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Alguns exemplos:
· ...declarou que precisava saber quanto tempo estava falando, inclusive pôs em
dúvida a palavra do Presidente.
(...e até pôs em dúvida, e chegou a pôr em dúvida a palavra do Presidente.)
A continuar esse linguajar crioulo, longe não estaremos do dia em que teremos de
assim cantar nosso hino nacional: “Desafia o nosso peito inclusive a morte”, “Gigante
inclusive pela natureza”, “Nem teme, quem te adora, inclusive a morte”.
Que pretende dizer o jornalista quando redige “Lembremo-nos inclusive de que...”?
Quer ele incluir uma lembrança dentro de outras, ou quer dizer, com bom senso e em
legítimo português, “Lembremo-nos outrossim de que...”, “Lembremo-nos ainda (além
disso, ademais) de que...”?
A legítima significação de inclusive vem de longa data, pois já se encontra nas
Ordenações Afonsinas: “Acontece algumas vezes, que he assignado termo ao Reo, que
ata certo dia aja de aparecer em juízo, ou fazer algum outro auto Judicial, e bem assi a
ho Autor, e recresce duvida ao Julgador, se aquelle dia, em que se acaba o dito termo, se
entenderá inclusive, ou exclusive, que quer tanto dizer como se se comprenderá em o
dito termo, ou não, em tal guisa, a que tal termo for assignado, não seja theudo a
aparecer em juízo em o dito dia” (Liv. 3, tit. 19).
O significado de compreender, de colocar dentro não se encontra em construções
levianas e estropiadas como estas:
· Não lhes foi possível falar com ninguém, inclusive com os jornalistas
(em vez de nem ao menos, nem sequer)
Frases como essas estiolam o que é genuína e belamente nosso, para dar guarida ao
que atrofia e deforma nossa língua. O conhecimento do idioma pátrio é cartão de visita,
é carta de referência de todo e qualquer profissional.
O emprego desta palavra constitui prova, a todo instante, nas colunas dos jornais,
nas ondas de rádio, nos canais de televisão, do quanto anda enfraquecido nosso idioma.
A confusão vai longe, pois a palavra vem sendo usada sem o devido sentido e sem a
função léxica que lhe cabe. Já cuidamos do assunto, mas vamos repisá-lo um pouco.
Inclusive é advérbio; equivale a inclusivamente. Não é preposição, como vemos
estropiada e continuamente empregado por redatores apressados: “...que estabelece
novas normas modificando inclusive o critério de linhas” (corrija-se para: “...que
estabelece novas normas e modifica o próprio critério de linhas” – além de errado
emprego de inclusive, o erro de emprego do gerúndio “normas modificando”).
Em vez de “sofre de uma inflamação dos rins e inclusive retenção de urina”,
construa-se “sofre de uma inflamação dos rins e ainda (e até, e também) de retenção de
urina”.
Constitui hoje doença o emprego de inclusive, doença introduzida pelas cozinheiras
na alimentação diária dos patrões. Melhor se serve a língua ressuscitando palavras,
formas, giros e significações antigas do que acolhendo novidades extravagantes e
barbarismos escandalosos. Os melhores escritores são antes restauradores do que
inovadores. São eles que nos conservam as belas expressões do tempo que passou, as
pérolas da linguagem de nossos pais.
Os medíocres, os inventores de “estórias”, esses deixam-se levam sem resistência
na torrente das inovações.
Nossa autonomia linguística seria inexequível, sobre vulgar e grosseira, se
consistisse em dar pontapés nos clássicos, nos grandes escritores que poliram a língua e
nos deixaram o precioso legado de uma dicção urbaníssima e de peregrina beleza.
Sejamos seus continuadores.