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Traumatismo cranioencefálico- Dr Arquimedes

Zé Luís, Marcos, Rozangela e Lucas Lima

O politrauma como um todo é um problema de saúde pública. O mais importante que se


deve saber sobre o TCE é que ele é um processo. Algo típico de acontecer é um paciente
com TCE ir ao PS, ser atendido, liberado, vai para a casa e morre. Por ser um processo,
uma entidade dinâmica, o paciente com TCE normalmente precisa ser internado para ser
avaliado e observado. Como ele é cuidado por múltiplas especialidades é importante que a
linguagem da avaliação desse paciente seja entendida pelos vários profissionais
responsáveis pelo atendimento dele. Essa linguagem é a escala de coma de Glasgow que
deve ser compreendida por todos.

HISTÓRIA

 Começou-se a tratar modernamente o TCE a partir da introdução da TC em 1970


quando também foi introduzida a escala de coma de Glasgow e começou o advento
da UTI com a utilização das monitorizações. Antes disso era sorte. O prognóstico
era muito ruim.
 As causas mais frequentes eram as guerras.
 O primeiro documento médico que faz referência ao TCE é o papiro de Smith
(1700 a.C) e menciona o faraó Sekenenre que sofreu TCE.
 O quadro “Os últimos sacramentos”, Rafael Romero, 1890, mostra que naquela
época quem “tratava” os traumatizados de crânio eram os religiosos. Dificilmente
tinham assistência médica, e, portanto, muitas vezes o padre ia apenas encomendar
a alma.

 Do ponto de vista biomecânico podemos ter TCE por:


 Impacto na caixa craniana;
 Forças inerciais (aceleração e desaceleração): não precisa necessariamente ter
impacto sobre o crânio, apenas a mudança brusca de velocidade. É importante
lembrar que por conta das diferentes densidades a caixa craniana se desloca numa
velocidade e a massa encefálica em outra velocidade provocando choque entre
essas estruturas. Às vezes você tem TCE grave em que não houve impacto sobre a
caixa craniana só as alterações de velocidades (freadas bruscas) que podem fazer
esses movimentos de rotação ou de translação da cabeça levando a TCE grave. A
causa principal das chamadas lesões axonais difusas, que são as lesões causadas
por essas forças inerciais são os acidentes automobilísticos.
 Perfuração por projétil: outra situação especial que causa TCE em que há impacto
com transformação de energia é o projétil por arma de fogo.

MORTALIDADE DO TCE NO BRASIL

 O TCE é a principal causa de morte em pacientes mais jovens. Sem levar em


consideração faixa etária é a quarta ou quinta causa de morte, dependendo do país.

 Normalmente são 130.000 mortes por ano no Brasil decorrentes não só de


politrauma, mas também de TCE.

Homicídios em 18 meses (1996): 70 mil


Mortos na Bósnia em 4 anos: 70 mil
Acidentes de trânsitos em 12 meses: 50 mil
Mortos no Vietnam em 7 anos: 56 mil
Se for feito uma comparação, o TCE causa muito mais mortes que algumas guerras em
alguns países que levaram até mais tempo.

A imagem acima mostra TCE em paciente grávida. A figura clássica do politrauma é


paciente com trauma de crânio, trauma ortopédico, trauma abdominal, trauma torácico. Em
pessoas geralmente na idade mais produtiva que passarão a ser um peso para a população,
pois além da mortalidade ser alta a morbidade também é muito elevada. Sobrecarrega a
previdência social. Algo mais típico é o TCE em homem, jovem.
TCE NOS USA

 1,5 a 2 milhões por ano;


 52 mil mortes, 2500 permanecem em estado vegetativo;
 50% por acidentes automobilísticos (e no nosso meio principalmente acidentes de
moto);
 Outras causas: quedas, violência interpessoal (traumas por arma branca e por arma
de fogo) e esportes.

 É um problema de saúde pública e que está relacionado a vários fatores (educação


da população, situação das estradas, legislação de trânsito, uso de equipamentos de
proteção individual, etc).

