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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS

História da Cultura II
Prof. Dr. Júlio Cesar Magalhães de Oliveira

Vitor Henrique Zanata de Barros Sanches


Nº USP 9337919

A aclamação e a revolta de Nika na História das Guerras e na História


Secreta de Procópio de Cesareia.

São Paulo
2018
Introdução

A revolta de Nika foi um dos principais eventos do século VI. Ocorrida em Constantinopla, no
ano de 532, durante o governo do imperador Justiniano, ela consistiu em um massivo levante popular,
iniciado pela união das facções dos Azuis e dos Verdes, comumente rivais, contra a ordem de execução
de alguns de seus membros dada por Justiniano. A natureza da revolta e o seu catastrófico desfecho têm
sido pontos de um amplo debate historiográfico, desde a sua primeira formulação na obra de J. S.
Bury1. Tendo causado milhares de mortes, além de imensos danos à capital imperial, o estudo de sua
origem e seu posterior desenvolvimento pode trazer contribuições para o entendimento dos conflitos
urbanos na Antiguidade Tardia.
Múltiplas fontes relatam o acontecido. Duas das principais, não só para o estudo da revolta de
Nika, mas também do período de governo de Justiniano como um todo, são os livros História das
Guerras (Hypèr tōn polémon lógoi) e História Secreta (Apokrýphe Historía), ambos escritos pelo
historiador Procópio de Cesareia. Nascido no ano 500, no bojo de uma importante família da região da
Palestina2, Procópio ocupou uma posição de destaque durante grande parte de sua vida adulta, tendo
sido conselheiro de Belisário, o principal general bizantino da época, responsável, entre outras coisas,
por esmagar a revolta de Nika.
Analisar as duas obras em conjunto, entretanto, é uma tarefa difícil. A História das Guerras é
um vasto relato das guerras empreendidas por Justiniano, foi escrita no gênero historiográfico greco-
romano, visava um grande público leitor 3, e foi entendida, em análises recentes, como uma justificativa
das políticas do imperador4. Já a História Secreta, de classificação mais problemática, consiste em um
polêmico relato sobre a corte imperial bizantina, na qual Procópio mostra uma imensa inimizade em
relação a Justiniano e sua corte. Tendo-a testemunhado pessoalmente, o autor descreveu a revolta de
Nika e as facções dos Azuis e Verdes em ambas, sendo que, à primeira vista, no relato contido na

1 O autor trata da revolta de Nika pela primeira vez em seu artigo de 1897: “The Nika riot”, in: JHS, xvii, 1897. 92-119.
Ele volta ao assunto em sua obra clássica, History of the later Roman empire from the death of Theodosius I to the
death of Justinian. Vol. II. New York: London, 1958. p. 39-48: “The famous rising at Constantinople, which occurred
in the first month of a.d. 532 and wrecked the city, was the result of widely prevailing discontent with the
administration, but it began with a riot of the Hippodrome factions which in ordinary circumstances would have been
easily suppressed. We saw how Justinian in his uncle's reign patronised the Blues and made use of them as a political
support. But when he was safely seated on the throne, he resolved no longer to tolerate the licence of the factions, from
the consequences of which he had formerly protected the Blues. Immediately after his accession he laid injunctions on
the authorities in every city that the disorders and crimes of the factions should be punished impartially. p. 38-39.
2 TREADGOLD. Warren. The Early Byzantine Historians. Palgrave Macmillan: London. 2010. p. 176-177.
3 Idem. p. 178.
4 BOY, Renato. Procópio de Cesareia e as disputas entre romanos e bárbaros na Guerra Gótica, da Queda de
Roma ao período de Justiniano. 2013. 193 f. Tese (Doutorado) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas,
Departamento de História, Programa de Pós-Graduação em História Social. p. 177.185
primeira, ele parece isentar Justiniano de qualquer culpa, ao contrário do que ocorre na segunda. Tal
distinção estaria de acordo com a imagem que cada uma das obras adquiriu tradicionalmente: a
História das Guerras foi muitas vezes tratada como uma obra de bajulação ao imperador, enquanto a
História Secreta, escrita em segredo, conteria a verdadeira opinião de Procópio sobre o Justiniano e a
sua corte. Essa aparente dicotomia, entretanto, é problemática. Como argumenta Averil Cameron,
atribuir funções específicas às obras de Procópio significa reduzir a sua real complexidade. Dessa
forma, a primeira não deve ser entendida apenas como uma obra de elogio, nem a segunda como uma
inconfidência excepcional5.
Posto isso, este texto tem o objetivo de mostrar, através dos escritos de Procópio sobre a revolta
de Nika, a importância que a aclamação adquiriu na Antiguidade Tardia e qual foi a sua função no
decorrer desse evento.

