógena. A
dual não é mais dependente de andrógenos e a depri- bicalutamida, na dose de 150 mg/dia, proporciona
vação andrógena não apresenta efeitos terapêuticos uma redução de 50% do PSA de 20% dos pacientes
efetivos. Não está claro se este clone de células insen- com CaPHR, além de estar associada a uma sobrevida
sitivas ao efeito hormonal existe desde o início da média de 15 meses (estudo SWOG).
doença (e durante o tratamento supera o crescimento Há cerca de 40 anos são conhecidas as tentativas de
do clone de células sensitivas) ou se ele se desenvolve utilização de estrogênios em pacientes com doença
posteriormente devido a um mecanismo de seleção progressiva sob deprivação andrógena. Uma redução
determinado pela terapia antiandrógena. das dores por um período de dois a quatro meses
Também permanece indefinido se uma terapia tem sido relatada por cerca de 40% dos pacientes. As
hormonal paliativa deve ser continuada caso o pro- possibilidades de administração são dietilestibestrol
gresso da doença for diagnosticado. Existem relatos (DES) oral, com meia-vida curta e fosfestrol (meta-
indicando que a interrupção desta terapia pode, em bolizado à DES e bifosfatos), com meia-vida longa.
torno de 20% dos pacientes, determinar um decrés- DES foi utilizado com este fim (na Alemanha, conhe-
cimo (passageiro) do valor do PSA (síndrome da cido como terapia com fosfestrol 1200 mg EV/24
retirada do bloqueio antiandrógeno). Explicação pos- horas, durante 10 dias) (Tabela 1). Altas doses promo-
sível é a de que a administração contínua de antian- vem feedback negativo, ação citotóxica direta (inibe
drógeno que se ligue ao receptor androgênico possa topoisomerases) e alívio da dor (bisfosfonados – like).
induzir uma modificação deste, o qual pode, por Profilaxia para trombose venosa profunda deve ser
sua vez, até mesmo ser estimulado por esta substância realizada na fase de indução. Se possível, durante a
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continuidade deste tratamento, deve-se administrar B) cT3-4, PSA > 20 ng/mL ou Gleason escore 8 a
antiagregantes plaquetários. 10. QT: paclitaxel, carboplatina, estramustina e
Os bisfosfonados são altamente efetivos no con- bloqueio hormonal por até quatro ciclos;
trole da dor e destruição óssea. Suas possibilidades C)cT2b, cT3-4, PSA > 15ng/mL, Gleason escore
de uso incluem os seguintes medicamentos: 8 a 10. QT: docetaxel, estramustina.
A)Pamidronato dissódico – 90 mg EV mensais; QT efetiva seria necessária para melhorar os resul-
B) Clodronato dissódico – 300 mg EV, administrar tados do tratamento da doença T3, permitindo a
em duas horas, por dois a cinco dias ou 400 eliminação de micrometástases. Com a identificação
mg VO três a quatro vezes ao dia; de novos agentes, cresce o interesse do seu emprego
C)Ácido zoledrônico – 4 mg em 100 mL de soro para doença de baixo estádio. A QT, nesta fase de
fisiológico EV (em 15 minutos) cada três a quatro doença, permanece experimental.
semanas (fácil administração). Estudo fase III
com esta medicação demonstrou maior inter- QT primária do câncer da próstata
valo (significativo) de tempo até ocorrência de metastático
eventos ósseos. Muitos estudos foram realizados nos quais, de
O tratamento com estrógenos deveria ser tentado maneira prospectiva e randomizada, a terapia antian-
em pacientes com tratamento antiandrógeno conven- drógena, em comparação com uma terapia combi-
cional já efetuado e com doença progressiva (escape nada de antiandrógenos e QT (por exemplo: estra-
hormonal) e sintomática. mustinfosfato, ciclofosfamida), foi analisada como
tratamento primário do CaP metastático. Nenhum
Quimioterapia (QT) destes estudos demonstrou melhores taxas de sobre-
vida para o grupo de pacientes tratados com terapia
combinada, ou seja, com QT adicional. Este trata-
QT neoadjuvante para doença mento não apresenta, atualmente, indicação para
localizada de alto risco pacientes com CaP metastático virgem de tratamento.
Há dois estudos sobre o uso da QT antes da pros- QT para o CAP metastático refratário
tatectomia radical, com os seguintes critérios de ao tratamento hormonal
inclusão e drogas correspondentes:
A) Pacientes com cT3; T1-2 com Gleason escore A grande maioria dos pacientes submetida à terapia
de 8 a 10; T2b-c, Gleason > 7, PSA > 10 ng/ antiandrógena irá apresentar, na sua evolução, pro-
mL; dez anos de expectativa de vida e com gressão. Estes pacientes esperam receber um trata-
menos de dois meses de bloqueio andrógeno mento alternativo quando do surgimento de dores
combinado. QT: três meses de bloqueio hor- ósseas ou mesmo já quando do aumento dos valores
monal combinado, dois ciclos de seis semanas do PSA. Para o caso de uma mudança da terapia
de cetoconazol + doxorrubicina/vimblastina + antiandrógena ou da terapia com estrogênio não ter
estramustina + agonista LH-RH + hidrocortisona sido efetiva, muitos autores recomendam QT como
(30 mg diário); ultima ratio.
