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Mecânica I

Prof. Rudiney Hoffmann Casali

2018
Copyright © UNIASSELVI 2018

Elaboração:
Prof. Rudiney Hoffmann Casali

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

C334m

Casali, Rudiney Hoffmann


Mecânica I. / Rudiney Hoffmann Casali – Indaial: UNIASSELVI, 2018.

195 p.; il.

ISBN 978-85-515-0177-1

1. Mecânica – Brasil. II. Centro Universitário Leonardo Da Vinci.




CDD 531
Apresentação
Caro acadêmico! Seja bem-vindo ao mundo da mecânica, uma extensa
área de conhecimento da física clássica. Você entrará em contato com a teoria
que fundamenta o estudo de um dos fenômenos que permeia o universo
em que vivemos e que fascinou o homem ainda nos primórdios de nossa
sociedade, o movimento dos corpos no espaço.

O movimento dos corpos sempre despertou o interesse dos pensadores,


o trânsito de corpos celestes, o deslocamento de partículas subatômicas ou o
próprio conceito de temperatura, derivado do movimento das moléculas que
compõem um corpo, sempre manteve ocupadas as mentes dos maiores filósofos
e cientistas da história. Por isso, estudaremos, aqui, não apenas a descrição
do movimento dos corpos, mas também suas origens e as consequências que
dele decorrem. Focaremos o mundo macroscópico, aquele que nos rodeia e
primeiro ambiente espacial explorado pelo pensamento científico humano.

Iniciaremos nossa jornada pelo estabelecimento dos conceitos mais


primários para a descrição do deslocamento dos corpos, as grandezas
físicas e suas unidades de medida serão nossa primeira parada. Focaremos
especificamente os conceitos de posição, tempo e massa, sem os quais
seria impossível iniciar nossos estudos. Revisaremos a geometria analítica,
focando os pontos de maior interesse. Aqui tentaremos esclarecer e reforçar
as relações entre matemática e física. Isso será importante, pois é fundamental
que você seja capaz de conectar essas duas áreas. A matemática nos fornecerá
as ferramentas de descrição de mundo e a física se encarregará de delinear as
condições de contorno para aplicação das equações matemáticas.

Agora sim, munidos dos conceitos básicos, podemos iniciar o estudo


da cinemática dos corpos, o campo da física que descreve o movimento,
sem se preocupar muito com sua causa. Vamos estudar o movimento da
velocidade constante e da inconstante também. Aqui você também perceberá
nosso esforço em manter evidente as influências do cálculo, geometria
analítica e álgebra linear, disciplinas com as quais você terá contato e cujas
propriedades serão essenciais para entendermos, por exemplo, como calcular
um deslocamento no espaço. Ou como encontrar a função horária da posição
e do tempo. Você reconhecerá as relações entre o movimento retilíneo
uniforme e o uniformemente variado. Estudaremos também um pouco o
movimento circular, alguns rodopios apenas. Vamos definir as bases para a
discussão da cinemática aplicada ao movimento circular, acelerado ou não.

A seguir debateremos a origem do movimento, vamos discutir as


leis de Newton e suas consequências. Da noção de alteração de estado de
movimento, passando pela aceleração dos corpos, as leis de ação e reação e a
definição matemática propriamente dita para a força que atua em um corpo,
alterando seu estado de movimento. Com esse espírito vamos conhecer
III
algumas das manifestações de força mais comuns em nosso cotidiano.
Essa ideia de associar a física ao cotidiano do leitor, seja lembrando-o o
que conhece, mesmo que intuitivamente, as propriedades e características
de muitos fenômenos que discutiremos aqui. E assim iremos até o fim da
segunda unidade, transitando da gravitação, para as forças de contato mais
familiares e também algumas não tão familiares assim. Falaremos tanto das
forças normais, como o peso e sua contrapartida sobre qualquer superfície,
a força normal. Falaremos também de forças reparadoras e resistivas.
Então faremos uma breve explanação pelas forças eletromagnéticas, tão
importantes no desenvolvimento tecnológico que alcançamos, finalizando
com uma também sintética discussão do âmbito nuclear.

No fim, mas não menos importante, discutiremos o que alimenta


o movimento, a energia mecânica, a conservação desta e todo o sistema
colocado em movimento, com corpos colidindo na linha, no plano ou no
espaço, atuando uns sobre os outros, conservando energia mecânica e
momento linear. Falaremos do trabalho realizado por uma força ao longo
de um deslocamento. Do impacto das forças conservativas na descrição de
sistemas. E das colisões entre corpos em movimentos e seus desdobramentos.

Esta será uma longa jornada e espero aguçar sua curiosidade,


incentivando-o a fazer pesquisas em trabalhos de ensino e pesquisa por nós
sugeridas. Você será encorajado a propor discussões, aprender com ideias
novas e inspirado a propor suas próprias ideias para o melhoramento da
educação tão próxima de você, como um personagem atuante do ensino,
mas também em níveis geograficamente mais abrangentes, principalmente
como um incentivador da curiosidade científica e amor pelo conhecimento.
É um trabalho bastante complexo compartilhar ideias ainda desconhecidas
para muitos. Isto requer dedicação e compromisso.

Para essa obra mantivemos em mente a intensão de conectar, sempre


que possível, a física e sua fiel companheira, a matemática. Em muitos
trechos do texto, você se deparará com comentários e referências a áreas da
matemática de nosso interesse e que se fazem presentes na descrição de cada
um dos fenômenos da natureza aos quais vamos nos ater. A física ocorre
quando a matemática encontra o mundo lá fora, sejam as escalas muito
pequenas ou muito grandes, lá estarão ambas. Assim como a gramática
encerra o conjunto de regras de uma língua, a matemática encerra o conjunto
de regras que utilizamos para descrever o mundo através da física. Se você é
um amante da física, deve também nutrir apreço pela matemática.

Também foi de nosso interesse realizar conexões relevantes entre os


assuntos abordados nesta obra e trabalhos de ensino e divulgação científica
publicados em revistas nacionais de relevância para o ensino de física.
Esse é um livro voltado para estudantes de licenciatura em física, futuros
professores, de modo que nos pareceu importante, durante toda a realização
deste livro, trazer referências relevantes para o aperfeiçoamento da profissão
que você estudante desempenhará no futuro. Por isso recomendamos ao

IV
leitor que faça as leituras sugeridas, pois elas trarão boas ideias e interessantes
insights para o ensino de física em nível médio.

Como método de produção desse trabalho tentamos focar nossa


atenção à fenomenologia, explorando nossa visão dos fenômenos. Tentamos
escrever tudo aquilo que achamos que nossos professores deveriam ter-nos
dito, e talvez não o tenham feito. É uma tarefa complicada estar do outro lado
da capa, mas encaramos o desafio de escrever sobre física com honestidade e
dedicação. Não importa onde estejamos, somos sempre estudantes.

Esperamos poder instigar no leitor, pelo menos um pouco, o mesmo


tipo de curiosidade e admiração pelo mundo que sentimos desde os tempos
de nossas primeiras primaveras e que também sentimos ao escrever esta
obra. Tentamos por isso conservar o ponto de vista do estudante, que há
pouco, ou há muito, deixou a escola, mas que tem curiosidade em descobrir
e gosto pelo aprendizado. Convidamo-lo, então, para esta experiência!

Prof. Rudiney Hoffmann Casali

NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há
novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto
em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.
 
Bons estudos!

V
VI
Sumário
UNIDADE 1 – CINEMÁTICA................................................................................................................ 1

TÓPICO 1– INTRODUÇÃO À FÍSICA................................................................................................ 3


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 3
2 INTRODUÇÃO À FÍSICA................................................................................................................... 4
3 GRANDEZAS FÍSICAS ....................................................................................................................... 8
4 SISTEMAS DE UNIDADES DE MEDIDA ...................................................................................... 11
5 VETORES E OPERAÇÕES COM VETORES .................................................................................. 16
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 23
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 24

TÓPICO 2 – CINEMÁTICA UNIDIMENSIONAL............................................................................ 27


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 27
2 VELOCIDADE MÉDIA E INSTANTÂNEA .................................................................................... 27
3 VELOCIDADE MÉDIA E INSTANTÂNEA .................................................................................... 28
4 MOVIMENTO RETILÍNEO UNIFORME (MRU)........................................................................... 29
5 ACELERAÇÃO MÉDIA E INSTANTÂNEA.................................................................................... 31
6 MOVIMENTO RETILÍNEO UNIFORMEMENTE VARIADO (MRUV).................................... 32
7 QUEDA LIVRE ...................................................................................................................................... 35
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 38
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 39

TÓPICO 3 – CINEMÁTICA BIDIMENSIONAL E TRIDIMENSIONAL..................................... 41


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 41
2 DESCRIÇÃO GEOMÉTRICA............................................................................................................. 41
3 LANÇAMENTO OBLÍQUO................................................................................................................ 43
4 MOVIMENTO CIRCULAR UNIFORME (MCU) ........................................................................... 50
5 ACELERAÇÃO TANGENCIAL E RADIAL..................................................................................... 54
6 MOVIMENTO CIRCULAR UNIFORMEMENTE VARIADO (MCUV)..................................... 55
7 MOVIMENTO RELATIVO ................................................................................................................. 59
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 62
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 71
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 72

UNIDADE 2 – DINÂMICA.................................................................................................................... 75

TÓPICO 1 – DINÂMICA E SEUS PRINCÍPIOS................................................................................ 77


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 77
2 A MECÂNICA NEWTONIANA......................................................................................................... 78
3 EQUILÍBRIO DE FORÇAS ................................................................................................................. 82
4 PRINCÍPIO DA INÉRCIA 
................................................................................................................. 83
5 LEIS DE NEWTON ............................................................................................................................... 83
5.1 1ª LEI DE NEWTON ....................................................................................................................... 83
5.2 2ª LEI DE NEWTON ....................................................................................................................... 84
5.3 3ª LEI DE NEWTON ....................................................................................................................... 84

VII
6 LEIS DE CONSERVAÇÃO .................................................................................................................. 86
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 89
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 90

TÓPICO 2 – APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA................................................................ 93


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 93
2 O DIAGRAMA DE FORÇAS ............................................................................................................. 93
3 FORÇA GRAVITACIONAL ............................................................................................................... 96
4 FORÇA PESO ......................................................................................................................................101
5 FORÇA NORMAL ..............................................................................................................................103
6 FORÇA DE ATRITO ...........................................................................................................................104
7 FORÇAS RESISTIVAS E DE ARRASTO .......................................................................................108
8 FORÇA REPARADORA ....................................................................................................................114
9 FORÇA DE EMPUXO ........................................................................................................................118
10 FORÇAS ELÉTRICA, MAGNÉTICA E ELETROMAGNÉTICA .............................................121
11 FORÇAS DE INTERAÇÃO NUCLEAR .......................................................................................125
LEITURA COMPLEMENTAR..............................................................................................................127
RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................131
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................132

UNIDADE 3 – APLICAÇÕES DA DINÂMICA............................................................................... 137

TÓPICO 1 – ENERGIA MECÂNICA, CONSERVAÇÃO DA ENERGIA MECÂNICA E


TRABALHO..................................................................................................................... 139
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 139
2 ENERGIA MECÂNICA E CONSERVAÇÃO DA ENERGIA MECÂNICA ............................ 139
3 TRABALHO REALIZADO POR UMA FORÇA .......................................................................... 147
3.1 TEOREMA TRABALHO-ENERGIA........................................................................................... 152
3.2 POTÊNCIA .................................................................................................................................... 154
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 156
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 157

TÓPICO 2 – CONSERVAÇÃO DE ENERGIA..................................................................................159


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................................159
2 FORÇAS CONSERVATIVAS............................................................................................................159
3 CONSERVAÇÃO DA ENERGIA MECÂNICA ............................................................................163
4 FORÇAS NÃO CONSERVATIVAS .................................................................................................164
RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................166
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................167

TÓPICO 3 – MOMENTO LINEAR, CONSERVAÇÃO DO MOMENTO LINEAR E


ESTUDO DAS COLISÕES...........................................................................................169
1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................................169
2 MOMENTO LINEAR DE UM CORPO ..........................................................................................169
3 CONSERVAÇÃO DO MOMENTO LINEAR ................................................................................171
4 SISTEMA DE PARTÍCULAS E CENTRO DE MASSA ...............................................................172
5 FORÇA E IMPULSO ..........................................................................................................................177
6 COLISÕES ELÁSTICAS, TOTALMENTE ELÁSTICAS E INELÁSTICAS ............................182
7 COLISÕES EM DUAS OU MAIS DIMENSÕES ......................................................................... 185
LEITURA COMPLEMENTAR.............................................................................................................. 187
RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................189
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................191
REFERÊNCIAS........................................................................................................................................193
VIII
UNIDADE 1

CINEMÁTICA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo dessa unidade, você deverá ser capaz de:

• introduzir o leitor ao mundo da física;

• introduzir o conceito de grandezas;

• debater a importância dos sistemas de unidades de medida;

• descrever o movimento dos corpos;

• conceituar grandezas fundamentais da cinemática;

• definir vetores de posição, velocidade e aceleração;

• investigar o movimento em 1,2 e 3D;

• introduzir a noção de relatividade de sistemas de referência,


movimento relativo;

• explanar sobre as analogias com o movimento circular.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você
encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado..

TÓPICO 1 – INTRODUÇÃO À FÍSICA

TÓPICO 2 – CINEMÁTICA UNIDIMENSIONAL

TÓPICO 3 – CINEMÁTICA BIDIMENSIONAL E TRIDIMENSIONAL

1
2
UNIDADE 1
TÓPICO 1

INTRODUÇÃO À FÍSICA

1 INTRODUÇÃO
Começamos aqui nossa trajetória pelo pensamento clássico do movimento.
Esta unidade foi dividida em três tópicos. No primeiro deles nos debruçaremos
sobre a física em seu caráter mais introdutório. Definiremos alguns conceitos
fundamentais para a leitura daqui em diante. Começaremos com as grandezas
físicas, seu conceito e variedade. Discutiremos uma forma de medir tais grandezas,
com sistemas de unidades de medida, muito importantes para a quantificação
do mundo. Trataremos também de sua descrição, revisando brevemente alguns
conceitos espaciais importantes, vetores serão recorrentes.

Depois disso, podemos então iniciar a discussão da cinemática.


Definiremos a posição de um corpo no espaço e, considerando o tempo que leva
para uma determinada variação em sua posição, definiremos a velocidade. Assim
completamos a discussão sobre o movimento retilíneo uniforme. Ao estudarmos
também o tempo que a velocidade de um corpo no espaço leva em duas
configurações, inicial e final, definiremos a aceleração e o movimento retilíneo
uniformemente variado. Por fim trataremos a queda livre dos corpos. Tratamos
com mais atenção a cinemática unidimensional, você verá que a descrição do
movimento no plano ou no espaço é, de uma certa forma, uma repetição daquela
unidimensional.

De certa forma, pois assim como tratamos o movimento retilíneo em três


dimensões, taramos também o movimento circular uniforme e o movimento
circular uniformemente variado. Você verá que para o movimento circular, o
plano é o limite inferior em dimensões. Falamos ainda sobre o movimento relativo
entre corpos em diferentes referenciais.

Mãos à obra! Vamos começar realizando uma breve biografia de um dos


mais importantes expoentes das ciências e grande influenciador da forma como
vemos o mundo e descrevemos o movimento dos corpos Galileu Galilei.

3
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

2 INTRODUÇÃO À FÍSICA
Observando o mundo a nossa volta, podemos perceber que as revoluções
científicas e tecnológicas têm nos presenteado com diversos dispositivos que
facilitam nossa vida e nossa interação com o mundo e com as pessoas. É de
grande valor, portanto, tornarmos cientes do funcionamento de tais tecnologias e
conhecimentos científicos.

A intenção desse livro é a de apresentar as bases científicas sobre as quais


tais desenvolvimentos vêm se alicerçando. Vamos discutir tópicos em física, com
algumas aplicações às tecnologias do cotidiano, focando nos fenômenos naturais
e como esses permeiam a nossa vida diária. Para isso tentaremos descrever
minuciosamente os conceitos apresentados. Os detalhes serão importantes, por
isso não julgue como entediante uma passagem mais detalhada, abra sua mente
para essa discussão em conjunto.

Tentaremos também aproximar a física de sua ferramenta de trabalho, a


matemática. É importante que você seja capaz de conectar aquilo que aprenderá
nas disciplinas de matemática, especialmente a de cálculo, com sua aplicação à
física, os momentos em que uma encontra a outra. Sempre que conveniente, você
encontrará alguns apontamentos da conexão de alguma equação que descreve
um fenômeno físico, e sua correspondente classificação no campo da matemática.
Discutiremos tanto a interpretação física de tais equações, quanto sua sintaxe
matemática. A matemática é uma linguagem e como ferramenta da física, campo
que tenta descrever a natureza, deve ser aprendida, entendida e discutida.

Toda a abordagem desenvolvida nesse livro se baseará em três concepções


filosóficas, e também nas combinações entre elas. Essas concepções filosóficas são a
de espaço, tempo e massa, três conceitos fundamentais para a construção tanto da
mecânica clássica de Isaac Newton, objeto desse livro de estudos, quanto da mecânica
relativística de Albert Einstein – vale ressaltar que, devido às baixas velocidades e às
pequenas massas envolvidas, a mecânica de Newton pode ser vista como um caso
particular daquela de Einstein. Trataremos dessas três concepções filosóficas (espaço,
tempo e massa) mais adiante no texto, em um momento mais adequado, em que
tentaremos construir definições claras para todas elas. Antes disso vamos conhecer,
brevemente, a história de um dos maiores precursores das ciências naturais, com seu
empirismo e visão de mundo Galileu Galilei (1564-1642) mudou a forma de se fazer
ciência e influenciou muitos pensadores que o sucederam.

Nascido em Pisa, na Itália, em 1564, Galileu Galilei é filho de Vincenzio


Galilei, músico e comerciante e de Giulia Ammannati, mudou-se para Florença
ainda pequeno onde foi educado no colégio do convento jesuíta, de onde saiu
um noviço, ainda com 15 anos de idade, a chamado do pai. Foi admitido na
Universidade de Pisa em 1581, com o intuito de estudar medicina, mas em 1585
abandonou o curso, com interesses voltados para a matemática, e retornou
à Florença para lecionar. Mais tarde, em 1592, após a morte do pai, mudou-se
para Pádua, também para lecionar (GENTILE, G. e TUMMINELLI, C. Istituto
Giovanni Treccani, Rome, 1935). Teve uma relação com Marina Gabba e muitos
filhos, não exatamente legítimos.
4
TÓPICO 1 | INTRODUÇÃO À FÍSICA

FIGURA 1 – GALILEU GALILEI, POR JUSTUS SUSTERMANS 1636

FONTE: Disponível em: <goo.gl/dGkJgt>. Acesso em: 9 mar. 2018.

Galilei estará para sempre marcado na história como uma das mais
brilhantes mentes de todos os tempos, seu trabalho inspirou o estudo de diversos
campos das ciências naturais, da astronomia à mecânica. Embora haja discussões
sobre a autenticidade de sua autoria, como o inventor do objeto, Galileu foi um dos
primeiros pensadores a apontar um telescópio para o céu e trazer observações a
respeito da topologia lunar, das manchas solares e do movimento de Vênus, entre
muitos outros. Galilei foi um dos pioneiros do heliocentrismo e quase foi queimado
na fogueira, pela inquisição romana. Na Figura 1 ele é retratado por Justus
Sustermans, um pintor barroco Belga, nascido na Antuérpia no fim do século XVI.

FIGURA 2 – ALLA PRESENZA DEL GRANDUCA GALILEO EFFETTUA


L’ESPERIMENTO DELLA CADUTA DEI GRAVI DALLA TORRE DI PISA, POR
LUIGI CATANI 1816

FONTE: Disponível em: <goo.gl/itPjYx>. Acesso em: 9 mar. 2018.

5
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

Mas não apenas à mecânica celeste ficam restritos os trabalhos e os


resultados de Galilei, a ele também devemos muitos desenvolvimentos em
outro tipo de mecânica, a clássica. Veremos que ele foi um dos precursores do
estudo do movimento dos corpos aqui na Terra, em nosso cotidiano. Talvez a
mais interessante de suas ideias foi aquela que afirmava que corpos caem com
velocidade independente de sua massa. É preciso notar que até o momento
contemporâneo a Galilei, a associação da massa ou peso dos corpos, mesmo que
esses ainda fossem conceitos teoricamente recentes, à velocidade com que cairiam
de uma determinada altura era muito impregnado no senso comum. Até hoje
esta não é uma prática incomum. Sua experiência de lançamento de dois objetos,
um claramente mais leve que o outro, do alto torre de Pisa, verídica ou mítica,
adicionou didática ao conceito que a permeia. Uma representação dele pode ser
vista no quadro da Figura 2, pintada por Luigi Catani (1762-1840), um italiano
nascido em Florença, e hoje exposto no Museo Galileo, na mesma cidade. Na
pintura Galilei observa de longe a queda de dois objetos, provavelmente rochas
de diferentes tamanhos e massas. Com o auxílio de um prumo rudimentar ele
compara as linhas de queda dos objetos, além de detectar a aparente inclinação
da torre. Hoje em dia o experimento já foi realizado, inclusive em gigantescas
câmaras de vácuo, e mostrou-se factível e fidedigno à teoria proposta.

Galilei não se destacou apenas por seu trabalho, ele obteve seu acesso à
prosperidade também por como realizava seu trabalho. Foi um dos primeiros a
desenvolver e adotar o método científico, ou o mais próximo disso que podia em
seu tempo. A matematização das teorias que explicavam os fenômenos naturais,
indiscutivelmente, pavimentou o trajeto que a física clássica e a física moderna
percorreram até aqui. E focar nessa estratégia é um dos objetos desta obra,
ajudá-lo a perceber essas relações entre a física e a língua que escolhemos para
representá-la.

Em seu livro De Motu Antiquiora, "Antigos escritos sobre o movimento" em


uma tradução livre, publicado em 1687, Galilei aborda o movimento e apresenta
um raciocínio que vai de encontro com o pensamento aristotélico regente na
época. Para Aristóteles o movimento de um objeto só se dá mediante a constante
ação de um ímpetus externo ao próprio objeto.

DICAS

Sugerimos aqui a leitura do trabalho intitulado “A complexidade do movimento


local na Física aristotélica”, publicado na Revista Brasileira de Ensino de Física. Disponível
em: <https://goo.gl/4yTpCV, de novembro de 2012 (CAMPOS, A.; RICARDO, 2012), para um
entendimento mais amplo, mas breve, da visão de mundo desse grande pensador grego.

6
TÓPICO 1 | INTRODUÇÃO À FÍSICA

Com a superioridade tecnológica de seu tempo, frente o contexto do período


de Aristóteles, Galilei observava seu mundo, e deve ter notado alguns dos efeitos
mais práticos, dos fenômenos com os quais ambos os pensadores se depararam.
Possivelmente as armas de guerra deram pistas a Galilei, como os canhões de guerra.
Foi influenciado pelas observações que fez de um projétil de canhão lançado que ele
escreveu uma, ainda rústica, equação que descrevia seu movimento. Galilei foi um
dos primeiros a ver na matemática a linguagem ideal para decodificar e descrever a
natureza. E isso com certeza vale uma posição na história.

Em Siderus Nunicus, algo como o Mensageiro Sideral, ele divulga algumas


conclusões de suas observações astronômicas, ainda em 1610. E ele concluiu que
elas confirmavam o modelo de Nicolau Copérnico (1473-1543), que colocava o Sol
no centro da órbita dos planetas. O problema residia em um decreto "promulgado"
pela igreja, que proibia o debate do heliocentrismo ou modelos do tipo. Embora
tenha causado uma situação embaraçosa, frente à igreja, Galilei não foi acusado
de "heresia", mas mesmo assim voltou atrás em suas afirmações a respeito da
posição do Sol no espaço e escapou de uma "punição" severa, imposta pela igreja.

Sua produção científica continuou por toda a vida, em 1612 ele publicou
um trabalho pomposamente intitulado de Discorso intorno alle cose che stanno in su
l’acqua o che in quella si muovono, endereçado ao gran-duque da Toscana, Cosimo
II. O trabalho ficou conhecido como "Discurso sobre os corpos flutuantes" e nele
Galilei estabelece suas teorias sobre a hidrostática. Em Dialogo di Galileo Galilei
sopra i due Massimi Sistemi del Mondo Tolemaico e Copernicano, ou "Diálogo sobre os
dois principais sistemas do mundo", publicado em 1632 ele publica contundentes
referências ao heliocentrismo e acaba preso em Roma, até que uma audiência com
o Papa Urbano VIII fosse marcada. Suas transgressões à imposição geocêntrica
foram a fonte de seu problema. Já no fim da vida, escreveu, em 1638, Discorsi e
Dimostrazioni Matematiche Intorno a Due Nuove Scienze, ou "Discurso sobre duas
novas ciências", em que discutia suas ideias acerca da mecânica. Morreu cego, em
1643, na cidade de Arcetri, na Toscana.

Foram muitas realizações na vida de Galilei, ela foi muito produtiva para
a ciência, para um aprofundamento em sua história e na história de muitos outros
cientistas da história.

DICAS

Sugerimos a leitura do livro intitulado “Os 100 Maiores Cientistas da História:


uma classificação dos cientistas mais influentes do passado e do presente”. (SIMMONS, J. C.
2002). Um compêndio de breves biografias que podem chamar sua atenção.

7
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

Galilei não só mudou o curso da metodologia de produção de conhecimento,


mas também mostrou que para conhecer melhor a física e interpretar com mais
rigor a natureza, você deve conhecer a matemática e sua relação com a física
e os fenômenos naturais; deve conhecer a ferramenta com que trabalha para
descrever o mundo para seus alunos. É importante que você não só se preocupe
em conhecer a matemática, mas também como conectá-la à física de forma clara e
despretensiosa. Deduza as expressões e discuta seus significados físicos, quando
aplicamos tais equações ao mundo a nossa volta.

Vamos agora seguir e discutir algo de cunho mais técnico e menos histórico.
Falaremos a respeito de um dos conceitos mais primordiais e fundamentais para
o entendimento de qualquer conteúdo físico. Discutiremos a seguir as grandezas
físicas, suas unidades de medidas e um pouco de revisão matemática da geometria.

3 GRANDEZAS FÍSICAS
Uma vez que a física trata de fenômenos naturais e do estudo de como
tais fenômenos ocorrem, é necessário também definir aquilo que chamaremos de
grandezas físicas. Aqui, essas grandezas serão as quantidades que pretendemos
quantificar. Você vai perceber que dois conceitos andarão de mãos dadas daqui
em diante: o primeiro é o próprio conceito de grandezas físicas e o segundo o de
unidades de medidas.

Embora talvez você ainda não tenha tido contado com uma formalização
do tema, perceba que já faz uso desses conceitos desde que nasceu, por exemplo,
a posição de uma bola de tênis, arremessada no espaço, a velocidade com que
ela se move e sua aceleração são grandezas físicas e cada uma delas é mensurada
através de uma unidade de medida particular. A simples atuação, durante uma
brincadeira escolar na infância ou durante uma prática esportiva no fim de
semana já nos mune do senso comum a respeito do tema. Entretanto, todos esses
conceitos serão abordados com calma e aprofundamento mais adiante, mas você
já os conhece há muito tempo.

Faremos aqui uma pequena consideração a respeito dos dois tipos de


grandezas: as grandezas físicas escalares e vetoriais. As grandezas escalares são
as do tipo mais simples, por assim dizer. O tempo t de voo entre duas localidades,
a massa m de uma pessoa e a temperatura T em um determinado ambiente são
exemplos desse tipo de grandeza. Essas quantidades ficam completamente descritas
pela informação numérica que as define e nenhum outro tipo de informação é
necessário para um perfeito entendimento da medição. As grandezas vetoriais são
um pouco mais complexas, é necessário complementar seu valor quantificador
com mais informações, sobre sua direção e sentido. Veremos mais adiante que
estas tratam de vetores, em sua concepção matemática, e que seu valor numérico
corresponderá ao módulo do vetor, seu comprimento propriamente dito. Essa
complementação fará sentido físico quando falarmos em posição r, deslocamento
∆r, velocidade v e aceleração a, que são exemplos de grandezas vetoriais.

8
TÓPICO 1 | INTRODUÇÃO À FÍSICA

FIGURA 3 – DAVI E GOLIAS, POR OSMAR SCHINDLER, 1888

FONTE: Disponível em: <goo.gl/ojm7RW>. Acesso em: 9 mar. 2018.

Para um olhar mais avizinhado às nossas percepções de mundo, observe a


Figura 3, vemos uma litografia do pintor alemão Osmar Schindler (1867-1927), que
retrata a batalha bíblica entre Davi e Golias. Segundo a crença religiosa, Golias,
um gigante guerreiro, foi morto por um jovem pastor de ovelhas chamado Davi,
que viria a se tornar o rei dos Judeus. Simbolismos religiosos à parte, a observação
da obra é um bom exercício para o entendimento do conceito de vetores.

A Figura 4 apresenta uma descrição visual do que queremos discutir.


Note que ao girar a atiradeira, na figura representada por uma faixa de pano com
uma pedra na extremidade, Davi altera, a cada momento, tanto o vetor posição
da pedra r em relação a sua própria posição, à esquerda, como também altera
o vetor velocidade da mesma v, mostrado à direita. Há outros vetores ainda
contidos nessa visualização, como a aceleração a, definida pela variação temporal
do vetor velocidade e outras forças, que abordaremos mais tarde. Note que, para
criar uma identidade com a notação aplicada às intervenções gráficas, podemos
manter no texto o uso da notação em negrito, para os vetores.

9
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

FIGURA 4 – VETORES DE POSIÇÃO E VELOCIDADE DA PEDRA QUE DAVID ARREMESSA EM


GOLIAS, EM RELAÇÃO A SUA PRÓPRIA POSIÇÃO

FONTE: Disponível em: <goo.gl/ojm7RW>. Acesso em: 9 mar. 2018.