A aclamação e a revolta

A revolta de Nika, malgrado a sua escala sem precedentes, não foi um evento isolado durante a
Antiguidade Tardia6. Ao contrário, ela foi antecedida por inúmeros levantes populares, que ocorriam
com certa constância ao redor do Império. Tais eventos tomavam diversas formas, mas, em geral,
consistiam em grupos populares, mais ou menos organizados, que se voltavam contra autoridades
públicas, mercadores, membros da Igreja, entre outras figuras de destaque em suas comunidades, e,
julgando ter sido prejudicados por elas, as perseguiam e tomavam ações que podiam variar entre
linchamentos, exilamentos, destruição de propriedade etc.
Para tal, lugares de reunião pública eram extremamente importantes e, em geral, eram onde
esses levantes começavam. No caso da revolta de Nika, em especial, cabe ressaltar a imensa
importância dos hipódromos como espaço de reunião das diversas camadas populares, e de encontro
entre elas e as autoridades estabelecidas. O hipódromo de Constantinopla era conectado ao palácio
imperial, e continha uma sacada especial (a kathisma) onde o imperador aparecia publicamente durante
as corridas e outros eventos. Geoffrey Greatrex, em seu estudo a respeito da revolta, ressalta a imensa
importância do hipódromo nas relações entre imperador e súditos:

“O hipódromo era o ponto focal nas relações entre o imperador e o povo, e tinha uma
função central em muitas das revoltas que surgiam na capital: essas podiam acontecer no

5 Cf. CAMERON, Averil. Procopius and the Sixth Century. Duckworth: Londres. 1996. p. 32-45.
6 GREATREX, Geoffrey. “The Nika riot: a reappraisal”. In: The Journal of Hellenic Studies, v. 117, p. 60-86, 1997. p.
65.
hipódromo mesmo que jogos não estivessem ocorrendo […]. O imperador podia ser incitado a
atender aos jogos se ele estivesse ausente, e ele, por sua vez, podia convocar o povo lá através
de uma aparição na área real (kathisma). Aqui o povo tinha a oportunidade de colocar suas
demandas para o imperador, e ele de responder positivamente, ou ignorá-los, ou de mandar as
tropas contra agitadores7”

Dessa forma, o hipódromo era um dos espaços onde ocorriam aclamações, ou seja, a
manifestação conjunta, em uníssono, de um desejo, crença ou opinião, feita por um grande número de
pessoas, geralmente com características musicais, como um ritmo e rimas 8. Essas expressões eram
utilizadas em diferentes circunstancias, por diferentes grupos sociais. Podiam consistir na aprovação ou
desaprovação, em uma assembleia política, de alguma proposta, na exaltação a alguma divindade, na
congratulação ou elogio a algum líder ou, no que mais interessa aqui, na comunicação de
descontentamento popular em relação a alguma ação política9.
A revolta de Nika se iniciou após uma aclamação conjunta feita pelas facções dos Azuis e dos
Verdes ao imperador Justiniano. Eles clamavam para que o imperador tivesse piedade em relação a
presos das duas facções que deveriam ser executados. Essas facções se assemelhavam em algo com as
modernas torcidas organizadas, eram patrocinadas pelo próprio Império, e organizavam corridas e
outros eventos de entretenimento público. A população se dividia entre as facções, torcendo por uma ou
outra10. Os membros mais fanáticos utilizam vestimentas e cortes de cabelos distintivos, e
frequentemente entrevam em conflito11. Os imperadores, geralmente, apoiavam uma das facções em
detrimento da outra, talvez como uma estratégia para melhor controlar a violência que elas geravam.
Por vezes, entretanto, os imperadores assumiam o trono já tendo um histórico de filiação a um dos
lados. Esse era o caso de Justiniano, que antes de assumir o trono, durante o reino de seu tio Justino,
favorecia os Azuis. Segundo Procópio, nessa época, ele teria sido responsável por inflamar os ânimos
das torcidas que, por sua vez, se enfrentavam violentamente nos espaços públicos12.
Ao assumir o poder, entretanto, Justiniano teria adotado uma posição neutra, punindo
igualmente as duas facções. Para Greatrex, a posição hesitante de Justiniano levaria, no futuro, ao
agravamento da revolta de Nika. Essa, por sua vez, começa com a prisão de alguns membros das
facções pelo prefeito urbano Eudaemon, que ordena sua execução. Enquanto eles eram transportados,

