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A LEI. O JUIZ.

O JUSTO

Amílton Bueno de Carvalho


Juiz de Direito em Santa Maria

‘A justiça é o pão do povo.


‘Às vezes bastante, às vezes pouco.
‘Às vezes de gosto bom, às vezes de gosto ruim.
‘Quando o pão é pouco, há fome.
‘Quando o pão é ruim, há descontentamento’.
a
(Brecht, Poemas, O Pão do Povo, 2 ed., Brasiliense, p. 309).

Na Faculdade de Direito ensina- cia, por comprometida com situa-


ram-me que o profissional capaz era ções concretizadas, nem sempre
aquele que mais conhecia a lei. No chegava ao justo.
exercício da advocacia percebi que Ciente de que a função jurisdicio-
não bastava o conhecimento do di- nal só tem sentido se comprometi-
reito positivo, necessário era saber da com o jurisdicionado é que ini-
o que pensavam os Juízes, qual o ciei estudo, coletando lições aqui e
caminho da jurisprudência. Ao as- ali, trocando idéias com colegas e,
sumir a magistratura, quando não antes de tudo, colhendo frutos da
mais tinha a responsabilidade ética vivência diária, do que resultou o
de pedir ‘bem’, mas sim de decidir, presente trabalho, onde busco dis-
descobri, em meio a angústia e so- cutir a lei, o dever do Juiz de
frimento, que saber da lei e da ju- aplicá-la ou não quando em confli-
risprudência não era suficiente. Os to com o justo, e, a final, qual o jus-
dispositivos legais ao serem apli- to a ser aplicado.
cados, com freqüência, resultavam Parece-me claro que, a partir do
em decisões injustas. A jurisprudên- momento em que uma classe toma o
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poder, ela se equipa com um aparato nômicos’. Ou, como vê Antônio


legal buscando nele perpetuar-se. Carlos Volkmer (Aspectos ideológicos
Nas sociedades capitalistas, onde o na Criação Jurisprudencial do Direi-
poder está nas mãos de uma mino- to, Revista AJURIS, 34/99): ‘O
ria (os detentores do capital e seus Legislativo elabora as leis; estas não
representantes), a lei tem basicamen- refletem necessariamente o direito,
te duas funções: manter coesas as mas sim a ideologia da classe po-
forças que estão no mando e deter- liticamente dominante’. Ou, como
minar a subordinação daqueles que quer Marx: ‘O direito é a vontade, fei-
sofrem a opressão (a maioria traba- ta lei, da classe dominante, que, atra-
Ihadora). Por outro lado, o Estado, vés de seus próprios postulados ide-
donde emerge a lei, é, segundo a tra- ológicos, pretende considerá-lo como
dição marxista, ‘uma máquina de re- expressão aproximativa da justiça
pressão que permite às classes domi- eterna’ (Júlio César Tadeu Barbosa,
nantes assegurar a sua dominação O que é Justiça, p. 48). Ou ainda,
sobre a classe operária, para sub- como dizem Trasímaco, Calícles e
metê-la ao processo de extorsão de Clítias, que ‘as leis são fruto do po-
mais-valia’ (Althusser, Aparelhos Ide- der arbitrário dos detentores do po-
ológicos de Estado, p. 62). Têm a der, que as editam em função de seus
mesma visão de Estado Roberto Lyra interesses’ (Roberto Aguiar, O que é
Filho, O que é Direito, p. 81, e Justiça, ed. 1982, p. 33).
Marilena Chauí, O que é Ideologia, Essa realidade (lei, escrita inter-
p. 69. pretando a tradição, a serviço dos que
Assim, o direito, visto aqui como estão no poder para estabelecer ou
lei, nada mais é do que a ideologia manter determinado sistema) não é
vencedora que sanciona, conforme a nova. Já era assim nos tempos da
lição de Roberto Aguiar (Direito, Po- Bíblia, pois, segundo especialistas
der e Opressão, ed. 1984, p. 79). Na (ver: Michel Clévenot, Enfoques Ma-
ótica de Althusser (ob. cit., p. 68), é terialistas da Bíblia, Paz e Terra,
ao mesmo tempo aparelho repressi- 1979, p. 31/38), os primeiros textos
vo do Estado (funciona via violência) bíblicos foram escritos quando da ins-
e aparelho ideológico do Estado (fun- talação do Estado monárquico por
ciona via ideologia). Já para Dennis Salomão, com o objetivo de legi-
Lloyd (A idéia de lei, p. 191), ‘é me- timá-lo no poder, sendo preciso, en-
ramente o meio de impor à popula- tão, dar uma nova interpretação à
ção o que o setor dominante consi- tradição, o que se encontra nos tex-
dera servir aos seus interesses eco- tos de 2 Samuel, cap. 9/20, de 1
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Reis, cap. 1 e 2, e no documento Ja- no essencial — Roberto Aguiar, Di-


vista inserido no Pentateuco. Seme- reito, Poder e Opressão, p. 35); ou
Ihantemente aconteceu em Atenas para justificar que não são opres-
com a reforma de Drácon quando sores, visando, assim, a sua manten-
pela primeira vez a lei foi escrita, mas ça no poder.
ela serviu muito mais para garantir o Aliás, Thomas Hobbes já ensina-
privilégio dos ‘cidadãos’ lançando um va que não é a sabedoria mas sim a
fardo ‘mais pesado para a classe dos autoridade que faz a lei (citação de
trabalhadores natos, os escravos’ (G. Júlio César Tadeu Barbosa, ob. cit.,
Glotz, História Econômica da Grécia, p. 53). Diria diferente: é a sabedoria
Lisboa, Ed. Cosmos, 1946, p. 147), que faz a lei, mas sábios a serviço
o que não foi diferente nas reformas dos que dominam.
posteriores, levando o filósofo Cumpre, pois, destruir o mito de
Trasímaco concluir que ‘a justiça, neutralidade da lei. Ela é definiti-
base do Estado e das ações do cida- vamente comprometida com aqueles
dão, consiste simplesmente no inte- que estão no poder. Pode estar ou a
resse do mais forte’ (Thomas serviço da maioria, se estes conquis-
Ransom Giles, Introdução à Filoso- tarem o poder político, ou a serviço
fia, EDUSP, 1979, p. 42). Tal realida- da minoria, se estes o conquistarem.
de sempre foi assim e o é atualmen- Alguns exemplos demonstram a
te, seja nos regimes capitalistas, seja quem serve a legislação vigente no
nos socialistas, onde os operários país; que compromissos básicos tem.
chegaram ao poder e estabeleceram A eles. Todos sabemos que o bem
leis que ali os mantêm, ou onde a da vida buscado pelo litigante só Ihe
burocracia busca perpetuar-se é concedido, como regra, após o trân-
(URSS). sito em julgado de uma sentença;
Poder-se-á argumentar que nem como exceção, em alguns feitos, o
todas as leis na sociedade capitalis- adiantamento é concedido quando o
ta servem de instrumento de opres- recurso é recebido apenas com efei-
são da classe majoritária e que vári- to devolutivo; como exceção da ex-
as são promulgadas no interesse do ceção, é dado adiantamento provi-
oprimido. Mas isso não ocorre por es- sório nas cautelares; como exceção,
pírito de benemerência dos que es- da exceção, da exceção, concede-se
tão no poder: ou são fruto de luta em liminares após justificação prévia,
dos oprimidos; ou servem como vál- com ouvida ou não da parte contrá-
vula de escape à pressão social ria; e, como exceção, da exceção,
(concede no periférico para manter da exceção, da exceção, o Juiz pode
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deferir o adiantamento sem a oitiva ca de dono (pai pelo marido, que a