A morte de Golias se dá também por uma característica muito interessante


do movimento da pedra, no momento em que Davi solta a faixa, a pedra é ejetada
de sua trajetória circular, em um movimento retilíneo, até a testa do gigante.
Vamos agora seguir para a discussão de como mensuramos tais grandezas. Como
criamos nossos instintivos padrões de comparação entre lento e rápido, leve e
pesado ou perto e longe?


Uma vez estabelecido o conceito de grandezas físicas, faz sentido


quantificar os valores associados a essas grandezas, para tal feito é importante
levar em conta que o estabelecimento dessa quantificação necessita da criação de
parâmetros de comparação. Você também já está habituado a essa quantificação.
Por exemplo, quando percebeu que corria mais rápido, ou mais devagar, que um
colega na escola, já estava fazendo uso desses padrões de medida. Do mesmo
modo, quando queremos evidenciar que um parque é grande, costumeiramente
o comparamos com um determinado número de campos de futebol, uma
padronização bastante difundida pela mídia. Assim, isso também se passa com a
física, para o tratamento de grandezas físicas estabelecemos aquilo que chamamos
de unidades de medidas. Tenha em mente, então, que é impossível medir ou
quantificar uma grandeza física a menos que essa quantificação seja determinada
por um parâmetro de comparação. Em síntese, podemos dizer que as unidades
de medida desempenharão esse papel comparativo.

10
TÓPICO 1 | INTRODUÇÃO À FÍSICA

4 SISTEMAS DE UNIDADES DE MEDIDA


Para que o comércio entre as nações funcionasse a todo vapor, e mais tarde
para que o trabalho científico pudesse ser reconhecido e reproduzido em diferentes
partes do mundo, foi necessária uma unificação das unidades de medidas, que
definem as grandezas físicas. Tal decisão tinha como intenção a padronização
dessas unidades. Para isso foi necessário criar padrões de comparação, assim
como os campos de futebol usados para avaliar o tamanho de um parque, como
vimos no exemplo anterior.

Logo após o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1948, durante a 9ª


Conferência Geral de Pesos e Medidas (CGPM), o Comitê Internacional de Pesos e
Medidas foi incumbido de desenvolver o chamado Sistema Prático de Unidades e
Medidas. Para cada uma das grandezas básicas discutidas anteriormente, propôs-
se um objeto de comparação, ou um experimento que permitisse o cálculo direto
ou indireto de tal unidade. Foi também nessa conferência em que se decidiu que
as unidades de medida seriam representadas pelas respectivas primeiras letras,
minúsculas, dos nomes das grandezas, exceto no caso de derivações de nomes
próprios, devendo, então, serem escritas em letra maiúscula. Em 1960, durante a
11ª CGPM, realizada na França, o Sistema Prático de Unidades foi sancionado sob
a denominação de Sistema Internacional de Unidades (SI).

Por fim, na 14ª CGPM, realizada em 1971, definiram-se as sete grandezas


fundamentais, juntamente com suas unidades, que compõem o SI. A posição/
deslocamento, medida em metro (m); a massa, medida em quilograma (kg); o
tempo, aferido em segundo (s); a corrente elétrica, determinada em ampère (A);
a temperatura, medida em kelvin (K); a quantidade de matéria, relacionada à
contagem de elementos que compõem um sistema, cuja unidade é o mol (mol);
e por fim, a intensidade luminosa, mensurada em candela (cd). Todas essas
informações podem ser verificadas no Quadro 1.

QUADRO 1 – GRANDEZAS FÍSICAS FUNDAMENTAIS, SUAS UNIDADES E SÍMBOLOS NO SI


Grandeza Unidade Símbolo
Posição/deslocamento Metro m
Tempo Segundo s
Massa Quilograma kg
Corrente elétrica Ampère A
Temperatura Kelvin K
Quantidade de matéria Mol mol
Intensidade luminosa Candela cd
FONTE: O autor

11
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

É importante ressaltar que, mesmo atualmente, o SI não é único sistema de


medidas utilizado, não sendo adotado em alguns países, como Mianmar, Libéria e
Estados Unidos da América. Uma das razões para o SI não ter pegado nos Estados
Unidos pode ter sido pela resistência dos industriais em realizar a monumental
tarefa de recalibrar todas as máquinas na cadeia de produção, uma vez que o
país já era largamente industrializado no momento da unificação das unidades.
Os americanos já possuíam um maquinário extenso e não seria financeiramente
viável. Alterar o padrão de medida que as pessoas estão acostumadas a tomar
como comparação deve ser bastante complicado, você sabe disso. Faça o teste, tente
calcular a área do seu apartamento em pés quadrados. Conjecture mentalmente
a largura de um armário em polegadas, ou quantos galões de gasolina cabem no
tanque do seu carro. Mesmo assim, hoje em dia muitos medidores modernos já
trazem marcadores para os dois sistemas, talvez aos poucos o SI passe a se tornar
o sistema dominante por lá. O Sistema Imperial Britânico de Medidas é o maior
concorrente do SI e o mais utilizado no dia a dia dos países anglófonos, por razões
óbvias. Esse sistema também estabelece as mesmas sete grandezas fundamentais
que vimos anteriormente, mas adota unidades diferentes para cada uma delas.
Por exemplo, o pé (ft), para o comprimento, o segundo (s), para o tempo e a libra
(lb), para a massa.

De fato essas grandezas, posição, massa e tempo, serão as mais


importantes que consideraremos aqui, no campo da mecânica. Há uma razão
para essa especial atenção. Como seria possível descrever eventos consecutivos
sem as noções de quando e onde? O tempo e o espaço nos dão o referencial para
descrever o movimento de um corpo, ou melhor, de uma massa, já que, quando
uma partícula, de determinada massa, altera sua posição no espaço, faz isso
através de uma sucessão temporal de eventos. Concluímos então que essas três
grandezas são um tripé essencial em nossa descrição e entendimento do mundo.
Como introduzido anteriormente, vamos agora discutir os conceitos de espaço,
tempo e massa.


O espaço é um conceito que se apresenta bastante claro para nós, pelo


menos aquele na escala cotidiana, com as dimensões de nosso planeta. Se
compararmos objetos de diferentes tamanhos, como as imagens clássicas do
átomo e suas módicas dimensões, e a imensidão do sistema solar, teremos uma
ideia do vasto espectro de ordens de grandeza. Nós vivemos na escala 10º m, e,
portanto, nosso padrão de comparação no SI para o espaço é o metro.

Hoje em dia ele é medido como o comprimento do percurso percorrido


pela luz, no vácuo, em um intervalo de tempo correspondente à fração de
1
de um segundo (29). Essa razão está associada à velocidade da luz
299792458
no vácuo, cujo valor é da ordem de c= 299792458 m/s ≈ 3 × 108 m/s. A Figura 5
apresenta o protótipo utilizado para a padronização do metro, até a década de
1960, uma liga de platina e irídio.

12
TÓPICO 1 | INTRODUÇÃO À FÍSICA

FIGURA 4 – O PROTÓTIPO INTERNACIONAL DO METRO

FONTE: Disponível em: <goo.gl/3mZNkz>. Acesso em: 9 mar. 2018.

O conceito de tempo parece algo mais subjetivo, talvez heurístico. Todos


reconhecemos sua existência, mas temos alguma dificuldade em defini-lo. Einstein
disse que a diferença entre o presente, o passado e o futuro é meramente uma ilusão.
Talvez ele estivesse se referindo às suas próprias ideias de relativização de nossa
percepção do tempo. Afinal uma hora esperando na fila do banco sempre parece
durar muito mais que o mesmo período sentado à mesa de um bar, divertindo-se
com seus amigos. Daí nossa dificuldade natural em conceituar o que é o tempo.
O tempo é, no fim das contas, uma invenção humana, uma forma de ordenar
fatos e acontecimentos de modo a obter pelo menos a ilusão de controle. Pense
por um momento, muitas vezes quando pensamos em tempo, associamos um
acontecimento de nossa memória, do qual queremos nos lembrar, a outros fatos,
como uma forma de estabelecer um referencial temporal. A marcação do tempo
faz então menção a uma sequência sucessiva, eventualmente periódica, de fatos
catalogados, como o movimento dos ponteiros do relógio. Talvez a forma mais
primordial que o homem adotou como "...sequência sucessiva, eventualmente
periódica, de fatos catalogados ..." tenha sido o nascer e o pôr do Sol. O homem
começou a contar o número de ciclos. Talvez tenha delimitado o ciclo em seu início
quando o astro aparece e, em seu fim, quando ele desaparece no horizonte. Então
a percepção de dois eventos consecutivos nos dá uma referência temporal. Dessa
forma, saber o que é o tempo pode ser menos importante, em termos práticos, do
que saber o que é um intervalo de tempo. Assim, podemos definir uma unidade
para o intervalo de tempo que decorre entre eventos consecutivos. Para o SI essa
unidade é o segundo (s), definido como a duração de 9192631770 períodos da
radiação correspondente à transição entre dois níveis do estado fundamental do
átomo do césio 133.

13
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

FIGURA 5 – O PROTÓTIPO INTERNACIONAL DO QUILOGRAMA

FONTE: Disponível em: <goo.gl/3mZNkz>. Acesso em: 9 mar. 2018.

A massa é a grandeza física associada à inércia dos corpos, ou seja, à


resistência associada à alteração do estado de movimento de um corpo, e sua
unidade no SI é o quilograma (kg). O quilograma foi, até o fim de 2017, definido
pelo protótipo internacional do quilograma, um objeto cilíndrico, feito de uma
liga de irídio e platina com massa igual a de um litro de água pura, destilada.
Esse cilindro está guardado em um ambiente evacuado, desde 1889, no Escritório
Internacional de Pesos e Medidas, do francês Bureau International de Poids et.
Mesures (BIPM), na cidade de Sèvres, na França. Na Figura 6 pode-se ver a peça
cilíndrica que representa o protótipo, guardado em duas câmaras, uma dentro da
outra, sob vácuo. Esse foi o método escolhido para determinar o quilograma até
o fim de 2017, porque depois disso ele, assim como o metro, passou a ser medido
em termos de uma constante fundamental da natureza. O principal motivo
dessa alteração é que o cilindro, guardado na França, não tem mais a massa de
um quilograma e isso preocupa bastante os metrologistas. Na prática, o que se
passa é que a manipulação do cilindro, para limpeza, e a evaporação do material
tornaram o cilindro mais leve em níveis de precisão altíssimos, muito além da
precisão a que estamos acostumados em nosso dia a dia, mas significativa em
termos da metrologia envolvida.

14
TÓPICO 1 | INTRODUÇÃO À FÍSICA

FIGURA 6 – OS PROTÓTIPOS INTERNACIONAIS DO QUILOGRAMA E DO


METRO

FONTE: Disponível em: <goo.gl/b5AJBT>. Acesso em: 9 mar. 2018.

O projeto Avogadro, organizado pela organizado pela CGPM, tem como


objetivo estabelecer uma nova forma de definir o quilograma em termos de
constantes fundamentais, através de dois experimentos interessantes. Um deles,
aperfeiçoa a balança de Watt, uma balança de dois pratos, em que em um deles
está uma massa equilibrada por uma força magnética, gerada por uma corrente
controlável. O outro experimento pretende realizar uma contagem de átomos em
uma esfera de silício puro com massa de um quilograma. Essa contagem ajuda
a calcular a constante de Avogadro, NA=6,022 x 1023 /mol, que está associada à
quantidade de partículas em um corpo de certa massa. O objetivo maior do projeto
é encontrar, por meio desses dois experimentos, valores para a constante de Planck
λ= 6,62607004 x 10-34 m2 kg/s, que descreve a relação entre a energia de um fóton e
sua frequência de vibração, que concordem entre si, com uma precisão da ordem
de um bilionésimo.

DICAS

Sugerimos a leitura do texto intitulado “Para manter o peso”, publicado na


revista FAPESP de junho de 2017. Disponível em: <https://goo.gl/CtX6KY>. A reportagem
apresenta em descrição clara todo o processo para alteração do método de medição do
quilograma, em termos agora de uma constante física.

15
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

Na Figura 7 podem-se ver, colocados lado a lado, o protótipo internacional


do quilograma, agora fora das câmaras evacuadas, e o protótipo internacional do
metro, unidade parâmetro para a distância no SI.

Como no SI é possível organizar essas unidades básicas em diferentes


agrupamentos, o sistema CGS aceita as unidades das grandezas básicas massa, em
gramas (g); tempo, em segundos (s); e comprimento, em centímetros (cm). No sistema
MKS tomamos o quilograma (kg), ou seja, a massa de uma grama (g) multiplicada
por mil como unidade para a massa. Para o comprimento consideramos o metro
(m) a unidade comparativa e também o segundo (s) para o tempo. O conceito de
unidade de medida se baseia em uma comparação entre o objeto cuja medida é
tomada e aquele usado como unidade de comparação. Medimos tudo em termos
dessas unidades que definimos para as grandezas físicas.

Agora que já discutimos os conceitos de grandezas físicas e de unidades


de medida, podemos nos dedicar à descrição mais aperfeiçoada de uma das
ferramentas mais importantes para o trabalho com grandezas físicas vetoriais, o
vetor. Você verá a seguir que é necessário atentar para um conjunto de definições
e regras, antes de podermos tratar lucidamente não só as grandezas, mas também
das operações com essas grandezas vetoriais.

5 VETORES E OPERAÇÕES COM VETORES


Vamos tornar nossa atenção para um aspecto mais matemático e muito
importante, do estudo da física. O conceito de vetores é importante para o
tratamento das grandezas vetoriais, normalmente porque precisamos fazer
considerações espaciais em determinados problemas. Desse modo, vamos
começar o estudo dos vetores e de suas operações definindo o que um vetor
representa.

Um vetor é o que os matemáticos chamam de um elemento do espaço


vetorial, detentor de algumas propriedades. Sua utilidade é a de descrever
determinado objeto no espaço. Ele pode tomar algumas formas gráficas, as
mais comuns são v, com uma seta por cima, v, em negrito ou vˆ, com um acento
circunflexo por cima. Fique atento, todas elas são convenções possíveis.

Os matemáticos não estão muito interessados na descrição do que o objeto


é em realidade e por que ele se comporta como ele se comporta. A eles importa
a descrição desse objeto no espaço. Os físicos têm uma intensão diferente, e dão
uma utilização um pouco diferente para essas entidades matemáticas. Para eles,
os vetores servem como ferramentas para descrição do mundo e dos fenômenos
naturais. Interessam-nos as quantidades escalares e também qualquer grandeza
cuja descrição possa ser decomposta em diferentes direções espaciais.

Veja um exemplo. Considere que você esteja, pela primeira vez, dentro
de um escritório, à noite e em meio a um blackout. Alguém sai de uma sala e lhe

16
TÓPICO 1 | INTRODUÇÃO À FÍSICA

chama, você pergunta onde ela está e ela lhe diz que você deve testar o disjuntor,
que fica no canto próximo ao armário de metal. Como você chega lá? A posição
do armário de metal no espaço é uma grandeza vetorial, você precisaria conhecer
há quantos metros à esquerda e ao fundo ele está, e à que altura do solo. Não é
possível descrever a posição do armário com apenas uma informação. O espaço
em que vivemos é tridimensional, e grandezas vetoriais precisam carregar
informações sobre as três dimensões.

É para isso que serve um vetor, ele contém em si essas três informações,
daí aqueles que chamaremos de vetor posição, ou de vetor velocidade, ou de
vetor aceleração. Todas essas são grandezas físicas vetoriais e por isso faremos
aqui uma breve recapitulação de geometria analítica, com a definição de alguns
tópicos que nos serão de especial interesse.

A Figura a seguir, apresenta uma descrição pictórica do que chamamos de


vetor. Perceba que ainda não há um sistema de referências estabelecido, lidaremos
com isso mais adiante. Observe o vetor r, ele é representado por um segmento de
reta, com uma seta que aponta para uma determinada direção, num sentido que
pode ser estabelecido por uma simples convenção. A origem do vetor, por sua
vez, fica do lado oposto à seta.

FIGURA 7 – VETOR r

FONTE: O autor

É claro que o conceito de vetor não fica atrelado apenas às dimensões


espaciais, você pode associar vetores a grandezas cujas propriedades não sejam
relacionadas ao espaço. Em programação, por exemplo, a ideia de vetores é
aplicada à descrição de qualquer conjunto de informação que caracterizem um
objeto. Tabelas de dados, formulários de inscrição e a posição de cada dígito em
um código de identificação apresentam alguma relação com os vetores. Esse
conceito você também já deve ter utilizado em algum momento da sua vida.

17
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

FIGURA 8 – VETOR EM UM SISTEMA BIDIMENSIONAL


1

0.8

0.6

0.4

0.2

0
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1

FONTE: O autor

Vamos agora introduzir em nosso espaço vetorial um sistema de


referências. Ele serve como marco comparativo, em relação a quem vamos definir
todas as posições, velocidades, acelerações, forças ou qualquer outra grandeza
vetorial. Em princípio, então, vamos considerar o vetor v da figura acima, ele
tem uma origem, cuja posição coincide com a origem do sistema de referências
xy, tem um comprimento |v| e faz um θ com o eixo x. Note que o vetor v tem
projeções no eixo x e no eixo y dadas por:


vx = →
v cos θ (1.1)


vy = →
v sin θ

A equação (2.1) apresenta uma versão vetorial do estudo do teorema de


Pitágoras para as relações entre os lados de um triângulo retângulo. Por isso, que
podemos pensar no módulo do vetor v como o comprimento da hipotenusa do
triângulo. Assim, ele será dado por:

→
v
= vx 2 + v y 2 (1.2)

Somando as duas partes da decomposição de v podemos defini-lo como


uma combinação linear em termos do sistema de referências como:

→  → 
v= →
vx + v y
(1.3)
= vx iˆ + v y ˆj ,

18
TÓPICO 1 | INTRODUÇÃO À FÍSICA

Em que os vetores unitário î e ĵ podem ser entendidos como unidades de



→ 

medidas do vetor v em cada uma das direções x e y e com vx = vx e v y = v y
representando as duas possívels representações para os módulos dos vetores vx
e vy, respectivamente, que poderemos adotar.

Com isso em mente, lembre-se do exemplo da sala escura, durante o


blackout, a moça deveria ter dito algo como, "...o armário fica a aproximadamente
um metro de altura, uns três metros no fundo da sala, à sua direita...", isso teria
facilitado a sua tarefa. Uma vez estabelecido que algumas grandezas físicas
podem ser associadas a vetores, podemos pensar em algumas operações que
podem ser realizadas com essas grandezas vetoriais. A posição de um corpo no
espaço pode mudar com o tempo, a velocidade com que esse corpo se move pode
variar também, e assim por diante.
  →
A primeira operação de que vamos tratar é a da soma → s= →u +v. O
percurso realizado e a posição final de uma partícula que se move com o tempo
será dada pela soma de todos os vetores posição, o mesmo vale para a velocidade
e a aceleração, respectivamente. A figura a seguir apresenta o vetor soma s =
u + v. Perceba que a notação aplicada à figura, para os vetores, é v, são duas
notações possíveis. Voltando à Figura 10, percebe-se que a soma pode ser feita,
geometricamente, ao se aplicar a lei do paralelogramo. Você pode transladar o
vetor u da origem até a seta do vetor v, respeitando o ângulo entre os vetores, e
fazer o mesmo com o vetor v. O vetor soma s será dado pela reta que liga os dois
extremos do paralelogramo.

Em termos da definição analítica de um vetor, apresentada em função de


→ →
um sistema de referências e com o vetor u = uxî + uyĵ e o vetor v = vxî + vyĵ teríamos
algo como:

→s = →u + v→

( )
= ( u x + vx ) iˆ + u y + v y ˆj (1.4)

FIGURA 10 – SOMA DE VETORES

FONTE: O autor

19
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

A subtração geométrica de vetores, ou a soma com vetores de sinal oposto,


→ → →
também explora a lei do paralelogramo, mas aqui as duas setas e tem-se d = u – v ,uma
descrição visual pode ser vista na figura a seguir. Perceba que agora não cruzamos
mais a diagonal mais longa, mas a mais curta.

FIGURA 11 – SUBTRAÇÃO DE VETORES

FONTE: O autor

Em termos da definição analítica de um vetor, teríamos algo como:

→ → → 
( )
d = u − v = ( u x + vx ) iˆ − u y + v y ˆj
(1.5)

FIGURA 12 – MULTIPLICAÇÃO DE UM VETOR POR UM ESCALAR


v

2v
FONTE: O autor

Uma vez estabelecidos os conceitos de soma e subtração de vetores


podemos agora seguir para os produtos que os envolvem. O produto por escalar
é aquele que pode alterar tanto o módulo de um vetor, seu comprimento, ou
→ →
o sentido dele. Vamos defini-lo como p = av , em que α ∈ N. A figura (1.12)
a apresenta uma descrição geométrica de um vetor cujo comprimento foi
multiplicado por dois.

20
TÓPICO 1 | INTRODUÇÃO À FÍSICA

O produto escalar entre dois vetores é definido como a projeção de um


vetor sobre o outro, desse modo vamos definir:


u ⋅→
  → →
v=u v cosθ (1.6)

Compare a equação (1.6) com o gráfico da figura a seguir e perceba o


ângulo θ entre os vetores u e v. Perceba também quanto o vetor u é projetado no
vetor v.

FIGURA 13 – PRODUTO ESCALAR ENTRE VETORES

FONTE: O autor

O produto vetorial entre dois vetores v e u gerará um vetor que é


perpendicular ao plano formado por esses dois vetores. Observe a equação a seguir:

 iˆ ˆj kˆ 

 →   
u × v =u  x uy uz  (1.7)
 
 vx vy vz 

( ) ( )
= u y ⋅ vz iˆ + ( u z ⋅ vx ) ˆj + u x ⋅ v y kˆ

( ) ( )
− u z ⋅ v yz iˆ − ( u x ⋅ vz ) ˆj − u y ⋅ vx kˆ

Note como a sequência î → ĵ → k� nunca é quebrada na primeira linha da


equação (1.7). Todos os termos são compostos pelo produto de duas decomposições
do vetor v, em uma determinada direção que não coincide com nenhuma daquelas
decomposições, de modo que a sequência acima é sempre mantida. Apenas na
segunda linha; que no caso de um vetor unitário, é o negativo da primeira, apresenta
termos que quebram essa sequência. Na segunda linha a sequência tem o sentido
inverso, por isso o sinal negativo. Ela tem a forma î ← ĵ ← k.O � resultado dessa

21
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

contagem de termos em cada uma das três direções origina um vetor resultante
→ →
u x v. Esse vetor tem a particularidade de ser perpendicular ao plano formado
→ →
pelos vetores u e v. Em uma representação escalar, podemos dizer que o módulo
→ → → →
|u x v| do vetor resultante do produto vetorial dos vetores u e v é dado da seguinte
forma:

FIGURA 14 – PRODUTO VETORIAL ENTRE VETORES

FONTE: O autor

Comparando a equação (1.8) com o gráfico da Figura 14 podemos perceber


→ → → → →
o ângulo θ entre os vetores u e v. Podemos também perceber que o vetor p = u x v
é perpendicular tanto aos vetores u e v quanto ao plano formado por eles.


 → → →
u ×v =u v sin θ (1.8)

DICAS

Para uma dedução mais detalhada da equação (1.8) e um aprofundamento nos


tópicos de geometria analítica e álgebra linear, sugerimos o estudo das obras ”Geometria
analítica” e “Álgebra linear”:

STEINBRUCH, A. WINTERLE, P. Geometria analítica. São Paulo: Pearson Makron books, 1987.
STEINBRUCH, A. WINTERLE, P. Álgebra linear. São Paulo: Pearson Makron books, 1987.

Comparando o produto escalar e o produto vetorial, notam-se vetores


π
perpendiculares que têm produto escalar nulo, uma vez que cos = 0 , o que
2
significa que não há nenhuma projeção envolvida. Nota-se também que dois
vetores colineares têm produto vetorial nulo, uma vez que sin 0 = 0, o que era de
se esperar, uma vez que eles não formam um plano, perpendicular ao qual um
novo vetor poderia ser gerado.
22
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• Até aqui vimos como a física se organiza em termos qualitativos, uma vez que
organizamos as grandezas em escalares, vetoriais e quantitativos, uma vez que
realizamos medições padronizadas pelas unidades de medida que definimos
até o momento.

• Começamos definindo as grandezas em dois tipos, escalares e vetoriais,


e especificamos que a diferença está associada à descrição de diferentes
grandezas.

• A posição de um corpo é uma grandeza escalar, assim como a velocidade


com que ele se desloca e a aceleração com que sua velocidade varia. O corpo
pode realizar diferentes tipos de movimentos, em cada uma das três direções
espaciais em que estamos imersos.

• Uma vez estabelecidos os dois conceitos de grandezas físicas, introduzimos


a ideia de unidade, que é um parâmetro comparativo, em relação ao qual
mensuramos uma grandeza. Um quilograma de feijão representa uma massa
comparativamente idêntica à massa de um cilindro composto de uma liga de
irídio e platina, guardado no escritório internacional de pesos e medidas, na
França.

• Fizemos uma descrição geométrica das grandezas vetoriais através da revisão


do conceito de vetores.

• Trabalhamos com algumas operações matemáticas com vetores, principalmente


com o intuito de prepará-lo para o próximo tópico, em que estudaremos o
movimento de um corpo no espaço.

23
AUTOATIVIDADE

1 As unidades de medida representam padrões de comparação que criamos


para conceber uma quantidade, em um processo de medição de uma
grandeza física. Relacione as grandezas físicas e suas unidades de medida:

(a ) Massa.

(b ) Comprimento.

(c ) Tempo.

( ) Usado para distinguir posições relativas e afastamentos no espaço.
( ) Quantidade associada à inércia dos corpos em movimento.
( ) Associado ao conceito de entropia, estrutura a distribuição de eventos
sucessivos.

2 Recordando nossa discussão anterior, a respeito do metro, considere as


seguintes afirmações e classifique-as como Verdadeira (V) ou falsa (F):

a) ( ) Representa o comprimento do percurso de um raio de luz, no vácuo, em


(1/3×10⁸) segundos. 

b) ( ) É representado por um protótipo específico, objeto de comparação. 

c) ( ) É definido em termos da constante de Planck. 


3 Recordando nossa discussão anterior, a respeito do(s) segundo(s), considere


as seguintes afirmações e classifique-as como Verdadeira (V) ou falsa (F):

a) ( ) Definido como o tempo necessário para um feixe de luz cruzar a distância


de um metro. 

b) ( ) Unidade utilizada para a catalogação de eventos periódicos sucessivos. 

c) ( ) Definido como a duração de um número astronômico de eventos
consecutivos no átomo de césio 133. 


4 Recordando nossa discussão anterior, a respeito do quilograma, considere as


seguintes afirmações e classifique-as como Verdadeira (V) ou falsa (F):

a) ( ) O quilograma correspondia à massa de um litro de água destilada. 



b) ( ) Será substituído em breve por um objeto cilíndrico, feito de uma liga de
irídio e adamantium. 

c) ( ) Foi concebido com a intensão de unificar sistemas de medidas diversos,
provenientes de outras culturas. 


5 Considere os vetores →
 
v =1iˆ + 2 ˆj + 3kˆ e u→ = 3 iˆ + 2 ˆj +1kˆ e calcule:
→ →
a) |v| e |u|
→ →
b) v + u

24
→ →
c) v - u
→ →
d) v . u 

→ →
e) v x u

6 Imagine que um campo de futebol americano tenha as medidas de 0,030 mi


de largura e 0,056 mi de comprimento. Imagine também que um campo de
futebol (aquele que jogamos no Brasil) tenha as medidas de 0,07 km de largura
e 0,10 km de comprimento. Compare as áreas dos dois campos e apresente a
relação entre eles.

u→ u x iˆ + u y ˆj e →

7 Calcule o produto vetorial entre os vetores= v = vx iˆ.

25
26
UNIDADE 1
TÓPICO 2

CINEMÁTICA UNIDIMENSIONAL

1 INTRODUÇÃO
Vamos agora discutir o movimento dos corpos, descrevendo-os sob a ótica
do tratamento matemático. Vamos emprestar o conceito matemático de taxa de
variação e empregá-lo na discussão da taxa de variação temporal da posição de
um corpo no espaço. Como nossa intensão, no momento, é discutir os conceitos,
vamos nos ater ao caso unidimensional, isso evitará confusões desnecessárias.
Mais adiante introduziremos novas dimensões e você já estará familiarizado com
a teoria, podendo se concentrar apenas na extrapolação espacial.

2 VELOCIDADE MÉDIA E INSTANTÂNEA


Uma vez que balizamos nosso conceito comum de tempo em termos de
um intervalo de tempo, a ideia de movimento se tornou muito intrigante para
nós, pois ela conecta tempo e espaço, através da variação de um em função do
outro, do espaço em função do tempo, mais especificamente.

Galileu foi o primeiro a estudar o movimento dos corpos. Mas com o


interesse pelo movimento dos corpos, é preciso saber contar o tempo, estabelecer
um padrão periódico, para poder contá-lo. O Sol nasce todas as manhãs e se põe
todas as tardes. Esse intervalo repetitivo virou o dia. E dentro desse intervalo
muitas coisas acontecem, padrões comparativos que ocorrem em intervalos
menores de tempo precisavam ser adotados. A ampulheta, o relógio à corda, o
digital, o atômico. Você entendeu a ideia.

Voltando a Galilei, ele estudou o rolar lento de esferas de metal através


de um trilho levemente curvado. Para alongar os intervalos de tempo. E como
ainda não confiava em métodos externos, usou o batimento do próprio coração
para medi-los. A esfera de metal levava tantos batimentos para chegar ao fim
do trilho. Ele foi o primeiro a perceber que a relação entre espaço percorrido
pela esfera metálica e o tempo que ela levou para isso era quadrática. Alguns
eventos demoravam para ocorrer, outros eram muito mais curtos. Há diversas
formas de como essa relação entre espaço e tempo pode se dar, mas o conceito de
movimento relaciona todas elas.