7 Idem. p. 63. (tradução minha)


8 ROUECHÉ, Charlotte. “Acclamations in the later Roman Empire: New evidence from Aphrodisias.” In: The Journal
of Roman Studies, v. 74, p. 181-199, 1984. p. 181.
9 Idem. p. 181-184
10 KALDELLIS, Anthony et al. The Secret History: with Related Texts. Hackett Publishing, 2010. p. 32. nota 17.
11 Idem. p. 32. 7, 1-29.
12 Idem. p. 32. 7, 1-2
entretanto, dois se salvam, um Azul e outro Verde, e são ajudados pela multidão que, clamando pelo
imperador, os levam a um mosteiro para serem acolhidos 13. Justiniano, ao saber do ocorrido, não sede
ao clamor popular e envia tropas. Isso desencadeia a revolta geral das torcidas, que se unem. Procópio
descreve o evento da seguinte maneira:

“Foi nesse tempo, então, que o magistrado em cargo da população em Bizâncio levou
alguns militantes (torcedores) para serem executados. Os dois lados então se entenderam e
fizeram uma trégua; eles tomaram aqueles que haviam sido presos e invadiram a prisão,
soltando todos que estavam trancados lá por acusações de sedição ou outro crime. Toda cúpula
da magistratura urbana foi morta sem motivos, enquanto todos os cidadãos leais à lei fugiam
para o continente oposto. A cidade foi incendiada como se tivesse sido tomada por inimigos. O
tempo de Sofia, os banhos de Zauxipos, e o pátio imperial da Propilaia até a chamada Casa de
Ares foi queimado e destruído, assim como os dois grandes pórticos que levavam até o fórum
que é nomeado em homenagem a Constantino, as casas de pessoas prósperas, e um grande
número de outras propriedades. O imperador, sua mulher, e alguns senadores se trancaram no
palácio e ficaram quietos. As facções agora se fixaram sobre um lema, Nika, e esse é o nome
que a revolta carregaria até hoje14”

Em seu Procópio comprime os eventos, que são apresentados com mais detalhes em outras
fontes, como mostra Greatrex. Antes de se unirem as torcidas teriam, na realização de corridas no
hipódromo, apelado ao imperador. O que cabe destacar aqui, entretanto, é a fixação de um “canto
comum”, a palavra “Nika”, vitória, em grego, entoada por toda a multidão. Tal expressão, que era
comumente utilizada pelas torcidas durantes as corridas é, subitamente, virada contra o imperador e
transformada num símbolo da união das facções pela libertação de seus companheiros.
Até esse ponto, todavia, as torcidas parecem, pelo menos no relato de Procópio, ter seu foco
voltado apenas para esse problema, e não para demandas políticas maiores. Tal retrato é difícil de
aceitar, já que uma agitação dessa escala, com a danificação de importantes pontos da cidade,
dificilmente aconteceria apenas pelo livramento de alguns torcedores. Isso fica claro na sequência dos
eventos: após alguns dias de revolta, a multidão, segundo Procópio, teria voltado sua atenção à
perseguição de dois homens, João da Capadócia, o prefeito pretoriano, e Triboniano, o questor:

