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A teoria da empresa e a atividade empresarial no Código Civil de 2002

Juliana Rocha Sanchez Discente do 2o ano do curso de Direito da Unesp (Franca-


SP)
Sumário
1. Introdução. 2. Conceito de empresário. 3. Pressupostos fundamentais ao exercício
empresarial. 4. Atividades econômicas civis. 5. Empresário Individual. 6. Prepostos do
empresário. 7. Conclusão. Bibliografia.
______________________________________________________________________
1. Introdução
O empresário constitui peça fundamental à constituição da empresa, sendo
considerado a figura basilar desta. A empresa, propriamente dita, serve a este como
instrumento, realidade tecnológica, cabendo a inteligência e a visão de negócios ao
empresário.
Uma demonstração clara disso é o sistema de círculos concêntricos. Neste
observamos que o empresário é representado pelo círculo maior que engloba, que
incorpora a empresa e o estabelecimento, de forma a submeter o estabelecimento à
sua vontade e, com isso fazer movimentar a empresa.
Graças à ação do empresário a empresa e o estabelecimento passam a existir e,
com isso, surgem também direitos e deveres, sendo o empresário responsável pela
atuação jurídica da empresa.
Dessa forma, compreender a posição do empresário na teoria da empresa e no
Direito brasileiro é de extrema relevância ao estudo dos institutos do Direito Comercial,
visto que este ocupa papel de destaque na composição das empresas e,
conseqüentemente, nas relações comerciais.
2. Conceito de empresário
Segundo Rubens Requião “empresário é o sujeito que exercita a atividade
empresarial.” (1), mais adiante, ainda, diz o seguinte “é um servidor da organização de
categoria mais elevada, à qual imprime o selo de sua liderança, assegurando a
eficiência e o sucesso do funcionamento dos fatores organizados” (2). O Livro II do
Código Civil, denominado “Do Direito da Empresa”, traz já no seu primeiro artigo o
conceito de empresário. Segundo o referido artigo:
Art. 966: “Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade
econômica organizada para a produção ou a circulação de bens e serviços.
Parágrafo único: Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual,
de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou
colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elementos de empresa.”
Como podemos perceber no aludido artigo o Código Civil de 2002 traz no seu
bojo alguns requisitos fundamentais à caracterização do empresário. São esses os
seguintes: profissionalismo, atividade econômica organizada e produção ou circulação
de bens e serviços. Com isso, passaremos agora a uma explanação do conceito do
empresário a partir desses três itens essenciais.
2.1. Profissionalismo
Para que a atividade seja caracterizada como empresarial deve-se obedecer ao
critério do profissionalismo. Ou seja, a atividade deve ser exercida de forma habitual e
pessoal. Com isso, não são considerados empresários aqueles que exercem a tarefa
de forma esporádica, organizando episodicamente a atividade de produção de certa
mercadoria, por exemplo, mesmo que a comercialize posteriormente. São
desconsiderados empresários, ainda, aqueles que exercem simultaneamente as
funções da atividade empresarial bem como as de produção.
Dessa maneira o empresário, para que seja caracterizado com tal, deve contratar
empregados que efetivamente exerçam a produção e promovam a circulação de bens
e
serviços, guardando para si somente o exercício das atividades empresariais. O
empresário deve, sobretudo, conhecer as informações a respeito dos bens e serviços
que disponibiliza ao mercado, bem como informar seus consumidores acerca dos bens
e serviços por ele fornecidos.
2.2. Atividade econômica organizada
A atividade do empresário deverá buscar o lucro a partir do bem ou serviço que
explora. Esse lucro deverá ser intentado mediante o exercício de atividade organizada
de forma a articular sob o domínio do empresário quatro artifícios básicos, que são:
capital, mão de obra, insumos e tecnologia. Sem um desses fatores basilares não há a
atividade empresarial.
2.3. Produção ou circulação de bens e serviços
A fabricação de produtos e mercadorias bem como a prestação de serviços são
pré-requisitos fundamentais da atividade empresarial. Quanto à circulação desses bens
e serviços, podemos dizer que consiste em efetivar a intermediação entre o produtor e
o
consumidor do bem ou o usuário do serviço a ser prestado.