27
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

A cinemática fará uso de uma área muito importante da matemática,


conhecida como cálculo diferencial e integral. Essa área da matemática trata
das taxas de variação de uma grandeza em relação à outra e também das somas
infinitesimais, cálculos de áreas debaixo de curvas de funções e estudo de
funções. Você já deve estar familiarizado aos conceitos do cálculo a essa altura,
mas tentaremos aqui manter clara essa relação entre a física e sua aplicação da
matemática. Muito bem, a cinemática tem origem no termo grego para movimento
e é do movimento de pontos espaciais e corpos que ela trata. Como você viu
anteriormente, é possível determinar a posição de um corpo no espaço, visto que
tenhamos um ponto, ou sistema de referências. Lembramos que focaremos em
apenas uma direção, pensaremos aqui em termos de uma reta.

3 VELOCIDADE MÉDIA E INSTANTÂNEA


Como estamos interessados no movimento de um corpo ao longo dessa
reta, se esse corpo mover sua posição variará ao longo da reta e ele levará algum
tempo para fazer isso, essa taxa de variação da posição do corpo ao longo da reta
é o que definiremos como velocidade média:

=v
(=x − x0 ) ∆x
(1.9)
( t − t0 ) ∆t

Aqui, o termo ∆ é o que representa a variação e a razão entre as duas


variações representa a taxa dessa variação. Por extenso esse símbolo significa a
diferença entre o valor final e inicial da grandeza estudada, para a posição isso é
∆x = (x − x0), para o tempo que se passou nessa transição, ∆t = (t − t0).

O conceito de ∆t se aplica a diferenças mensuráveis de tempo, mas


também temos interesse em estudar variações instantâneas no comportamento
dos corpos. Se esse ∆t tender a valores muito pequenos? Com que taxa de variação
da posição com o tempo nos movemos quando levamos um susto? Para isso,
vamos aplicar aqui o conceito de limites, muito importante para o cálculo e de
aplicação pertinente aqui, escreveremos:

∆x d
=v lim
= x (1.10)
∆t →0 ∆t dt

Essa será a definição da velocidade instantânea, como se comporta um


corpo imediatamente após o início do movimento. Note como agora a notação
muda de ∆ para d, essa é a simbologia matemática para o drástico apequenamento
da variação temporal da posição. A velocidade instantânea emerge da aplicação
prática da ideia de limite à variação temporal. Fique atento, vamos utilizar muito
esse conceito, ele é importante e deve ser discutido em sala de aula. Como possível
fonte de inspiração.

28
TÓPICO 2 | CINEMÁTICA UNIDIMENSIONAL

DICAS

Gostaríamos de sugerir aqui a leitura do trabalho intitulado: “Velocidades média


e instantânea no Ensino Médio: uma possível abordagem”. Disponível em: <https://goo.gl/
ytrr5U>, de Souza, P. V. S.; Donangelo R., 2012), que propõem uma abordagem interessante
para o tema. Em sua proposta os autores tentam expor o distanciamento entre o conteúdo
escolar e o cotidiano do estudante e promover a ação inversa. Os autores propõem métodos
investigativos de aprendizagem, explorando objetos acessíveis ao aluno e a eles mesmos.
Eles, por exemplo, tratam o tema da velocidade média através do uso de um automóvel em
miniatura e discutem uma possível relação entre a escala do brinquedo e a velocidade média
que o mesmo atingiria, se fosse funcional. Seria essa uma velocidade média também em
escala com a do automóvel original? Eis aqui um interessante tema de investigação.

4 MOVIMENTO RETILÍNEO UNIFORME (MRU)


Seguindo a sequência de eventos descrita nas subseções anteriores, vamos
estudar um pouco mais a fundo o movimento unidimensional de um corpo.
Suponha que o corpo se mova com uma velocidade constante v. Considerando
a equação (2.10), percebemos que ela representa a taxa de variação da posição
com o tempo. A operação de derivação está associada à taxa de variação de uma
função, e sua operação inversa, a integração à soma de termos infinitesimalmente
pequenos. Vamos reescrever a equação (2.10) de modo a estudar o efeito da
integração em seus termos:

vdt = dx (1.11)

Realizando a integração dos dois lados da função teremos uma expressão


para a posição x em função do tempo t, ou:

x t

∫dx = ∫v dt
x0 t0
(1.12)

x + x0 = v ( t − t0 )

x ( t ) + x ( t0 ) =
v∆t

Optando pela notação x(t0) = x0, poderemos então escrever a posição de


um corpo em função do tempo como:

x ( t ) + x0 =∆
v t (1.13)

29
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

Para o caso em que t0 = 0, teremos:

x ( t ) + x0 =
vt
(1.14)

Aí está, então, a função posição de um corpo em movimento retilíneo


uniforme e a figura a seguir, apresenta a função posição de um corpo que segue
em movimento retilíneo uniforme, ou seja, a velocidade constante. A curva preta
apresenta o deslocamento de um corpo que inicialmente se encontrava na origem
do sistema de referências, na curva azul o corpo já mantinha uma posição inicial
não nula. Para as curvas azul e vermelha, a partícula se move a uma taxa de um
metro por segundo, a partícula cujo deslocamento é regido pela linha verde se
move a uma taxa duas vezes maior. Compare as retas azul e verde e perceba
como a inclinação aumenta com a velocidade. Isso fica bem claro, uma vez que as
duas retas partem da mesma posição de origem.

FIGURA 15 – FUNÇÃO HORÁRIA DA POSIÇÃO NO MRU


4

3.5

2.5
x (t) (m)

1.5

0.5

0
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1
t (s)

FONTE: O autor


Note a semelhança entre a equação (1.14) e aquela para a equação da reta,


dada por:

y= a + bx (1.15)

Em que a é o coeficiente linear, b é o coeficiente angular e x é a variável


∆y
independente. Lembre-se de que a é o valor de y quando x = 0 e que b =
representa a taxa de variação. ∆x


 ∆x Até aqui nosso corpo se move com velocidade constante, mas essa
velocidade pode variar.

30
TÓPICO 2 | CINEMÁTICA UNIDIMENSIONAL

Como ainda manteremos um movimento em apenas uma direção, apenas


variações no sentido e no módulo serão considerados.

5 ACELERAÇÃO MÉDIA E INSTANTÂNEA


Eventualmente é possível que a taxa com que o corpo muda de posição
com o tempo também varie, ou seja, a velocidade com a qual a partícula se move,
pode aumentar ou diminuir. Se a velocidade representa a taxa de variação da
posição com o tempo, podemos supor que a taxa de variação da velocidade com
o tempo será a aceleração do veículo. Exatamente, definiremos assim a aceleração
média de um corpo:

=a
(=v − v0 ) ∆v
(1.16)
( t − t0 ) ∆t

Novamente aqui podemos especular sobre a alteração instantânea da


velocidade, ao tomarmos o limite de um tempo muito pequeno, teremos:

∆v d
=a lim
= v (1.17)
∆t →0 ∆t dt

E assim definiremos a aceleração instantânea de um corpo cuja velocidade


varia com o tempo. Perceba que como a aceleração representa a taxa de variação da
velocidade com o tempo, sua unidade de medida é o [a] = (m/s)/s, ou também [a] =
(m/s2). Note também que a aceleração representa a segunda derivada da posição:

dd 
a=  x (1.18)
dt  dt 

É interessante como aplicamos a interpretação matemática ao mundo ao


nosso redor. Você deve se manter atento não só para os fenômenos naturais, como
também para as novas tecnologias que surgem, no dia a dia. Não apenas porque
elas nos apresentam novas formas de aplicação dos fenômenos naturais, como
o eletromagnetismo das televisões modernas, a hidrodinâmica em algumas das
fontes energéticas ou dinâmica dos fluidos, presente nos componentes hidráulicos
do maquinário das indústrias. Você também pode tirar proveito dessa tecnologia
ao apresentá-la ou fazer uso dela, como ferramenta didática.

31
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

DICAS

Com isso em mente, gostaríamos de sugerir a leitura do trabalho intitulado


“Medindo a aceleração de um elevador”. Disponível em: <https://goo.gl/8w6VJm>, de Franco,
Marranghello e Rocha, 2016). Nele, os autores sugerem um experimento interessante a
respeito do conceito de aceleração. Utilizando um tablet e softwares livres para a medição
de dados, eles propõem uma prática de baixo custo para um exercício prático de ensino de
física.

6 MOVIMENTO RETILÍNEO UNIFORMEMENTE VARIADO


(MRUV)
Após um breve momento para a definição do conceito de aceleração,
vamos nos atentar à aplicação desse conceito no movimento de uma partícula
sobre a reta.

Considerando a equação (2.17), percebemos que ela representa a taxa de


variação da velocidade com o tempo. Vamos novamente aplicar o conceito de
integral aos dois lados dessa equação e estudar como ela se comporta.

d
a= v; (1.19)
dt
adt = dv;
t v


t0

adt = dv
v0

v ( t ) − v0 = a ( t − t0 )

v ( t ) = v0 + a∆t .

Para o caso em que t0 = 0, teremos:

v ( t=
) v0 + at (1.20)

O mesmo tratamento dispensado à Figura 15 é agora concedido ao


corpo que segue em movimento retilíneo uniformemente variado. A Figura 16
apresenta duas curvas, uma preta para um corpo que partiu do repouso, e uma
azul, para um corpo que já se movia com uma velocidade inicial, no momento em
que começam a contar o tempo.

32
TÓPICO 2 | CINEMÁTICA UNIDIMENSIONAL

Compare as Figuras 15 e 16 e perceba que, a despeito de se tratarem de


duas grandezas vetoriais distintas, seu comportamento é matematicamente o
mesmo. São duas expressões, de tipo semelhantes à equação da reta (2.14). O
MRU guarda uma relação linear com a passagem do tempo.

FIGURA 16 – FUNÇÃO HORÁRIA DA VELOCIDADE NO MRUV


4

3.5

2.5
v(t) (m/s)

1.5

0.5

0
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1
t (s)

FONTE: O autor

É possível também, escrever a expressão para a posição em função do tempo.


É preciso considerar novamente a equação (2.17), ela define a velocidade como a
taxa de variação da posição com o tempo, mas com a operação inversa à derivação é
possível calcular a expressão para a posição em função do tempo, fazendo:

dx = vdt;
(1.21)
x t

∫dx = ∫vdt
x0 t0

Aplicando na equação (2.21), a equação (2.20), teremos uma nova equação


integral, dada por:

d
v= x; (1.22)
dt
dx = vdt;
x t


x0
dx = vdt ∫
t0

t
x ( t ) − x0= ∫ v 0 + at  dt
t0

1
x ( t ) = v0 ( t − t0 ) + a ( t − t0 )
2

33
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

Uma vez que v0 representa a velocidade inicial do veículo, que pode


ser nula ou uma constante positiva ou negativa, e que a aceleração a é também
constante, elas podem ser removidas da integração. Para o caso de t0 = 0, teremos:

FIGURA 17 – FUNÇÃO HORÁRIA DA POSIÇÃO NO MRUV


3.5

2.5

2
x (t) (m)

1.5

0.5

0
0 0.5 1 1.5 2
t (s)

FONTE: O autor

A figura acima apresenta a função horária para a posição apresentada pela


equação (1.22), ela mostra como se dá o comportamento da posição uma partícula,
que se move sob a ação e uma aceleração, em função do tempo. Discutiremos mais
adiante essa discussão quando tratarmos o lançamento oblíquo de corpos. Aqui
você pode ter uma noção do comportamento parabólico de uma partícula sob
tais circunstâncias, a linha tracejada e com pontos (vermelha) mostra um corpo
que parte da origem. Já as linhas tracejadas (azul) e sólida (verde) partem de uma
posição inicial diferente de zero. Além disso a maior inclinação da linha sólida se
deve à duplicação da aceleração à que o corpo está submetido.

Esse resultado também pode ser alcançado pela dupla integração direta
da equação (1.18), o que é, indireta e exatamente o que acabamos de fazer. Ou
seja, para uma partícula que prossiga em um movimento retilíneo uniformemente
variado, sua posição se altera quadraticamente com o tempo, mais ou menos
como o resultado que Galileu obteve para uma esfera que descia um trilho curvo,
com a aceleração da gravidade.

1
x ( t ) = x0 + v0t + at 2 (1.23)
2

Voltando à equação (1.23), perceba como ela guarda uma relação íntima
com a equação da parábola, definida pela relação:

y = ax 2 + bx + c (1.24)
34
TÓPICO 2 | CINEMÁTICA UNIDIMENSIONAL

Vamos agora tratar de um assunto bastante importante para o


desenvolvimento do conteúdo a seguir. Falaremos sobre o que ocorre quando
um corpo é deixado cair em um campo gravitacional uniforme, sob a aceleração
da gravidade g. Vamos discutir os efeitos dessa suposição e demonstrar como ela,
em breve, será importante para o estabelecimento de conceitos mais complexos,
como o da conservação de energia.

7 QUEDA LIVRE
O movimento de queda livra é bastante interessante, pois demonstra
a aceleração dos corpos, quando submetidos a uma queda, a partir de uma
velocidade inicial nula. A partir daqui, sempre que tratarmos do movimento de
um corpo no espaço, faremos menção a uma aceleração em particular, a aceleração
da gravidade g. Fundamental na teoria de Newton, ela será a responsável por
fazer maçãs caírem na cabeça das pessoas, rolarem ladeira abaixo ou evitarem que
folhas de papel voem com o vento. Interessante como a maçã é figura marcante
em dois ramos tão distintos do pensamento humano.

A queda livre dos corpos foi um dos temas mais abordados por Galileu, o
famoso experimento da que de dois corpos, um mais pesado que o outro, tentava
demonstrar que a velocidade de queda de dois corpos não depende das massas
deles. Isso quer dizer que se largados ambos à mesma velocidade inicial, nula,
por exemplo, seus tempos de queda não seriam influenciados pela massa de seus
corpos. Era um pensamento arrojado para a época, não é muito intuitivo, para
falar a verdade.

Ainda há mais uma forma de se estudar o movimento retilíneo


uniformemente variado. Considere a equação (1.16), dela podemos mostrar a
relação:

v(t) − v
( t − t0 ) = a 0 (1.25)

Aplicando essa expressão na equação (1.22), teríamos:

2
 v ( t ) − v0  1  v ( t ) − v0 
x ( t ) − x0 v0 
=  + a  (1.26)
 a  2  a 
   

v 2 ( t ) − v02
=
2a

Ou também:

35
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

v 2 ( t ) = v02 + 2a∆x (1.27)

v 2 = v02 + 2a∆x

A equação (1.27) foi deduzida por Evangelista Torricelli (1608 -1647),


um físico italiano, formado pela Universidade La Sapienza, de Roma. Além de
contribuir para a mecânica dos corpos, Torricelli se dedicou aos estudos dos
fluidos e inventou o barômetro de mercúrio. Voltando à equação (1.27), perceba
que ela mostra que a intuição de Galilei estava correta. Observe como a equação
relaciona uma distância percorrida ∆x à velocidade v, por meio da aceleração a,
sem nenhuma referência ao tempo. É por si uma confirmação da proposição de
Galilei a respeito da queda dos corpos não depender de suas massas e que dois
corpos de massas diferentes caem com a mesma velocidade e atingem o solo ao
mesmo tempo.

Esta equação contém toda essa informação e ratifica a previsão de Galilei.


Dessa forma parece justo fazermos uma referência a esse talentoso pensador. O
retrato de Torricelli; pintado por Lorenzo Lippi, um artista e poeta florentino, é
apresentado na figura a seguir:

FIGURA 18 – EVANGELISTA TORRICELLI, POR LORENZO LIPPI, 1647

FONTE: Disponível em: <goo.gl/kNC61t>. Acesso em: 9 mar. 2018.

Gostaríamos de fazer uma estratégica referência à aceleração da gravidade,


uma vez que estamos tratando de queda de corpos. Tomando a equação (1.27),
você provavelmente se adaptará ao uso da expressão:

36
TÓPICO 2 | CINEMÁTICA UNIDIMENSIONAL

v 2 = v02 + 2 g ∆y (1.28)

Para um corpo que cai, a partir do repouso, ou seja vy,0 = 0, a velocidade


terminal tem a forma:

vy
= 2 g ∆y (1.29)

em que g = 9, 8m/s/s é a aceleração creditada à força da gravidade, que


estudaremos mais adiante e cujo valor numérico valos deduzir no momento mais
oportuno. Por sua vez, ∆y é a distância percorrida pelo objeto descendente. Nada
de massa, nada de tempo.

Torricelli foi um pensador importante para física e por vezes parece pouco
lembrado, é importante conhecer um pouco da pessoa por trás do ícone. Além da
contextualização temporal, que pode lhe ajudar a entender os conceitos sob a
ótica contemporânea ao cientista, também pode lhe servir de ferramenta futura,
na prática docente. Você pode discutir experimentos e invenções sob o prisma
das demandas tecnológicas da sociedade, por exemplo. Quais as razões que
impulsionaram o desenvolvimento de determinado campo de pesquisa, em um
determinado momento da história, em detrimento de outros campos de pesquisa?
Por que tal assunto estava em voga? Como se estabeleceu o raciocínio que levou
à solução do problema. Tudo isso faz parte da física, inserir o desenvolvimento
científico no tecido político-social da história.

DICAS

Com isso em mente, sugiro a leitura e reflexão a respeito do trabalho apresentado


em (MACÊDO, 2010), intitulado “A equação de Torricelli e o estudo do movimento retilíneo
uniformemente variado (MRUV). Disponível em: <https://goo.gl/W2Lf1X>. Ele defende o uso
da história como ferramenta de ensino de física e apresenta um resgate histórico de Torricelli
e de sua influência no estudo do MRUV. O trabalho também traz uma reflexão de como a
equação (1.27) é apresentada e discutida nas escolas.

Trabalhe outras estratégias para o ensino de física, aborde todas ao


mesmo tempo. Introduza um conceito sob viés histórico, discuta a matemática
relacionada e sua relação com a física, debata os conceitos fenomenologicamente.
Instigue a curiosidade de seu aluno, torne a física um assunto fascinante.

Muito bem, agora você conhece a lenda da queda dos corpos, da torre de
Pisa, conheceu a formalização das da ideia proposta por Galilei e desenvolvida
por Torricelli. Vamos seguir para uma rápida revisão desse e dos demais assuntos
abordados nesse tópico.
37
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• Até aqui podemos adicionar à nossa revisão inicial o conceito de movimento,


definido como a taxa de variação da posição com o tempo.

• Ainda estamos restritos à reta unidimensional, especialmente para focar


nas relações entre sucessivas grandezas e suas taxas de variação temporal
associadas.

• Encontramos expressões para a posição, a velocidade e a aceleração de uma


partícula, em função do tempo.

• Revisamos aí a relação entre a origem dessas expressões e a operação de


integração e derivação do cálculo.

• Discutimos a variação da posição com o tempo, como uma taxa de variação e


encontramos a função horária, da posição.

• Relembramos que esta horária da posição guarda uma íntima relação com a
equação da reta e por isso obtemos sucesso com a descrição do movimento
retilíneo uniforme MRU, devido à similaridade entre esta e aquelas para a
posição e suas derivadas.

• Discutimos a aceleração como a taxa de variação da velocidade e a introduzimos


ao movimento retilíneo uniformemente variado MRUV.

• Deduzimos a função horária da velocidade e mostramos como essa também se


aproxima matematicamente da equação da reta.

• Deduzimos também a função horária da posição para o MRUV, e apontamos


sua similaridade com a equação da parábola, ou do segundo grau.

• Tratamos a queda livre, um dos interesses de Galileu, e deduzimos e equação


de Torricelli, que trata de como a velocidade de um objeto, que se move com
aceleração constante, varia em função da distância percorrida.

• Mostramos como ela confirma as ideias de Galilei de que a velocidade de queda


é independente da massa do corpo que cai.

• Fique agora com algumas autoatividades para pôr em prática os cálculos e a


interpretação teórica dos fenômenos naturais que estudamos até aqui.

38
AUTOATIVIDADE

1 Imagine uma partícula que se move de acordo com a equação x(t) = 2,0 + 5,0t.
Qual é a posição inicial da partícula, qual é a sua velocidade?

2 Imagine uma partícula que se move de acordo com a equação x(t) = 2,0 + 5,0t + 10t2.
Calcule a velocidade da partícula. Calcule também a aceleração dela.

3 Imagine uma partícula que se move de acordo com a equação



( ) ( )

r ( t ) = 2 , 0iˆ + 3, 0 ˆj + 5, 0iˆ + 10 , 0 ˆj t . Qual é o vetor posição inicial r₀

da

partícula, qual o vetor velocidade v associado?

4 Imagine que um carro está em movimento em uma pista e sua posição varia
de acordo com a equação x(t) = 100 + 2t + 10t2, note que o deslocamento é
medido em metros, ou seja [x(t)] = m. Realize uma análise dimensional em
cada um dos termos da equação x(t), discutindo-os brevemente e calcule sua
posição após cada um dos primeiros 5 s de deslocamento. Calcule então a
expressão para a velocidade v(t)do carro e compare a análise dimensional de
cada termo dessa nova equação com os dos termos anteriores, calcule também
a velocidade em cada um dos primeiros 5 s após o início do deslocamento.
Por fim apresente a expressão para a aceleração a(t) do carro, assim como
a discussão da análise dimensional de cada um de seus termos e os valores
para os primeiros 5 s.

39
40
UNIDADE 1
TÓPICO 3

CINEMÁTICA BIDIMENSIONAL E TRIDIMENSIONAL

1 INTRODUÇÃO
Aqui abordaremos um tratamento geométrico na descrição do movimento
de corpos no espaço. Quando um corpo se move em uma dimensão dizemos
que ele realiza um movimento retilíneo, quando ele se move em duas dimensões
perceberemos um movimento no plano formado pelas duas direções nas quais
ele se move. Um movimento em três dimensões ocorre no espaço. O corpo sobe
e desce, vai e volta e passa pela nossa frente, ou atrás de nós. Você verá que a
discussão do movimento de um corpo, seja a velocidade constante ou com alguma
aceleração é uma generalização de tudo aquilo que já discutimos anteriormente,
para as três dimensões espaciais. Alguns termos serão acrescentados, mas no fim
você perceberá que poderá reescrever um movimento no plano ou no espaço
como dois ou três movimentos unidimensionais.

2 DESCRIÇÃO GEOMÉTRICA
Uma vez se movendo no plano, ou no espaço, precisaremos aplicar a
descrição vetorial para a posição, velocidade e aceleração do corpo. É preciso
considerar separadamente os movimentos, pois eles podem ocorrer de diferentes
formas em cada direção.



r ( t ) = x ( t ) iˆ + y ( t ) ˆj + z ( t ) kˆ (1.30)

Uma pedra lançada obliquamente realizará um movimento


uniformemente variado na direção vertical, mas pode ou não estar submetido a
uma aceleração nas outras direções, dependerá da quantidade de vento no local,
por exemplo. Então mantenha isso em mente, trataremos muitos movimentos no
plano, principalmente o lançamento de projéteis sem vento, mas isso pode variar.
Começaremos com a descrição da posição de um corpo no espaço e definiremos
o vetor posição r como função do tempo da seguinte forma:


→ d→ d d d
v ( t ) =r =x ( t ) iˆ + y ( t ) ˆj + z ( t ) kˆ (1.31)
dt dt dt dt

= vx ( t ) iˆ + v y ( t ) ˆj + vz ( t ) kˆ

41
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

Cada direção terá uma equação de posição específica, que pode variar
com o tempo de uma forma distinta das demais. A velocidade desse corpo no
espaço será definida como a taxa de variação da posição, isso também inclui o
tratamento diferencial para cada direção. Essa variação será dada com o tempo:


→ d→  d d d
a ( t ) == v vx ( t ) iˆ + v y ( t ) ˆj + vz ( t ) kˆ (1.32)
dt dt dt dt

= ax ( t ) iˆ + a y ( t ) ˆj + az ( t ) kˆ

Da mesma forma, cada direção terá uma equação de velocidade em função


do tempo específica. Caso essa velocidade também varie com o tempo, a taxa de

variação aqui estará associada à aceleração a(t) da partícula, definida como:

FIGURA 19 – VETOR DESLOCAMENTO ∆r NO ESPAÇO

FONTE: O autor

A figura acima apresenta um deslocamento tridimensional de uma partícula


no espaço. Em bora haja quatro variáveis envolvidas, entenda que r representa
i
o instante inicial em que começamos a atentar para sua trajetória e r o momento
f
→ → → 
final entre um evento. Esse evento foi o deslocamento ∆r = rf − ri , entre as posições
inicial e final.

Já a figura a seguir mostra os vetores velocidade inicial v e final v .O


→ → → i f
vetor que representa essa diferença é ∆v = v −v . Lembre-se de que se dividirmos
f i
a variação da velocidade pelo intervalo de tempo que ela levou para ocorrer,

obteremos a aceleração a.

42
TÓPICO 3 | CINEMÁTICA BIDIMENSIONAL E TRIDIMENSIONAL

FIGURA 20 – VETOR VARIAÇÃO DA VELOCIDADE ∆V NO ESPAÇO

FONTE: O autor

3 LANÇAMENTO OBLÍQUO
O lançamento oblíquo ocorre quando um objeto é arremessado de
soslaio, ou seja, com alguma angulação não perpendicular em relação ao solo.
Um exemplo comum quando pensamos em lançamentos oblíquo de objetos é o
lançamento balístico.

FIGURA 21 – PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA, POR BENEDITO CALIXTO 1893

FONTE: Disponível em: <goo.gl/STjNZV>. Acesso em: 9 mar. 2018.

43
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

A figura acima apresenta um óleo sobre tela, de 1893, de Benedito Calixto,


um multitalentoso pintor brasileiro nascido em Itanhaém, São Paulo, em 1853.
Ele apresenta também alguns canhões utilizados para lançar cargas metálicas a
longas distância. Após impulsionada a carga realiza um movimento parabólico
devido ao lançamento obliquo original. A carga era lançada adiante e para cima,
atingia a altura máxima, na metade do tempo do lançamento, e o solo mais à
frente. Com este movimento temos vários outros exemplos, como uma cobrança
de falta no futebol. O lançamento de uma rede de pesca, possivelmente ainda
mais complexo, ou um lançamento no boliche.

Quando lidamos com um movimento assim temos que nos lembrar que se
trata de um movimento no plano, pelo menos, e não mais sobre a reta. É preciso
tratar o problema vetorialmente, pois há um movimento ocorrendo no espaço.

DICAS

Para reforçar essa ressalva, sugerimos a leitura do trabalho intitulado “Regiões


de segurança em lançamento de projéteis”. Disponível em: <https://goo.gl/NtSNnv>, de
Pereira e Bonfim, 2008. Nele, os autores discutem o cálculo de regiões de segurança para o
lançamento de objetos balísticos, e projéteis. O trabalho apresenta um estudo sobre a área
envoltória de uma família de trajetórias possíveis, com ênfase na importância do ângulo de
lançamento. A matemática apresentada pode parecer um pouco sofisticada para o iniciante,
mas o trabalho é com certeza uma leitura interessante.

GRÁFICO 1 – LANÇAMENTO OBLÍQUO, ALTURA MÁXIMA


30

25

20
y (t) (m)

15

10

0
0 0.5 1 1.5 2
t (s)

FONTE: O autor

44
TÓPICO 3 | CINEMÁTICA BIDIMENSIONAL E TRIDIMENSIONAL

Observe o gráfico acima. Ele apresenta a curva descrita por um objeto que
se move no plano a sua frente, perpendicular a sua linha de visada. O objeto realiza
um movimento parabólico, de concavidade para baixo, sob a ação da aceleração
da gravidade −g. Como vamos inicialmente associar o eixo y à altura e o eixo x à
largura de nosso campo de visada, vamos reescrever a equação (1.23) como:

1 2
y ( t ) =y0 + v0 , y + gt . (1.33)
2

No gráfico apresentamos a equação (1.33) sob três condições. A linha


tracejada e com pontos (vermelha) apresenta um lançamento em que a posição
inicial y0 = 0 m é a origem e cuja velocidade vertical inicial de lançamento é
v0; y = 10 m/s. Já a linha tracejada (azul) apresenta um lançamento em que y₀ = 2 m
10 m/s,
e v0; y == 10 m/s, além disso a linha sólida (verde) apresenta y = 2 m e v0; y == 20
Todas os lançamentos submetidos à g = – 10 m/s/s, para simplificar os cálculos.
Note que a altura máxima alcançada é dada pelo momento em que v y t y ; max = 0 ( )
e isso ocorre quando:

d d  1 
(
v y t y ; max =) dt
(
y t y ; max = ) 
dt 
y0 + v0 , y t − g t 2 = 0;
2 
(1.34)

= v0 , y − g t = 0

v0; y
t y ; max = .
g

Em que t y ; max é o tempo necessário para que um corpo lançado com


10
velocidade vertical inicial v0; y =alcance a altura máxima, sob ação de uma aceleração
– g. Perceba que a duplicação na velocidade inicial de lançamento duplica também
o tempo tomado para a altura máxima, esses pontos são apresentados no Gráfico
1 pelos círculos pertinentes a cada curva já descrita. Perceba também que isso
significa que a altura máxima alcançada por esse objeto se dará em t = t y ; max , ou em:

2
 v0; y  1  v0; y 
(
y t y ; max ) y0 + v0 , y 
=
 g
+ g
 2  g


(1.35)
   
2
1 v0; y
= y0 + .
2 g

Você também pode checar as alturas máximas, referentes a cada lançamento


no Gráfico 1. O leitor deve ter percebido que embora estejamos falando de um

45
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

movimento no plano, com decomposição de vetores, a equação (1.33) é escalar.


Isso ocorre porque podemos decompor o vetor posição:



r ( t ) x ( t ) iˆ + y ( t ) ˆj
= (1.36)

A equação (1.33) representa o segundo termo da equação (1.36), ela é a


equação que descreve a altura do objeto em função do tempo. Como planejamos
nos aprofundar um pouco mais no conteúdo, mas ainda manter uma aproximação
simplificada, vamos considerar que a equação que descreve a distância horizontal
que o objeto percorra, seja dada por:

x ( t=
) x0 +v0; xt (1.37)

Ele descreverá um movimento retilíneo uniforme, em que x₀ é a posição


inicial do corpo e v0; y =é10
sua velocidade inicial constante no eixo x. Vamos agora
considerar que associado a esse corpo há também um vetor velocidade. Observe
a figura a seguir.