do pólo passivo e sem justificação recebe solenemente no altar). No
(o art. 797 do CPC fala em ‘casos âmbito do direito civil, a situação não
excepcionais’). Todavia, a exceção, se altera; é anulável o casamento se
da exceção, da exceção, da exceção, a mulher não for virgem (art. 219,
é regra nas ações de busca e apreen- IV, do CC);
são previstas no Decreto-Lei n. 911/ b) dirão alguns que a lei penal ti-
69. Ali o Juiz obrigatoriamente con- pifica aqueles comportamentos que
cede liminares de busca e apreen- ofendem mais à moralidade média.
são sem que se ouça o réu (art. 3°). Será verdade? Vejamos o que nos
Tal decreto-lei serve a quem? Às ins- causa maior desagrado: a ofensa à
tituições financeiras. Donde veio? honra (injúria), a ofensa ao corpo (le-
Dos Ministros da Marinha, Exército são leve), ou a ofensa ao patrimônio
e Aeronáutica. Outras excrescências (uma pessoa com grave ameaça que
do Decreto-Lei n. 911 foram apreci- subtraia um relógio — roubo)? Evi-
adas por Carlos Alberto Álvaro de dente que a ordem de desagrado é
Oliveira (Revista AJURIS, 33/81, n. em primeiro lugar a honra, após o
4; ali também é analisado o corpo e depois o patrimônio. Quais
Decreto-Lei n. 70/66, a Lei n. 5.741/ as penas? Detenção de um a seis me-
71 e o Decreto-Lei n. 167/37, entre ses ou multa (art. 140 do CP); deten-
outros). ção de três meses a um ano (art.
No direito penal a ideologia do- 129); reclusão de quatro a dez anos
minante mostra-se a nu. Exemplos (art. 157), respectivamente. Surge
gritantes: uma questão básica: quem pratica o
a) delito de sedução, onde todo o roubo, ou seja, a subtração de coisa
espírito machista aparece: a mulher móvel mediante grave ameaça? Evi-
é incapaz de se proteger, logo, man- dente que é o pobre. Os outros dois
ter congresso carnal com ela é cri- delitos os não pobres praticam, o de
me; somente são protegidas as vir- roubo não! Para quem foi feito o dis-
gens, posto que as que já foram positivo legal com tamanha pena?
‘desgraçadas’ não merecem o res- c) outro exemplo é mais chocan-
peito penal; a mulher é propriedade te: imaginemos o mesmo delito de
do pai, criminoso é quem possuí-la; roubo (mediante grave ameaça sub-
o homem não pode ser vítima do de- traiam um relógio) em confronto com
lito porque nasceu para o mundo do o delito de esbulho possessório (me-
prazer, ao contrário da mulher que diante grave ameaça invadam um
deve ser casta até o momento da tro- imóvel — art. 161 do CP). O crime
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é praticamente idêntico, só difere que fique claro que não existe direito do
num o objeto é móvel, noutro é imó- trabalho. O raciocínio é simples: pa-
vel. Como valoramos mais o imóvel, ra existir direito do trabalho deve ha-
este deveria ser melhor protegido. ver antes direito ao trabalho, o que
Mas não é. A pena daquele é de qua- inexiste. Mais, é direito do trabalha-
tro a dez anos, a deste é de um a dor receber Cz$ 804,00 mensais?
seis meses e multa. Pergunta-se Evidente que não. É direito ( = vanta-
quem comete roubo de relógio? Al- gem) do patrão em pagar tão pouco.
gum latifundiário? Ora, a subtração Mas o que me causa espanto no Ju-
de móvel é crime do pobre, o esbulho diciário trabalhista é a prescrição bie-
possessório é do rico. Logo, as pe- nal. Todos sabemos que existem pa-
nas são diferentes, absurdamente trões que não pagam horas-extras
diferentes. Todavia, como atualmen- aos empregados durante anos. Sa-
te o povo (= pobre) está invadindo bemos que o empregado que exige
terras, aparecem democratas preocu- seu direito é despedido, só reclaman-
pados com a segurança do país e do, pois, quando ocorre a despedi-
propõem a elevação das penas do da. Mas, se trabalhou durante dez
esbulho, o que por certo logo virá; anos e durante todo o tempo fez
d) o pobre que não trabalha é horas-extras, só pode reclamar os
contraventor, pois não coloca no últimos dois. É a prescrição bienal.
mercado de trabalho a sua força O Juiz sabe que acontece isso. Tudo
para ser explorada (art. 59 da LCP). fica provado. Tem ciência da explo-
E o rico? ração. Mas nada pode fazer. É uma
e) note-se que ao Judiciário é da- teratologia jurídica. E o fundamento
do entrar no caminho do criminoso é a segurança, a paz social. Mas que
apenas em parte: a investigação é segurança e paz social que estão
do Executivo; após, o Judiciário de- assentadas no roubo, na exploração?
fine; e a ‘recuperação’ cabe nova- Alguém consegue justificar? E se fica
mente ao Executivo. Dois momen- a explicar a natureza jurídica da pres-
tos vitais: procura e recuperação não crição ...
Ihe pertencem, o Executivo investi- Mas quando vêm leis a serviço
ga quem quer e ‘recupera’ da ma- do oprimido (ver CF, art. 165: I,
neira que Ihe parece melhor (tenha- que garante ao trabalhador salário
se em mente que os pobres é que capaz de satisfazer as necessidades
estão nos presídios). dele e de sua família; XV, que Ihe re-
E no direito do trabalho como são conhece direito a assistência sani-
as coisas? Antes de mais nada que tária, hospitalar e médica preventiva;
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XVIII, que determina a existência de dades de direito, ao perderem o sen-