3. Pressupostos fundamentais ao exercício de atividade empresarial
Segundo o disposto em lei, existem alguns pressupostos fundamentais ao
exercício de atividade empresarial. O primeiro diz respeito à capacidade. Teoricamente
todo homem é capaz de direitos e obrigações, contudo para que adquira plena
capacidade, segundo o disposto no Código Civil, deverá ter mais de 18 anos. No caso
de incapacidade, existem duas hipóteses previstas no Código Civil: a do menor
absolutamente incapaz e a do menor relativamente incapaz. Na primeira hipótese se
enquadram os menores de 16 anos e na segunda os menores de 18 anos e maiores de
16 anos. Entretanto em ambos casos mediante a emancipação o menor poderá adquirir
sua maioridade civil e, com isso, comerciar. A emancipação poderá ser alcançada
através do casamento; pela concessão dos pais; pelo exercício em emprego público
efetivo; pela colação de grau em curso superior; pelo estabelecimento civil ou
comercial, tendo o menor economia própria.
A partir do momento da sua emancipação o menor estará apto a ser sócio de
sociedade comercial. Entretanto, esse tipo de exigência inexiste no que diz respeito à
sociedades por ações, pois pode-se ser acionista em qualquer idade, desde que o seja
de ações integralizadas. Não pode ser acionista de ações não integralizadas durante a
menoridade porque, dessa forma, estaria estabelecendo uma espécie de contrato do
qual poderiam decorrer responsabilidades.
Quanto aos interditos- os que por enfermidade ou deficiência mental não tiverem
o discernimento necessário para cumprir com atos civis, ou que por causas duradouras
não puderem exprimir a sua vontade- são submetidos a um curador devidamente
nomeado para cumprir tal função. A esse curador cabe a tarefa de administrar os bens
e serviços do seu curatelado.
Estão proibidos de exercer atividades comerciais os funcionários públicos sejam
eles federais, estaduais ou municipais; os militares da ativa das três Armas; os
magistrados; os corretores e leiloeiros; os cônsules; os médicos, em farmácias,
drogarias ou laboratórios farmacêuticos. Aos falidos, enquanto não reabilitados, é
vedado o exercício de atividade empresarial, pois seus bens passam a constituir o ativo
da massa falida.
Cabe ressaltar que caso o exercício do comércio seja efetivado mesmo com a
previsão legal de proibição o ato de comércio não é anulado, ele é realmente válido.
Porém, o proibido torna-se comerciante e passa a sofrer as penalidades administrativas
a que sua falta corresponder.
4. Atividades econômicas civis
Segundo o Código Civil de 2002 existem quatro hipóteses de atividades
econômicas civis, a saber: profissional intelectual, empresário rural e cooperativas. A
quarta hipótese diz respeito às atividades exploradas por quem não se enquadra no
conceito legal de empresário, passando a se considerado, portanto, como regime civil e
não empresário.
4.1. Profissional intelectual
Segundo o artigo 966, parágrafo único, do Código Civil aqueles que exercem
profissão intelectual de natureza científica, literária ou artística não são considerados
empresários. Portanto esses profissionais não se enquadram na função de
empresários
por exercerem atividades econômicas civis, que não são reguladas sob a régia do
Direito Comercial. Outro fator que descaracteriza essas atividades como empresárias
consiste no fato de não se atrelarem a mecanismos de obtenção de lucro, nem mesmo
na organização e disposição de capital e trabalho. São estes profissionais liberais
(advogados, arquitetos, médicos, etc.), escritores e artistas.
Entretanto, a partir do momento que o exercício da profissão passa a constituir
elemento de empresa e que o profissional contribua como organizador dos fatores de
produção, podemos dizer que surge, então, a figura jurídica do empresário.
4.2. Empresário rural
No Brasil, podemos observar que a atividade rural divide-se em duas
modalidades bastante distintas, de um lado temos as agroindústrias e de outro a
agricultura familiar. A produção através da agroindústria ocorre em grandes áreas de
cultivo, com mão de obra assalariada, tecnologia de produção avançada e
especialização de cultura. Por outro lado, a agricultura familiar emprega o trabalho da
família em pequenas áreas de cultivo e sem o emprego de muitos recursos
tecnológicos. Com isso, a produção agrícola brasileira passa a ser altamente
industrializada e concentrada em grandes empresas rurais, gerando toda uma
problemática social, política e econômica.
Buscando abrir espaço ao pequeno produtor rural, o legislador inseriu no Código
Civil alguns mecanismos que possibilitam ao exercente de atividade rural a requisição
na Junta Comercial de sua inscrição no registro de empresa, como pode ser visto no
artigo 971:
Art.971: “O empresário, cuja atividade rural constitua sua principal profissão,
pode, observadas as formalidades de que tratam o art.968 e seus parágrafos, requerer
inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, caso em que,
depois de inscrito, ficará equiparado, para todos os efeitos, ao empresário sujeito a
registro”.