FIGURA 9 – LANÇAMENTO DE PROJÉTEIS, VELOCIDADE INICIAL V (T0), VELOCIDADE


V (T) E ACELERAÇÃO A ( T0) APONTADOS NA TRAJETÓRIA PARABÓLICA Y (T)
1 1

0.8 0.8

0.6 0.6
y(t) (m)

y(t) (m)

0.4 0.4

0.2 0.2

0 0
0 0.5 1 1.5 2 0 0.5 1 1.5 2
t (s) t (s)

FONTE: O autor

Da mesma forma que fizemos para a equação (1.36), temos para as


velocidades:


v ( t ) vx ( t ) iˆ + v y ( t ) ˆj
= (1.38)

46
TÓPICO 3 | CINEMÁTICA BIDIMENSIONAL E TRIDIMENSIONAL

Em que cada termo tem a forma:

vx ( t ) = v0, x (1.39)

v y (=
t ) v0, y − gt

Em que vx ( t ) e v y ( t ) são as velocidades iniciais do projétil em cada


direção correspondente, constante na horizontal e variável na vertical. Note que
elas formam o vetor velocidade inicial, tangente à trajetória da do projétil:



) →v=0 v0 , xiˆ + v0 , y ˆj
v ( t0= (1.40)

Observe o gráfico a seguir, ele apresenta o vetor velocidade inicial v(t0)


perceba que o ele é tangente ao movimento parabólico, descrito pelo objeto, e faz
um ângulo θ com o eixo x, nossa horizontal. Usando a trigonometria podemos
escrever as equações para a velocidade inicial em termos de senos e cossenos:



v0 , x = v0 cosθ (1.41)


v0 , y = v0 sin θ

Para evitar o transtorno de carregar o sinal de módulo|v(t₀)|, fizemos a


opção pela notação|v(t₀)|= v₀. Observe então a equação (1.39) e perceba que elas
podem ser reescritas como:

vx ( t ) = v0 cosθ (1.42)

v y ( t ) v0 sin θ − gt
=

GRÁFICO 3 – VETOR VELOCIDADE V E PROJEÇÕES


1

0.8

0.6

0.4

0.2

0
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1

FONTE: O autor

47
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

Assim como as velocidades, as posições verticais e horizontais do projétil


em função do tempo, dadas pelas equações (1.33) e (1.37).

x ( t=
) x0 + [v0 cosθ ]t (1.43)

1 2
y (t ) =
y0 + [v0 sin θ ]t − gt
2

Vamos considerar novamente a equações (1.49) para a trajetória de um


corpo que parte da origem de um sistema de referências. Dividindo equação
pela outra teremos uma relação que conecta os dois movimentos em uma única
descrição. Vejamos:

x (t ) 1  1 2
= [v0 senθ ] − gt  (1.44)
y ( t ) [v0 cosθ ]t  2 

1 gt 2
= tan θ −
2 v0 (cosθ )2

Uma vez que podemos escrever o tempo t em função da posição e do


módulo do vetor velocidade inicial das coordenadas x, teremos:

1 x ( t ) gt
=y ( t ) x ( t ) tan θ − (1.45)
2 v0 cosθ

1 x (t ) g
2
= x ( t ) tan θ −
2 v02 (cosθ )2

Essa equação relaciona as trajetórias horizontais e verticais de um objeto


lançado obliquamente. Note que ela depende apenas da velocidade inicial, uma
∆y
constante, e do ângulo de lançamento θ . Note que a tangente tan θ = relaciona-
∆x
se com a posição, e perceba que o produto dos dois nos deixa com unidades de
[y]. Note também que como nem o primeiro termo, nem o segundo dependem do
tempo, podemos reescrever essa equação como:

1 x2 g (1.46)
=y x tan θ −
2 v02 (cosθ )2

48
TÓPICO 3 | CINEMÁTICA BIDIMENSIONAL E TRIDIMENSIONAL

Como o movimento é uniformemente variado em x, a relação entre


o a distância coberta entre na trajetória e o tempo para sua ocorrência são
proporcionais, podemos então afirmar que um projétil lançado obliquamente
alcançaria e metade do tempo entre o lançamento e a queda ao solo, exatamente
∆x
ao alcançar metade dessa trajetória, ou seja, em xm = . Esse momento ocorre
2
quando v y ( t ) = 0 , isso quer dizer que a equação (1.42) fica:

v0 sin θ
tm = (1.47)
g

E isso quer dizer também que para a trajetória (1.49) a altura máxima fica:

2
 v sin θ  1  v0 sin θ 
=ym v0 senθ  0 − g  (1.48)
 g  2  g 

v02 sin θ 2θ 1 v02 sen 2θ


= −
g 2 g

2 2
1 v0 sen θ
=
2 g

Suponha que um foguete foi lançado do veículo apresentado no Gráfico 3,


quanto tempo ele levaria para atingir o solo? Para responder a essa pergunta, vamos
considerar a situação. Sabemos que o projétil toca o solo na origem y₀ = 0 , até o
momento do lançamento e em sua altura final ytm = 0 . Aplicando essas condições à
equação (1.49), teremos:

1
− gt 2 + v ( t0 senθ ) t =0 (1.49)
2

Que é, como esperávamos, uma equação parabólica de concavidade para


baixo, cujas soluções serão providas pelo método de resolução de equações de
segundo grau mais apropriado.

DICAS

Ainda tratando do assunto de lançamento balístico, gostaríamos de sugerir a


leitura do trabalho intitulado “Um foguete de garrafas PET”, de Souza, 2007. Disponível em:
<https://goo.gl/ZS8YNG>. Nele, o autor sugere um experimento que trata do lançamento de

49
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

um projétil, construído com o auxílio do Polietileno tereftalato, mais conhecido sob a forma
de garrafas PET. É um experimento de baixo custo e acessível a qualquer professor e aluno e
também uma ótima forma de demonstrar os conceitos que você estudou até aqui.

4 MOVIMENTO CIRCULAR UNIFORME (MCU)


Quando um corpo se move em movimento circular, ele já está intrinsicamente
sob a ação de uma aceleração. Você verá mais adiante que a força centrífuga é
responsável por nos jogar contra a porta, quando o carro em que estamos faz uma
curva muito abrupta. Mas vamos deixar isso para lá, por um momento.

FIGURA 23 – LE MOULIN DE LA GALETTE, POR VINCENT VAN


GOGH, 1886

FONTE: Disponível em: <goo.gl/GJF71g>. Acesso em: 9 mar. 2018.

O movimento circular uniforme trata do ângulo varrido por um corpo,


em trajetória que forma um círculo fechado. É um movimento repetitivo e pode
ser investigado sobre a ótica dos fenômenos periódicos. Mas uma forma muito
prática que trabalhar esse conceito é através de uma analogia como o movimento
retilíneo uniforme. Aqui, ao invés de distâncias, falaremos em ângulos varridos,
velocidades angulares farão, às vezes, a velocidade linear, e assim por diante.

50
TÓPICO 3 | CINEMÁTICA BIDIMENSIONAL E TRIDIMENSIONAL

Uma forma interessante de aproximar esses conceitos matemáticos ao


nosso entendimento da vida cotidiana pode ser pela introdução de um recurso
visual, que facilite nossa visualização. Com isso em mente, vamos, então, discutir
a arte. Repare na Figura 23, ela apresenta um óleo sobre tela do pintor Vincent
Willem van Gogh (1853-1890), intitulado Le Moulin de la Galette. Repare que a obra
retrata um moinho de quatro hélices, que se move ao sabor do vento.

Imagine que ele gira em sentido anti-horário e considere, já na figura a


seguir, a hélice vertical, no topo do moinho. Imagine que ela deu algumas voltas,
cobrindo várias vezes uma circunferência, somando um ângulo total varrido de
θ = nπ, sendo n qualquer número real. Observe a imagem e tente imaginar o
moinho se movendo e varrendo um valor θ.

FIGURA 24 – VELOCIDADE ANGULAR E MCU

FONTE: Adaptada de <goo.gl/GJF71g>. Acesso em: 23 abr. 2018.

É importante aqui manter em mente que há uma relação entre o vetor


velocidade v e a velocidade angular ω que remonta uma relação ainda mais

primária. Considere a figura a seguir, e imagine que o vetor r , nela expresso, se

desloca de uma quantidade dr . Lembre-se de que estamos discutindo o MCU,
de modo que manteremos a relação de igualdade entre os comprimentos dos
vetores.

51
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA


FIGURA 25 – VETOR DESLOCAMENTO dr.
1

0.8

0.6
y

0.4

0.2

0
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1
r x

FONTE: O autor


 →
Vetores de modo que lim
→ r + ∆r . Isso nos impõe a condição de que
→ dr →0
dr . Aqui você não esquecer da relação:
tan dθ = →
r

sin dθ
tan dθ = ; (1.50)
cos dθ

sin dθ dθ
θ lim
lim tan= θ θ
= = d=
dθ → 0 dθ →0 cos dθ 1

Note que tomando o limite do deslocamento angular dθ → 0 é o mesmo


que tomar o mesmo para o próprio ângulo, θ → 0 . Dessa relação tiramos que:
 
dr→= θ →
r; (1.51)

d→    d →
r= →
v=  θ  r= ω →
 
r;
dt  dt 

d2 →  d→  →  d 2  →
= a=  2 θ  r= α →
 
2
r= v r.
dt dt  dt 

A equação (1.51) apresenta relações fundamentais e que são


intuitivamente compreensíveis. Perceba que na primeira linha relacionamos

o minúsculo deslocamento dr com o vetor original r e o também minúsculo
ângulo varrido θ → dθ. Depois, a segunda linha é apenas a divisão da igualdade
anterior por um intervalo de tempo dt, que nos fornece a relação entre v e ω,
também através de → r. Note como ω é apenas um fator de proporcionalidade
→ →
entre o vetor posição r e o vetor de velocidade v. A velocidade angular não é

52
TÓPICO 3 | CINEMÁTICA BIDIMENSIONAL E TRIDIMENSIONAL

um vetor pelo mesmo motivo que θ não é um vetor, ela tem uma função diferente.
→ →
Ela conecta o vetor r à velocidade v com que o deslocamento dr→, ou dθ, ocorre. A
terceira linha apresenta uma informação com a qual trabalharemos mais adiante.

Com a aplicação direta de mais uma diferenciação ao vetor r obtemos uma relação
→ →
entre a aceleração a e o próprio vetor r. através agora da aceleração angular α.
Novamente, observe que α também não é um vetor, mas sim um escalar que tem
→ →
a função de conectar o vetor r à taxa com a qual sua velocidade v se altera com o
tempo.

Vamos então agora tratar de aprofundar um pouco o trataremos
dispensado às novas grandezas apresentados acima. Obviamente, a hélice leva
um determinado tempo para varrer o ângulo θ qualquer e essa taxa de variação é
então definida como a velocidade angular média ω, da seguinte forma:

∆θ
ω= (1.52)
∆t

Se considerarmos o instante inicial, ainda com a variação de tempo


transcorrido muito próxima da nulidade, perceberemos que o ângulo θ varrido
tende a um valor infinitesimal dθ, também muito próximo de zero. Já o tempo
transcorrido para varrer um ângulo tão pequeno será, por sua vez, também muito
pequeno, o infinitesimal dt. Com esse raciocínio teremos o que chamamos de
velocidade angular instantânea ω:

∆θ dθ
=ω lim
= . (1.53)
∆t →0 ∆t dt

Podemos então reescrever a equação (1.53) como uma relação de proporção


entre dt e o produto ωdt , ambos com a unidade de radianos [θ] = [ωt] = rad. Além
disso poderemos também realizar a soma integral dessa relação. Assim teremos:

ω dt = dθ ; (1.54)
t θ

∫ω dt = θ∫dθ ;
t0 0

θ ( t ) − θ 0 =ω∆t ;

θ ( t ) = θ 0 + ω∆t .

θ ( t=
) θ 0 + ωt .

Perceba que do resultado da soma integral aplicada àquela relação (1.53),


emerge a função horária do ângulo varrido θ(t) . Note que se [θ] = rads, sua taxa de

53
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

 ∆θ 
variação com o tempo, terá a unidade   =[ω] = rads/s. É claro que a velocidade
 ∆t 
angular também pode variar com o tempo, teríamos também uma nova taxa de
variação associada à aceleração angular α.

5 ACELERAÇÃO TANGENCIAL E RADIAL


Antes de apresentar definições matemáticas a respeito da variação
da velocidade angular ω, faz sentido distinguir os dois tipos de aceleração
associadas ao movimento circular. Uma delas é a aceleração radial ar, referente à
posição do corpo que realiza o movimento, em relação ao centro da rotação, ela é
proporcional ao negativo do produto do quadrado da velocidade angular ω com
o raio r de rotação, como vemos a seguir:

ar = −ω 2 r ; (1.55)

2
d 
= −r  θ  ;
 dt 

ω 2r 2
= −r ;
r2

v2
= − .
r

Note que ar existe em qualquer tipo de movimento circular, mesmo à


velocidades constantes e que para manter uma aceleração radial ar constante, à
medida que se afastasse do centro da revolução, um corpo teria que reduzir sua
velocidade angular ω na mesma proporção. Ele também teria que aumentar ω, se
quisesse manter ar constante, caso o corpo se aproximasse do centro. A proporção
apresentada na primeira linha da equação (1.55) tem as mesmas unidades, uma
vez que [ar] = [ω2r]= (rad2/s2)m = m/s, e o radiano é uma unidade matemática de
ângulo, não física. A segunda linha é uma aplicação direta na velocidade angular,
que também pode ser escrita como ω = vr e aplicada à terceira linha do raciocínio.
A última linha nos diz que a aceleração radial de um corpo em MC é diretamente
proporcional ao quadrado da velocidade tangencial v e inversamente proporcional
ao seu raio. Você pode investigar mentalmente o que ocorre em um movimento
como esse, apenas realizando considerações a respeito dessas variáveis. Essa
aceleração está ligada ao que nos submetemos quando estamos dentro de um
veículo que realiza uma curva muito rápida. Quando isso acontece nos sentimos
pressionados contra as paredes dos veículos, exercendo uma força sobre elas, a
reação normal das paredes está associada à at.

54
TÓPICO 3 | CINEMÁTICA BIDIMENSIONAL E TRIDIMENSIONAL

A segunda aceleração a que temos que fazer referência, dentro do MC


é a aceleração tangencial at, essa sim responsável por nos jogar para fora das
curvas rápidas. Essa aceleração é diretamente proporcional à taxa de variação da
velocidade angular, que conheceremos em breve, chamada de aceleração angular
d
α= ω e por isso está associada ao movimento circular uniformemente variado.
dt
Teremos para at, então:

at = α r ; (1.56)

d 
= r  ω;
 dt 

1 d 
=r v ;
 r dt 

d 
=  v
 dt 

Note que, independentemente de as hélices do moinho girarem em


velocidade angular constante, ou não, sempre há algum tipo de vetor aceleração
associado ao movimento e ambas as formas vetoriais podem ser vistas na Figura
1.28. Em sumário, o vetor aceleração alusivo a qualquer movimento circular pode
ser escrito como a composição de vetores radiais e tangenciais, como:



a ar rˆ + atθˆ.
= (1.57)

Agora sim, podemos discutir os efeitos de um vento mais forte ou mais


fraco, seja lá como o clima varie, na velocidade de rotação das hélices do moinho
de van Gogh.

6 MOVIMENTO CIRCULAR UNIFORMEMENTE VARIADO


(MCUV)
Eventualmente o vento pode ficar mais intenso e fazer com que as hélices
do moinho da figura a seguir girem mais rápido, ou ele pode também cessar por
um tempo, tornando o moinho mais lento. O efeito dessa variação na velocidade
será estudado nessa seção e perceberemos que todo o desenvolvimento teórico
é bastante análogo àquele do MRUV. Novamente, se considerarmos o intervalo
de tempo ∆t entre as duas estabilizações sucessivas da velocidade, poderemos
calcular a aceleração angular α, dada por:

∆ω (1.58)
α=
∆t

55
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

Se considerarmos novamente o instante inicial, também com a variação de


tempo transcorrido muito próxima da nulidade, perceberemos que a velocidade
angular ω ainda é muito pequena e tende a um valor infinitesimal dω, também
muito próximo de zero. Já o tempo transcorrido durante uma variação dω tão
pequena será, por sua vez, também muito pequeno e infinitesimal dt. Com esse
raciocínio teremos o que chamamos de aceleração angular instantânea α:

FIGURA 26 – ACELERAÇÕES RADIAL E TANGENCIAL E MCUV

FONTE: Adaptado de: <goo.gl/GJF71g>. Acesso em: 23 abr. 2018.

∆ω d d2
α lim = =
= ω θ. (1.59)
∆t →0 ∆t dt dt 2

Após um breve momento para a definição do conceito de aceleração


angular, vamos nos atentar à aplicação desse conceito ao movimento de uma
partícula em trajetória circular. Considerando a equação (1.59), percebemos que
ela representa a taxa de variação da velocidade com o tempo. Vamos novamente
aplicar o conceito de integral aos dois lados dessa equação e estudar como ela se
comporta. Teremos então:

α dt = d ω ; (1.60)

t ω

∫α dt = ∫ dω ;
t0 ω0

56
TÓPICO 3 | CINEMÁTICA BIDIMENSIONAL E TRIDIMENSIONAL

ω ( t ) − ω0 =α∆t ;

ω ( t ) = ω0 + α∆t .

Perceba que a primeira linha evidencia uma relação de proporcionalidade


entre a velocidade angular ω e o produto da aceleração α com o tempo transcorrido
t, ambos os lados dessa igualdade devem apresentar unidades iguais e o fazem,
tendo [at] = [ω] = (rad/s2)s = rad/s. Após aplicação da soma integral nos dois lados
da equação, representada na segunda linha, chegamos a uma relação linear entre
a velocidade angular e o tempo. Essa é a chamada função horária da velocidade
angular, evidente na última linha do raciocínio. Perceba que embora o movimento
aqui seja circular, a equação que descreve a velocidade angular ω em função do
tempo é uma equação da reta do tipo y = a + bx, como já vimos antes, no MRUV.

ω ( t=
) ω0 + α t. (1.61)

O mesmo tratamento dispensado à Figura 16 é agora concedido ao corpo


que segue em movimento circular uniformemente variado. A Figura 29 apresenta
três curvas, uma tracejada e com pontos (vermelha) para um corpo que partiu
do repouso, e uma tracejada (azul), para um corpo que já se movia com uma
velocidade angular inicial ω0 ≠ 0 no momento em que começamos a contar o
tempo e uma curva sólida (verde), para um corpo que parte de uma velocidade
inicial ω0 não nula, mas com o dobro da aceleração angular, ou seja 2α.

Note que, como esperado, o coeficiente angular α altera a inclinação da


curva ω (t). Compare as Figuras 16 e 27 e perceba que, a despeito de se tratarem
de duas grandezas distintas, seu comportamento é matematicamente o mesmo.

É possível também, escrever a expressão para o ângulo varrido em função


do tempo. Para isso é preciso considerar novamente a equação (1.53), ela define a
velocidade angular como a taxa de variação do ângulo varrido com o tempo, mas
com a operação da soma integração é possível calcular a expressão conhecida
como função horária do ângulo varrido θ(t):

57
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

FIGURA 27 – FUNÇÃO HORÁRIA DA VELOCIDADE ANGULAR NO MCUV

3.5

2.5
ω(t) (rad/s)

1.5

0.5

0
0 0.2 0.4 0.6 0.8 1
t (s)

FONTE: O autor

dθ = ω dt ; (1.62)

θ t

∫dθ = ∫ω dt ;
θ0 t0

t
θ ( t ) − θ=
0 ∫ ω 0 + α t  dt ;
t0

t t
θ ( t ) − θ=
0 ω0 ∫dt + α ∫tdt ; θ ( t ) − θ 0= ω0 ( t − t0 ) + 1 α ( t − t0 )2 .
t0 t0 2

Note que da segunda para a terceira linha aplicamos a equação (1.61) e


a integração subsequente toma novamente uma feição familiar. Uma vez que ω0
representa a velocidade angular inicial da partícula, que pode ser nula ou uma
constante positiva ou negativa, e que a aceleração angular α é também constante,
elas podem ser removidas da integração. Para o caso de t₀ = 0 , teremos:

1
θ ( t ) =θ 0 + ω0t + α t 2 . (1.63)
2

Lembrando que esse resultado também pode ser alcançado pela dupla
integração direta da equação (1.59), o que é, indiretamente, exatamente o que
acabamos de fazer, ou seja, para uma partícula que prossiga em um movimento
circular uniformemente variado, o ângulo varrido se altera quadraticamente
com o tempo. Realizando as devidas alterações e comparando a equação (1.63)

58
TÓPICO 3 | CINEMÁTICA BIDIMENSIONAL E TRIDIMENSIONAL

à equação (1.24), é possível perceber que ela também guarda uma relação íntima
com a equação da parábola.

Ainda há mais uma forma de se estudar o movimento circular


uniformemente variado e ele se dá através de considerações análogas àquelas
empregadas por Evangelista Torricelli. Considere a equação (1.59), dela temos:
α dt = d ω ; (1.64)
t ω
α ∫dt = ∫ d ω ;
t0 ω0

ω − ω0
( t − t0 ) =α .

E aplicando a expressão (1.64) na equação (1.62), ficamos com:


2
 ω − ω0  1  ω − ω0  (1.65)
θ ( t ) − θ ω0 
= + α  ;
 a  2  a 
2 2
1 (ω − ω0 )
θ (t ) − θ = ;
2 α
ω 2 ( t ) = ω02 + 2α∆θ .

Novamente, a equação (1.65) é semelhante à (2.27), deduzida de Torricelli,


e relaciona a velocidade angular ω ( t ) à aceleração angular α e à variação do
ângulo varrido θ , sem fazer menção ao tempo transcorrido. Nesse momento já
deve ter lhe ocorrido que o MCUV é análogo ao MRUV, se de fato lhe ocorreu,
então você está correto. A ideia é a mesma e pode ser facilmente comprovada
comparando-se os gráficos apresentados nos dois tópicos correspondentes.

Até aqui cobrimos dois tipos distintos de movimento, aquele em que a


velocidade é constante e aquele em que a velocidade é uma função do tempo,
tanto para deslocamentos retilíneos quanto para circulares. Em comum esses
quatro tipos de movimento têm o referencial, todos eles foram descritos em
relação a nossa posição no espaço, por assim dizer. Mas o que aconteceria se
considerássemos uma partícula se movendo em relação a outro referencial,
diferente do nosso? É disso que trataremos na próxima seção, vamos falar do
movimento relativo.

7 MOVIMENTO RELATIVO
Até esse momento estudamos o movimento de um corpo no espaço, em
relação a um sistema de referências, mas o que acontece se um sistema de referência
se move em relação a outro sistema de referência? Como seria possível descrever
a posição de um corpo que se move em um sistema de referência, em termos
das coordenadas espaciais referentes ao outro sistema de referência? É disso que
trataremos nessa seção. Como tratar um problema de movimento relativo.
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UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

O conceito de movimento relativo emerge de uma correção à noção


newtoniana de tempo e espaço absolutos. Newton, em seu livro, Philosophiae
naturalis principia mathematica acreditava que tanto o espaço, como o tempo eram
absolutos, iguais em todos os lugares, quando observados de qualquer referencial.
Foi com Gottfried Wilhelm Leibniz, um dos pais do cálculo, e George Berkeley
que nasceram as primeiras críticas a essa ideia. Mais tarde, o físico e filósofo
austríaco Ernst Mach (1838-1916) publicou um trabalho, intitulado The science
of mechanics: A critical and histirical account of its development, em que critica tais
conceitos e afirma que não há referenciais absolutos no universo, nem espaciais e
nem temporais. Não existe um único referencial no universo que não se mova em
relação a outro. Dessa forma temos que o movimento de um corpo em um desses
referenciais pode ser descrito em função das coordenadas de outro referencial.

FIGURA 28 – SISTEMAS DE REFERENCIAIS RELATIVOS

FONTE: O autor

Observe acima, veja que o vetor r0 representa a distância entre as origens


O e O′ dos sistemas de referenciais S e S′. Note também que o vetor r representa a


distância entre o ponto O e o ponto P. Além disso, o vetor r representa a distância
 
entre o ponto O′ e o ponto P, ou seja, r é a soma dos vetores r ' e r0 . Com isso, em
→ → →

mente podemos escrever:


 →
→  

r= r '+ r0 . (1.66)

Uma vez que cada vetor posição pode ser escrito como a equação (1.30),
teremos:

x = x′ + x0 ; y = y ′ + y0 ; z = z ′ + z0 . (1.67)

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TÓPICO 3 | CINEMÁTICA BIDIMENSIONAL E TRIDIMENSIONAL

Suponha que uma partícula, cuja posição relativa aos dois referenciais
seja inicialmente o ponto P, move-se com o tempo, até um outro ponto qualquer
→ 

no espaço. Diremos que a taxa de variação do vetor posição r , e dos vetores r ' e
→
r0 , com o tempo pode ser escrita como:
 d→
→  d → d →
=v = r r ′ + r0 . (1.68)
dt dt dt

Ou seja, a velocidade da partícula no espaço, também definida


geometricamente:
 → →
→ 
v= v '+ v0 . (1.69)

A soma das velocidades envolvidas também pode ser decomposta como


a soma de suas componentes:

v=
x vx' + v0 , x ; (1.70)
v=
z vz ' + v0 , z .

v=
y v y ' + v0, y ;

Se o módulo da velocidade com que a partícula se move aumentar ou


diminuir, ou se sua direção ou sentido forem alterados, teremos uma aceleração
envolvida, que pode ser escrita como:

→ d → d → ' d →
=a = v v + v0 , (1.71)
dt dt dt

Cuja expressão geométrica é dada por:


 → →

a= a '+ a0 . (1.72)

E a soma das acelerações envolvidas também pode ser decompostas como


a soma de suas componentes:
ax= a′ + a0, x ; (1.73)

a=
y a y ' + a0 , y ;

a= az ' + a0 , z .
DICAS z

Nós gostaríamos de sugerir aqui, a leitura do trabalho intitulado “Proposta de


laboratório de física de baixo custo para escolas da rede pública de ensino médio”, de (Silva e Leal,
2017. Disponível em: <https://goo.gl/1dAoaX>. Nele, os autores apresentam suas conclusões
sobre os resultados obtidos com utilização de materiais de baixo custo para a criação de um
laboratório multidisciplinar, para levar às salas de aulas. Neste trabalho, você encontrará boas
ideias, para manter em mente, enquanto se prepara para a profissão de professor.

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UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

LEITURA COMPLEMENTAR

LATTES: NOSSO HERÓI DA ERA NUCLEAR

Cássio Leite Vieira

No outono de 1946, aos 22 anos de idade, o físico brasileiro Cesare


Mansueto Giulio Lattes (ou apenas César Lattes, como era mais conhecido),
praticamente recém-formado, chegou à Inglaterra para uma temporada de dois
anos no Laboratório H. H. Wills, que ocupava o quarto andar do Royal Fort, um
prédio monumental da Universidade de Bristol, cidade na costa oeste do país.

Lá, uma equipe liderada pelo físico Cecil Powell empregava as chamadas
emulsões nucleares para o estudo da física nuclear e dos rachapas fotográficas
especiais, fragmentos ainda desconhecidos da matéria. Eles seriam produzidos,
a dezenas de quilômetros de altitude, pelo choque de partículas ultraenergéticas,
os chamados raios cósmicos, contra núcleos atômicos que formam a atmosfera.
Essas colisões, que podem atingir energias milhões de vezes superiores àquelas
produzidas nos mais modernos aceleradores de partículas, causam um tipo
de cascata, o chamado chuveiro aéreo extenso, que pode varrer quilômetros
quadrados do solo, contendo bilhões de partículas, principalmente elétrons,
múons e neutrinos. Lattes era jovem, como muitos dos físicos que formavam a
equipe de Powell. Porém ele tinha, pelos menos, dois diferenciais a seu favor:

i) Boa formação teórica, principalmente devido a seu contato com Gleb Wataghin e
Mário Schenberg na graduação e durante um curto período de pesquisa depois
de formado (corrobora essa afirmação o depoimento de um dos integrantes
da equipe de Powell, que, mais tarde, recordou que seu primeiro contato com
alguns conceitos da mecânica quântica se deu através de conversas com Lattes
e Ugo Camerini, outro brasileiro que, pouco depois, se juntaria à equipe do
H.H. Wills);
ii) Treinamento, na Universidade de São Paulo (onde se formou em 1943, aos 19
anos), na análise de chapas fotográficas aplicadas ao estudo de raios X, dado
pelo físico italiano Giuseppe Occhialini, que passou uma temporada no Brasil
e, logo após o fim da Segunda Guerra, foi trabalhar com Powell, em Bristol.
Lattes contou que foi o único aluno desse curso.

De teórico a experimental

A simpatia de Lattes pela carreira de teórico foi bastante desmotivada


depois de trabalhar com Wataghin e Schenberg em problemas relacionados à
abundância de elementos no universo (esses trabalhos foram publicados em 1945,
na Physics Reports USP, e no ano seguinte, na Physical Review). Segundo Lattes,
cálculos envolvendo uma lagrangiana “com 99 termos” ocupavam páginas e
páginas. Esse fato fez com que Lattes procurasse Occhialini com o desejo de se
tornar um experimental (alguns amigos apontam ainda a influência que o ex-
professor, tido como um experimental brilhante, teria exercido sobre Lattes).
62
TÓPICO 3 | CINEMÁTICA BIDIMENSIONAL E TRIDIMENSIONAL

Ainda no Brasil, Lattes, Andréa Wataghin (filho de Wataghin) e Camerini


construíram e trabalharam com uma câmara de nuvens (ou câmara de Wilson).
Nessa época, Lattes mandou para Occhialini, que já estava em Bristol, uma
fotografia feita a partir do trabalho com a câmara. Recebeu de volta fotografias
mostrando trajetórias de prótons e partículas alfa obtidas com uma nova emulsão,
mais concentrada, fabricada pela Ilford, empresa com sede em Essex (nessas
emulsões, a relação entre a concentração de haletos e de gelatina era quatro vezes
maior que nas chapas fotográficas convencionais).