colônias de férias e clínicas de repou- so crítico, buscam fazer crer que a
so; art. 176, a educação é direito de lei é inquestionável, que se deve
todos; art. 160, Ill, é reconhecida a conhecêla mais e mais, porém não
função social da propriedade; art. criticá-la.
153, § 14, é assegurado respeito ao Mas, se isso é verdade, e creio
presidiário), ainda assim de nada ser- que seja, qual é o papel do Juiz quan-
vem, porquanto não são aplicadas. do, na apreciação do caso concreto,
Fechner já dizia: ‘Somente para em confronto com a lei, notar que
os desafortunados é que a ordem ju- da aplicação do dispositivo legal ex-
rídica se torna problemática. Para surgirá injustiça? Deve aplicar a lei,
eles, essa ordem é, exclusivamen- ou não? O Judiciário deve legitimar
te, produto do arbítrio dos podero- o injusto?
sos. É proibido pedir esmolas nas A discussão é antiga e por certo
portas das igrejas, roubar pão e dor- longe está de chegar ao fim, tudo
mir sob as pontes’ (citação de César porque a opção por uma ou outra
Dias Netto, Vice-Presidente da corrente emerge de uma postura ide-
OAB-RS, em discurso proferido na ológica.
a
abertura da 5 Assembléia Regional Figuras brilhantes entendem que
de Advogados, Santa Maria, ao Juiz é vedado deixar de aplicar a
16.5.86). lei quando Ihe parecer injusta. Dizem
O direito penal brasileiro tem mui- que ele não pode substituir o legisla-
to em comum com a teologia da li- dor. Despontam nessa linha Mário
bertação: optou pelos pobres. O Ju- Guimarães, O Juiz e a Função
a
diciário trabalhista assumiu o Jurisdicional, 1 ed., p. 330, n. 196;
preconceito e em latim: ‘in dubio, pro Carlos Maximiliano, Hermenêutica e
a
misero’! Aplicação do Direito, 9 ed., p. 79; n.
Tenho, pois, que a lei merece 82 (a não-aplicação gera instabilidade
ser vista com desconfiança. Deve ser do direito); Limongi França, Enciclo-
constantemente criticada sob pena pédia Saraiva do Direito, 48/455
de sermos, Juízes, Promotores e ad- (deve ser respeitada a legalidade e o
vogados, agentes inconscientes da regime); Benjamin N. Cardozo, A
opressão. Inocentes úteis de um sis- Natureza do Processo e a Evolução
tema desumano. Não quero dizer do Direito, p. 223; Min. Oscar Corrêa
que não se possa optar por tal sis- (RE n. 93.701-3); Des. Nelson Oscar
tema, mas que, se assim se fizer, o de Souza, RJTJRGS, 115/356 (o
seja conscientemente. As facul- subjetivismo do Juiz é inadmissível
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contra a determinação legal); Des. fosse outra, evidente que a angús-


Edson Alves de Souza, RJTJRGS, tia do julgador seria infinitamente me-
114/420 (no respeito à lei o Juiz deve nor. Sobre quem é o legislador, ver
haurir sua força); Des. Oscar Gomes Roberto Aguiar, Direito, Poder e
Nunes, RJTJRGS, 110/419(deixar de Opressão, p. 22.
aplicar a lei injusta: só se o Juiz fos- O legislador através do comando
se infalível; retira a segurança do ci- da lei preceitua genericamente. É-lhe,
dadão; instaura a pior das ditaduras, pois, impossível prever a totalidade
a do Judiciário); outros dizem que o dos casos em particular. A lei, por
Juiz é um escravo da lei. Aliás, melhor que seja, como comando ge-
Montesquieu já dizia: ‘Les juges de ral, pode na casuística levar à injus-
la nation ne sont que la bouche qui tiça flagrante. Ora, ao Judiciário é
prononce les paroles de la loi, des dada a obrigação de, no caso parti-
êtres inanimés qui n’en peuvent cular, corrigir a situação não previs-
moderér la force ni la rigueur’ (Má- ta, ou mal prevista, caso contrário,
rio Franzen de Lima, Da Interpreta- não teria sentido sua existência. Se
a
ção Jurídica, 2 ed., p. 202). D. Ma- a função do Juiz é buscar a vontade
ria I comunicou ao Vice-Rei do Bra- do legislador, qual a razão de ser do
sil: ‘Advirta aos Desembargadores Judiciário? Simples seria deixar ao
que, se desrespeitarem os meus mi- próprio legislador a tarefa da aplica-
litares, sentirão o peso de minha ção, que o faria administrativamente.
mão’, ou seja, se desrespeitarem O intermediário Judiciário seria mera
minha lei (Dalmo Dallari, O Poder formalidade, a não ser que sua exis-
Judiciário como Instrumento de Re- tência tivesse por fim a hipótese le-
alização da Justiça, publicação vantada por Dallari: esconder o legis-
AJURIS, 1985, p. 69). lador, o verdadeiro interessado, ca-
Antes de coletar opiniões contrá- bendo ao Judiciário fazer ‘um papel
rias às acima expostas, pretendo dis- sujo, pois é quem garante a
cutir as justificativas dadas antes. efetivação da injustiça’ (loc. cit., p.
O argumento forte é o de que o 65).
Juiz não pode substituir o legisla- Ora, ‘a função jurisdicional trans-
dor. Mas quem é o legislador? A cende a modesta função de servir aos
nossa história demonstra que ele caprichos e à vontade do legislador
está a serviço da classe dominante ...’ (Antônio Carlos Wolkmer, Revista
(donos do capital): busca manter a AJURIS, 34/95).
opressão da maioria. Isso deve fi- O Judiciário é Poder do Estado e
car claro, posto que, se a ótica dele a ele cabe o compromisso, tão sério
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quanto o do Legislativo, de buscar o cação jurídica entender que o direito


que é melhor para o povo. A lei é positivo é o único fator de segurança
apenas um referencial, o mais impor- (p. 135). Outrossim, necessário que
tante, mas apenas referencial. A não se tenha claro o que é a ‘ordem’ na
ser que se dê a ela o condão de es- sociedade capitalista, para tanto vale
tancar o mundo. a lição de Marilena Chauí, Desordem
O argumento de Carlos Maximi- e Processo, ed. 1986, p. 21/22: ‘Nu-
liano de que a não-aplicação da lei ma sociedade de classes, a ‘ordem’
gera instabilidade não convence. Ao não é a organização social dos mo-
contrário, o que gera instabilidade é res ou do ‘sentimento do direito’,
a aplicação da lei injusta. Isso sim como não é o jogo fluído do proibido
faz com que o povo (para ele é dirigi- e do permitido, mas é a ordenação
do o Estado, ou ao menos deveria da sociedade pela classe dominante
ser) perca a confiança nas institui- e pelo Estado, de tal modo que a ‘or-
ções. Basta lembrar o exemplo antes dem’ é controle social, dominação po-
coletado da prescrição bienal lítica, sujeição ideológica, exclusão
trabalhista: a sua aplicação é que cultural, coerção psíquica e física,
gera instabilidade! A instabilidade cri- numa palavra, violência’.
ada pela aplicação da lei quando in- Limongi França fala em respeito à
justa, por certo, é que levou James legalidade e ao regime. Mas legal
Baldwin, o líder negro norte-ame- tudo pode ser desde que se obedeça
ricano, a concluir que o sistema judi- aos preceitos legislativos. A respos-
ciário ianque é um meio legal de pro- ta ao obedecer cegamente ao legal
mover injustiça (Dallari, loc. cit., p. vem de Radbruch, citado por Lyra
59). 0 próprio Carlos Maximiliano re- Filho, Para um Direito Sem Dogmas,
conhece que ‘todo o direito escrito ed. 1980, p. 131: ‘O jurista que fun-
encerra uma parcela de injustiça’. dasse a validade de uma norma tão-
Onde a estabilidade? Só se outro -somente em critérios técnico-formais
Poder do Estado, no caso concreto, nunca poderia negar com bom funda-
puder corrigir. Aí surge o Judiciário mento a validez dos imperativos dum
tornando estáveis as relações em paranóico, que acaso viesse a ser rei’.
sociedade. Mesmo porque é ilusão Todavia, o próprio Limongi diz que,
afirmar que a ordem jurídica oferece em caso de lei flagrantemente injus-
segurança e que o legislador é sem- ta, é cabível a resistência direta e até
pre racional (Warat, Mitos e Teorias violenta. O mesmo argumento serve
na Interpretação da Lei, p. 47). Mais, para ‘o respeito ao regime’: que res-
o próprio Warat diz que é massifi- peito merecem o regime sul-africano,
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as ditaduras do Irã, do Afeganistão e processada a partir da ideologia’,