13 GREATREX, Geoffrey. “The Nika riot: a reappraisal”. In: The Journal of Hellenic Studies, v. 117, p. 60-86, 1997.
p.68
14 KALDELLIS, Anthony et al. The wars of Justinian. Hackett Publishing, 2014. p. 61. 24, 7-10
“O primeiro desses dois homens, João, não havia sequer escutado de cultura ou
educação liberal. Ele não aprendeu nada na escola de gramática a não ser as letras, e mal. Mas
através da força de sua habilidade natural e se tornou o mais poderoso homem de nossos
tempos, já que ele era o mais capaz em saber o que tinha que ser feito e em achar soluções para
problemas práticos. Entretanto, ele também se tornou o mais perverso de todos os homens e
devotou toda a força de sua natureza a isso. Nenhum mandamento divino ou vergonha ante seus
associados entravam nele; ao contrário, suas preocupações eram a de destruir a vida de muitas
para lucrar e de destruir cidades inteiras. Em um curto período ele adquiriu uma vasta fortuna e
se jogou em um estilo de vida de infindável deboche embriagado. Até a hora do almoço todos
os dias ele saquearia a propriedade de seus súditos enquanto no resto do dia ele se devotaria a
beber e a prazeres carnais. Como ele não podia de maneira alguma se controlar, ele comia até
vomitar e estava sempre pronto para roubar dinheiro embora estivesse ainda mais pronto para
gastá-lo. Essa pessoa, então, era João. Triboniano, ao contrário, era também um tanto talentoso
e era, além disso, o primeiro de seus contemporâneos quando se tratava da extensão de seu
aprendizado. Mas ele também era anormalmente viciado em fazer dinheiro e estava sempre
pronto para vender a justiça e obter lucro. Todos os dias ele revogaria algumas leis e proporia
outras, vendendo cada serviço de acordo com as necessidades de seus clientes.
Agora, contando que a população estivesse dividida e brigando entre si em nome destas
cores, nenhuma atenção era dada aos crimes que aqueles homens estavam cometendo contra o
interesse público. Mas quando as facções se entenderam, como eu já contei, e começaram a
revolta, eles abertamente insultaram esses dois homens através da cidade e os procuravam para
matá-los. Então o imperador, que queria ganhar de volta a população, instantaneamente depôs
ambos de seus cargos.15”

Nesse trecho é possível observar como a revolta, desencadeada pela execução de dois membros
de facção, rapidamente evolui para a contestação popular de dois membros da administração do
Império. Também, é notável a importância que Justiniano, após ter recusado uma demanda muito mais
simples no início, a liberação dos torcedores, não tarda a perceber o poder destrutivo do levante e acata
aos pedidos da multidão em relação a João da Capadócia e Triboniano. Acata, entretanto, parcialmente.
Ele apenas despede os dois funcionários, enquanto a multidão, pelo menos segundo Procópio, pedia a
vida deles. Além disso, não é só Justiniano que parece perceber o poder da multidão: ela mesma parece
ter consciência disso, ao ponto de requererem a morte de duas pessoas importantes na corte imperial.
As deposições de João e Triboniano, entretanto, não foram suficientes para apaziguar a
multidão (será que a entrega dos mesmos teria sido?). Ainda preso em seu palácio, Justiniano, de
acordo com Procópio, temendo uma tentativa de assassinato, comanda que Hipatio, sobrinho do

15 Idem. p. 61-62. 24, 12-18


falecido imperador Anastácio, fosse embora do palácio, pois receava a sua elevação ao trono 16. Isso
viria a acontecer: não internamente, no palácio, como Justiniano temia, mas através do clamor da
multidão, que força-o ao trono a seu contragosto:

“Então a população inteira foi a eles, proclamaram Hipatio imperador, e carregaram


ele ao fórum onde ele tomaria cargo dos eventos. Mas a mulher de Hipatio, Maria, uma
mulher discreta com uma grande reputação de prudência, agarrou-se ao seu marido e não
soltou, chorando em desespero e suplicando com todos seus amigos e associados que as
facções estavam levando ele para sua morte. Superada pela pressão do povo, entretanto, ela
soltou seu marido contra sua vontade e então o povo o carregou, contra sua vontade
também, ao fórum de Constantino onde eles chamaram ele ao trono. Não tendo um
diadema em mãos, nem qualquer uma das coisas com as quais é comum investir um
imperador, eles colocaram um torque de ouro sobre sua cabeça e aclamaram ele como
imperador dos Romanos.17”