Lattes ficou impressionado com o que viu. Os resultados eram muitos


superiores aos obtidos pela câmara de nuvens. Pediu então ao ex-professor que
arranjasse um modo de ele, Lattes, passar um tempo em Bristol. Foi obtida uma
bolsa (15 libras por mês) da Wills, fabricante de cigarros e empresa que financiou
o Royal Fort, que, por isso, ficou conhecido como ‘Torre do Cigarro’. A ida de
Lattes parece também ter sido impulsionada pela falta de físicos experimentais nas
universidades menores na Inglaterra do pós-guerra. As passagens foram pagas
pela Fundação Getúlio Vargas, graças ao prestígio e à influência do matemático
brasileiro Leopoldo Nachbin.

Lattes desembarcou em Liverpool, depois de 40 dias de viagem a bordo


do Santo Rosário (segundo ele, o primeiro navio cargueiro que partiu, depois
da Segunda Guerra, carregando passageiros do Brasil). Depois de uma breve
passagem por Londres, chegou à estação ferroviária de Bristol em um final de
semana. Dois dias depois, juntou-se a Powell e Occhialini.

Emulsões com Bórax

A primeira incumbência de Lattes em Bristol foi medir o nível de


decaimento de partículas alfa do samário com a ajuda das novas emulsões, mais
concentradas, que passaram a ser fabricadas a partir de 1946 e classificadas
segundo o tamanho dos grãos (A, B, C e D), sendo que cada uma delas estava
disponível em três sensibilidades: 1, 2 e 3 (vale adiantar que as do tipo C2 se
tornariam as ‘grandes vedetes’). Em seguida, sua nova missão foi calibrar essas
emulsões, ou seja, obter a chamada relação alcance energia, bombardeando-
as com um feixe de 1 MeV de deutério produzido pelo acelerador Cockroft-
Walton, em Cambridge. Ele, juntamente com Peter Fowler (neto do neozelandês
Ernest Rutherford e ainda estudante de graduação) e Peter Cuer, obtiveram a
relação alcance-energia nas novas chapas para prótons, partículas alfa e núcleos
de deutério (dêuterons) até 10 Mev. Esses resultados [1] foram importantes
para estabelecer parâmetros relacionados à detecção individual de partículas
carregadas em emulsões nucleares.

Entre as chapas calibradas, estavam algumas nas quais, a pedido de


Lattes para técnicos da Ilford, foi acrescentado bórax (tetraborato de sódio) na
composição, uma idéia que se mostraria fundamental para os desdobramentos
que levariam à detecção do méson pi. No acelerador, o boro da emulsão era
bombardeado com um núcleo de deutério, dando carbono e nêutron (B11 + H2

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UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

→ C12 + n). O objetivo inicial de Lattes (e isso é importante ressaltar) era medir a
energia e o momento de nêutrons cósmicos a partir da reação na qual um núcleo
de boro 10 gera duas partículas alfa e um trítio (n + B10 → He4 + He4 + H3).

Pediu a Occhialini, que estava saindo de férias no final de 1946, para


esquiar nos Pirineus franceses, que expusesse as emulsões (do tipo B1) carregadas
com bórax no observatório astronômico no Pic-du-Midi, a 2,8 mil metros de
altitude. Pediu também que se expusessem chapas normais (sem bórax). Expor
chapas em grandes picos já era uma tradição no estudo de raios cósmicos, pois
nas alturas é maior a probabilidade de se capturar eventos relacionados com as
colisões. Porém Gariboldi, estudioso da história desse período, afirma que isso
foi uma atitude deliberada de Lattes, juntamente com Occhialini, para diminuir
o fading, ou seja, esmaecimento da imagem das trajetórias nas emulsões, o que
era então um problema com a técnica de emulsões. Segundo o autor, outra opção
(não adotada) seria diminuir o tempo de exposição.

Na volta, cerca de um mês e meio depois, ao revelar as emulsões com e


sem bórax, Occhialini notou que nas primeiras estavam evidências de mésons
sendo capturados por núcleos e os desintegrando. Virou a noite, escreveu um
artigo (segundo Lattes, sem conhecimento de Powell) e o enviou para publicação.
Detalhe: esse primeiro artigo [2], com os resultados das chapas carregadas com
bórax, foi assinado apenas por Occhialini e Powell, nesta ordem. Lattes protestou
junto a seu ex-professor.

A partir daí a ênfase do grupo de Bristol se voltou totalmente para os


raios cósmicos, ou seja, para a análise dessas emulsões. Com isso, a física nuclear
convencional que Powell vinha praticando (espalhamento nêutron-próton a 10
Mev) ficou de lado. Pouco depois, Marietta Kurz, uma das várias microscopistas
da equipe (o chamado ‘Belo Coro de Powell’), identificou um méson primário
(píon) que decaía em um secundário (múon). Mas este último não parava na
emulsão. Outra microscopista, Irene Roberts, achou posteriormente outro
decaimento desse tipo, mas, dessa vez, com um secundário parando dentro da
emulsão e com uma trajetória de 600 microns – no primeiro caso, apesar de o
múon não parar na chapa, a equipe supôs que seu alcance seria algo em torno de
600 microns.

Esses dois eventos foram os primeiros exemplos do decaimento de um


píon (no caso, positivo) em um múon (ou, na denominação da época, de um
méson de Yukawa em um mésotron de Anderson). O trabalho foi assinado nesta
ordem: Lattes, (Hugh) Muirhead, Occhialini e Powell e saiu na edição de 24 de
maio de 1947 da Nature [3].

Vale ressaltar que, ainda em janeiro daquele ano, Donald Perkins, do


Imperial College, em Londres, havia publicado o primeiro exemplo da captura
de um píon negativo por um núcleo. Seis semanas depois, o artigo de Occhialini e
Powell apresentaria seis outros exemplos, graças às chapas carregadas com bórax.

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TÓPICO 3 | CINEMÁTICA BIDIMENSIONAL E TRIDIMENSIONAL

Ida a Chacaltaya

Lattes percebeu o alcance das novas emulsões e a exposição delas em


grandes altitudes, e pediu a Powell que financiasse sua ida a um lugar de altitude
para fazer novas exposições. Foi à biblioteca do Departamento de Geografia da
Universidade de Bristol e verificou que havia, na Bolívia, um monte com cerca de
5,3 mil metros de altitude, o monte Chacaltaya, onde poderia chegar depois de
uma viagem de 20 minutos de carro a partir de La Paz.

Numa cerimônia simples, em que estavam presentes A. M. Tyndall (diretor


do H. H. Wills e neto do descobridor do efeito de mesmo nome), Powell e Occhialini,
Lattes recebeu “um monte de notas de pounds” e assinou um recibo em que estava
escrito: “Pago a César Lattes para sua viagem à Bolívia”. Tyndall recomendou
que Lattes viajasse em um avião da British Airways. Mas um colega sugeriu que a
viagem fosse feita pela Panair, companhia brasileira, “pois os aviões da British eram
ex-bombardeiros da Segunda Guerra, enquanto os da companhia brasileira eram
novinhos em folha, as aeromoças bonitas e o filé servido na refeição, suculento”.
Lattes se convenceu. Sorte dele, o próprio Lattes costumava lembrar, pois o avião
da British acabou caindo em Dacar, no Senegal. Não houve sobreviventes.

Mésotron ou Píon?

Lattes voltou ao Rio de Janeiro com as chapas já expostas (uma delas


foi revelada ainda na Bolívia, mas a qualidade da água era inadequada; mesmo
assim, pôde-se ver um decaimento píon-múon). Revelou outra delas no Brasil e
mostrou (com a ajuda de um microscópio do físico Joaquim Costa Ribeiro, do
Departamento de Física da Faculdade Nacional de Filosofia) os resultados para
o físico austríaco Guido Beck e o brasileiro José Leite Lopes. Lá estavam mais e
melhores evidências dos píons.

Lattes voltou à Inglaterra com suas chapas de Chacaltaya, e lá elas


foram devidamente reveladas e escaneadas pelas microscopistas. As emulsões
mostraram 31 trajetórias com decaimentos de píons em múons. A Lattes foi dada
a (árdua) tarefa de calcular, com base na contagem de grãos, a relação entre as
massas dessas duas partículas, um trabalho que exigia a paciência de um monge
tibetano, pois envolvia contar milhares de ‘grãozinhos’ das trajetórias nas
emulsões reveladas. Os resultados foram publicados em artigos assinados por
Lattes, Occhialini e Powell, em Nature [4] e no ano seguinte em Proceedings of
the Physical Society of London [5].

Estes artigos, além dos primeiros daquele ano, tiveram um grande impacto
internacional. O que passou a ser conhecido como méson pi (o nome foi dado por
Powell) havia sido previsto ainda em 1935 pelo físico japonês Hideki Yukawa.
Descobri-lo implicava explicar um problema relativamente simples - visto através
da perspectiva de hoje –, mas – até então um mistério para a Física: por que o núcleo
dos átomos é estável, coeso – em outras palavras, explicar por que os prótons, que
têm carga elétrica positiva, não se repelem, explodindo o núcleo.

65
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

Os trabalhos da equipe de Bristol em 1947 também serviram para reforçar


a idéia de que havia dois mésons, o de Yukawa e o de Anderson (na verdade, de
Anderson e Neddermeyer e de Street e Stevenson, dois grupos independentes),
uma idéia que foi lançada, ainda em 1943, pelos físicos japoneses Yasutaka
Tanikawa, Shoichi Sakata e Takeshi Inoue, bem como, quatro anos depois, por
Hans Bethe e Robert Marshak.

Logo depois da proposição do méson por Yukawa – o nome méson (médio,


em grego) tem a ver com o fato de ele ter calculado que a massa dessa partícula
seria intermediária entre a do próton e a do elétron -, o físico norte-americano Carl
Anderson detectou uma partícula, com a ajuda de uma câmara de Wilson, com
características semelhantes à daquela proposta por Yukawa. A primeira reação
da comunidade foi associar essas duas partículas (até mesmo Yukawa, cuja teoria
foi disseminada no Ocidente por Robert Oppenheimer, fez essa associação).
Porém, ainda durante a Segunda Guerra, os italianos Marcelo Conversi, Ettore
Pancini e Oreste Piccioni mostraram que o mésotron de Anderson não podia ser o
responsável pela força forte, pois ele não interagia fortemente com o núcleo (esse
trabalho foi feito em um porão, quando os autores se escondiam dos nazistas, e
publicado apenas em 1947).

Portador de uma técnica

Com a repercussão dos primeiros artigos daquele ano, Lattes foi convidado
para fazer palestras na Suécia e na Dinamarca. Assistentes de Niels Bohr haviam
visitado Bristol para tomar ciência do que estava acontecendo por lá (segundo
Lattes, eles devem ter percebido que o cálculo da relação da massa do píon e
do múon estava a cargo dele). Na Dinamarca, Bohr convidou o brasileiro para
uma conversa em sua residência. Segundo Lattes, Bohr aconselhou-o a ir para os
Estados Unidos, pois “lá as coisas estavam quentes”.

No início de 1948, Lattes chegou em Berkeley, Califórnia, onde, desde


primeiro de novembro de 1946, funcionava o síncrotron de 182 polegadas,
financiado com US$ 1,5 milhão pela Fundação Rockefeller. O principal objetivo
dessa máquina era a produção artificial de píons. Porém, até então, essas partículas
não haviam sido detectadas, para a profunda insatisfação do líder da equipe, o
físico norte-americano Eugene Gardner

Meses antes da chegada de Lattes a Berkeley, Gardner já havia trocado


uma série de correspondências com a Eastman (Kodak), também fabricante de
emulsões nucleares. Nas cartas, Gardner reclamava (às vezes, duramente) do
caráter sigiloso que a empresa mantinha sobre a composição química de suas
emulsões e que, com elas, não conseguia reproduzir os resultados da equipe
de Bristol. Na Inglaterra, a situação era um pouco diferente. Um painel para o
desenvolvimento das emulsões nucleares foi idealizado por Patrick Blackett e,
depois de constituído, chefiado por Joseph Rotblat. Esse comitê era basicamente
integrado por três frentes: i) o estabelecimento nuclear inglês, responsável pelo
desenvolvimento do projeto Tube Alloy, que pesquisava o uso de energia atômica

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TÓPICO 3 | CINEMÁTICA BIDIMENSIONAL E TRIDIMENSIONAL

para o desenvolvimento de uma bomba; ii) a academia, com a presença de Powell,


por exemplo; iii) a indústria, ou seja, a Ilford (mais tarde, a Kodak inglesa passou
a integrá-lo também). A presença da Ilford no painel garantia que a composição
química das emulsões (apesar de serem um segredo industrial) fosse acessível
para os pesquisadores, que, por vezes, solicitavam modificações nelas, como foi o
caso da adição de bórax pedida por Lattes.

A chegada de Lattes a Berkeley, portando caixas das novas emulsões Ilford,


do tipo C2, representou muito mais do que a simples ida de um pesquisador para
colaborar com um colega. Lattes, naquele momento, era o portador de uma técnica
desenvolvida pelo grupo de Bristol que envolvia o aprimoramento de emulsões,
de métodos de revelação, de técnicas ópticas de observação e de contagem de
grãos para a determinação da massa das partículas. Não seria muito arriscado
dizer que a técnica das emulsões nucleares estava próxima de seu ponto mais
alto, atingido em 1949 com as chapas NT4, da Kodak, e G5, da Ilford, que eram
sensíveis a qualquer partícula com carga (foi com elas que, em 1949, foi detectado
o decaimento píon-múon-elétron em Bristol). Era o cume de uma técnica que
começou no início do século XX com o emprego de emulsões para estudos da
radioatividade (vale lembrar que as fotografias tiveram um papel fundamental
na descoberta da radioatividade e dos raios X no final do século XIX).

Ainda em 1910, o físico japonês S. Kinoshita empregou chapas fotográficas


– por sinal, foi ele quem iniciou a técnica de expô-las empilhadas, como depois
foram empregadas no estudo de raios cósmicos – para medir o fluxo de partículas
alfa emitido por elementos radioativos. Mas foi com Marietla Blau e Hertha
Wambacher, no início da década de 1930, que os primeiros prótons rápidos
foram capturados em emulsões. Assim é atribuída a essa dupla insólita – Blau,
judia, e Wambacher, ‘sócia de carteirinha’ do Partido Nazista – o pioneirismo no
emprego de emulsões para o estudo de raios cósmicos. Ainda em 1938, Walter
Heitler chamou a atenção de Powell para os resultados dessa dupla. A partir daí,
principalmente entre aquele ano e 1943, depois de analisar experimentos em que
as duas técnicas eram empregadas, Powell usou emulsões e tratou de aperfeiçoar
a técnica, até perceber que ela era, em muitos casos, superior à câmara de Wilson.
Ironicamente, Wilson fora orientador de doutorado de Powell.

A técnica de emulsões teve um pioneiro na Rússia, A. Zhdanov, e também


se disseminou, na mesma época de Powell, nos Estados Unidos, principalmente
através de Wilkins, Rumbaugh e Locher.

A detecção artificial Lattes apostou que, com alguma sorte, píons poderiam
ser produzidos no acelerador de Berkeley, cujo feixe de partículas alfa chegava a 380
MeV, ou seja, 95 MeV por núcleon. Isso era insuficiente para a produção de píons,
mas o brasileiro apostou que, com a energia interna do núcleo (a chamada energia de
Fermi), seria possível, com alguma sorte, produzir píons. E ele estava certo.

Nos meses anteriores à chegada de Lattes, várias cartas haviam sido


trocadas entre a equipe de Gardner e Bristol, na esperança de que se conseguisse

67
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

a reprodução dos resultados obtidos pelos colegas europeus. Receitas, as mais


diversas possíveis, alteravam o tipo de revelador, o tempo de revelação, produtos
químicos, entre outros procedimentos.

Lattes, em seus relatos, sempre ressaltou que “não descobriu” os mésons


pi em Berkeley, mas que apenas os detectou, pois eles já vinham sendo produzidos
pelo acelerador desde 1947. As evidências surgiram uma semana depois de sua
chegada. Uma das primeiras iniciativas de Lattes foi perguntar a Gardner quanto
tempo ele mantinha as emulsões no revelador. Resposta: quatro minutos. O
brasileiro disse que esse tempo deveria ser dez vezes maior. Também retirou o
excesso de papel preto que envolvia as emulsões, pois, segundo ele, isso ‘freava’
os mésons. Assim o problema foi resolvido, e os primeiros píons (negativos)
apareceram para o olhar treinado de Lattes uma semana depois de sua chegada.
Gardner e Lattes publicaram esses resultados em Science [6]. Mais tarde (e com
mais dificuldade) foram detectados mésons positivos, pois esses se misturavam
com as trajetórias de outras partículas nas emulsões [7].

Pouco antes de seu retorno ao Brasil, Lattes ainda, a pedido de Edwin


McMillan, analisou emulsões expostas ao feixe de 300 MeV de raios gama gerados
pelo sincrociclótron. Lá estavam também as trajetórias de vários píons. Lattes não
sabe o que foi feito com aquelas chapas, mas afirma que certamente foi a primeira
fotoprodução de píons da história.

Em 1984, em um texto publicado na Folha de S. Paulo (21/7), Occhialini


disse que, se Lattes tivesse trabalhado apenas aqueles dois anos em Bristol, o
lugar do brasileiro estaria certamente garantido na história da Física e que a
detecção artificial pertencia a uma outra época. No entanto (sem querer tirar o
mérito de um dos grandes mestres da física experimental do século passado),
valeria destacar que a detecção artificial em Berkeley foi, de longe, muito mais
importante que a natural. Sem querer ser exaustivo sobre os desdobramentos da
detecção artificial, poderíamos dizer que ela:

i) É tida como o marco de inauguração da área de física de partículas como uma


disciplina autônoma;
ii) Significou o controle sobre a produção de partículas com energias superiores
às da radiação alfa (núcleos de hélio) e beta (elétrons), que os físicos buscavam
havia muito, desde as primeiras proposições teóricas de Ernest Rutherford,
ainda em 1927; iii) Representou um grande impulso para a construção de
“aceleradores gigantescos”, conforme palavras do próprio Ernest Lawrence,
inventor do ciclotron, primeiro acelerador de partículas, em 1931; iv) Fez
com que a comunidade de físicos de raios cósmicos passasse a ver com certa
desconfiança a precisão das técnicas desenvolvidas e empregadas pelo grupo
de Bristol, do qual, ironicamente, Lattes fazia então parte, pois os resultados
de Berkeley apontavam uma razão de 1,3 entre a massa do píon e do múon,
enquanto aqueles obtidos em Bristol davam essa razão como 2 (com base nisso,
o grupo de Powell sugeriu que, juntamente com o múon, o píon decaía em uma
partícula neutra, com massa equivalente à desse lépton).

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TÓPICO 3 | CINEMÁTICA BIDIMENSIONAL E TRIDIMENSIONAL

Empurrado pela História O nome de Lattes estará para sempre vinculado


às duas detecções do méson pi. Mas ele foi bem mais além do que isso. Na década
de 1960, descobriu novos fenômenos, como os chamados mirim, açu e guaçu,
tidos como produção múltipla de mésons e até hoje mal-entendidos; estabeleceu
laboratórios no Brasil e no exterior; e concretizou uma colaboração intensa e
duradoura com o Japão, juntamente com Yukawa, na área de raios cósmicos, com
o uso, em Chacaltaya, de detectores terrestres de grandes proporções. Envolveu-
se ainda com o estudo das constantes da natureza e levantou, equivocadamente,
hipóteses sobre a teoria da relatividade de Einstein.

A partir de meados da década de 1950, o uso de câmaras de Wilson e de


emulsões em grandes altitudes passou a ser substituído pela pesquisa em aceleradores.
Hoje, de certa forma, o trabalho iniciado pelos pioneiros no estudo de raios cósmicos
se revitalizou na forma de laboratórios de proporções gigantescas, como é o caso do
Observatório de Raios Cósmicos Pierre Auger, cujos detectores, à base de tanques de
água ultrapura, ocupam cerca de 3 mil km2 na cidade de Malargüe, na província de
Mendoza, no oeste plano e árido da Argentina, aos pés dos Andes.

Em entrevista feita nas comemorações de 50 anos da detecção do méson


pi, Lattes foi perguntado se, caso tivesse chance, mudaria algo em sua vida. Foi
enfático: “Não. Fui empurrado pela história e fiz o possível”. Em sua resposta,
pode-se ler o principal traço de sua personalidade: a humildade. Some-se a isso a
bondade (basta perguntar a quem teve o prazer de conviver, ainda que brevemente,
com ele). Lattes também foi polêmico. Seus momentos de depressão e euforia
prejudicaram-no bastante, dando, muitas vezes, uma ideia errada sobre quem ele
verdadeiramente era. Porém, uma coisa é fato: Lattes é indissociável de sua doença.
Assim, para entender sua vida e sua obra, é preciso entender esse binômio.

Certa vez, um jornalista disse que Lattes era “o nosso herói da Era Nuclear”
do pós-guerra, de uma época em que a Física era a grande vedete da Ciência.
Caracterização benfeita. Foi o nome de Lattes e suas descobertas que possibilitaram
a fundação, em 1949, do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), no Rio
de Janeiro. A reboque do CBPF, veio praticamente toda a estrutura político-
administrativa da Ciência no Brasil, começando pelo CNPq, poucos anos depois.

Justiça, Independência e Grandeza

Em 1949, Yukawa ganhou merecidamente o Nobel, tornando-se o primeiro


japonês a receber esse prêmio. No ano seguinte, foi a vez de Powell. Gardner
morreu em 1950, em função de um envenenamento devido a uma continuada
exposição ao berílio atribuída a seu trabalho durante o projeto Manhattan, que
levou à construção das bombas atômicas lançadas sobre o Japão em agosto
de 1945. Como foi colocado com perspicácia em um dos obituários de Lattes,
escrito por Iuda Lejbman, pesquisador do Instituto de Física da Universidade
de São Paulo, “uma dúvida plausível que se torna pertinente seria o que poderia
acontecer se Gardner tivesse sobrevivido. O ‘lobby’ de Berkeley, absoluto em
premiações Nobel em épocas posteriores, poderia estar apoiando Gardner e
Lattes? Especulação...”
69
UNIDADE 1 | CINEMÁTICA

Quase um ano depois da morte de Lattes – e mesmo sem o Nobel que muitos
almejam para o Brasil -, todos aqueles envolvidos com a Ciência neste país, de
funcionários e estudantes a pesquisadores e políticos, de linguistas a astrofísicos,
de norte a sul, de leste a oeste, deveriam refletir uns poucos instantes sobre quem
foi Lattes e o que ele fez pelo Brasil. Assim, certamente haverá esperança de que
este país siga rumo àquilo que esse grande cientista – que também foi um grande
ser humano – sempre quis para o povo brasileiro: justiça social, independência
política e grandeza cultural.

Referências

[1] C. Lattes, P. Fowler and P. Cuer, Nature 159, 301 (1947).


[2] G. Occhialini and C.F. Powell, Nature 159, 93-94 (1947). 159
[3] C. Lattes, H. Muirhead, G. Occhialini e C.F. Powell, Nature 159, 694-697 (1947).
[4] C. Lattes, G. Occhialini e C.F. Powell, Nature 160, 453 e 486 (1947).
[5] C. Lattes, G. Occhialini e C.F. Powell, Proceedings of the Physical Society of
London 61, 173 (1948).
[6] E. Gardner e C. Lattes, Science 107, 270 (1948).
[7] E. Gardner e C. Lattes, Physcal Review 75, 382 (1949).

FONTE: Disponível em: <http://www.sbfisica.org.br/fne/Vol6/Num2/a16.pdf>. Acesso em: 8


maio 2018.

70
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• Uma generalização bi e tri dimensional do tópico anterior, nela discutimos a


descrição geométrica da posição de um corpo no plano e no espaço, bem como
sua velocidade como uma taxa de variação dessa posição, em um movimento
uniforme MU, e também a taxa de variação dessa, sua aceleração, no movimento
uniformemente variado MUV.

• Falamos do lançamento oblíquo e como um objeto lançado dessa forma mapeia


o plano, mas também pode se mover no espaço tridimensional, se mais uma
velocidade atuar no eixo apropriado.

• Introduzimos também o movimento circular uniforme MCU. Fazendo uso da


imagem de um moinho discutimos os conceitos de ângulo varrido, velocidade
angular e das acelerações radial, tangencial e angular.

• Ao também discutir o movimento circular uniformemente variado MCUV


deduzimos, assim como para o MRU e MRUV, as funções horárias para o
ângulo varrido, no MCU a para a velocidade, no MCUV.

• Ao fim do capítulo tratamos do movimento relativo dos corpos. Discutimos


como descrever um evento que ocorre em um determinado referencial, em
termos das direções de outro referencial.

• Toda essa discussão a respeito das definições de grandezas físicas, das


unidades de medida, e da cinemática dos corpos pavimentará o caminho para
a discussão de fenômenos um pouco diferentes, mas não menos importantes.
A quantidade de movimento, a força e a conservação de energia serão nossos
objetos de discussão, mas isso fica para breve.

71
AUTOATIVIDADE

1 A respeito da descrição geométrica do movimento de um corpo no espaço,


aponte as afirmações verdadeiras com um (V) e as falsas com um (F):

a) ( ) A posição de um objeto no espaço pode ser descrita como a combinação


linear de vetores unitários. 

b) ( ) A velocidade é um vetor e pode ser deduzida através da aplicação do
operador derivada termo a termo, sobre o vetor posição. 

c) ( ) A descrição do movimento de um corpo no espaço deve ser tratada
de forma es- parcialmente conjunta, ao se interpretar as variações do vetor
posição no espaço como um movimento único e indivisível. 

d) ( ) A aceleração é um vetor e sua definição está relacionada à diferenciação
temporal do vetor velocidade. 

e) ( ) O vetor deslocamento, definido como a diferença entre os vetores
posição inicial e final é uma grandeza de fato escalar, pois trata apenas da
diferença de percurso dos vetores de posição. 


2 A respeito do lançamento oblíquo de um corpo no espaço, aponte as


afirmações verdadeiras com um (V) e as falsas com um (F): 


a) ( ) É um movimento que necessariamente impõe ao corpo acelerações em


todas as direções. 

b) ( ) Relativo à função horária da posição vertical y(t), podemos dizer que
um aumento de duas vezes na velocidade vertical inicial implica uma
duplicação de tempo estimado para a altura máxima alcançada pelo objeto
lançado. 

c) ( ) Para o lançamento de projéteis é possível associar, a cada instante,
vetores de posição r, de velocidade v e de aceleração a ao objeto lançado. 

d) ( ) Pelo que vimos na subseção de lançamento de projéteis, podemos
concluir que um objeto nunca poderia deixar a órbita terrestre. 

e) ( ) O lançamento de projéteis possui a forma parabólica especificamente
porque o vetor aceleração da gravidade g nunca altera seu sentido. 


3 Discuta por que é possível lançar objetos ao espaço, se as equações para o


lançamento de projéteis nos mostram que ele alcançará uma altura máxima
em ty, max . 


4 Calcule a altura máxima atingida por uma esfera de ferro, lançada a 20o de
inclinação, com o solo, se o módulo de sua velocidade inicial é dado por
v0 = 200 m/s. Você pode considerar g =10 m/s/s.

5 A respeito do movimento circular uniforme MCU de um corpo no espaço,


aponte as afirmações verdadeiras com um (V) e as falsas com um (F):

72
a) ( ) O MCU é um tipo de movimento no espaço cujas equações que o
descrevem guardam uma relação de analogia com o MRU. 

b) ( ) O grau é a unidade angular que adotamos para a realização dos cálculos
do MCU. 

c) ( ) O movimento circular uniforme não envolve nenhuma relação com


vetores de velocidade v . 

d) ( ) A velocidade angular tem unidades de rad/s e poderia ser interpretada
como uma contagem de ângulo varrido por unidade de tempo. 

e) ( ) Para que haja uma aceleração angular α atuando sobre um corpo em
MCU não é necessário que o vetor de velocidade v seja alterado. 


73
74
UNIDADE 2

DINÂMICA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• introduzir o conceito de força;

• definir o conceito de equilíbrio de forças;

• discutir as Leis de Newton;

• tratar leis de conservação;

• introduzir o conceito de diferentes formas de força;

• explanar sobre as analogias com o movimento circular.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em dois tópicos. No decorrer da unidade, você en-
contrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – DINÂMICA E SEUS PRINCÍPIOS

TÓPICO 2 – APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA

75
76
UNIDADE 2
TÓPICO 1

DINÂMICA E SEUS PRINCÍPIOS

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico, falaremos sobre o movimento em sua origem. A causa do
movimento de um corpo reside na aplicação sobre este de uma força, de contato
ou de ação a distância. Veremos que para alterar o estado de movimento de um
corpo devemos gerar sobre este uma alteração em sua quantidade de movimento,
ou momento linear. Discutiremos a noção geométrica de soma de forças de um
corpo em equilíbrio, ou seja, quando a soma resultante das forças que atuam sobre
um corpo é nula. Esse problema é bastante empregado no setor de engenharia e
na construção civil, por exemplo.

Vamos discutir também o princípio da inércia, responsável pela resposta


de corpos submetidos à aplicação de uma força. A inércia de um corpo está
associada com sua tendência em manter seu atual estado de movimento, o que
significa que um corpo oferecerá resistência a qualquer força que tente alterar
sua atual quantidade de movimento. Passaremos então para a discussão das
três leis de Newton, começando pela primeira – a lei da inércia – e passando
por sua descrição matemática na segunda lei, até a lei de ação e reação. Por fim,
definiremos o momento linear e discutiremos também a lei de conservação que
rege sua conservação.

O Tópico 2 está reservado para a discussão de algumas aplicações do
conceito de força. Em diferentes situações, essa mesma abstração pode assumir
formas diferentes, dependendo de diferentes quantidades. Começaremos uma
rápida recapitulação histórica, uma rápida discussão da biografia de Isaac
Newton, sua história e legado. Depois trataremos do equilíbrio de forças, condição
necessária à estabilidade de qualquer edificação. Então discutiremos o princípio
da inércia, tão presente em todos os nossos deslocamentos diários. Debateremos
as leis de Newton e suas aplicações e então discutiremos as leis de conservação
do momento linear.