do Chile? Warat, ob. cit., p. 115). No momento
No que tange ao subjetivismo do que decide, toda sua história, sua vi-
Juiz ao negar a aplicação da lei, é são de mundo, consciente ou in-
de se ter claro que toda e qualquer conscientemente, explode, vem à
decisão, seja legalista ou não, pas- tona. Assim é com todo o ser huma-
sa necessária e obviamente pelo no ao realizar seu trabalho. E o sub-
subjetivismo do julgador. Aliás, as jetivismo de que aqui se trata é tem-
coisas no processo emergem de perado pelo argumento das partes,
incontáveis subjetivismos: das par- pela apreciação do sistema, pela ne-
tes ao narrarem os fatos aos seus cessidade do litigante. Logo, ao
advogados; destes ao peticionarem; subjetivismo do Juiz são incorpora-
das testemunhas; dos peritos; e, evi- dos outros subjetivismos, deixando,
dentemente, do julgador. Não há pois, de ser o subjetivismo dele tão-só.
como fugir disso. Warat até diz que Além disso, o ato decisório do Juiz
‘uma dor qualquer, a opinião da so- denomina-se sentença, que vem de
gra do juiz, sua situação social, o ‘sentir’, tal como a palavra ‘sen-
clima do Tribunal, os meios de co- timento’. O que se pretende é que o
municação são, em muitas hipóte- Juiz, ante o fato que Ihe é posto à
ses, as causas reais dos processos apreciação, expresse o que dele sen-
de elaboração das decisões, te e, diante desse sentimento, defina
normativamente disfarçadas’ (ob. a situação. Existe algo mais subjeti-
cit., p. 52). Não se chega a tanto, vo do que ‘sentimento’, ‘sentir’, ‘sen-
porquanto se busca, ao decidir, abs- tença’? Todavia, como as pessoas
trair ao máximo os componentes não foram educadas para expressar
pessoais e se não se logra êxito sim- o que sentem (ao contrário, foram-no
plesmente não se julga (quantas e para reprimir), busca-se racionalizar,
quantas vezes o ânimo do magistra- dando-se contornos técnicos para
do não permite momentaneamente esconder o sentimento. Tais contor-
decidir!). Todavia, certo é que tais nos servem, além de esconder (em-
fatores subjetivos influem e por uma bora sem eliminar) o que se sente,
razão muito simples: o homem é um para ‘persuadir o órgão censor’, na
todo, não é num momento Juiz e palavra de Warat (ob. cit., p. 57),
noutro homem que sofre angústias. e para dar aparência de neutralida-
Voltando. Toda a decisão é fruto de. A regra é o Juiz apreciar o fato e
da ideologia do julgador (‘o raciocí- apurar seu sentimento em relação
nio argumentativo é uma reflexão a ele, para posteriormente buscar
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argumentos técnicos-legais para Difícil imaginar ditadura dos Juí-


justificá-lo. Não é o técnico, a lei, que zes já que ditadura repousa na força
precedem ao sentimento, mas este e o Judiciário tem poder desarmado,
que precede àqueles, todos emer- geralmente inofensivo, na palavra do
gentes da ideologia. Juiz francês M. Baudot. Mais, dita-
É no respeito à lei que o Juiz deve dor é um ou pequeno grupo, com a
haurir sua força? Tenho que não. Se mesma ideologia; Juízes têm as mais
a lei é parcial, é comprometida, ser- variadas ideologias e são em núme-
ve a interesses escusos, como nela ro muito elevado (por exemplo, na
buscar força? O fortalecimento do URSS são eleitos cerca de nove mi-
Juiz deve vir do justo. lhões e quinhentos mil Juízes de Tri-
O argumento de que o Juiz deve bunais Populares — in ‘Em Foco’, 46/
aplicar a lei por ser falível serve tam- 39, informativo sobre a URSS). Como
bém para justificar a sua não-aplica- se daria tal ditadura?
ção quando for injusta, porque o le- Ainda mais, ditador age às escon-
gislador também é falível. Do con- didas, não permite fiscalização, cor-
fronto entre as falibilidades do Juiz re em busca de vantagens econômi-
e do legislador, parece-me menos cas e da perpetuação no poder. Ora,
danoso que se fique com as do Juiz o Judiciário obra às claras, mediante
que está próximo das partes, sua vi- provocação; é fiscalizado pelas par-
são é do momento concretizado e tes, pelos advogados, pela impren-
não da situação abstrata (o legisla- sa, já que seus atos são públicos; as
dor universaliza direitos; o Juiz con- decisões do Juiz são fundamentadas
cretiza a universalidade abstrata — e sujeitas ao duplo grau de jurisdi-
Aristóteles, Política, citado por ção; e jamais julga no seu interesse
Chauí, Desordem e Processo, p. pessoal.
20). Assim, o mais comum é a falibi- Por outro lado, são tão poucos os
lidade do legislador ante litígio pre- litígios que chegam ao Judiciário em
sente. razão da aplicação da lei (a grande
Não se aplicar a lei geraria a pior maioria dos descompassos é solu-
das ditaduras, a do Judiciário? Não cionada extrajudicialmente ou sequer
se pode dizer isso simplesmente por- ocorre), que seria uma ousadia
que não há precedente histórico. A pensar-se numa ditadura do Ju-
discussão é, pois, em tese. Antes de diciário.
mais nada que fique claro que se ad- Na verdade é que se entende como
voga a não-aplicação da lei tão-só ditadura do Judiciário o eventual ex-
quando ela for injusta. cesso de poder. Mas o que dizer
142/A lei. O juíz. O justo