 Alguns dados estatísticos sobre os acidentes de trânsito no Brasil:


 50.000 mortes/ano;
 136 mortes/dia;
 Uma morte a cada 11 minutos;
 Para cada morte, 3 sequelas;

EPIDEMIOLOGIA
Estudo realizado nos EUA na década de 1990:

 A hipóxia cerebral (segundo trauma decorrente do TCE) determina em 30 % a


mortalidade;
 O choque hipovolêmico está relacionado em 20 % da mortalidade. Por isso a
importância de no atendimento do politraumatizado estabilizá-lo
hemodinamicamente e manter a permeabilidade das vias aéreas prevenindo a
hipóxia e a hipotensão.
 O atendimento no local do acidente, segundo a OMS, reduz a mortalidade em 20 %
nos acidentes automobilísticos;
 O uso de cinto de segurança reduz em 40-60% a ocorrência de TCE grave;
 Esses pacientes com TCE são atendidos segundo os preceitos do ATLS desde o
atendimento pré-hospitalar e isso ajudou a reduzir a mortalidade.

A imagem acima mostra estudos avaliando a dinâmica do trauma, mas o que quero que
vocês entendam é basicamente que ou há impacto deformando o crânio ou há as forças
inerciais em que não há impacto sobre a caixa craniana, mas sim diferenças de velocidade
no deslocamento da massa encefálica que se desloca mais rápido que a caixa craniana e
acaba se chocando contra as saliências ósseas.
TIPOS DE LESÕES CRANIOENCEFÁLICAS
*O trauma de crânio é qualquer trauma com lesão que afete o crânio e seus envoltórios.

 Primárias: são aquelas que se processam no momento do traumatismo sobre:


 Couro cabeludo: cortantes, superficiais, lacerações e perda de substância;
hematoma subgaleal. Perda de massa encefálica e afundamento craniano associado.
 Crânio: fraturas lineares, afundamentos, base do crânio.
 Meninges: associadas com afundamento.
 ENCEFÁLICAS
 Contusão cerebral: lesão primária do cérebro em que a massa encefálica se choca
contra os acidentes ósseos na base do crânio. Por isso é mais frequente ter contusão
frontal em que o lobo frontal se choca contra a parte frontal do osso que é cheia de
acidentes ósseos e na ponta do lobo temporal em que ele se choca na asa do
esfenóide.
 Lesão axonal difusa: ocorre que por conta dessas alterações de velocidades, quando
a pessoa é desacelerada muito rapidamente às vezes esse cérebro, além da sua
parada de velocidade, ele gira em torno da articulação crâniocervical e isso faz com
que esses axônios sofram um processo de torção. Quando ocorre essa torção o
paciente pode entrar em coma, pois essa tração é transmitida à formação reticular
ativadora ascendente. Esses pacientes muitas vezes tiveram o TCE, estão em coma
e a TC é normal (a principal causa de coma (pode ser grave) com TC normal é a
lesão axonal difusa; ás vezes o paciente está em coma grave, esse coma que já
apresenta sinais de sofrimento do tronco cerebral ou um coma que dura mais de 24
horas e ele está com a TC normal ou no máximo ele pode apresentar pequenos
pontos hemorrágicos na linha média quando ocorre essa torção do cérebro, rotação
ou translação).
o Comoção cerebral até 6 horas: seria a inconsciência após o TCE até 6 horas.
Normalmente ela é breve. O paciente perde a consciência após o trauma, mas logo
recupera, podendo às vezes ficar apenas com sequela desse trauma apresentando
uma amnésia retrograda ou anterógrada. Talvez essa perda de consciência seja até
um mecanismo de defesa psíquica para que o paciente realmente não se lembre do
que ocorreu, pois muitas vezes o acidente é grave e leva a um trauma psicológico
importante.
o Leve: a lesão é leve quando o paciente fica de 6-24 horas em coma (alguns
consideram comoção);
o Moderada: até 24 horas em coma;
o Grave: maior que 24 horas sem recuperação da consciência ou com sinais graves de
sofrimento do tronco cerebral;

 Lesão de nervos cranianos

 Secundárias: são aquelas que começam a se estabelecer logo após o trauma inicial
e causam hipertensão intracraniana, hérnias cerebrais e lesões isquêmicas.
 Hemorragia subaracnóide traumática
 Hematomas intracranianos (HED- hematoma extradural, HSD- hematoma subdural,
HIC): o HED não se forma logo após o trauma. Normalmente tem o impacto,
durante esse impacto tem a fratura de crânio que lesa a díploe, a duramáter, e ali
começa a extravasar sangue até formar o hematoma. Então não é algo imediato para
fazer o paciente já apresentar repercussão clínica.
 Swelling (tumefação cerebral): difusa/hemisférica
COMPLICAÇÕES QUE PODEM ADVIR DO TRAUMA

 Infecções: principalmente quando ocorrem fraturas de base de crânio. Geralmente


comunica o ouvido infectado com a caixa craniana.
 Vasculares (fístulas carótida-cavernosa)
 Fístula liquórica
 Pneumoencéfalo
 Hidrocefalias
 Epilepsias
 Alterações psiquiátricas/demências

OUTRA CLASSIFICAÇÃO

 TCE fechado: ocorreu impacto na caixa craniana sem solução de continuidade.