77
UNIDADE 2 | DINÂMICA

2 A MECÂNICA NEWTONIANA
A dinâmica é a área da mecânica que trata da origem do movimento.
Esse conceito evoluiu com o passar do tempo e foi inicialmente endereçado por
Aristóteles, na Grécia, aproximadamente 350 a.C. Ele acreditava que, para entrar
em movimento, um corpo precisa estar sujeito à ação daquilo que atualmente
chamaríamos de uma força, o que até hoje faz sentido, porém Aristóteles
acreditava que também para mantê-lo em movimento era necessário submetê-lo
a uma força constante, durante todo o movimento, o que não faz mais sentido nos
dias de hoje.

DICAS

Para uma contextualização histórica do pensamento aristotélico e a título de


comparação, sugerimos a leitura do trabalho “A complexidade do movimento local na Física
aristotélica”, A. Campos e É. C. Ricardo, (2012), pulicado na Revista Brasileira de Ensino de
Física. Nele, os autores discutem a visão de Aristóteles para o movimento local, na superfície
terrestre. Disponível em: <https://bit.ly/2kd6e00>.

Muitos foram os pensadores do movimento, entre eles Galilei, porém o


mais marcante de todos foi, definitivamente, Isaac Newton (1642-1727). Nascido
prematuramente em uma família simples, no dia 25 de dezembro de 1642, em
Lincoln Shire, Inglaterra, filho de um trabalhador homônimo, morto três meses
antes de seu nascimento e de Hannah Ayscough, que se casou novamente, agora
com Barnabas Smith. Devido ao novo casamento da mãe, Newton foi criado pela
avó desde os três anos, e há quem diga que essa primeira infância conturbada
deixou traumas em sua personalidade. A Figura 1 apresenta um retrato de
Newton, pintado por Godfrey Kneller (1646-1723), o retratista inglês mais
requisitado na Inglaterra entre os séculos XVII e XVIII.

78
TÓPICO 1 | DINÂMICA E SEUS PRINCÍPIOS

FIGURA 1 - ISAAC NEWTON, DE GODFREY KNELLER, 1702

FONTE: Disponível em: <goo.gl/T9ZNwP>. Acesso em: 9 mar. 2018.

Ele se matriculou no Trinity College, em Cambridge, em 1661 e influenciado


principalmente por Francis Bacon (1561-1626) e René Descartes (1596-1650), se
inclinou para o estudo da matemática e da astronomia. Quando em 1664 foi
selecionado para uma bolsa de estudos na Trinity, teve que fugir da grande peste
que atingiu as regiões mais populosas da Europa. Foram dois anos de isolamento
altamente frutíferos, em termos de trabalhos originais. Estudando a geometria
de Descartes, Newton avançou no desenvolvimento do cálculo. Ainda durante
seu período de solitude, desenvolveu as bases para sua teoria da gravitação e
também da ótica.
Ao retornar ao Trinity College, em 1667, se tornou membro
da Universidade de Cambridge, ocupando em 1669 uma posição de professor,
substituindo uma grande influência, o teólogo e matemático Isaac Barrow
(1630-1677). Com o tempo, sua fama e influência crescem, chamando a atenção
e entrando em um conflito de ideias com Robert Hooke (1635-1703), filósofo e
estudioso da matemática. Hooke discordava de suas ideias a respeito da luz e
das cores. Embora pesaroso pelos conflitos anteriores, há registros de discussões
entre Newton e Edmond Halley (1656-1742) – aquele do cometa – a respeito do
movimento dos planetas, que evidenciam sua extensa cobertura de interesses
dos fenômenos naturais. Seu maior alcance editorial foi a publicação do livro
Philosophiae naturalis principia mathematica, em que define formalmente suas ideias
a respeito do movimento dos corpos. Além de aventuras no mundo da ciência,
Newton se aventurou também no parlamento em 1689, como guardião na casa da
moeda real, em 1696, e mestre em 1699.

Talvez essa posição na hierarquia aristocrata o tenha beneficiado bastante e


também mostrado uma faceta mais rigorosa do cientista. Até sua morte, em 1727,
ocupou o cargo de presidente da Real Sociedade, cargo para o qual foi eleito em 1703.


79
UNIDADE 2 | DINÂMICA

Newton não contribuiu diretamente para o desenvolvimento do método


científico, este já estava alicerçado no imaginário do pesquisador científico,
mas com o ferramental matemático, ele divide com Gottfried Wilhelm von
Leibniz (1646-1716) um de seus maiores desafetos em vida, o título de inventor
do cálculo diferencial e integral ou método dos fluxões, como ele se referiu
ao que hoje conhecemos como diferenciação, em seu livro Method of Fluxions,
publicado em 1736. Você, como aluno de física e atual ou futuro estudante da
disciplina de cálculo, já deve ter ideia da complexidade matemática encerrada
nesse conceito. Aqui, tentaremos esclarecer a validade do cálculo para a Física e,
consequentemente, a Engenharia.

Newton foi o precursor da força e da dinâmica, e hoje seu nome é lembrado
na escala de unidades da grandeza. Ele deu um passo além de Aristóteles e seu
impetus, e mostrou que o estado de movimento de um corpo só pode ser alterado
através da aplicação de uma força que altere seu vetor velocidade, causando neste
uma aceleração. A inércia é a responsável por manter o estado de movimento de
um corpo entre a interferência de uma força e outra, corrigindo Aristóteles. Mas
antes de nos aprofundarmos nesse tópico, vamos tentar definir o conceito de força.

DICAS

Tratando desse assunto, gostaríamos de sugerir a leitura do trabalho


“Demonstração" da lei da inércia?”, de F. Catelli, O. Giovannini Jr. e V. G. Laurido (2016),
publicado na Revista Brasileira de Ensino de Física. Nele, os autores propõem uma discussão
a respeito de como a inércia é apresentada aos alunos de nível médio. O trabalho apresenta
demonstrações experimentais da lei da inércia. São ideias interessantes para uma abordagem.
Disponível em: <https://bit.ly/2rZa1m5>.

Todos nós temos uma noção intuitiva do que significa a ação de uma
força. Na infância, quando um colega nos empurrava ou nos chocávamos contra
alguma pessoa, sentíamos os efeitos de empurrões e trombadas em nossos corpos.
Se você já teve que ajudar um colega a empurrar seu carro pifado, sabe muito
bem o que significa aplicar uma força sobre um objeto.

Para ilustrar esse conceito, faremos uso da lenda de Sísifo. Segundo a


mitologia grega, Sísifo foi o filho de Éolo, rei da Tessália, e Enarete. Sua astúcia
era reconhecida pela população e quando, por causa dela, entrou em conflito
com Zeus, sendo submetido a um castigo interessante. A Figura 2 apresenta
uma imagem renascentista de Sísifo em meio a seu castigo, pintado por Tiziano
Vecellio (1473-1490), exposto no Museo del Padova, em Madri. Foi condenado a
carregar uma pedra da base ao topo de uma montanha repetidamente. O sadismo
do castigo estava em a pedra rolar periodicamente, morro a baixo, em direção à
base. Forçando Sísifo a reiniciar a punição.

80
TÓPICO 1 | DINÂMICA E SEUS PRINCÍPIOS

Coloque-se na posição de Sísifo. É uma situação, de certo modo, muito


semelhante àquela de empurrar o carro de seu amigo, mas para o resto da sua
existência. Ele precisava colocar em movimento, a partir do repouso, uma pedra
muito pesada, com uma massa m.

FIGURA 2 – SÍSIFO, DE TIZIANO VECELLIO, 1549

FONTE: Disponível em: <goo.gl/BaAvR1>. Acesso em: 9 mar. 2018.

Considerando a unidade anterior, que trata do movimento em si e não


de suas causas, você pôde notar que para tirá-la do repouso, velocidade inicial
igual a zero ou constante, era necessário que ele alterasse seu estado inicial de
movimento, que chamaremos de instante 1, aumentando sua velocidade até um
determinado valor não nulo em um instante 2, ou seja, v1 = 0 para v2 ≠ 0.

Obviamente, você já deve ter percebido que essa alteração no valor de
sua velocidade, em relação ao solo, por exemplo, implica uma aceleração. Você
há de convir também que é mais fácil empurrar uma pedra pequena do que uma
grande. Com isso em mente é uma questão de raciocínio se dar conta de que, a
força necessária para alterar o estado de movimento de uma pedra, dependerá
tanto da massa da pedra quanto da taxa com que se alteram as velocidades
envolvidas. Isso significa dizer que, para mover a pedra, Sísifo deve aplicar sobre
ela uma força proporcional a sua massa e à aceleração que deseja imprimir à
mesma. Daí fica fácil perceber a origem da famosa expressão para a força:

F = ma (2.1)

81
UNIDADE 2 | DINÂMICA

Perceba que a equação (2.1) apresenta uma formulação escalar, pois ainda
não estamos interessados nas direções e sentidos que estarão envolvidos, mas
considerando que Sísifo devia empurrar a pedra para frente e morro acima, você
já deve ter notado que a força é uma grandeza vetorial.

O conto de Sísifo é uma boa exemplificação da aplicação do conceito de


força, mas se você já teve que empurrar o carro de um amigo, também já sentiu na
pele aquilo que discutimos aqui. Uma vez definido o conceito de força, é preciso
ressaltar que o desenvolvimento científico conduziu a descobertas peculiares
que subdividiram esse conceito. O tipo de força mais comum e acessível à nossa
compreensão é, claro, o de forças de contato. Essas são forças que, como o próprio
nome diz, exigem um contato físico entre corpos. É necessário que você encoste
no carro para poder empurrá-lo. Uma batida de trânsito, uma trombada em
meio à multidão ou o puxão de uma corda amarrada a um barco, são exemplos
claros de uma força de contato, mas essa não é o único tipo de força existente,
tampouco o único de que trataremos. Existem forças que atuam sobre corpos
sem a necessidade de um contato físico direto. As forças elétricas, magnéticas ou
nucleares fortes e fracas são também formas de se atuar sobre um corpo, sem a
necessidade de contato físico direto.

Newton foi tão importante na formulação teórica que adotamos até hoje
para o tratamento da força, que dá seu nome à unidade escolhida para representá-
la. O reconhecimento e homenagem a ele prestados se dão devido ao trabalho
publicado no livro Princípios matemáticos da filosofia natural, do Latim Philosophiae
naturalis principia mathematica, com primeira edição publicada ainda no século
XVII. Nele, Newton apresenta a fundamentação teórica para suas três leis do
movimento dos corpos, que são referenciadas de forma enumerada e se tornaram
homônimas a ele.

3 EQUILÍBRIO DE FORÇAS
Como definimos intuitivamente antes, a força é uma grandeza vetorial
e como um vetor pode ser somado geometricamente no espaço. Considere, por
exemplo, um grupo de leoas que ataca um gnu, digamos três ou quatro de uma
vez só, uma à frente, outras duas de cada lado e um puxa o animal pelo rabo. Cada
uma delas arrasta a presa para seu lado, para baixo, talvez para cima, dependendo
da geografia do terreno. Cada uma delas aplica uma força. Considerando-se a
soma de forças N envolvidas, o gnu tenderá a ser deslocado na direção e sentido
da força resultante. Observe a equação a seguir:

→  →
→  →  

FR= F1 + F2 + F3 + …+ FN (2.2)

Mas e se todas elas, por algum motivo, puxam o bicho com a mesma
força e em direções opostas, teremos então, embora sob a ação de quatro forças
distintas e um sofrimento dilacerante, a tendência de manter-se imóvel. Eis então
o conceito de equilíbrio de forças. Vejamos a seguir uma formulação a respeito:

82
TÓPICO 1 | DINÂMICA E SEUS PRINCÍPIOS

 →
→  →   →
→ 
F1 + F2 + F3 + …+ FN = 0. (2.3)

Note→
que após a soma das N forças envolvidas, a soma resultante é o
vetor nulo 0 . Você pode pensar nisso também como um cabo de guerra entre N
equipes de puxadores. Além de ser uma analogia válida, o cabo de guerra parece
um exemplo bem mais divertido e agradável. Considerando a equação (2.1), pode-
se notar que essa somatória de forças que resulta em um vetor nulo representa
uma posição estática do corpo sobre o qual se aplicam as forças. Embora N seja
aplicada, a somatória
→ →
delas é zero, o que implica que o corpo não está submetido
a uma aceleração a = 0.

4 PRINCÍPIO DA INÉRCIA 

O princípio da inércia é um cânone da física clássica, a partir do qual
construiremos nosso entendimento da dinâmica dos corpos. A inércia dos corpos
é representada pela massa dos mesmos e constataremos isso mais adiante,
quando tratarmos do conceito de quantidade de movimento, sua importância
para o entendimento da relação entre a força aplicada a um corpo e aceleração
que este adquire. Veremos, a seguir, as três leis que esquadrinham as bases para
o tratamento da dinâmica dos corpos.

5 LEIS DE NEWTON
Agora, focaremos nossa atenção nas três leis enunciadas por Newton,
que estabelecem os conceitos mais fundamentais da dinâmica que contribuem
massivamente para a realidade onde vivemos fazer sentido para nós. Sugiro que
você as interprete com calma e atente para sua simplicidade e, ainda assim, a
complexidade de informações sobre o mundo a nossa volta.

5.1 1ª LEI DE NEWTON


O primeiro desses regulamentos que estruturam a dinâmica dos corpos
é conhecido como a lei da inércia. A inércia é uma propriedade dos corpos
associada ao seu atual estado de movimento. É importante que você entenda aqui
que o termo movimento faz referência à marcha de um corpo, seja ela estacionária
ou constante, ou seja, se o corpo se desloca, ou não, em relação a um referencial
especificado. Caso esse conceito não esteja claro, sugerimos que o leitor invista na
releitura do capítulo anterior. De qualquer modo, a lei da inércia diz que a menos
que uma força atue sobre um corpo, ele tenderá a manter seu estado incipiente
de movimento. Se um corpo se desloca com velocidade constante em relação a
um referencial, ele tenderá a manter essa velocidade, a menos que uma força atue
sobre ele. E se atuar, ele será submetido a uma aceleração. Se esse corpo estiver

83
UNIDADE 2 | DINÂMICA

em repouso e parado em relação a um referencial, ele tenderá a se manter em


repouso, a menos que uma força atue sobre ele, e se atuar, ele será submetido a
uma aceleração.

5.2 2ª LEI DE NEWTON


A segunda lei de Newton é uma formulação matemática sucinta do
princípio da inércia. A seguir, na equação (2.4), vemos que a ausência de uma força
→ → → →
F = 0 impossibilita a impressão de uma aceleração a = 0 a um corpo de massa m.
Observe:

 →

F =m a ; (2.4)
→
→ F
a= .
m

  1 →
Perceba que como a aceleração pode ser escrita como →
a =   F , ou seja,
→ m
o produto entre um escalar 1 e um vetor F, continua sendo representada por
m
um vetor:


 →
 d → d →
F ma
= =
dt
( mv=) dt
p, (2.5)

→ → →
em que a grandeza p = mv. A grandeza p é então definida como
quantidade de momento, ou momento linear, de uma partícula ou corpo de
massa m. Observando a equação (2.5), concluímos que para alterar o estado
de movimento, ou quantidade de movimento, de uma partícula de→massa m é
necessário atuar sobre ela com uma força proporcional de módulo |F|. Perceba
como essa expressão encerra em si o conceito de inércia, discutido anteriormente.

5.3 3ª LEI DE NEWTON


A terceira lei de Newton continua fazendo referência à força, porém esta
considera a mudança de referencial entre os atores envolvidos. Tecnicamente, a
lei diz que para a toda ação existe uma reação igual em direção e módulo, mas
de sentido contrário. Em outras palavras, para cada força imposta por um corpo
A há um corpo B, há uma força de resposta imposta pelo corpo B ao corpo A. Do
ponto dos referenciais envolvidos, você pode interpretar que há uma espécie de
lei de conservação associada à equação:

→ 

FAB = − FBA , (2.6)

84
TÓPICO 1 | DINÂMICA E SEUS PRINCÍPIOS

De modo que a soma das forças de ação do corpo A sobre o corpo B,


com a de reação do corpo B sobre o corpo A, tendem a se cancelar. A grandeza
conservada a que fazemos referência aqui é movimento do centro de massa entre
os corpos A e B, que é definido como:

→ 1 → → → →
 →
=rcm
M
( m1r1 + m2 r2 + m3 r3 + m1r1 +  + mN rN ) ; (2.7)

N
1 →
=
M ∑m r .
i =1
i i

Em que consideramos a média das posições de cada um dos corpos


envolvidos no sistema, dois por enquanto. A massa total é definida como
M = m1 + m2 + m3 + ... + mN e podemos considerar em nosso caso M = m1 + m2 .

DICAS

Para uma leitura mais focada nas aplicações desse conceito em termos de
ensino, sugerimos a leitura do trabalho “Um foguete de garrafas PET”, de autoria de J. A. Souza
(2007), pulicado na Revista Física na Escola. Nele, o autor sugere a confecção de foguetes
feito com garrafas plásticas. Temas como propulsão, aerodinâmica, estabilidade, lançamento,
variação do momento pela alteração da velocidade e da massa são discutidos e podem
proporcionar inspiração. Disponível em: <https://bit.ly/2IVlMU1>.

O centro de massa é uma posição específica em um sistema. É nesse ponto


que concentramos a ação das forças que atuam em um corpo, quando desenhamos
o diagrama de forças, por exemplo. Sua relação específica com a terceira lei de
Newton pode ser entendida através da arte.

O quadro apresentado na Figura 3 (a) foi pintado pelo artista americano


William James Glackens (1870-1938), intitulado Skating in Central Park, ou
esquiando no Parque Central, em uma tradução literal. Ele representa em um estilo
realista um dia de inverno na Nova York de 1910. Ele também representa para nós
uma boa oportunidade de discutir a terceira lei de Newton, que trata da ação e
reação e sua relação com a conservação do centro de massa.

Considere os dois patinadores no centro da pintura: o rapaz com casaco


escuro e chapéu e a moça com o longo vestido rosa e chapéu roxo, se tocando
pelas mãos. Imagine que o casal resolva brincar de empurrar um ao outro, apenas
pressionando as palmas das mãos de cada→um. Toda a ideia é pictoricamente
descrita na Figura 3 (b). Perceba

que a força Fr,m que a moça aplica sobre o rapaz
é compensada pela força Fr,m que o rapaz realiza sobre a moça. Escolhemos

85
UNIDADE 2 | DINÂMICA

convenientemente o retrato de um lago congelado, pois aqui podemos assumir a


total falta de atrito entre os patinadores e a superfície. Consideramos também um
dia bem calmo, sem grandes rajadas de vento. Apenas as forças dos namorados
são consideradas.

FIGURA 3 – SKATING IN CENTRAL PARK, DE WILLIAM JAMES GLACKENS, 1910

a) b)
FONTE: Disponível em: <goo.gl/Dzf4J9>. Acesso em: 9 mar. 2018.

Sob essa circunstância gelada e escorregadia, algo muito interessante


aconteceria. Ao fim da manobra, os dois seriam lançados de suas posições atuais,
em sentidos opostos. Lembre-se de que pela terceira lei de Newton, equação (2.6),
a cada ação corresponde uma ação igual e contrária. À ação do rapaz, de empurrar
a moça, haveria também a reação da moça, empurrando o rapaz, e vice-versa.

6 LEIS DE CONSERVAÇÃO
Vamos agora adentrar em um aspecto muito importante da interpretação
física da realidade, de fato uma das principais ferramentas para a realização de tal
descrição. As leis de conservação se mostrarão daqui para frente como princípios
fundamentais para o determinismo relacionado à mecânica clássica. Elas consistem
na conservação de determinada grandeza, uma espécie de preservação de uma
quantidade específica, quando avaliada antes e depois de dois eventos distintos.

A ideia da conservação de uma determinada quantidade precede


formulações matemáticas, diversos foram os pensadores que imaginaram
diferentes grandezas conservadas com o passar dos tempos. O químico francês
Antoine Laurent de Lavoisier (1743-1794) ficou conhecido como o pai da química
moderna com sua célebre frase "... na natureza nada se cria, nada se perde, tudo
se transforma" se tornou um símbolo de continuidade dos processos naturais.
Nossa intenção aqui não é discutir a química, mas podemos acatar essa colocação
a respeito do movimento dos corpos. Além de Lavoisier, podemos citar outros
idealistas da conservação de grandezas naturais, como Joseph Priestley (1733-
1804) e Henry Cavendish (1731-1810) e o princípio de conservação da massa.

86
TÓPICO 1 | DINÂMICA E SEUS PRINCÍPIOS

A quantidade a ser conservada que consideraremos aqui será a quantidade


→ →
de movimento p = mv, com a qual você teve contato em alguns parágrafos
anteriores. René Descartes (1596-1650), conhecido como o pai do método
científico, foi um dos primeiros a enunciar o princípio cujo enunciado mais se
assemelha à versão moderna do que praticamos hoje. Em sua asserção, Descartes
cita uma figura criadora de todo o universo, que concedeu a este uma quantidade
de movimento limitada e imutável. Dois corpos, segundo ele, poderiam então
trocar quantidades de movimento, sem alterar a quantidade finita e constante
presente em todo o universo finito. Apesar de um tanto esotérica, em princípio,
Descartes apontava seu raciocínio em uma direção correta, em comparação com
a formulação teórica que temos hoje.

DICAS

Para uma leitura mais focada nas aplicações desse conceito em termos de
ensino, sugerimos a leitura do trabalho “Os princípios fundamentais ao longo da história da
física”, de J. P. Baptista (2006), pulicado na Revista Brasileira de Ensino de Física. Nele, o autor
trata alguns dos princípios de conservação mais aplicados nas ciências naturais. A leitura é
válida, pois fornece uma perspectiva a respeito da discussão aqui abordada. Disponível em:
<https://bit.ly/2IEEsIF>.

O momento linear é um vetor, dado pelo produto entre massa de um


corpo e sua velocidade, é possível calcular um momento linear resultante, em um
evento n corpos envolvidos. Isso pode ser visto na expressão (2.8) a seguir:

 →  →  →  →

p = p1 + p2 + p3 +...
 + pN (2.8)

A ideia por trás da conservação dessa quantidade é que a soma dos


momentos lineares de dois ou mais corpos, antes e depois de um determinado
evento, mantém um valor constante, como pode ser visto na equação (2.9) a seguir:


 → →
 →
 →
 →

pi =
p1;i + p2;i =
+ p1; f + p2; f =
pf (2.9)

Perceba que, independentemente de como essa grandeza seja transferida


de um corpo, existe a conservação do momento entre os momentos inicial (i) e
 →
→ 
final (f), expressa pela igualdade pi = p f . Esse conceito de conservação pode ser
traduzido de uma forma diferente, em termos da variação, do momento linear
dos corpos envolvidos. Observe a equação (2.10):
→ →  →
 →
 →
 →

( )
∆p1 = p1; f − p1;i = − p2; f − p2;i = −∆p2 , (2.10)

87
UNIDADE 2 | DINÂMICA

→ →
e note que, apesar de termos a possibilidade das desigualdades p1; f ≠ p1;i

→ 

e p2; f ≠ p2;i , o que significa que há uma variação de momento linear de um corpo
específico, é imperativa a igualdade ∆→
 
p1 = −∆→
p2 . Eis aí, mais uma interpretação
matemática da conservação do momento linear.

Você pode entender essa igualdade da seguinte forma: ela diz que a variação
do momento linear associado à partícula (1) é igual à variação de momento linear
associado à partícula (2), o sinal negativo (-) indica que a perda de momento em
um corpo é traduzida como o ganho de momento em outro. São variações opostas.

Imagine agora se considerarmos essa variação de momento linear, das duas
partículas, dentro de um determinado intervalo de tempo. Isso pode ser investigado
com o auxílio equação (2.11):

→ →

∆p1 ∆p2
= − . (2.11)
∆t ∆t



Se tomarmos o limite lim ∆p = d →
p , poderemos reescrever a equação
∆t →0 ∆t dt
(2.11) como:

d →  d →
p1 = − p2 ; (2.12)
dt dt
d →  →  →

dt
( p1 + p2 ) = 0.

Note como, ao estruturarmos as duas variações de momento em apenas


um lado da equação, agora considerando a soma de ambas, encontramos, por fim,
que a variação de tal quantidade é nula. Como se não fosse suficiente, Descartes
enunciou a lei da inércia como um princípio, uma “proposição que exprime um
comportamento básico e fundamental de um conjunto de partículas isoladas,
independentemente das leis de movimento que as mesmas estão sujeitas”, como
exprime tão bem o autor (Baptista, J. P. 2006).

88
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• A dinâmica é a área da mecânica que lida com a origem do movimento de um


corpo.

• Para alterar o estado de movimento de um corpo, submetendo-o a uma


aceleração, é necessário que uma força seja aplicada sobre o mesmo.

• Isaac Newton é considerado o pensador mais influente da física clássica.

• Newton foi o autor da teoria que aplicamos ainda hoje, em áreas que vão do
estudo e ensino da física, ao planejamento das estruturas mais diversas no
campo da engenharia.

• Definimos o conceito de força, apelando à mitologia de Sísifo, condenado a


carregar uma pedra de grande massa por toda a eternidade.


• Há um tratamento vetorial dessa grandeza.

• O somatório de todas as forças que atuam em um sistema é conhecido como


força resultante.
→ →
• O equilíbrio dessas forças, implica uma aceleração nula, a = 0 .

• A inércia é uma propriedade intrínseca da matéria.


→ →
• A força é definida como F = ma ;
→ →
• O momento linear é uma grandeza vetorial, definida como p = mv .

• Para variar a quantidade de movimento de um objeto é necessário aplicar uma


força sobre ele.

89
AUTOATIVIDADE

1 Newton foi um dos maiores pensadores da fenomenologia física da história.


Seu trabalho alterou a forma como vemos o mundo e dele fazemos uso até
os dias atuais. Recordando nossa discussão anterior, a respeito da biografia
de Newton, considere as seguintes afirmações e classifique-as como
verdadeiras (V) ou falsas (F):

a) ( ) Formulou as três leis da dinâmica.



b) ( ) Desenvolveu independente de Leibniz o cálculo integral e diferencial.
c) ( ) Trabalhou ativamente no desenvolvimento do método científico.

d) ( ) Formulou uma teoria para a gravitação dos corpos.

e) ( ) Desenvolveu em conjunto com Leibniz o cálculo integral e diferencial.

2 O conceito de força está intimamente relacionado à origem de qualquer


movimento, uma vez que reflete a própria variação de momento de um
corpo. Recordando nossa discussão anterior, a respeito do conceito de força,
considere as seguintes afirmações e classifique-as como verdadeiras (V) ou
falsas (F):

a) ( ) Foi formulado exclusivamente para descrever como uma maçã madura


cai da macieira. 

b) ( ) Emerge do conceito de movimento e alteração de estado de movimento.

c) ( ) Demonstra que a velocidade de queda de um corpo de fato depende de
sua massa. 

d) ( ) Mostra que para manter um objeto em movimento é necessária a
aplicação de uma força.
e) ( ) Está intimamente ligado ao conceito de conservação do momento
linear. 


3 Imagine que você assiste, de cima para baixo, a um cruzamento: quatro


carros se envolvem em uma batida simultânea, após cada um deles acelerar
para ser mais rápido que os outros. O carro 1 possuía uma aceleração
→
a=
→
3iˆ + 4 ˆj . O carro 2 possuía a1 = − 3iˆ − 4 ˆj . Os carros 3 e 4 apresentavam
1

 
acelerações a3= 1iˆ + 1 ˆj e a=→
4 2iˆ + 2 ˆj . Considerando uma massa média de
aproximadamente 1000 kg, indique das opções a seguir qual representa
CORRETAMENTE o vetor força resultante das quatro, provenientes da
batida:



( )
) FR 10 1iˆ − 1 ˆj N.
a) ( =
3

→
( )
) FR 103 3iˆ + 3 ˆj N.
b) ( =


( )
) FR 106 1iˆ − 1 ˆj N.
c) ( =

90
→ 5
(ˆ ˆ )
) FR 10 3i + 3 j N.
d) ( =


( )
) FR 300iˆ + 300 ˆj N.
e) ( =

4 O conceito de inércia é intimamente ligado ao nosso entendimento do que


é o movimento de um corpo em relação a um referencial, que em nosso dia
a dia se manifesta toda vez que andamos de carro, descemos escadas ou
pegamos um elevador. Recordando nossa discussão anterior, a respeito do
conceito de inércia, considere as seguintes afirmações e classifique-as como
verdadeiras (V) ou falsas (F):

a) ( ) O conceito de inércia descreve como se dá a alteração do estado de


movimento de um objeto. 

b) ( ) De forma resumida, o conceito de inércia diz que um corpo tende a
manter seu estado de movimento em relação a um determinado referencial,
a menos que uma força atua sobre ele.
c) ( ) O conceito de inércia descreve como é necessária a ação constante de
uma força para manter um corpo em movimento com velocidade constante.

d) ( ) O momento de inércia tem aplicações diretas na indústria automobilística.

e) ( ) A inércia é a responsável por manter o condutor ao banco do carro,
durante alterações bruscas de percurso. 


5 A segunda lei de Newton relaciona a aplicação de uma força em um corpo


à alteração de seu estado de movimento, o que significa a aceleração desse
corpo. Recordando nossa discussão anterior, a respeito da segunda lei de
Newton, considere as seguintes afirmações e classifique-as como verdadeiras
(V) ou falsas (F):


a) ( ) Uma força está associada a toda aceleração à qual um corpo seja


submetido. 

b) ( ) O movimento retilíneo uniforme de um objeto sobre o gelo é
impulsionado por uma força líquida na mesma direção e sentido do
movimento, pois podemos desprezar o atrito com o solo.
c) ( ) A segunda lei de Newton é uma clara demonstração de que a força F1
necessária para mover o objeto 1 mais pesado, em relação a outro objeto 2
mais leve é menor F2, se mantivermos a aceleração constante.
d) ( ) Pela segunda lei de Newton, podemos perceber que a força necessária
para submeter um corpo de massa m a uma aceleração a é diretamente
proporcional à massa do corpo e à taxa de variação da velocidade desse
corpo. 

e) ( ) A força resultante é conhecida como a soma vetorial de todas as forças
que atuam em um sistema. 