do sistema ianque, tido como o mais Doutra banda, figuras não menos
democrático do mundo, onde a Su- brilhantes estão a afirmar que ao Juiz
prema Corte tem o poder de definir é facultado deixar de aplicar a lei
se é ou não legal a própria pena de quando injusta. Autores das mais va-
morte? E nos sistemas aonde vigora riadas correntes filosóficas assim
o precedente? pensam. Vejamos.
Por tudo que se disse anterior- Já a Bíblia, no que se refere aos
mente, penso que não se deve temer deveres dos Juízes, diz: ‘A justiça
que o Judiciário tenha poderes ao seguirás, somente a justiça, para que
ponto de negar a lei quando injusta. vivas, e possuas em herança a terra
O Juiz é escravo da lei? Não é. A que te dá o Senhor teu Deus’
resposta vem de Dallari (ob. cit., p. (Deuteronômio, 16, v. 20, tradução de
61): ‘0 escravo não pensa, o Juiz tem João Ferreira de Almeida).
que pensar. O escravo não é respon- Santo Agostinho, citado por Tomás
sável, o Juiz tem que ser responsável. de Aquino, na Suma Teológica, in
O Juiz é um ser humano dotado de Textos Clássicos de Filosofia do Di-
inteligência e vontade. Ele não pode reito, ed. 1981, p. 21, ensina que se-
ser escravo de ninguém, nem da lei’. quer deve ser considerado lei o que
Deve-se presumir, no mínimo, que o não for justo, mas, sim, corrupção
julgador seja livre, dotado de inteli- dela. Logo, faz parte integrante da
gência e de vontade. conceituação de lei o justo e, se tal
Assim, parece-me que aplicar a lei não ocorre, deixa de ser lei. Noutro
quando injusta passa a ser um ato momento Agostinho afirma: ‘Sem jus-
cômodo no qual o Juiz retira de si, tiça, o que é o Estado senão um ban-
como escravo, toda a responsabili- do de ladrões?’ (A Cidade de Deus,
dade ética pelo julgamento. Ou seja, IV, 4, citação de Dennis Lloyd, ob. cit.,
lamenta a lei ser injusta e afirma que p. 62).
nada pode fazer porque a culpa é do Platão esclarece que ‘a verdadei-
legislador. É o jurisdicionado? ra lei é somente a justa e não a injus-
En passant, é de notar que a ex- ta, ainda que os ignorantes tenham
pressão ‘escravo da lei’ vem de Cí- esta última como lei’ (Da Lei, 317, c).
cero (Pro Cluentio, 53, citado por Cícero diz que ‘é absurdo pensar que
a
Juarez Freitas, Filosofia do Direito, 1 seja justo tudo o que é determinado
ed., p. 139) e não se refere tão-só aos pelos costumes e leis dos povos’ (De
magistrados, mas a todo o povo: ‘En- Legibus, I, 15, 42). Guilherme de
fim, para sermos livres, é necessário Hockham aduz que ‘toda a lei civil
que sejamos escravos da lei’. que contradiz a razão divina ou a
A lei. O juíz. O justo/143

razão revelada, não é lei’, razão por Juiz é o legislador da situação concre-
que não se deve obedecê-la (Goldast, tizada ).
Il/630, todos citados por Juarez Frei- A jurisprudência gaúcha, em inú-
tas, ob. cit., p. 137/139 e 143). meras vezes, tem decidido negando
Na mesma trilha seguem: a) Den- vigência da lei por entender que a
nis Lloyd, ob. cit., p. 95: ‘A lei deve aplicação no caso concreto não é jus-
ser assimilada à justiça’ (...) ‘a lei sem ta. Cito os seguintes exemplos: O
justiça é uma zombaria, senão uma Alçada entendeu que ‘o Estado care-
contradição’; b) Couture: ‘Teu dever ce de autoridade para punir as con-
é lutar pelo direito. Mas, no dia que travenções relacionadas com os jo-
encontrares o direito em conflito com gos que ele tolera ou explora’ para
a justiça, luta pela justiça’; c) Dallari, descriminalizar o jogo do bicho, en-
loc. cit., p. 73: ‘Num conflito entre a sinando que ‘a aplicação da lei não
legalidade e a justiça, eu tenho tran- pode se divorciar da realidade social’
a
qüilidade em afirmar que a justiça (Julgados do TARGS, 45/148); a 5
deve prevalecer’; d) Antônio Carlos Câmara Cível do Tribunal de Justiça
Wolkmer, loc. cit., p. 93: ‘A atitude entendeu que ‘é válido o legado de
do Juiz, em relação à lei, prossegue homem casado à sua concubina’ em
Belaid, não se caracteriza jamais pela afronta ao disposto no art. 1.719, III,
passividade, nem tampouco será a lei do CC. É bem verdade que a funda-
considerada elemento exclusivo na mentação não é explicitamente agres-
busca de soluções justas aos confli- siva ao texto legal, ao que parece, se-
tos; a lei se constitui em um outro ele- guindo a lição de Warat, ob. cit., p.
mento entre tantos que intervêm no 57: ‘O Juiz pode apartar-se da nor-
exercício da função jurisprudencial’; ma sempre que pareça não se apar-
e) José Maria Rosa Tesheiner, Revista tar’, mas no real não aplicou o texto
a
AJURIS, 21/70, que ensina que se legal (RJTJRGS, 115/371); a 1 Câ-
deva fazer justiça apesar da lei; f) por mara Cível do Tribunal de Justiça
outro lado, ilustres Desembargadores outra coisa não fez ao autorizar o
do Tribunal de Justiça gaúcho têm casamento de menor com dezessete
reiterado seu compromisso com anos, explicitando que o fazia ‘sem
o justo no caso concreto (Silvino apego excessivo à literalidade da lei’
Joaquim Lopes Neto, RJTJRGS, (RJTJRGS, 117/387).
102/467; Oswaldo Proença, O magistrado gaúcho Sérgio
RJTJRGS, 110/420; Galeno La- Gischkow Pereira, em dois momen-
cerda, em inúmeras palestras; Cristo- tos, faz coro com Luiz Fernando Coe-
vam Daiello Moreira, para quem o lho, professor das Universidades
144/A lei. O juíz. O justo

Federais do Paraná e de Santa Cata- Ciência do Direito), escrita em 1906


rina, autor do livro Lógica Jurídica e sob o pseudônimo de Gnaeus Fla-
Interpretação das Leis, nos artigos vius, inauguradora da escola do di-
Interpretação Jurídica e Aplicação do reito livre que entende que deve pre-
Direito, Revista AJURIS, 27/186, e valecer o direito justo na falta de pre-
Relevância do Pensamento Teórico visão legal ou contra a própria lei.
e Filosófico no Direito: ‘Um exemplo Como ideais, apresenta Kantorowicz
do tradicional problema? Aí vai: ‘A a popularidade da jurisprudência viva,
velha questão de como deve o ma- sua especialização, sua imparcialida-
gistrado conduzir-se em face da lei de, sua independência e sua própria
‘injusta’ nos parece inteiramente su- justiça que reclama liberdade, perso-
perada, e pasma que autores emi- nalidade e competência.
nentes ainda tenham dúvidas teóri- Penso, pois, que ‘o Juiz não é um
cas sobre a solução; a nós se confi- executor cego e, sim, um artista da
gura evidente que deve prevalecer a aplicação do direito’ (Carlos Ma-
justiça, o que possibilita ao magis- ximiliano, ob. cit., p. 81). Entendo
trado corrigir a lei ou declará-la que a lei injusta não deve ser aplica-
inaplicável. Essa correção, todavia, da. Evidente que o Juiz não é com-
não implica prolação de uma sen- putador. Deve pensar a lei em todas
tença contra legem, pois, se a nor- as possíveis interpretações e, não
ma jurídica é portadora de valoração encontrando nela respaldo para o
independente, importa descobri-la no justo, deve negá-la. Os anseios so-
contexto dos demais valores sociais, ciais assim exigem. É de se notar
isto é, conduzir a norma de direito que não pretendo que se coloque o
ao seu lugar no quadro geral das Judiciário acima dos outros Poderes,
valorações; o que a hermenêutica entendendo que ele é superior. Não,
tradicional considera, portanto, uma o que quero dizer é que o compro-
decisão contra legem nada mais é misso é com o jurisdicionado; a bus-
do que a exclusão a que o Juiz pro- ca de solução justa para o conflito
cede das valorações estranhas que está acima do dispositivo legal.
a norma possa constituir, porque Parece-me cada vez mais claro que
contrárias aos princípios gerais de o mundo do Juiz, o seu campo de
direito’. luta, o local onde realiza sua obra
Cabe especial referência à obra de de arte, sua fonte de realização pes-
Hermann Kantorowicz, autor da cé- soal, e onde sela seu compromisso
lebre monografia Der Kampf um die com a sociedade, é no reinado do
Rechtswissenschaft (A Luta pela caso concreto.
A lei. O juíz. O justo/145