 Fratura de crânio: sem lesão de pele, sem laceração;
 Hematoma extradural: o mecanismo que o provoca é o impacto; a
duramáter é ligada ao osso. Quando ocorre fratura do osso que lesa um
ramo da duramáter começa a ocorrer acúmulo de sangue entre o osso e a
duramáter ocorrendo o deslocamento desta formando uma lente biconvexa.

 Contusões: o mecanismo são as acelerações lineares;


 Hematoma subdural: quando ocorre uma aceleração linear importante em
que essa velocidade do crânio e do encéfalo é diferente, o encéfalo se
desloca mais rápido e as chamadas veias pontes se rompem e levam ao
hematoma subdural. Normalmente ele acompanha toda a convexidade
cerebral.
 Lesão axonal difusa: o mecanismo são as acelerações angulares (quando
ocorre torção); geralmente a TC é normal. Na RM pode haver na linha
média pontos de hemorragia. *Concussão cerebral: hoje se sabe que é uma
importante causa de demência. Esses pacientes sofrem várias lesões axonais
difusas (principalmente no boxe, mas também em outros esportes) e passam
a ter hemorragias no corpo caloso, no tronco cerebral.

 TCE aberto: há solução de continuidade entre a pele e o osso (quando o paciente


chega com exposição de massa encefálica).

*Qual a diferença entre hematoma e contusão? O hematoma é circunscrito e o parênquima


fica em volta; ele delimita. A contusão é como se o sangue infiltrasse o parênquima, então
você vai ter regiões de parênquima e regiões de sangue.
*Normalmente no hematoma extradural o parênquima cerebral está normal. Já o hematoma
subdural não costuma vir isolado, vem associado a outras lesões (edema, contusão
cerebral, lesão axonal difusa), tendo por conta disso um prognóstico pior. E lembrar que o
HED forma uma lente biconvexa, enquanto o HSD segue a convexidade do crânio.
*Classificação do HSD:
TCE agudo: para essa classificação se usa a regra dos 3. Até 3 dias;
TCE subagudo: até 3 semanas;
TCE crônico: após 3 semana; nem sempre é decorrente do trauma, podendo até ser
considerado uma complicação do trauma. Na maioria das vezes é um paciente idoso ou
alcoólatra e geralmente tem um pouco de atrofia cerebral. Esse trauma pode ter ocorrido ou
não. Muitas vezes o paciente nem lembra que ocorreu. Outra situação em que pode haver
formação desse HSD crônico é em pacientes que usam cronicamente anticoagulantes sem
histórico de trauma. Geralmente tem um bom prognóstico. É também uma causa tratável
de demência. Na investigação de demência geralmente você encontra um HSD crônico.
Tem um mecanismo de formação diferente do HSD agudo.
ESCALA DE COMA DE GLASGOW

A escala de coma de Glasgow além de ser uma escala de avaliação da gravidade é também
uma escala de prognóstico. Em um paciente com TCE quanto menor o Glasgow pior será o
prognóstico.
CLASSIFICAÇÃO DO TCE DE ACORDO COM O QUADRO CLÍNICO E A
ESCALA DE COMA DE GLASGOW
TCE Mortalidade
Grave: Glasgow de 3-9 48%
Moderado: de 10-13 18%
Leve: de 14-15 1%
SINAIS DE TCE
Nem sempre um paciente vítima de trauma tem uma história óbvia. Então existem alguns
sinais de TCE.
 Sinal do guaxinim: hematoma periorbitário, bipalpebral e pode ser bilateral.
Normalmente indica lesão de base de crânio. Mas é importante observar que essa
região periorbitária é frouxa e quando há um trauma o líquido tem tendência a se
acumular nessa região.

 Rinoliquorreia – complicação na qual sai líquor pelo nariz. Existe a


Rinoliquorragia, quando sai líquor misturado com sangue, além da Otoliquorreia
e Otoliquorragia. São indicativos de lesão da base do crânio. A figura à esquerda
mostra uma Equimose Retroauricular ou Equimose Retromastoidea (Sinal de
Battle), também sugestivo de Fratura de Base de Crânio.