Não nos cabe aqui discutir o fato dessa previsão não bastar à solução do
problema da má distribuição de terras no Brasil. Porém, esse registro possibilita que o
pequeno empresário rural submeta-se às normas do Direito Comercial e equipare-se
aos demais empresários.
4.3. Cooperativas
Cooperativa é a empresa formada e dirigida por uma associação de usuários,
que se reúnem em igualdade de direitos, com o objetivo de desenvolver uma atividade
econômica ou prestar serviços comuns, eliminando os intermediários. O movimento
cooperativista contrapõe-se às grandes corporações capitalistas de caráter
monopolístico. Conforme a natureza de seu corpo de associados, as cooperativas
podem ser de produção, de consumo, de crédito, de troca e comercialização, de
segurança mútua, de venda por atacado ou de assistência médica. As mais comuns
são as cooperativas de produção, consumo e crédito; há ainda as cooperativas mistas,
que unem, numa só empresa, essas três atividades.No Brasil, a formação de
cooperativas é regulamentada por lei desde 1907. Internacionalmente, a atividade é
incentivada pela Aliança Cooperativa Internacional.
Segundo a linguagem empregada no Código Civil de 2002 cooperativas são
sociedades simples, ou ainda, sociedades civis independentemente da atividade que
exploram. Normalmente as cooperativas dedicam-se a atividades idênticas às dos
empresários e até mesmo atendem aos requisitos legais dessa caracterização. O que,
contudo, as diferencia é o fato de não poderem sujeitar-se à falência e nem mesmo
impetrar concordata. Sua principal diferenciação em relação às demais dia respeito à
adesão voluntária de número ilimitado de associados e variabilidade do capital social.
De acordo com o professor Luiz Antonio Soares Hentz, sobre as cooperativas:
“A junção de forças pessoais visa a melhoria das condições econômicas de uma determinada classe social
ou categoria econômica. Os princípios cooperativos são pregados em todo lugar e as cooperativas e
organizações similares têm sido um sucesso mundial.”
(3)
Como pode ser observado, as cooperativas são cada vez mais utilizadas como
um recurso àqueles que teriam dificuldades em solucionar problemas financeiros e
empregatícios. Com isso podemos afirmar que constitui numa forte ferramenta de
emancipação e fortalecimento dos trabalhadores.
5. Empresário Individual
Na sociedade empresária a figura do empresário é representada pelo empresário
como figura jurídica.Já no caso de empresário individual, a atividade empresarial cabe
ao empresário como pessoa física.
Essa diferenciação ocorre, pois, na constituição da sociedade empresária
pessoas naturais reúnem esforços com o intuito de atingir lucro através de exploração
empresarial de uma certa atividade econômica. Para tanto, a sociedade constituída cria
de forma fictícia uma pessoa jurídica com personalidade autônoma e sujeita de direitos.
Essa figura jurídica é a empresária, sendo os membros da sociedade apenas sócios
empreendedores ou investidores.
O empresário individual, por sua vez, exerce atividade que exige menores
investimentos, não exercendo funções econômicas de grande porte, e que,
conseqüentemente, oferece menores riscos. São exemplos de atividades empresárias
individuais:varejo de produtos estrangeiros adquiridos em zonas francas, confecção de
bijuterias, de doces, bancas de frutas, de pastéis, etc. Como podemos observar, o
empresário individual lida diretamente com seu consumidor final.
O exercício de atividade empresarial individual é vedado em duas hipóteses. A
primeira está presente nos artigos 972, 974 a 976 do Código Civil:
Art. 972.” Podem exercer a atividade de empresário os que estiverem em pleno gozo
da
capacidade civil e não forem legalmente impedidos.”
Art. 974. “Poderá o incapaz, por meio de representante ou devidamente assistido,
continuar a empresa antes exercida por ele enquanto capaz, por seus pais ou pelo
autor de herança.
§ 1o Nos casos deste artigo, precederá autorização judicial, após exame das
circunstâncias e dos riscos da empresa, bem como da conveniência em continuá-la,
podendo a autorização ser revogada pelo juiz, ouvidos os pais, tutores ou
representantes legais do menor ou do interdito, sem prejuízo dos direitos adquiridos por
terceiros.
§ 2o Não ficam sujeitos ao resultado da empresa os bens que o incapaz já possuía, ao
tempo da sucessão ou da interdição, desde que estranhos ao acervo daquela, devendo
tais fatos constar do alvará que conceder a autorização.”