Ali ele é soberano para buscar a Vale outro exemplo coletado da


justiça. Ao legislador cabe a criação obra de Dennis Lloyd (p. 188): ‘Algu-
de normas genéricas, tão-só. mas sociedades orientais, e em par-
O Juiz comprometido com o jus- ticular a chinesa, não aceitaram a
to concretizado é o que querem tam- idéia de lei como um meio de apli-
bém os advogados (ver discurso do cação de regras universais a situa-
Prof. Nelson Jobim em nome da ções particulares, e desprezaram o
OAB/RS, in RJTJRGS, 114/ homem que buscava recorrer unica-
423-428). mente a regras’.
Os processualistas lutaram por Um Judiciário preso a leis injustas
muito tempo para provar que o pro- gera nos Juízes profunda angústia
cesso é instrumento de realização do como a manifestada pelo magistra-
direito material. Basta ir um pouco do gaúcho Márcio Pugina, à qual faço
mais adiante: o direito material é ins- coro: ‘Um Judiciário insensível e
trumento de realização do justo. É acastelado na lei, mesmo que esteja
meio e não fim. E o que prepondera, totalmente divorciada da realidade,
obviamente, é o fim buscado. mesmo quando ela seja instrumento
A aplicação silogística da lei, de opressão, é um Judiciário servil,
como é ensinado nas faculdades, dependente, mesquinho e canhestro.
nada mais é do que uma forma de Resultado disto é o triste espetáculo
aprisionar o Juiz, tirar-lhe a força cri- de uma justiça impotente, cada vez
adora. Serve, pois, às classes que mais distanciada do povo. Quem de
elaboram as leis, pois fazem dele um nós, de sã consciência, pode dizer
mero e frio aplicador do direito posi- que suas sentenças estão a serviço
tivo. de uma efetiva justiça social? O que
Uma questão fica àqueles que op- é o Judiciário para o homem do po-
tam pelo primado da lei. Qual a situ- vo, senão o triste prolongamento do
ação penal dos criminosos de guer- aparelho repressor estatal? O que é
ra nazistas que cometeram atos hor- o Judiciário para o desempregado sem
rendos obrigados pelas leis de estabilidade, para o sem-terra, para os
Hitler? Deveriam ou não ser conde- deserdados da vida, enfim, senão a
nados? A humanidade disse que ponta de lança de um sistema econô-
sim; a hermenêutica tradicional dis- mico elitista, pronto para a estocada
se que não. Todavia, ao arrepio da final? Será que a nós, Juízes, foi dado
ótica positiva, receberam condena- o único e medíocre poder de lançar
ção. Ou seja, o justo foi colocado miseráveis nos presídios e assinar
acima da lei. mandados de despejo?’
146/A lei. O juíz. O justo

(Autonomia do Poder Judiciário e o extraído a partir da realidade vigen-


Conteúdo Ético da Norma Jurídica, te. Não pode estar acima ou fora das
tese junto à Escola Superior da Ma- circunstâncias sociais e econômicas
gistratura Gaúcha). Mais é preciso? vividas pelo povo em dado lugar, em
Assim, a lei (que é comprometida determinado momento. Do cotejo
com a minoria opressora na realida- desses fatos é que se pode afirmar
de capitalista) deve ser vista com des- se determinado comportamento é ou
confiança (leia-se: constantemente não justo. Em dada época matar al-
criticada). Serve ela como um refe- guém era justo (‘Juízes de Deus’, na
rencial — importante, é verdade — idade média). Em determinados lo-
na aplicação do direito. Todavia, do cais ter a mulher como objeto é tido
confronto entre a lei e o justo deve como justo.
prevalecer este, como se pretendeu No que atine ao Judiciário, que
demonstrar. Aliás, esse é o exemplo aprecia questões já ocorridas entre
deixado por Cristo (Marcos, 2, 27) ao litigantes; que está vinculado ao fato
desobedecer a lei na situação con- concreto; é na concretude que deve
cretizada, dizendo que ‘o sábado (a verificar se ocorre ou não a justiça.
lei) foi estabelecido por causa do ho- Do cotejo entre as classes em luta;
mem e não o homem por causa do das necessidades pessoais objetivas
sábado’. dos litigantes; até das psicológicas;
Surge, em conseqüência, uma in- é que deve emergir ou não o justo.
dagação: qual a justiça a ser feita? Repito: a justiça ‘neutra’, aquela
Dizem alguns que existe uma justiça que procura colocar o conflito na
neutra, imparcial. A justiça cega ex- conceituação do justo já preexistente
pressa não tão famosa e formosa e não a que é buscada em função do
imagem. Tal justiça está fora do mun- litígio, só serve para favorecer os for-
do e do processo histórico. Está aci- tes, os que são intelectualmente do-
ma de tudo e de todos. É um sen- nos da definição pré-concebida do
timento que existe em todos os ho- que é ou não justo, é a justiça dos
mens. dominadores que pretende colocar o
Parece-me claro que inexiste jus- mundo a seu serviço. Esconde, pois,
tiça neutra. A cegueira ou ‘neutrali- a opção pelos fortes.
dade’ só favorece aos fortes. Quem é Tal idéia de justiça ‘neutra’ leva,
cego ou ‘neutro’ na disputa entre em conseqüência, a se tentar fazer
opressor e oprimido é aliado daquele. crer que o aplicador desta justiça tam-
A justiça só existe no processo his- bém neutro é. Diz-se, pois, que o
tórico, é um valor relativo a ser Juiz é neutro como se isso possível
A lei. O juíz. O justo/147