Aqui se encontra, talvez, um último estágio na escalada da revolta: a aclamação de um novo


imperador. É impossível saber, pelo menos através do relato de Procópio, se Hipatio teve algum
envolvimento nisso: para o autor ele foi tornado imperador contra sua vontade. Tal descrição,
entretanto, torna ainda mais fascinante o poder que da multidão. Deve-se notar, entretanto, os padrões
desse processo. Não é algum líder ou agitador popular que se torna imperador. Ao contrário, a
população se apega a símbolos que legitimariam o poder de seu líder: Hipatio era sobrinho de um
falecido imperador, que havia reinado por um longo período; sua aclamação se faz em um espaço que
simboliza o Império, o fórum de Constantino, fundador da cidade e primeiro imperador cristão; e, por
último, improvisa-se um diadema de ouro, assim como a de Justiniano, que simboliza a passagem de
poder da multidão belicosa ao novo imperador.
A coroação de Hipatio, entretanto, não se concretiza. Após negociações e tentativas frustradas
de acabar com revolta por parte de Justiniano, que, segundo Procópio, cogitava até a fuga da capital,
ele é salvo pela volta do general Belisário à Constantinopla. Ele vinha da fronteira oriental do Império,
onde lutava contra os persas, e, acompanhado de uma divisão de Godos, põe fim à revolta ao matar
algo em torno de 40.000 mil pessoas que haviam se reunido no hipódromo e tentavam invadir o palácio
para instalar Hipatio no trono18. Por fim, Hipatio é decapitado, e João da Capadócia é restituído ao

16 Idem. p. 62-62. 24, 19-22


17 Idem. p. 63. 24, 22-24
18 GREATREX, Geoffrey. “The Nika riot: a reappraisal”. In: The Journal of Hellenic Studies, v. 117, p. 60-86, 1997. p.
79
cargo de prefeito pretoriano por Justiniano. O imperador reinaria por mais 33 anos, até 565, e
empreenderia, junto a Belisário, a conquista de grande parte do antigo Império Romano do Ocidente.
Sobre os escombros dos prédios destruídos pela revolta, Justiniano ordenaria a construção de suntuosos
monumentos, como a atual Hagia Sofia. Procópio, além das duas obras aqui utilizadas, ainda escreveria
o livro Das Construções, um panegírico sobre as diversas obras arquitetônicas erguidas a mando do
imperador.

Conclusão

A despeito da resolução violenta da revolta de Nika, o seu desenrolar revela a instabilidade por
trás do exercício do poder na Antiguidade Tardia. Concordo com Roueché, quando a mesma afirma
que, mediante a dissolução das instituições cívicas e a centralização institucional no Império tardio, o
exercício do poder político por parte do povo passa a espaços de reunião pública (como o hipódromo)
que não tinham, inicialmente, essa função19. Eles, entretanto, a adquirem, já que propiciam uma quebra
nas barreiras sociais ao juntarem pessoas de todas as origens, que, através das aclamações, conseguem
exercer poder. Todavia, mesmo no caso extremo da revolta de Nika, o que se busca não é a subversão
da estrutura administrativa do Império, mas sim o reestabelecimento da legitimidade do exercício do
poder, seja ao aclamar um novo imperador, ou ao simplesmente eliminar pessoas que exercem-no
indevidamente. As aclamações aparecem, dessa forma, como uma maneira das massas penetrarem na
hierarquia de poder durante a Antiguidade Tardia.

19 ROUECHÉ, Charlotte. “Acclamations in the later Roman Empire: New evidence from Aphrodisias.” In: The Journal
of Roman Studies, v. 74, p. 181-199, 1984. p. 198
Bibliografia

Edições das fontes

KALDELLIS, Anthony et al. The Secret History: with Related Texts. Hackett Publishing, 2010.

KALDELLIS, Anthony et al. The wars of Justinian. Hackett Publishing, 2014.

Historiografia

BOY, Renato. Procópio de Cesareia e as disputas entre romanos e bárbaros na Guerra Gótica, da
Queda de Roma ao período de Justiniano. 2013. 193 f. Tese (Doutorado) – Faculdade de Filosofia,
Letras e Ciências Humanas, Departamento de História, Programa de Pós-Graduação em História
Social.

BURY, J. S. History of the later Roman empire: from the death of Theodosius I to the death of
Justinian. Vol. II. New York: London, 1958.

CAMERON, Averil. Procopius and the Sixth Century. Duckworth: Londres. 1996.

GREATREX, Geoffrey. “The Nika riot: a reappraisal”. In: The Journal of Hellenic Studies, v. 117, p.
60-86, 1997.

ROUECHÉ, Charlotte. “Acclamations in the later Roman Empire: New evidence from Aphrodisias.”
In: The Journal of Roman Studies, v. 74, p. 181-199, 1984.

TREADGOLD. Warren. The Early Byzantine Historians. Palgrave Macmillan: London. 2010.

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