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A taxa de multiplicação das células do câncer pros- esgotar as opções de tratamento hormonal, quando
tático é muito menor se comparada com outros tu- o paciente apresenta estado geral regular ou bom.
mores (por exemplo: câncer de células germinativas Em 1997, estudo prospectivo randomizado
testiculares). Como a maioria dos citostáticos exerce comparando mitoxantrona + prednisona versus
seus efeitos desejados sobre as células que se encon- prednisona (somente) demonstrou melhores resultados
tram em replicação, a QT se torna pouco efetiva para a terapia combinada. Foram verificados melhores
para este tipo de tumor. Todavia, esta taxa de repli- resultados (para alguns quesitos) de qualidade de vida.
cação de um carcinoma resistente à terapia hormonal Este estudo permitiu a liberação (FDA – EUA) do
e progressivo pode aumentar significativamente, uso desta QT para CaP metastático.
constituindo-se no momento adequado para que a
QT seja realizada. Muitas substâncias quimioterápicas,
citostáticas e citotóxicas (Tabela 2) foram estudadas A QT determina aumento do tempo de sobrevida.
com o propósito de analisar os seus efeitos (redução CaP é quimiossensível
do tamanho tumoral, melhora dos sintomas
dolorosos). Nenhuma destas substâncias se mostrou Pacientes com CaPHR têm atualmente múltiplas
especialmente eficiente. Não se constatou, com o uso opções de tratamento além das possibilidades secun-
de QT, remissão completa ou parcial duradoura. Até dárias de terapias com agentes hormonais. QT com-
o ano de 1997, a QT não estava associada ao aumento binada com agentes que afetam a integridade dos
do tempo de sobrevida. microtúbulos (taxanos – paclitaxel, docetaxel) pare-
cem apresentar boa atividade e efeitos adversos tole-
ráveis. Em especial, regimes combinados com taxanos
Regimes contemporâneos demonstram que o representam uma opção promissora, com taxas de
CaP não é tão insensível à QT como se acredi- resposta acima de 50%.
tava previamente Muitos regimes de fase II demonstraram sobre-
vida média de 18 a 24 meses, em contraste com resul-
Embora não tenha sido estabelecido de modo tados de 20 anos de estudo nos quais a sobrevida
rigoroso, é provável que a terapia atualmente disponível média de pacientes com CaPHR era de apenas dez a
para o CaPHR modifique apenas discretamente a 11 meses. Enquanto que a migração de estádio é
história natural desta doença. As indicações para a QT claramente responsável por alguns destes aparentes
podem não ser restritas somente como tratamento melhoramentos, parece provável que progressos reais
sintomático paliativo. Todavia, como é comum em também tenham sido adquiridos. Benefícios adicionais
outros contextos em que a QT tem apenas um impacto de sobrevida relatados em estudos fase II estão para
modesto sobre a sobrevida, decidir quando e como ser confirmados em estudos fase III. Dados mais
utilizá-la permanece, tanto quanto uma ciência, também recentes com único agente – docetaxel – têm demons-
uma arte. O melhor momento para sua indicação é trado atividade significativa deste. Sua administração
na progressão bioquímica/clínica da doença após semanal (36 mg/m2) está associada à menor inci-
dência de mielossupressão. Estes ensaios com doce-
Tabela 2: Quimioterápicos estudados para o tratamento de câncer
taxel como agente único dão suporte para aplicação
de próstata metastático refratário à terapia hormonal em regimes combinados.
Alguns esquemas de QT apresentados recente-
mente estão resumidos na Tabela 3. Estudos em fase
III encontram-se em desenvolvimento. Estudo do
grupo oncológico Southwest (SWOG) está tratando
pacientes com CaPHR com mitoxantrona + predni-
sona ou docetaxel e estramustina. O objetivo primá-
rio deste ensaio é determinar se existe aumento da
sobrevida global de 30% no braço dos taxanos.
No entanto, ainda não há liberação para sua
aplicação, exceto em protocolo de estudo, em países
como Alemanha e Estados Unidos. No Brasil, na
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prática clínica, alguns centros já utilizam QT para androgen-independent prostate cancer. J Clin Oncol, v. 21
(1): 123-8, 2003.
pacientes com CaPHR. Novos agentes, em combi-
2. Ebert T, Bendhack ML (1997). Prostatakarzinom - Diagnostik,
nação ou como droga única associada a estes regimes, hormonelle Therapie, Radiotherapie, Chemotherapie. Urologe
serão críticos para aumentar tempo de resposta e A, 36: 570-7.
sobrevida nos pacientes com CaPHR. 3. Goodin S, Rao KV, DiPaola RS. State-of-the-art treatment
of metastatic hormone-refractory prostate cancer. The
Oncologist, 7: 360-70, 2002.
4. Walsh PC, Retik AB, Vaughan Jr ED, Wein, AJ. Campbell’s
Leitura recomendada Urology. Oitava edição, Philadelphia, 2002.
5. Wirth M. Prostatakarzinom - Therapie des lokal begrenzten
1. Beer TM, Eilers KM, Garzotto M, Egorin MJ, Lowe BA, Henner Prostatakarzinoms. Em: Rübben H (editor). Uro-Onkologie.
D. Weekly high-dose calcitriol and Docetaxel in metastatic Springer-Verlag Berlin Heidelberg New York, pp. 233-67, 2001.
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