fosse. A única forma de uma pessoa y los Jueces italianos durante estos
ser neutra é estar fora do mundo, últimos años, en el sentido de enten-
como se as coisas acontecessem der su función judicial y la realización
abaixo dela. Na verdade ninguém, de la justicia no como una función
nem mesmo o cientista, pode ser neutra, aséptica, que se agotaría to-
neutro. Já se disse antes que o ato talmente en la sola aplicación
sentencial é fruto da ideologia do mecánica de las leyes vigentes sea
julgador (mesmo as da lavra dos cual fuere el contenido de éstas, sino
positivistas — Dennis Lloyd, ob. cit., en el más profundo de llegar a la
p. 183) e todos sabemos que a visão comprensión de que si el Derecho no
de mundo que temos é comprometi- es imparcial y justo, ellos, en el fondo,
da com a nossa história. Ao decidir, no pueden ser tampoco imparciales
ou se está aplicando uma lei que não ni justos: y que entonces su sublime
é neutra, ou se está aplicando uma ministerio no sería realmente el de
justiça que também não o é. Logo, ‘hacer justicia’, sino simplesmente el
não neutra é a decisão. Acresce-se, de convertirse en meros transmisores
ainda, que tal decisão é prolatada a y ejecutores de la voluntad, más o
partir da ideologia do julgador que por menos justa o injusta, que ha logra-
sua vez também não é neutra. do hacerse Derecho’ (Mário Treves,
Algumas citações deixam claro a El Juez y la Sociedad, Edicusa,
impossibilidade da neutralidade do Madrid, 1974, p. 10-11).
Juiz quer na aplicação da lei, quer na Roberto Aguiar, na indispensável
busca do justo. Vejamos. obra O que é Justiça, ed. 1982, p.
‘Não percebiam os próprios magis- 17/18, ensina que ‘... a justiça não é
trados, como até hoje a muitos es- neutra, mas sim comprometida, não
capa, que a preconizada fidelidade à é mediana, mas de extremos. Não há
lei, ou o fetichismo legal, era conduta justiça que paire acima dos conflitos,
traçada no contexto da ideologia só há justiça comprometida com os
institucionalizada’ (Orlando Gomes, conflitos, ou no sentido de manuten-
A Casta dos Juristas). ção ou no sentido de transformação’.
‘A era do Juiz politicamente neu- Assim, o que é justo para uns po-
tro, no sentido liberal da expressão, de ser injusto para outros, basta ver
já foi superada’ (Fábio Konder Com- o atual conflito sobre a reforma agrá-
parato, Revista AJURIS, 37/202). ria: para os sem-terra invadir proprie-
‘En primer lugar, la progressiva dades é justo, porque representa a
toma de conciencia de cada vez más possibilidade de trabalho, de vida
amplios sectores de la magistratura digna; para os donos das terras é
148/A lei. O juíz. O justo

injustiça pois fere o sagrado direito dade é relativo: as de ontem não são
de propriedade. ‘Uma, é a idéia de necessariamente as de hoje. Deve ser
justiça tal e qual entende a classe di- interpretada diante das circunstâncias
rigente. Outra, é o ideal de justiça das e da ideologia de cada um. Inexiste
classes dominadas’ (Júlio César Ta- padrão externo definitivo que possa
deu Barbosa, ob. cit., p. 16). estabelecer o que é ou não verdade:
Que fique claro: o aplicar a lei, depende sempre da finalidade. É ver-
em si, não implica justiça ou in- dade, em princípio, o que favorece o
justiça, o que definirá é a aplicação oprimido. Logo, também nela não há
do fato concreto ante uma postura neutralidade.
ideológica. Vejamos o seguinte exemplo. Na
Importante, diante disso, é que não Alemanha nazista havia muitos reli-
se estabeleçam, a priori, critérios ti- giosos que não mentiam jamais. Eles
dos como definitivos para a aprecia- escondiam judeus que, se desco-
ção do justo. Repito: o justo emerge bertos, seriam mortos em campos de
do caso concreto. concentração. À polícia nazista, que
Dizem uns que a justiça é dar a chegava na casa deles e perguntava
cada um o que é seu, mas Roberto se ali havia judeus, eles eviden-
Aguiar (Direito, Poder e Opressão, p. temente não mentiam e os policiais
XVI) pergunta: o que é o seu de cada levavam-nos à morte. Outras pes-
um? Segundo quais critérios? A res- soas, em igual situação, correndo o
posta é que a definição é vazia, como risco de serem presas, mentiam di-
ele mesmo ensina: diz tudo e não diz zendo que ali não havia judeus e es-
nada. Dependerá, evidentemente, do tes eram salvos. Uns eram menti-
caso que se apresenta e da visão de rosos, outros não. Pergunta-se: qual
mundo de quem aprecia. Lyra Filho, foi o justo, o mentiroso ou o que fa-
a
‘O que é Direito’, 4 ed., p. 28, sobre lou a verdade? Evidente que justo foi
o assunto cita João Mangabeira: ‘Por- o mentiroso.
que, se a justiça consiste em dar a Dirão que tal argumento é ad
cada um o que é seu, dê-se ao pobre terrorem, fere a lógica porque fun-
a pobreza, ao miserável a miséria, ao damentado na exceção. Mas o Judi-
desgraçado a desgraça, que isso é o ciário trabalha em cima da exceção.
que é deles ...’ A regra é não ocorrerem litígios, as
Nem mesmo a verdade pode ser pessoas entenderem-se sem a inter-
princípio definitivo da justiça. Poder- venção estatal. O que é exceção
-se-ia discutir o que vem a ser verda- para o mundo é regra para o Judiciá-
de. Parece-me que o conceito de ver- rio.
A lei. O juíz. O justo/149

O que se quer deixar claro aqui é da maioria, tomará o baile na luta e


que na apreciação do caso concreto na invasão, pois essa justiça é irmã
não se pode partir de regras pré-con- da esperança e filha da contestação.
cebidas para definir os critérios de Mas o peculiar nisso tudo é que a
justiça. O reinado do caso concreto velha dama inconstante continuará
é que afirmará se tal comportamento no baile, açulando seus donos con-
é ou não justo (o justo que não é neu- tra essa nova justiça que não tem a
tro, nem está fora do conflito). Crité- virtude da distância nem a capa do
rios feitos aprioristicamente servem equilíbrio, mas se veste com a roupa
tão-só de referenciais. Importantes, simples das maiorias oprimidas. Essa
é verdade, mas só referenciais! nova justiça emergente do desequi-
Em acórdão estampado na líbrio assumido, do compromisso e
RJTJRGS, 98/271, o culto Des. do conflito, destruirá aquela encaste-
Silvino Joaquim Lopes Neto diz que lada nas alturas da neutralidade e
‘não é possível a cada decisão imergirá na seiva da terra, nas veias
mudar-se a tábua de referências dos oprimidos, no filão por onde a
valorativas’. É possível, mesmo por- história caminha. O que é justiça? É
que a tábua de valores é alterada esta!’ (O que é Justiça, p. 15/16).
constantemente. O caso concreto, o Na minha ótica, pois, o justo está
único do mundo, é que dirá quais os no compromisso com a maioria do
valores, aqui e agora, a serem apli- povo que, obviamente, na realidade
cados. capitalista são os explorados, aque-
Mas se a justiça não é neutra e les que não detêm o poder real (que
sim comprometida, restam, basica- está nas mãos dos donos do capital),
mente, duas justiças: a do opressor nem o formal (que está a serviço da-
e a do oprimido. A opção por qual- queles).
quer delas é de índole íntima. O cer- O justo, como inexiste fora do con-
to é que não se pode ficar entre ou texto histórico, deve ser buscado,
acima delas. A minha justiça é a sempre e sempre, dentro do conflito
cantada por Roberto Aguiar quan- real e, sempre e sempre, na ótica do
do diz que a justiça é uma bailarina oprimido.
e ‘essa bailarina que emerge não O que há de novo aí? Apenas o
será diáfana e distante, não será de trocar de lado, porquanto até hoje,
todos e de ninguém, não se porá consciente ou inconscientemente, a
acima dos circunstantes, mas entra- justiça foi amante da minoria, favo-
rá na dança de mãos dadas com os recendo-lhe, buscando perpetuar as
que não podem dançar e, amante diferenças de classe, a exploração
150/A lei. O juíz. O justo