6 A reação a uma força aplicada está associada à conservação de momento


linear durante a interação. O recuo de uma arma disparada, a inversão nas
velocidades de bolas de bilhar que se chocam frontalmente ou o ricocheteio

91
contra o cinto de segurança do carro são exemplos da ação e reação de
Newton. Recordando nossa discussão anterior, a respeito da ação e reação,
considere as seguintes afirmações e classifique-as como verdadeiras (V) ou
falsas (F):

a) ( ) Para haver reação a uma determinada força é necessário que as


superfícies estejam em contato.
b) ( ) A reação a uma força terá sentido oposto ao dela.
c) ( ) Quando reação equipara ação, não observamos acelerações.
d) ( ) Apenas forças de contato apresentam forças de reação.
e) ( ) Objetos colocados sobre superfícies planas se submetem a uma força de
reação ao seu peso normal à superfície. 


92
UNIDADE 2 TÓPICO 2

APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico, discutiremos algumas aplicações do conceito de força. Para
isso é necessário introduzir uma técnica de avaliação da dinâmica dos corpos
muito importante para a discussão e resolução de problemas de mecânica.
Chamamos essa técnica, que consiste em traçar vetorialmente as forças envolvidas,
de diagrama de forças. Imagine que cavalos puxam uma carroça, carregada por
uma determinada distância, em um terreno lamacento. Começaremos discutindo
a força gravitacional, a mais abrangente de todas as forças descritas classicamente.

Seguiremos então para uma discussão a respeito do peso dos corpos, uma
consequência da força gravitacional. Falaremos da força normal às superfícies
em que pousamos objetos. Ainda discutiremos os efeitos do atrito, do arrasto
e das forças resistivas. Em contraste às forças resistivas, discutiremos as forças
reparadoras, associadas à restauração de energia em sistemas massa-mola.
Tratando de corpos mergulhados em fluidos discutiremos o empuxo.

Adentrando o ambiente eletromagnético, discutiremos brevemente


as forças associadas aos fenômenos de campo elétrico e magnético. Por fim,
terminamos a unidade discutindo as forças nucleares, fraca e forte, responsáveis
pelas relações de decaimento de partículas e suas interações com outras partículas
nucleares.

2 O DIAGRAMA DE FORÇAS
Na Figura 4 (a), apresentamos uma obra do pintor belga François Backvis
(1857-1926), intitulada Four horses pulling a wagon loaded with trees through a winter
landscape; ou Quatro cavalos puxando uma carroça carregada com árvores através de
uma paisagem de inverno, numa tradução literal. Quatro cavalos, como o próprio
nome diz, puxando uma carroça com algumas toras de madeira, sobre um terreno
recentemente submetido à neve. É possível imaginar que a carroça se encontrava
atolada no momento retratado.

93
UNIDADE 2 | DINÂMICA

FIGURA 4 – (A) FOUR HORSES PULLING A WAGON LOADED WITH TREES THROUGH A WINTER
LANDSCAPE. POR FRANÇOIS BACKVIS, EM 1851; (B) DIAGRAMA DE FORÇAS

a) b)

Com isso em mente, vamos agora, por meio da Figura 4 (b), intervir na obra
de Backvis, apresentando as principais forças em ação sobre a carroça. O primeiro
passo é estabelecer um sistema de referência, como padrão de comparação de
nossas observações. Aqui associaremos x para a horizontal e y para a vertical.
Obviamente esta é uma convenção, das mais comuns, e você poderá encontrar
outros tipos de convenções, previamente estabelecidas, em outras ocasiões.

Uma vez introduzido o sistema de referência, podemos apelar para o


que faz dele uma ideia muito interessante. A partir de agora, todos os vetores de
força envolvidos no sistema serão definidos em comparação com o sistema de
referência. Sua direção, seu sentido e seu comprimento.

Portando as ideias da geometria analítica, que revisamos anteriormente,


vamos começar a descrever nosso diagrama de forças, ou diagrama de corpo livre,

como também é conhecido. Temos, para começar, a resultante de forças F gerada
pela soma das individuais
 forças
 →  que cada um dos cavalos realiza ao puxar a
→ → → →
carroça. Algo como F = 1F + F2 + F3 + F4 , em que cada índice numérico representa

um cavalo. Temos ainda o peso P da carroça, que → deve levar em conta o peso da
carga de toras. Além disso, há a força de atrito Fat entre as rodas da carroça e
o solo. Ela tem um caráter dependente dos materiais relacionados no contato e
atua no sentido contrário do movimento, dificultando-o. Vamos supor aqui uma
força de atrito em apenas uma direção, com a intenção de simplificar os cálculos.

Projetamos o vetor F nos eixos x e y, através das relações trigonométricas:
 
Fx  Fx  F cos ; (2.13)
 
Fy  Fy  F sin 

94
TÓPICO 2 | APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA

Aí está→a projeção da força resultante no plano xy, em que θ é o ângulo


entre o vetor F e o eixo x, mas é possível escolher qualquer outro ângulo entre a
força e o referencial. Perceba que ela pode ser elegantemente descrita em termos
da intensidade da força e do ângulo que ela realiza com os eixos do sistema de
referências. O diagrama de força conecta a física das forças envolvidas em um
evento, com a matemática da geometria espacial euclidiana. É importante que
você entenda bem o que se passa aqui. É o esboço da interpretação newtoniana
de mundo. Ele emprega todas as noções desenvolvidas nas três leis.


F Fx iˆ + Fy ˆj ;
= (2.14)

A ideia aqui é que você possa agora escrever o vetor de força resultante
como uma soma vetorial de suas duas projeções, como na equação (2.14). Ao
fazer isso, você pode analisar o problema separadamente, em cada direção. Isso
facilita os cálculos, pois acaba reduzindo o número de forças em cada direção
e consequentemente simplifica →
o problema. Note

que escolhemos utilizar as
duas notações para vetores, F para o diagrama e F a análise matemática. Tente se
habituar às duas notações.

São três direções no espaço, largura, altura e profundidade, os famosos


(x,y,z). Vamos então discutir uma direção por vez, começando pelo eixo x,
aquele normalmente associado à nossa impressão de horizontal e que, como
tal, consideraremos aqui. Nessa direção duas forças atuam, uma é a projeção


horizontal Fx da força resultante com a qual os cavalos puxam a carroça. Ela tem
o sentido positivo de x. Por outro lado, opondo-se ao movimento da carroça, há a
→
força de atrito Fat , a qual trataremos mais especificamente em breve. Supomos,
obviamente, que os cavalos vencem a batalha contra o barro e conseguem imprimir
uma aceleração à carroça, escapando do atoleiro. Assim teríamos:
  
Fx  Fat  max ;� (2.15)

Note que como pode ser projetado nas duas direções, a equação (2.4)
impõe um vetor aceleração que também deve ser projetado nos dois eixos, daí
ax. Se tomarmos apenas os módulos dos vetores de força e aceleração, teremos:

max ;
Fx − Fat = (2.16)


Na direção y, temos as forças peso P e a projeção vertical da força resultante


dos cavalos Fy :
  
Fy  P  ma y ;� (2.17)

Ou na forma escalar:

ma y ;
Fy − P = (2.18)

95
UNIDADE 2 | DINÂMICA

Aqui, não estamos interessados em resolver um problema específico,


apenas em apresentar o conceito de diagrama de forças. E assim o fizemos. O
diagrama nos ajuda a entender o problema, dividi-lo em pedaços menores
e discutir mais detalhadamente cada um dos movimentos do problema. Mais
adiante, faremos uma discussão a respeito de algumas das mais importantes
forças às quais estamos submetidos, seja direta ou indiretamente. Vamos começar
pelas grandes escalas universais, aplicando a teoria newtoniana à astronomia.
Discutiremos a gravitação universal, que descreve como os corpos celestes
interagem e por que maçãs caem na cabeça de grandes cientistas.

3 FORÇA GRAVITACIONAL
O mito criado ao redor de Newton sugere um dia no pomar, um passeio
entre as macieiras e um incidente frutífero. Verídica ou não, essa fábula fomenta
também a mitologia. A obra de Isaac Newton é um divisor de águas na história
da Física e da Ciência. O conceito por trás daquele mito é mais importante que a
verdade dos fatos. Segundo ele, Newton teria comparado a relação que a Terra
tem com a lua e sua órbita, àquela entre a Terra e uma maçã, que cai do galho
quando madura.

Imagine que ele pode ter pensado que tanto a Lua quanto a maçã estão
sendo atraídas em direção à Terra. Newton pode ter imaginado que, como os três
objetos possuem massa, a força que as atraia poderia estar relacionada a isso, e que
como deveria ser necessária mais força para mover corpos mais massivos, talvez
essa força devesse ser proporcional às massas. Ele talvez tenha considerado que
a maçã está mais próxima da superfície da Terra, em comparação com a lua que
está bem mais longe. A maçã caía mais depressa que a Lua, talvez a intensidade da
força ficasse cada vez menor quanto maior fosse a distância entre os corpos. E com
certeza seria necessário calcular uma constante de proporcionalidade. Talvez tenha
sido assim, talvez não, mas a expressão para a força gravitacional tem essa cara:


→ GmM →

FG = − 2 r ; (2.19)
r

Aqui ela é apresentada na forma vetorial. Perceba como a força FG é

inversamente proporcional à distância r entre as massas. Isso significa que a
intensidade da força é dada sobre a linha que as separa. Para satélites que orbitam
astros, isso significa que a força gravitacional é atrativa e radial. Como M e m
são medidas em kg e [r] = m, G representa uma constante de proporcionalidade
entre a força gravitacional e a razão entre o produto das massas e a distância
entre elas. Ela foi determinada em um experimento realizado pelo físico-químico
francês Henry Cavendish (1731-1810), cujo retrato é apresentado na Figura 5,
folha de rosto da biografia escrita pelo também químico George Wilson (1818-
1859). Nascido em Nice, Cavendish foi o mais velho dos dois filhos de Charles
Cavendish, também físico e dado à experimentação, e Anne Grey, morta

96
TÓPICO 2 | APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA

quando ele ainda tinha dois anos. Sob influência de trabalhos do pai, que era o
administrador do museu britânico no período de sua infância, em áreas como calor,
eletricidade e magnetismo, o jovem Henry cresceu nesse meio. Afinal, o engenho
do experimento não deve ter dado tanto trabalho assim. Henry era conhecido
por realizar medições bastante precisas, principalmente depois que começou a
trabalhar no Royal Greenwich Observatory, o observatório real de Greenwich. Lá,
ele atualizou muitos instrumentos meteorológicos, mas também estimou a massa
da Terra e a composição do ar, além de ter proposto ideias compatíveis com a
teoria de conservação de massa. E, para terminar, foi o autor da descoberta do
hidrogênio.

DICAS

Para uma leitura mais focada na história por trás do cientista francês Henry
Cavendish e como seu trabalho influenciou a história e o desenvolvimento da tecnologia,
sugerimos a leitura do trabalho “Henry Cavendish”, de autoria de J. Wisniak (2004), pulicado
na Revista Educacion Quimica. Nele, o autor discorre minuciosamente sobre a história de
vida, dos primeiros anos, passando pela obra do pesquisador e o legado que ele nos deixou.
Disponível em: <https://bit.ly/2J0D2Ye>.

FIGURA 5 – PÁGINA DE ROSTO DO LIVRO: THE LIFE OF THE HON,


HENRY CAVENDISH. ESCRITO POR GEORGE WILSON, EM 1851

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/n4asDM>. Acesso em: 9


mar. 2018.

97
UNIDADE 2 | DINÂMICA

O experimento em questão era bastante simples e talvez resida aí sua


genialidade. O aparato era constituído por uma espécie de balança que utiliza
a torsão em um fio para medir valores muito pequenos de força. O sistema
apresentado na Figura 6 é composto por uma armação de madeira, dois sistemas
independentes de suspensão. As esferas de chumbo maiores ficavam presas
ao sistema preso no suporte superior, e as esferas menores, no sistema preso
no topo da parte lateral direita. Em cada lado da balança, uma esfera grande e
uma pequena formavam dois pares. O experimento foi capaz de medir a atração
gravitacional entre as esferas de chumbo, a mínima atração gravitacional entre as
esferas de chumbo foi detectada nesse experimento e, uma vez que conhecia as
massas das esferas envolvidas, as distâncias envolvidas e havia acabado de medir
a força gravitacional entre elas, ele precisaria apenas rearranjar a equação (2.19)
para calcular o valor da constante= G 6.74 × 1011 m3kg−1s−2. O erro associado
à medida de Cavendish é de apenas um por cento, quando comparado pelo valor
atual 3 −1 −2
= G 6.7408 × 10−11 m kg s .

FIGURA 6 – EXPERIMENTS TO DETERMINE THE DENSITY OF THE EARTH,


BALANÇA DE TORSÃO DO EXPERIMENTO DE CAVENDISH, 1797-8

G H P H
G
m M M
P

K
F F

L
E E
A g
m A
S nh D hn S T
T D
W W
B C CB
R R
G G

FONTE: Disponível em: <goo.gl/AYbMP2>. Acesso em: 9 mar. 2018.

Considere o quadro da Figura 7 (a). É um óleo sobre tela do pintor Van


Gogh, que você já conheceu anteriormente. A obra hoje está exposta no Museu
de Arte Moderna de Nova York. A pintura retrata o céu noturno do quarto do
hospício onde o artista holandês ficou internado, na cidade de Saint-Rémy-de-
Provence, no sudeste francês, a vila é uma licença poética do autor. Perceba a
Lua no topo, à direita. São momentos que antecipam o amanhecer, mas ainda é
possível perceber algumas estrelas no céu.

98
TÓPICO 2 | APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA

FIGURA 7 – NOITE ESTRELADA, POR VINCENT VAN GOGH, EM 1889

a) b)
FONTE: Disponível em: <goo.gl/p3mnWG>. Acesso em: 9 mar. 2018.

Considerando a tela não apenas sob o ponto de vista do infortúnio de Van


Gogh, mas também sob a ótica newtoniana da gravitação, poderíamos imaginar
um diagrama das forças gravitacionais entre a Lua, a Terra e as estrelas com a
forma descrita na Figura 8 (b). Note que todas as onze estrelas foram enumeradas,
assim como a Terra (T) e a Lua (L), note também que apenas a interação Lua-
→ →
Terra é descrita com os vetores das forças FL ;T = − FT ; L bem identificados. Esta é
a única interação descrita na imagem, mas não a única existente. Como estamos
considerando a interação entre a Lua e os demais objetos celestes, perceba que há

→ →  
→ 

um número finito de vetores de força, como F L ;1 = − F1; L , FL ; 2 = − F2; L etc. É claro
que esta é um epítome do conceito, com a intenção de demonstrar a complexidade
da gravitação newtoniana e seu caráter geométrico.

Se você se pergunta por que os objetos celestes “possuem uma força


gravitacional", ou por que objetos que possuem massa tendem a se "atrair no
espaço", você está no caminho certo. Mas as respostas para essas dúvidas podem
não ser tão relevantes assim. Não sabemos exatamente porque o universo se
comporta de tal maneira. Ainda estamos trabalhando nas perguntas do tipo
"como". Como dois objetos massivos se atraem? Afinal, uma pedra cai do alto de
uma torre inclinada sem que nada a conecte ao solo. Como conceber a queda dos
corpos sem entender como o fenômeno ocorre?

Newton não se importou em responder a essas questões. Ele pensou em
uma relação que pudesse ser medida, uma força que pudesse gerar previsões. A
força da gravidade atua a distância, sem contato direto entre as massas envolvidas.
Ela é um exemplo daquilo que chamamos de "forças de ação a distância", é um
conceito clássico e não há muita discussão a respeito de como a força funciona,
mas é uma forma eficaz de tratar o assunto. O conceito newtoniano de força
gravitacional é bom porque funciona, aliás, muito bem, em nossa vida cotidiana.
Ele só precisou ser revisado e atualizado com os trabalhos de Albert Einstein
(1879-1955) e a teoria da relatividade. Einstein publicou, em seu trabalho de 1915,
uma teoria para a geometria do tecido do espaço-tempo, levando em conta os

99
UNIDADE 2 | DINÂMICA

efeitos da gravitação dos corpos. Através de sua equação mais famosa, ele mostrou
que a gravidade é uma propriedade geométrica desse tecido. É responsável por
curvá-lo na vizinhança de objetos massivos. Einstein mostrou que a energia ou a
massa de um corpo são capazes de gerar fontes gravitacionais e são ambas duas
faces de uma mesma propriedade da natureza. É claro, a relatividade engloba
os resultados da teoria clássica da gravitação, mas podemos dizer que a teoria
de Newton descreve muito bem um caso particular da teoria de Einstein. São
duas formas diferentes de ver o mundo, foram duas ideias que influenciaram
profundamente o mundo.

DICAS

Com o intuito de satisfazer uma possível curiosidade a respeito de como se dá


a relação entre essas duas visões de mundo, compartilhadas em uma mesma sociedade,
sugerimos a leitura do trabalho “Uma visão do espaço na mecânica newtoniana e na teoria
da relatividade de Einstein”, de autoria de C. M. Porto e M. B. D. S. M. Porto (2008), pulicado
na Revista Brasileira de Ensino de Física. Nele, os autores abdicam do uso do formalismo
matemático e exploram a fenomenologia da gravidade, sob as óticas de Newton e de
Einstein. As visões de espaço e tempo: separados, para Newton, e unidos, para Einstein.
São discutidas e comparadas e as imposições físicas que tornaram obsoletas as concepções
newtonianas no processo até o amadurecimento das concepções einsteinianas. Disponível
em: <https://bit.ly/2GEvHIC>.

Newton não nos explicou como sua força de ação a distância funciona, ele
apenas demonstrou que sua teoria poderia prever coisas, eventos e acontecimentos.
Einstein, por sua vez, foi além. Em seu trabalho, ele faz uma descrição geométrica
do fenômeno gravitacional, dá substância a essa propriedade, diz como as coisas
se dão. Ele não apenas foi capaz de fazer previsões, como também desvendou o
mecanismo por trás da atração gravitacional.

DICAS

Com o intuito de aprofundar seus conhecimentos em cosmologia newtoniana,


gostaríamos de sugerir a leitura do trabalho “Compreendendo o universo numa perspectiva
newtoniana”, de F. E. M. Costa (2018), pulicado na Revista Brasileira de Ensino de Física. Nele,
o autor discute o mundo sob o viés astronômico da influência do trabalho de Newton em
nossa forma de ver esse mundo. Nesse trabalho, o autor discute a importância do estudo
da cosmologia e também apresenta algumas deduções de expressões da cosmologia
moderna, a partir das equações de Newton para a gravitação. É um interessante exercício de
desenvolvimento matemático, aliado à discussão fenomenológica. Disponível em: <https://
bit.ly/2KHQ61Q>.

100
TÓPICO 2 | APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA

4 FORÇA PESO
O peso é a manifestação da força que nos mantêm presos à superfície
terrestre, ela deriva da equação a seguir:
 
P = mg �
. (2.20)

Uma vez apresentado o experimento que calculou a constante


gravitacional G, podemos agora discutir a medição da famigerada aceleração
da gravidade g = 9.8 m/s2.

Imagine que você tem uma pedra na mão e deseja calcular a aceleração com
que a força gravitacional a atrairá para o solo quando você a soltar, deixando-a
cair. Como vimos anteriormente, podemos supor que a força gravitacional,

→ 

submetida à segunda lei de Newton, terá a forma Fg = ma , em que m é a massa

da pedra que você segurava previamente. O vetor aceleração a, no caso da queda

livre, será identificado com o vetor aceleração da gravidade g. Teremos então:

GmM → 

− 2
r=mg ; (2.21)
r

A aplicação da segunda lei na equação (2.19), pode ser escrita de forma


escalar da seguinte maneira:

GmM
− mg ;
= (2.22)
r2

GM
− g
=
r2

Note a simplificação da massa m da pedra. Agora, como em nosso


exemplo, você segurava uma pedra sobre a superfície do planeta. Vamos
considerar M = MT , em que MT é a massa da Terra e r = RT , em que RT é o raio
do planeta. Teríamos assim:

GM T
g= − (2.23)
RT2

Perceba que o valor da aceleração da gravidade depende da massa da


Terra MT, mas também da distância em relação ao centro de massa do planeta,
que a equação (2.23). Porém, note que isso significa que g é uma função da altura,
g = g(d), em que d = RT + h. Algo como o que é apresentado na equação a seguir:

GM T
g= − . (2.24)
d2

101
UNIDADE 2 | DINÂMICA

Observe a Figura 8 por alguns momentos. Nela, apresentamos a curva para


a equação (2.24). À esquerda, você pode perceber como o módulo da aceleração
da gravidade |g| decai quadraticamente com a altura h em relação à superfície
da Terra. Note que em h = 0 , temos d = RT . É possível então perceber que g decai
de algo em torno de 9.8 m/s/s na superfície terrestre, para algo próximo de g = 1.5
m/s/s em h = 10000 km, próximo do fim da exosfera.

FIGURA 8 – ACELERAÇÃO DA GRAVIDADE COMO FUNÇÃO DA ALTURA


10 9,9

9 9.85

8 9.8

7 9.75
│g(d)│ (m/s)

│g(d)│ (m/s)
6 9.7

5 9.65

4 9.6

3 9.55

2 9.5

1 9.45
0x10⁰ 2x10³ 4x10³ 6x10³ 8x10³ 1x10⁴ 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
h (km) h (km)

FONTE: O autor

Em termos das camadas atmosféricas, ainda podemos ver, à esquerda, que


entre o fim da termosfera, por volta de h= 690 km, e o fim da exosfera, g decai
drasticamente desde 8 m/s/s. Já à direita do gráfico, podemos ver as camadas
mais baixas da atmosfera, pois consideramos uma altura máxima h = 100 km.
Nessa faixa, a aceleração da gravidade decai quase que linearmente com a altura.
Podemos ver sua variação nas diversas camadas atmosféricas entre o início
da troposfera, em h = 6 km até o início da termosfera, em h = 100 km. Perceba
também que agora se torna evidente a diferença entre aplicarmos o raio terrestre
no equador RT,e, representada pela curva sólida (vermelha), e o raio terrestre
no polo RT,p, representada pela curva tracejada (azul). Isso é interessante, pois
delimita a faixa de valores para g que podemos adotar aqui na superfície terrestre,
dependendo de nossa latitude no globo. Essa faixa delimitadora fica evidente
com a linha preta, em h = 0 , entre g = 9.8 m/s/s e g = 9.86 m/s/s.

É claro que você poderia considerar sua própria altura, com r = RT + d


(altura entre a pedra e o solo), mas podemos desconsiderar essa diferença.
Considerando G , MT = 6 X 10²⁴ kg e RT = 6.4 x 10⁶ m, teremos:

g=−
( 6.7408 ×10 −11
)(
m 3 kg −1s −2 6 × 1024 kg ) = −9.8742185ms −2
≈ − 9.8ms −2 . (2.25)
( 6.4 ×10 m)
2
6

102
TÓPICO 2 | APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA

DICAS

A determinação da aceleração da gravidade foi um evento importante na história


da ciência, e é interessante saber como esse valor foi encontrado e também que a forma
apresentada aqui não é a única possível. Há outras maneiras de se estabelecer esse valor de g
e, com isso em mente, sugerimos a leitura do trabalho “Um laboratório portátil de baixo custo:
medição de g utilizando um pêndulo e a placa Raspberry Pi”, de autoria de T. C. Almeida, E. C.
Dias e A. S. Julião (2017), pulicado na Revista Caderno Brasileiro de Ensino de Física. Nele, os
autores propõem o uso de uma placa de circuito para medir o período de oscilação e obter
assim o valor de g com alta fidelidade. Parece uma ideia interessante e possivelmente atrativa
para aqueles que se interessam por circuitos elétricos. Disponível em: <https://bit.ly/2GFbC4F>.

5 FORÇA NORMAL
A força normal pode ser interpretada como a força de reação que uma
superfície oferece a, por exemplo, o peso de um objeto. →Toda vez que você

descansa uma xícara à mesa, sobre ela atua a força peso P = mg , que vimos
anteriormente, e também uma força de reação a esta. Chamamos essa força de
normal, pois ela tem uma direção que coincide com o vetor normal à superfície.
Ela pode ser escrita da seguinte maneira:
→ →
0
N −P= (2.26)

Esta é uma força de contato que aparece entre superfícies e que terá uma
grande importância quando estudarmos mais adiante a dinâmica do movimento
relativo entre essas superfícies. Toda vez que você se apoia contra uma parede
ou uma pilastra, que coloca uma caixa no chão ou pisa no degrau de uma escada,
você causa uma força normal a uma superfície.

FIGURA 9 – (A) VASE A FLEURS, DE CLAUDE MONET, 1882; (B) DIAGRAMA DE FORÇAS

a) b)
FONTE: Disponível em: <goo.gl/LkERVU>. Acesso em: 9 mar. 2018.

103
UNIDADE 2 | DINÂMICA

Para discutir a ação dessa força, vamos considerar a obra Vaso de flores,
do artista francês Claude Monet (1840-1952), apresentado na Figura 9 (a). Em
seu óleo sobre tela, hoje exposto no Courtauld Gallery, em Londres, o pintor
emprega o impressionismo para compor a imagem de um vaso de flores, sobre
o que parece ser uma superfície, como uma mesa ou um balcão. Considerando o
virtuosismo dessa obra para nossa discussão, observe na Figura 10 (b). As forças
→ →
normal N e peso P são ilustradas e atuam em um ponto específico do vaso, ou
pelo menos, onde imaginamos que se encontre o centro de gravidade do vaso. É
nesse ponto que imaginamos, geometricamente, a atuação das forças nos corpos
cujos diagramas desenhamos.

Você sabe que nada acontece quando colocamos um vaso sobre a mesa,

a interpretação trazida aqui é que isso ocorre devido à força normal, em que N
mantém o vaso parado na vertical. A força normal é uma força de reação, ela
existe sob condição de um contato entre superfícies. É um assunto interessante,
pois baseia nossa compreensão de como se dá a interface entre dois materiais.

DICAS

É com essa curiosidade em mente que sugerimos a leitura de mais um trabalho


“Deslocamento da força normal à superfície de apoio a um corpo em equilíbrio na presença da
força de atrito”), de E. V. Costa e C. A. F. Leite (2010), pulicado na Revista Caderno Brasileiro de
Ensino de Física, mas agora sob circunstâncias especiais, às quais retornaremos em instantes.
Nele, os autores propõem o estudo do equilíbrio de um corpo, considerando um bloco sobre
uma superfície e o atrito que eles mantêm com ela. É um desenvolvimento bastante esmiuçado,
principalmente porque considera um deslocamento da força normal, enquanto o objeto mantém
com a mesa um movimento relativo. O trabalho demanda uma familiarização prévia com o
atrito, por isso recomendamos que você pare aqui, siga em frente no estudo do livro, e depois
que se aclimatar ao atrito, retorne à dica para sua leitura. Disponível em: <https://bit.ly/2J2tlbF>.

6 FORÇA DE ATRITO
O atrito é uma força de oposição ao movimento, ele acontece em situações
em que há duas superfícies se movendo, uma em relação à outra. Se você já tentou
empurrar um objeto pesado, como um armário de madeira maciça ou um guarda-
roupas antigo, sem a ajuda de rodas ou outros facilitadores, sabe que essa tal força
e atrito devem depender, de alguma forma, da massa do objeto. Essa forma de
depender da massa se dá através da força normal (N) à superfície em que o objeto
se encontra. Você sabe que encontraremos algum tipo de constante que também
desempenhe uma função de descritiva da relação entre as superfícies no sistema.
Essa constante é o coeficiente de atrito entre as duas superfícies consideradas.
Observe a equação (2.27):

→ 

Fat ≤ µ N . (2.27)

104
TÓPICO 2 | APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA

O sinal de de menor ou igual limita a força de atrito a ser igual à força


normal, mas nunca maior. Caso contrário, você não veria muita coisa se mexendo
no mundo. A força de atrito estático vem da rugosidade de cada uma das
superfícies em contato, tanto em escalas nano ou macroscópicas. A aspereza entre
as superfícies impede a alteração do estado de movimento relativo. O coeficiente
de atrito estático é quem descreve a força homônima naquela superfície.
Quando as forças que tentam alterar esse estado de movimento relativo entre
as superfícies se torna maior que a força de atrito estático, então um movimento
relativo se estabelece, que agora é a força de atrito cinético, que resiste à alteração
de estado de movimento. O coeficiente de atrito cinético é quem descreve a
força homônima naquela superfície.

É interessante notar que mesmo aparentemente grande, vista em escala


cotidiana, a real área de contato entre as duas superfícies, que apenas se encostam,
fica limitada a alguns pontos específicos. É apenas quando a massa de um dos
objetos é grande que a aspereza entra realmente em ação. Tanto é verdade que,
se você desparafusar uma porta do guarda-roupas e a empurrar sobre a mesma
superfície, ela obviamente apresentará uma força de atrito proporcional e menor.

Esse modelo foi proposto por Charles-Augustin de Coulomb (1736-


1806), o mesmo físico francês, autor da teoria que descreve a força eletrostática,
responsável pela atração ou repulsão de corpos, dependendo de sua carga elétrica.
Ele ficou famoso pela lei de Coulomb, mas também contribuiu para a mecânica.

Vamos refletir por um momento na equação (2.27). Observando-a e


lembrando da seção sobre vetores, você vai concordar que ela representa a

→ →
multiplicação Fat de um vetor N , por um escalar µ. Quando você empurra um
guarda-roupa, empurra para frente, mas a força normal é para cima. Como pode
o produto acima descrever a realidade?

Como dito anteriormente, o atrito decorre do contato direto entre duas


superfícies distintas, então sua intensidade dependerá de propriedades específicas
desses materiais. O coeficiente de atrito µ, expresso em um valor adimensional,
determina como se dá a relação de contato entre duas dessas superfícies. Por
exemplo, há um coeficiente de atrito entre a borracha e o asfalto, que determina
o nível de aderência do pneu à rodovia. Há outro coeficiente de atrito para o caso
do asfalto molhado, outro para óleo sobre o asfalto, e por aí vai.