Art. 975. “Se o representante ou assistente do incapaz for pessoa que, por disposição
de lei, não puder exercer atividade de empresário, nomeará, com a aprovação do juiz,
um ou mais gerentes.
§ 1o Do mesmo modo será nomeado gerente em todos os casos em que o juiz
entender
ser conveniente.
§ 2o A aprovação do juiz não exime o representante ou assistente do menor ou do
interdito da responsabilidade pelos atos dos gerentes nomeados.”
Art. 976. “A prova da emancipação e da autorização do incapaz, nos casos do art. 974,
e a de eventual revogação desta, serão inscritas ou averbadas no Registro Público de
Empresas Mercantis.
Parágrafo único. O uso da nova firma caberá, conforme o caso, ao gerente; ou ao
representante do incapaz; ou a este, quando puder ser autorizado.”
Já a segunda possibilidade de impedimento à empresa individual diz respeito à
mecanismos de proteção de terceiros. Essa hipótese está no artigo 973 do Código
Civil:
Art. 973. “A pessoa legalmente impedida de exercer atividade própria de empresário,
se
a exercer, responderá pelas obrigações contraídas.”
6. Prepostos do empresário
Como dito anteriormente, o empresário deve necessariamente contratar
funcionários, reservando para si a função de gerenciador da atividade produtiva da
empresa. Os funcionários que desempenham tarefas sob a coordenação do
empresário
podem ser empregados por este de acordo com o regime do Direito do Trabalho (CLT)
ou, ainda, vinculado por contrato de prestação de serviços. Independentemente do
vínculo existente entre o empregador e o empregado, seja ele definitivo ou temporário,
esses trabalhadores são chamados de prepostos.
De maneira geral, os atos praticados pelos prepostos dentro do estabelecimento
empresarial, sendo estes identificáveis como funcionários através de uniformes,
crachás, etc., vinculam o preponente, ou seja, o empresário. Dessa forma, toda e
qualquer informação prestada pelo preposto, assim como os compromissos por ele
assumidos, atendidos aqueles pressupostos de lugar e objeto, criam obrigações para o
empresário.
Contudo, de acordo com os artigos 1169 a 1171 do Código Civil, que dispõem
sobre os prepostos, estes respondem pelos seus atos de que derivem relações com
terceiro. E em caso de agir com culpa, deverá indenizar o preponente titular da
empresa.
Duas classes de preposto recebem maior atenção do Código Civil: o gerente e o
contabilista. Quanto ao gerente, está previsto que este pode ter seus poderes limitados
pelo preponente mediante arquivamento do ato na Junta Comercial. Não havendo essa
limitação expressa o gerente responsabiliza o preponente em todos os seus atos. No
que tange ao contabilista, está previsto que, diferentemente do gerente que é um
pressuposto facultativo, este desempenha função de preposto obrigatório, sendo
responsável pela escrituração dos livros do empresário.
Conclusão
Como pudemos observar, o Direito Comercial brasileiro oferece ao empresário
papel de destaque, regulamentando desde sua concepção até a atuação de seus
prepostos.
Quanto á concepção o Código civil define o empresário como a figura que exerce
atividade econômica de forma habitual, pessoal e economicamente organizada. Para
que alguém possa ser empresário deve ser absolutamente capaz, estando no total
gozo
dos seus direitos.
Existem, no entanto, certas atividades previstas em lei que, apesar de cumprirem
com certas características da atividade empresarial, não são classificadas como tais,
mas sim como atividades econômicas civis. São aquelas executadas por profissionais
liberais, empresários rurais, cooperativas e, ainda, as exercidas por aqueles que não se
enquadram na concepção legal de empresário.
Um caso excepcional de empresário diz respeito ao empresário individual.
Empresário individual é aquele que exerce uma atividade de pequeno porte e de baixo
investimento econômico mas que, contudo, busca atingir o lucro de forma
economicamente organizada.
No que tange aos preposto do empresário, estes são seus funcionários. São
aqueles que representam sua empresa e exercem tarefa sob sua coordenação. Podem
ser obrigatórios ou facultativos e vinculam seus atos ao seu preponente.
Finalmente, cabe ressaltar que a atividade empresarial é de suma importância ao
Direito Comercial, sendo fundamental à sua compreensão uma análise dos seus
elementos constitutivos e, dentre eles, a figura do empresário.
Notas
(1)- REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. Vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2003.
p.
76.
(2)- idem.
(3)- HENTZ, Luiz Antonio Soares. Direito de empresa no Código Civil de 2002: teoria
geral do novo direito comercial. 3a. ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Juarez de
Oliveira, 2005. p. 147.

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