da maioria oprimida. Agora o que se considerados necessários para tor-


busca é uma justiça igualmente com- nar a igualdade das partes no pro-
prometida mas só que com o povo cesso não apenas formal e aparen-
na luta por uma sociedade mais te, mas efetiva, e válida, assim não
igualitária, menos opressora, enfim menos para o pobre, para o ignoran-
que dê condições de vida a todos e te, para o mal defendido, do que para
vida em abundância como ambicio- o rico e para o erudito’. Que venha
nava Cristo (João, 10.10). ao processo ajudando a parte, auxi-
Dentro da sociedade capitalista a liando a reparar seus erros, que saia
justiça tem sido alvo de crítica como da pseudo-passividade que só for-
tendo por finalidade servir aos pode- talece aos fortes (Cappelletti, A Ide-
rosos. Dallari, na ob. cit., p. 59, con- ologia no Processo Civil, Revista
ta de sua experiência com uma AJURIS, 23/25). Um Juiz que siga a
favelada que dizia: ‘O senhor está lição do magistrado francês Baudot:
falando de direito, de justiça, isto tudo ‘Sede parciais. Para manter a balan-
é muito bonito, mas isto não é para ça entre o forte e o fraco, o rico e o
nós. Isso é coisa para os ricos’. pobre, que não têm o mesmo peso,
Dennis Lloyd, ob. cit., p. 99, também é preciso que calqueis um pouco a
cita um Juiz inglês da era vitoriana mão do lado mais fraco da balança.
que dizia jocosamente que ‘a lei, Esta é a tradição capeteana.
como o Hotel Ritz, está franqueada Examinai sempre onde estão o forte
aos ricos e aos pobres indis- e o fraco que não se confundem ne-
tintamente’. cessariamente com o delinqüente e
Uma justiça e um Juiz não neu- sua vítima. Tende um preconceito
tros, como sempre foram. Uma jus- favorável pela mulher contra o mari-
tiça e um Juiz comprometidos, como do, pelo filho contra o pai, pelo de-
sempre foram. Só que agora cons- vedor contra o credor, pelo operário
cientes e comprometidos com a mai- contra o patrão, pelo vitimado con-
oria do povo, como poucas vezes fo- tra a companhia de seguros, pelo
ram, buscando ‘uma ciência jurídica enfermo contra a Previdência Soci-
da libertação, como já existe uma te- al, pelo ladrão contra a polícia, pelo
ologia com essa mesma finalidade’ pleiteante contra a justiça’.
(Lyra Filho, Para um Direito sem Assim, deve-se buscar no âmago
Dogmas, p. 18), ou seja, a serviço do caso concreto quem é o opressor
do povo. e quem é o oprimido (como se
Um Juiz ao modelo austríaco, que viu de Baudot, opressor pode, por
tenha ‘todos os poderes e deveres exemplo, ser o empregado e oprimi-
A lei. O juíz. O justo/151

a a
do o patrão, embora raramente) e a Desembargadores nas 5 e 6 Câma-
partir daí, com desapego à lei ou a ras Cíveis do Tribunal de Justiça ga-
conceitos vagos preestabelecidos, úcho, em dois momentos os orado-
tomar conscientemente o lado do res lembraram da máxima
oprimido, fazendo-lhe justiça, a jus- (RJTJRGS, 111/ 345 e 359).
tiça da libertação. Mas se se quer No entanto, se dizem que o Juiz,
tomar a opção pela justiça do mais como profissional, ao julgar é soli-
forte (a postura ideológica pessoal tário, nada de novo há: é só o profes-
é que define), tranqüilo parece-me sor ao dar aulas; o engenheiro ao fa-
que se deve aplicar silogística e zer cálculos; o advogado ao preparar
mecanicamente o sistema legal vi- suas teses; o cirurgião ao operar; o
gente, o que requer menos trabalho operário ao construir. E todos, inclu-
e não leva ao ‘doloroso e difícil exer- sive o Juiz, nos momentos de dúvi-
cício do pensamento’ ( Rubem A. das buscam socorro na experiência
Alves, A Empresa da Cura Divina: dos outros, seja através de livros,
um Fenômeno Religioso, Coleção como do convívio com os colegas.
Instituto de Pesquisas Especiais, n. Mas sub-repticiamente isso quer
1, cap. IV, p. 116, Ed. Universidade dizer que o magistrado, ao ser só,
Católica), quiçá até perigoso! Já a deve ficar distanciado do povo, por-
opção pelo oprimido requer que se que a massa popular é portadora de
negue a lei com alguma freqüência; doença contagiosa, ou seja, próxi-
o questionamento do sistema como mo do povo o Juiz perceberá com
um todo; a busca no conflito do real clareza a angústia popular e ficará
opressor; exige competência (fácil é contaminado por ela. E perto do opri-
aplicar a lei; difícil é negá-la porque mido, contagiado pelo seu sofri-
demanda estudo profundo, com mento, evidente que tomará opção
conhecimentos sociológicos e filosó- por ele. A solução encontrada é dei-
ficos, sob pena de se receber a pecha xar o Juiz só, fora do mundo, dis-
de irresponsável); que se ouse nos tante dos conflitos sociais, para não
pedidos (advogados) e nas decisões se dar conta do que acontece na his-
(magistrados). tória. Um Juiz desse tipo será, evi-
Mas, acima de tudo, necessário dentemente, um frio aplicador da lei.
que se conheça a realidade social, o A quem ele servirá?
povo. E isso parece ser negado ao A máxima foi elevada à lei tanto
Juiz, tanto que existe uma máxima por que a LOMAN não permite que o Juiz
quase todos aceita: ‘O Juiz é um ho- exerça cargo de direção de socieda-
mem só. Nos discursos de posse de de civil, associação ou fundação,
152/A lei. O juíz. O justo

seja de qual for a natureza ou fina- vontade, mas alheio à realidade so-
lidade (art. 36, Il, da Lei Comple- cial.
mentar n. 35). Um Juiz crítico da lei, próximo do
Então, o Juiz só é um homem ina- povo, comprometido com o justo do
cessível, distante, frio. Ao ponto de o oprimido, e que faça isso de forma
povo ter medo dele, o que é de- responsável e com competência,
nunciado por Dallari, loc. cit., p. fará com que o Judiciário participe
71/72. da história na busca do homem de
Juiz só é aquele do poeta Maia- que trata Maiacovski no poema De-
covski: dicatória:
‘O Equador estremece sob o som ‘Homens!
dos ferros. ‘Amados e não amados,
‘Sem pássaros, sem homens, o ‘Conhecidos e desconhecidos,
Peru está a zero. ‘desfilai por este pórtico num vas-
‘Somente, acocorados com rancor to cortejo!
sob os livros, ‘O homem livre —
‘Ali jazem, deprimidos, os Juízes’. ‘de que vos falo —
Por certo só, também, é o Juiz do ‘Virá,
cineasta Babenco (filme Pixote): um ‘acreditai,
homem honesto com fascinante boa ‘acreditai-me’!

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