Ibiapina pergunta se esses sinais demoram a aparecer após o trauma. Ele responde que
depende de muitos fatores, como a idade do paciente, da natureza do trauma/da agressão,
da velocidade, etc., e a absorção também depende. Numa contusão, ela reabsorve em 20
dias, e ela passa por vários estágios (uma fase mais clara [??], outra mais vermelha, depois
amarelada, amarronzada, até o normal) que dependem do grau de degradação e reabsorção
da hemoglobina. E por que na conjuntiva a Equimose conjuntival vai ser sempre
vermelha? Por causa da irrigação da córnea; a córnea praticamente não tem oxigenação,
então...[??? 35:50 ???].
O ATLS, como tem que ser atendidos os pacientes com trauma de crânio.
Como pedir Exames de Imagem num paciente com TCE? Quando pedir?

 Sempre que houver sintomatologia


 Hoje até por conta do receio de um processo médico-legal: às vezes vc pode
mandar o pct pra casa e lá ele desenvolve um Edema Cerebral, algum outro
problema, até mesmo levando ao óbito. Então há essa possibilidade de pedir o
exame para se defender.

Obs: agora, pct assintomático, Glasgow de 15, não há necessidade de pedir exame. Aí vc
faz um RX de crânio mais por pressão, até porque RX de crânio quase sempre não ajuda
em nada, podendo mostrar fraturas, mas se mostrar fratura, vai ter que pedir TC de todo
jeito pra estudar hematomas ou lesões subjacentes à fratura. Então, a indicação de exame
de imagem em TCE hoje é bem liberal, assim, quase sempre se pede. Às vezes, é até
melhor pedir logo o exame de imagem na urgência pra descartar logo algum problema
grave do que ficar observando por 12 horas e retardar o diagnóstico. Se não houver nada
grave ao exame, e o pct estiver melhorando clinicamente, já o libera logo pra casa e dá só
orientações.
O que mais se utiliza no atendimento ao politraumatizado é a TC, por ser mais barata, um
exame não-invasivo, pode ser feito de urgência, mais facilmente disponível, então TC é o
exame principal para avaliação do TCE. Aqueles pacientes com sinais neurológicos com
TC normal é que vc vai lançar mão da RNM. A RNM nunca é na admissão, é um exame
pra fazer acompanhamento do paciente.

Atendimento ao paciente grave na UTI –


avaliação metabólica do paciente.
A Monitorização da PIC pode ser feita a partir do Ventrículo, a partir do parênquima
cerebral (hoje os mais utilizados são os monitores de fibra óptica), pode ser feita a partir do
transdutor epidural (fica em contato com a duramáter), a partir do transdutor subdural. A
melhor e mais viável de se fazer seria essa aqui (??? 41:10), mas aqui em Teresina, por
questão de custos, ainda se faz muito a punção ventricular. Muitas vezes é muito difícil de
monitorizar a PIC porque por conta da HIC, o Ventrículo fica bem diminuído (quando
aumenta a pressão, o líquor sai mais dos ventrículos para compemsar.

Isso é uma forma de tratar a HIC – a CRANIECTOMIA DESCOMPRESSIVA: retira o


flapiócio, amplia a duramáter, faz uma plástica nela e fecha o couro-cabeludo. Esse
flapiócio “se joga é no lixo” mesmo, porque se botar na barriga isso infecta demais (no
HUT há problemas bem sérios de infecção), mas alguns serviços ainda colocam esse
flapiócio na gordura abdominal, e depois que o pct sai do estado de coma, esse flapiócio é
retirado do subcutâneo do abdome e colocado na cabeça. Hoje em dia se faz muito é
molde/prótese desse osso retirado (faz-se baseado numa TC crânio), só que isso é caro,
mais de R$100.000,00.
Um dos desafios atuais no TCE é a prevenção. A Sociedade Brasileira de Neurologia
tem o Projeto Pense Bem, que está no momento meio desativado por problemas de
financiamento.
Cuidados Imediatos: Formação de médicos com conhecimento do ATLS; o
Neurointensivismo. E a pesquisa básica da própria lesão celular pra ver se há medidas
farmacológicas...(o corticoide era a medida usada antigamente, hoje sem muito valor).

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