Há também dois tipos de atrito, dos quais vamos tratar aqui. Há o atrito
estático, quando duas superfícies se tocam, mas não existe movimento relativo
entre as duas. É esse atrito entre o pneu e o asfalto que ocorre quando seu carro
acelera. Há também o atrito cinético, que ocorre quando as duas superfícies em
contato mantêm movimento relativo entre si. É esse atrito entre o pneu e o asfalto
que ocorre quando seu carro derrapa.

A seguir, o quadro da Figura 10, de autoria da artista americana Christianna


Pierce, retrata um bonde que sobe uma rua de inclinação θ:
105
UNIDADE 2 | DINÂMICA

FIGURA 10 – SAN FRANCISCO CABLE CAR, DE CHRISTIANNA PIERCE, 2013

a) b)
FONTE: Disponível em: <goo.gl/UmyJ6A>. Acesso em: 9 mar. 2018.

A rua é uma ladeira, que trata de um plano inclinado e tomando a vertical


y como perpendicular e a horizontal x como paralela à superfície, a força peso,
que é radial, precisa ser projetada nos eixos x e y. Para a direção y, temos as
seguintes forças atuando:

N
= P=
y mg cosθ . (2.28)

Já na direção x, as forças que atuam sobre o bonde são:

ma ;
Px − Fat = (2.29)

mg sin θ − Fat =
ma.

Considerando, por enquanto, que o bonde desce a ladeira com uma certa
aceleração. É claro que podemos reescrever, a partir das forças no eixo y, o peso
mg = N/ cos θ, o que nos deixa como:

sin θ
=Fat N − ma ; (2.30)
cosθ

= N tan θ − ma.

Observando a equação (2.30), podemos observar duas coisas. A primeira


é que quando não há aceleração, ou seja, a = 0 , e o bonde se mantém parado na
ladeira devido apenas à força de atrito, temos:

Fat = N µe . (2.31)

106
TÓPICO 2 | APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA

Perceba que µ e = tan θ , isso significa dizer que se colocássemos uma caixa
sobre uma superfície qualquer e começássemos, gradualmente, a aumentar a
inclinação da superfície, o coeficiente de atrito estático seria dado pela tangente
do ângulo limite, em que a caixa ainda permanece estática em relação à superfície,
ou seja, com aceleração nula a = 0. Em outras palavras, quando você aplica uma
força sobre uma caixa, ela não entra em movimento imediatamente, pois há uma
força de atrito resistindo ao movimento. No caso do bonde, representado na
Figura 10, é necessário superar tal força de atrito entre as rodas e os trilhos para
que o bonde entre em movimento.

A segunda coisa é que quando há aceleração, ou seja, a ≠ 0, e o bonde desce


a ladeira mesmo que lentamente, devido à força de atrito cinético. Da equação
(2.29), temos:

N µe N tan θ − ma.
= (2.32)

ma
O que implica que µ= c µe − , daí o motivo pelo qual o coeficiente de
N
atrito cinético ser menor que o coeficiente de atrito estático, µ e > µ c . Note que µ e
está relacionado com a resistência que deve ser vencida para colocar um objeto
em movimento, e µ c está relacionado com a resistência que deve ser vencida
para manter um objeto em movimento. Por isso você tem a sensação de que é
mais fácil manter um guarda-roupa em trânsito até sua futura posição definitiva,
do que iniciar esse movimento.

µe = tan θ . (2.33)

É intrigante concluir que a força de atrito entre um objeto e outro depende


da massa m do bloco, mas o coeficiente de atrito, entre as duas superfícies µ ,não.
A constante é uma propriedade do material que não depende de sua massa,
isso não é muito intuitivo. Se você duplicar a massa da caixa, ela só começará
a escorregar a partir do mesmo ângulo crítico. Além disso, µ é independente da
área submetida ao atrito, o que também não é muito intuitivo. Isso quer dizer
que, em uma situação hipotética em que você considere o atrito entre os pneus
dos carros em uma ladeira e o asfalto do piso, como sendo µ e = 1 . Bastaria uma
inclinação de 45º para que carros começassem a escorregar.

A força de atrito é uma forma de força resistiva dependente de uma


propriedade material chamada de coeficiente de atrito µ, que consideramos
constante aqui, para nós ela não se altera em função de outras propriedades do
sistema, isso é muito interessante.

107
UNIDADE 2 | DINÂMICA

DICAS

É com essa curiosidade que sugerimos a leitura do trabalho “Determinação dos


coeficientes de atrito estático e cinético utilizando-se a aquisição automática de dados”, de
autoria de V. L. F. Mossmann et al. (2002), pulicado na Revista Caderno Brasileiro de Ensino
de Física, mais antigo, mas ainda uma boa ideia. Nele, os autores desempenham a medição
de coeficientes de atrito através da utilização de sensores de força e de posição em interface
com um computador pessoal. Talvez esse trabalho possa lhe inspirar uma atualização.
Entretanto, há algumas forças que se opõem ao movimento, cujas propriedades materiais
se alteram de acordo com propriedades materiais do sistema. Disponível em: <https://bit.
ly/2IGyoeu>.

Aqui, tomamos uma versão simplificada da força de atrito com objetivo


de entender basicamente seu comportamento, mas na indústria suas aplicações
e consequências são muito mais complexas. Elas precisam lidar com a influência
da temperatura sobre o coeficiente de atrito, por exemplo. Entretanto, há também
forças resistivas cujas propriedades, como viscosidade e pressão, são alteradas
com a velocidade do objeto em contato com o meio e das propriedades materiais
envolvidas. Essas forças resistivas serão tratadas na próxima seção.

7 FORÇAS RESISTIVAS E DE ARRASTO


Toda vez que um objeto se move através de um fluido, que pode ser água,
óleo ou ar, esse objeto experimentará uma força resistiva, vulgarmente conhecida
como arrasto e relacionada exatamente à dificuldade de se mover um objeto
através de um determinado meio. Por se tratar de uma interação do objeto com o
meio ao seu redor, essa força dependerá da forma, do tamanho, de propriedades
do meio através do qual o objeto se move e também da velocidade do objeto em
relação ao fluido. A percepção dessa força é bastante intuitiva. Se você, algum
dia, já andou de carro a uma velocidade consideravelmente alta e percebeu que
as árvores estão paradas, porque não há vento atuando sobre elas, mas que você
sente uma forte corrente de ar no seu rosto, você pode ter uma ideia bastante
pessoal sobre o arrasto. O que se passa nesse caso?

Perceba que para simplificar o argumento estamos considerando um dia


sem vento, ou seja, o ar que o envolve está parado em relação a você e ao solo.
O exemplo proposto também considera que você se move à alta velocidade em
relação ao solo, o que significa que você se move em alta velocidade em relação ao
meio em que está imerso. Sob o prisma aerodinâmico, o carro está atravessando a
camada de ar, assim como um navio abre caminho pelo oceano, empurrando as
camadas de água a sua frente - mais para a frente - e também para os lados. Não é
a corrente de ar, detentora de movimento relativo, que entra pela fresta da janela,
é a janela que se move em relação ao ar, parado em relação ao solo, que permite
que o ar entre por sua fresta. Faz sentido que esta força dependa diretamente da
108
TÓPICO 2 | APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA

velocidade do objeto, pois é claro que se a sua velocidade for nula, o objeto não se
move e logo não "arrasta" o ar a sua volta. Também é claro que para acelerar o carro
até uma velocidade infinita seria necessária uma quantidade infinita de força.

Obviamente, as propriedades materiais do meio devem influenciar a força
necessária para realizar alguma tarefa. Considere mentalmente, por exemplo, um
pote com mel, que escorrendo até pingar da borda do frasco sobre um pedaço de
bolo ou pão. Agora, compare essa imagem com a de um gole de água que você
bebe direto da garrafa. Água e mel são dois fluidos absolutamente diferentes.
Suas cores, opacidades, cheiros e principalmente viscosidades são bem diferentes.
Parece bastante evidente que uma folha de papel aberta caia no chão muito mais
lentamente que uma folha exatamente igual, mas amassada, quando ambas são
deixadas cair da mesma altura. Então a forma e o tamanho também contam, pela
influência de sua forma e de sua área.

As forças de atrito e arrasto se diferenciam porque no atrito o coeficiente µ


não é uma função da velocidade do corpo que se move, tampouco de sua geometria
ou área. No atrito, o que importa é o contato físico direto entre as superfícies do
objeto que se move e da superfície sobre a qual ele se move. No arrasto, as coisas
são um pouco mais complexas. Observe a equação (2.34):


( )

− κ1v + κ 2 v 2 vˆ.
Fres = (2.34)

O sinal (ˆ) significa que a força tem a mesma direção do vetor velocidade
e todos os valores dentro dos parênteses têm sinal positivo, pois κ1 e κ 2 são
constantes, que dependem da forma e do tamanho do objeto e também do
tipo de fluido em que ele se encontra, e a velocidade v é dada em módulo. Isso


significa que a força resistiva Fres tem a mesma direção, mas se opõe ao sentido da

velocidade v. Se você considerar uma esfera acelerada em um fluido, o módulo
da força resistiva que atuará sobre ela é: 


F
=res C1rv + C2 r 2 v 2 (2.35)

O primeiro termo da equação (2.35) é o termo relacionado à viscosidade


do material. Quanto mais viscoso, mais grudento ele é. Pense em água, óleo e
piche. Piche é o mais viscoso de todos, porque atravessá-lo seria a tarefa mais
complicada dentre os três fluidos. O segundo termo é conhecido como o termo de
pressão. A razão para esse termo depender do quadrado da velocidade tem a ver
com a transferência de momento relacionada à interação do objeto com o meio. O
raio ao quadrado está relacionado à área da seção transversal da esfera, ou seja, à
área cujo vetor normal é paralelo ao vetor deslocamento da esfera em um fluido
parado, ou ao vetor deslocamento fluxo de fluido que se choca com uma esfera
parada. Observe a Figura 11, ela apresenta a projeção bidimensional de uma bola
de basquete, uma esfera. A seção transversal na linha do equador da bola é a área
dessa projeção que você está vendo.
109
UNIDADE 2 | DINÂMICA

FIGURA 11 – BASKETBALL, DE KATIE MORRIS, 2012

FONTE: Disponível em: <goo.gl/HYhzvS>. Acesso em: 9 mar. 2018.

Considerando as unidades das constantes, temos C1 = kg/(ms) e C 2  =


kg/m3. C1 é fortemente dependente da temperatura do meio, isso faz sentido
porque se colocar um fio de óleo na frigideira, ele escorre mais rápido com a
temperatura. O sorvete pinga quando aquece, o mel derrete em banho-maria.
Todos esses fluidos são mais pegajosos quando estão frios, como se se tornassem
mais líquidos com o aumento da temperatura. Já C2 não depende muito da
temperatura, ele mantém uma relação muito próxima com a densidade do fluido,
tanto que tem a mesma unidade de sua densidade ρ .

Imagine que você observe um objeto esférico, digamos uma massa, que
cai bem a sua frente. Considerando esta uma aproximação válida para o caráter
didático, o objeto esférico de massa m é acelerado perpendicularmente em
direção à superfície da Terra, de forma radial, com pela gravidade. Observe a obra
apresentada na Figura 12 (a), do artista surrealista belga René Magritte (1898-
1967), de 1964. Ela é intitulada Le fils de l’homme, ou O filho do homem, em uma
tradução literal, e apresenta uma ilustração muito interessante desse exemplo.
Se aplicarmos aqui o diagrama de fases sem negligenciar a atuação da força de
resistência do vento, teremos algo com o que é apresentado na ilustração da
Figura 12 (b):

110
TÓPICO 2 | APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA

FIGURA 12 – LE FILS DE L’HOMME, DE RENÉ MAGRITTE, 1964

a) b)
FONTE: Disponível em: <goo.gl/9DM6DK>. Acesso em: 9 mar. 2018.

A força resistiva crescerá com a velocidade do objeto até o momento em


que ela se igualará a à força peso:

Fres= P= mg . (2.36)

Então, poderemos dizer que a maçã alcançou uma velocidade terminal


v
term , ou seja, sua velocidade passa a ser constante porque a = 0. Não há mais
aceleração. Nesse momento, teremos:

C1rvterm + C2 r 2 vterm
2
mg .
= (2.37)

Conhecendo g , a massa do objeto, seu raio aproximado e as propriedades


C1 e C2 do meio, pode-se calcular a velocidade terminal da queda desse objeto
naquele meio. Por se tratar de uma equação quadrática, obtém-se duas respostas,
uma genuinamente física, a outra, não.

Ainda sobre a equação (2.35), pode haver dois regimes de forças resistivas
derivadas. Uma derivada das viscosidades envolvidas e outra das pressões às
quais o fluido submete a esfera que o atravessa, em que um dos regimes domina
a interação, seja quando a viscosidade se torna mais importante ou quando a
pressão é o que importa mais. Para maior comodidade, vamos chamar a primeira
situação de regime (I) e a segunda de regime (II). Quando os dois regimes
possuem a mesma parcela de responsabilidade pela força resistiva resultante, ou
seja, quando o regime (I) é tão importante quanto o regime (II), considerando a
equação (2.35), teremos a relação:

111
UNIDADE 2 | DINÂMICA

C1rvterm = C2 r 2 vterm
2
; (2.38)

C1 = C2 rvterm .

Para um corpo acelerado sob tal condição, percebe-se que a velocidade


terminal é dada por:

C 1
vterm =  2  . (2.39)
 C1  r

Para distinguir com mais clareza os regimes (I) e (II), considere uma esfera
metálica em um determinado meio. Perceba que no regime (I), aquele dominado
pela viscosidade do meio, é menos provável que o objeto atinja sua velocidade
terminal. Isso significa que v << vterm e implica mg = C1rvterm . Uma vez que a
massa de nossa esfera pode ser escrita em termos de sua densidade ρ , de modo
4 3
que m = π r ρ , teremos:
3
 1  mg
vterm ; I =   ; (2.40)
 C1  r

1 4 3 g
=  πr ρ  ;
C1  3 r

1 4 2
=  πρ gr  .
C1  3 

Observe que a velocidade terminal depende do quadrado do raio r e


da densidade ρ da esfera. Além, é claro, da aceleração g local. No regime (II),
dominado pela pressão que a esfera percebe, proveniente do choque de sua
superfície com o meio, o que significa dizer que v >> vterm . Nesse caso, temos que
mg = C2 r 2 vterm
2
:

1/ 2
 1  mg 
vterm ; II =   2  ; (2.41)
 C2  r 
1/ 2
 1 4 g
=   π r3ρ  2  ;
 C2  3 r 
1/ 2
 1 4 
=   πρ gr   .
 C2  3 

112
TÓPICO 2 | APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA

Note que, sob maior influência das forças associadas à pressão, a


velocidade terminal de um corpo depende da raiz quadrada do raio r. Para que
você tenha uma imagem um pouco mais concreta em mente a respeito das forças
resistivas em diferentes meios, vamos fazer uma experiência mental. Considere
que estudemos esferas metálicas de diferentes raios, que caem, em queda livre,
dentro de um tubo permeado com xarope milho, um líquido altamente viscoso
usado na indústria alimentícia. A ideia é calcular as velocidades terminais em cada
um dos regimes, para quatro diferentes esferas, com diferentes raios. A esfera 1
tem um raio de r₁= 0,003175 m, a esfera número 2 tem um raio de r₁= 0,00396875 m,
ligeiramente maior que a primeira. A esfera número 3 tem um raio de r₃ = 0,0047625
m e a de número 4 r₄ = 0,00635 m. Para esta situação, teremos as propriedades
viscosa C1 = 1, 6 × 10² kg/m/s e de pressão C2 = 1,2 x 10³ kg/m³. As densidades são
3
= 7 , 8 ×103 kg/m³ para as esferas e ρ xarope
de ρ aço = 1, 7 × 10 kg/m³ para o xarope de
milho.

Observe a Figura 13. Ela apresenta um gráfico das velocidades envolvidas.
A curva roxa (tracejada) representa a equação (2.42), tomada aqui como a
velocidade terminal de um corpo caindo em um meio material, considerando as
forças de viscosidade e de pressão atuando sobre o objeto.

vterm vterm ; I + vterm ; II .


= (2.42)

A curva verde (com traços separados por um ponto) representa o termo de


viscosidade, representado pelo regime I. A curva azul (com traços separados por
dois-pontos) representa o regime II, em que a pressão representa a contribuição
mais contundente para a força resistiva. Perceba que este é um gráfico que
relaciona raios de diferentes esferas às velocidades terminais de queda, de cada
esfera. Lembre-se de que a área de uma esfera, exposta ao atrito com o meio, ou
não, é proporcional ao seu raio. Analisando a Figura 13, vemos que o regime I se
limita às regiões de mais baixa velocidade e de menor raio, enquanto o regime II se
concentra em regiões de valores mais positivos, no plano vr da Figura (13). Isso se
deve à estrutura dos termos da força resistiva da equação (2.35), uma vez que no
primeiro termo o produto rv reage muito mais lentamente às alterações tanto de
r, quanto de v, do que o produto r²v², no segundo termo. Uma região interessante
do gráfico é aquela apresentada pela linha (cheia) vermelha, que mostra a região
em que os dois regimes contribuem consideravelmente para a força resistiva.
Podemos ver que todas as esferas consideradas no cálculo apresentam uma força
resistiva, principalmente caracterizada pela viscosidade do xarope de milho, uma
vez que este é o termo dominante. Vemos também que a velocidade terminal
aumenta inicialmente com o quadrado do raio, e depois com a raiz quadrada do
raio, o que torna essa dependência mais evidente.

113
UNIDADE 2 | DINÂMICA

FIGURA 13 – VELOCIDADE TERMINAL v term E SEUS REGIMES

100

10
v (m/s)

0.1
0.0001 0.001 0.01 0.1
r (m)

FONTE: O autor

O assunto é extenso e bastante interessante. As forças resistivas apresentam


um comportamento mais distante daquele que podemos considerar como trivial,
quando as comparamos com outras formas mais cotidianas de experimentação.

DICAS

É com essa curiosidade em mente que sugerimos a leitura do trabalho “A


aerodinâmica da bola de futebol”, de autoria de C. E. Aguiar e G. Rubini (2004), pulicado na
Revista Caderno Brasileiro de Ensino de Física. Nele, os autores propõem uma discussão
sobre a aerodinâmica da bola de futebol e as forças que atuam sobre tal objeto quando em
curso do pé de um jogador às traves do campo. Eles abordam especialmente um efeito
bastante interessante, conhecido com efeito magnus, e sua leitura pode ser percebida como
um aprofundamento no assunto. Disponível em: <https://bit.ly/2GxSN4B>.

8 FORÇA REPARADORA
Vimos anteriormente que a força de atrito se opõe ao movimento de um
objeto de massa m. A força de atrito tenta cessar o movimento do objeto através
da fricção entre as duas superfícies envolvidas. Uma força reparadora utiliza
uma estratégia diferente para tentar restaurar o estado inicial de equilíbrio de
um sistema.

114
TÓPICO 2 | APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA

Forças como as do tipo sistema massa-mola são ótimos exemplos. O


sistema é formado por um bloco ou esfera de uma determinada massa m e uma
mola, normalmente metálica, com propriedades elásticas. Nesses sistemas,
encontramos uma força restauradora que depende de uma propriedade do
material de que é feita a mola e do deslocamento da massa. Após assumir duas
posições consecutivas, ainda conectada à mola, a massa acabará voltando a
sua posição original, depois de oscilar algumas vezes em torno do ponto de
equilíbrio. A responsável por esse comportamento da massa é a mola e sua
força reparadora, cuja intensidade tema forma:

F =−κ ∆x (2.43)

Pela equação (2.43) você pode perceber que um deslocamento positivo


do bloco, seja onde você já tenha colocado seu sistema de referencial, acarretará
em uma força reparadora de sentido negativo e, por sua vez, um deslocamento
negativo. Digamos que você tenha comprimido a mola, ela então gerará uma
força reparadora de sentido positivo nela mesma. Perceba que se trata de uma
equação de reta, e que a constante da mola κ é o coeficiente angular na relação
de como a força restauradora varia com a distância percorrida pelo bloco. Ela é
uma força que origina o equilíbrio em um sistema físico. De certa forma, as forças
reparadoras também têm sentido contrário ao movimento, mas atuam de forma
a restaurar uma condição inicial de equilíbrio, quando a resultante das forças,
atuando no sistema, era nula.

O coeficiente κ é tão interessante que se pensarmos nele como uma


propriedade volumétrica do material, ou seja, se pensarmos nele como uma
relação entre as forças restauradoras no espaço tridimensional, ele se torna uma
matriz de transformação de ordem κ ₃x₃ entre o vetor deslocamento → s = (x,y,z) e a

força restauradora F = (Fx,Fz,Fz).


→ 

F=−κ 3×3 ∆s ; (2.44)

Ou em forma matricial:

 Fx  κ11 κ12 κ13   x 


    
 Fy  = κ 21 κ 22 κ 23   y  ; (2.45)
 F  κ  
 z   31 κ 32 κ 33   z 

A equação (2.44) representa uma transformação linear em três dimensões,


do tipo que você aprende no curso de álgebra linear. Essa extrapolação espacial
nos gera o seguinte sistema de equações numéricas:

Fx = κ11 x + κ12 y + κ13 z ;


Fy = κ 21 x + κ 22 y + κ 23 z ; (2.46)
Fz = κ 31 x + κ 32 y + κ 33 z.

115
UNIDADE 2 | DINÂMICA

Com essa complexidade geométrica em mente, vamos voltar para o


mundo unidimensional de um bloco se movendo apenas na direção x, descrita
pela equação (2.43), e discutir a fenomenologia do problema.

Observe a Figura 14 por um momento. Ela apresenta uma única esfera


pendurada por uma mola presa ao teto, em cinco diferentes momentos t, que
progridem da esquerda para a direita. Por enquanto, ainda não estamos
interessados no que acontece após t5, vamos nos atentar ao início do problema.
Em um primeiro momento t1, a esfera está presa por um barbante na posição de
equilíbrio da mola, definida como a linha horizontal que cruza a esfera em t1,t3 e
t5. Ela não está nem comprimida, nem esticada. Apenas a tensão e o peso atuam
na esfera e se cancelam mutuamente. Isso significa que não há aceleração a = 0. De
repente, a corda é cortada, e depois, devido à aceleração da gravidade g, já não
está na origem do sistema. A esfera se desloca por alguns centímetros em direção
a uma posição mais baixa. Enquanto isso acontece, uma força reparadora começa
a atuar sobre a esfera. Quando essa força reparadora atinge uma intensidade
igual àquela do peso, a esfera para.

FIGURA 14 – FORÇAS ATUANTES EM UM SISTEMA MASSA-MOLA

FONTE: O autor

Depois disso tudo acontecer, a esfera metálica começa a sofrer a ação de


uma aceleração a na direção vertical e no sentido positivo do eixo y. Esse é o
momento t2 . Daqui para frente, a esfera começa a reduzir o valor do deslocamento
∆y, aproximando-o do equilíbrio. Novamente no equilíbrio, os vetores de peso e
da força reparadora se igualam. Esse é o momento t3 em nosso sistema.

A esfera passa a comprimir a mola, o que significa que o deslocamento


é positivo em nosso sistema de referencial e que a força reparadora começa a
apontar verticalmente no sentido negativo do eixo y, isso acontece até o momento
em que a mola não pode mais ser comprimida, ponto de deslocamento máximo
da esfera. E como a força reparadora é diretamente proporcional ao deslocamento

116
TÓPICO 2 | APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA

da esfera, ela também atingirá sua intensidade máxima. Esse é o momento t4 da


Figura 14. A força reparadora é máxima, agora, e empurra a esfera para baixo,
juntamente ao peso dela. Ao se aproximar do ponto de equilíbrio, momento t5,


Frep decai em intensidade até a nulidade.

FIGURA 15 – ROBERT HOOKE, RITA GREER, 2004

FONTE: Disponível em: <goo.gl/fZFJ5Q>. Acesso em: 9 mar. 2018.

Na literatura, você encontrará formulações horizontais de sistemas


similares, todas as formulações horizontais de sistemas similares dizem a mesma
coisa. As forças reparadoras têm a ver com as propriedades materiais do que está
sendo comprimido, bem como com o tamanho do deslocamento causado pela
compressão. Essa forma de pensar o problema, em termos de um sistema massa-
mola, é atribuída a Robert Hooke (1635-1703), um filósofo naturalista inglês cujas
feições foram retratadas com base em relatos históricos pela artista Rita Greer,
que nos é contemporânea, no ano de 2004, e são apresentadas na figura anterior.

Sistemas com forças reparadoras são fascinantes. Você pode imaginar
sistemas lineares, como o elástico de suas meias ou os amortecedores de seu carro.
E pode também vislumbrar extrapolações bidimensionais e tridimensionais,
como uma cama elástica ou uma luva médica.

117
UNIDADE 2 | DINÂMICA

DICAS

É com esse interesse em se aprofundar no assunto que sugerimos, como um


passo além, a leitura do trabalho “A lei de Hooke e as molas não lineares, um estudo de
caso”, de N. Aranha et al. (2016), pulicado na Revista Caderno Brasileiro de Ensino de Física.
Nele, os autores subvertem um pouco nossa discussão a respeito das forças restauradoras,
introduzindo um elemento de não linearidade ao debate. O trabalho sugere o uso de três
molas helicoidais, porém apenas uma linear, ou seja, nas outras duas há variações no raio
nas hélices das molas, o que pressupõem um efeito na resposta da força reparadora ao
deslocamento. É uma ideia muito interessante, que pode ser discutida em sala de aula.
Disponível em: <https://bit.ly/2IVCt1R>.

9 FORÇA DE EMPUXO
Se você já tentou alguma vez afundar uma bola cheia de ar, dentro de
uma piscina, já deve ter presenciado a ação do empuxo. O empuxo é uma força
resistiva ao movimento de peculiar interesse para nós. Desse modo, vamos tratá-
la especificamente.

Você já deve ter reparado que quando diferentes materiais são jogados
à água, alguns flutuam e outros afundam imediatamente. A razão dessa
diferenciação de comportamento tem a ver com a relação entre as densidades
do meio e do material, nele atirado. A teorização a respeito é antiga e remonta
períodos de mais de vinte séculos.

Arquimedes (287-212 a.C), criado no porto de Siracusa, capital de


província homônima da Sicília, na Itália, é considerado o pai do conceito de
empuxo. Observe o retrato apresentado na Figura 16, um óleo sobre tela pintado
pelo artista italiano Domenico Fetti (1589-1623), do período barroco. A origem
de Arquimedes não é muito clara, mas em um de seus trabalhos, intitulado
Psammites, também conhecida como O contador de areia, há uma referência ao
parentesco com Fídias, um astrônomo também não muito conhecido. Famoso
pelo princípio da alavanca e muitos engenhos bélicos, Arquimedes sustenta um
mito muito divulgado, o de que foi incumbido pelo governante Hieron II (306-
215 a.C.) de averiguar se uma coroa de ouro, por ele encomendada, era mesmo
completamente composta por ouro. O mito conta que Arquimedes meditou por
muito tempo no problema e encontrou uma solução, quando se deitou em uma
banheira para tomar um banho.

118
TÓPICO 2 | APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA

FIGURA 16 – ARQUIMEDES PENSATIVO, DOMENICO FETTI, 1620

FONTE: Disponível em: <goo.gl/fCJv3N>. Acesso em: 9 mar. 2018

A ideia é, que quando afundada em um recipiente completamente cheio


de água, Arquimedes poderia comparar a massa da coroa com a massa do
volume de água transbordado do recipiente. Elas devem ser iguais, apesar de
não terem a necessidade de apresentarem o mesmo valor de volume. São as
densidades que contam.

O empuxo é governado pela relação entre as densidades do material e do


meio. Se a densidade do material for menor que aquela do meio, então o objeto
será impelido até a superfície e lá flutuará. Caso contrário, afundará. Porém, se a
densidade do material for igual à densidade do meio, então este se manterá em
equilíbrio com aquele, em qualquer posição do meio, inclusive imerso.

Isso também funciona para dois ou mais líquidos, como por exemplo,
água e óleo de cozinha. Por possuir uma densidade menor, o óleo flutua sobre
a água. Para que flutue, um navio de metal precisa alterar a densidade de sua
composição. Perceba que o metal é mais denso que a água, logo, ele afunda. Mas
quando o projetista imagina um navio com um grande volume, oco, ele está
indiretamente alterando a relação das densidades envolvidas.

Observe o quadro apresentado na Figura 17 (a), de autoria do artista


alemão Alexander Koester (1864-1932) e intitulado Canards sur un étang de roseaux,
ou Patos em uma lagoa de juncos, em tradução literal. A obra apresenta alguns patos
flutuando sobre uma pequena lagoa:
 →
→  

ma.
E−P= (2.47)

119
UNIDADE 2 | DINÂMICA

O diagrama das forças é expresso pela equação (2.47) e pode ser visto na
→ →
Figura 17 (b), que apresenta os vetores de empuxo E e de peso P que atuam sobre
o pato.

FIGURA 17 – CANARDS SUR UN ÉTANG DE ROSEAUX, ALEXANDER KOESTER, POR VOLTA DE


1890

(a) (b)
FONTE: Disponível em: <goo.gl/WK6Pjz>. Acesso em: 9 mar. 2018.

Note que o sinal da aceleração depende apenas da diferença das forças.


Se a força de empuxo for maior que o peso do objeto, então ele flutuará naquele
meio, caso contrário, se o peso for maior que o empuxo, o objeto afundará:

 →
 1 → 
=

a
m
(
E−P . ) (2.48)

Como falávamos, a densidade e o volume do fluido deslocado (FD) são


grandezas fundamentais para o entendimento do empuxo. Sabemos que ele pode
ser escrito da seguinte maneira:

E = mFD a , (2.49)

em que mFD é a massa do fluido deslocado, a é a aceleração à que


está submetido, no caso dos patos e dos navios, a = g. Considerando a relação
entre massa m, volume V e densidade ρ , podemos reescrever a massa como
mF D = ρ F DVF D e aplicá-la à equação (2.49):

E = mFD g ; (2.50)

= ρ FDVFD g .

Esse é o princípio de Arquimedes. Quando mergulhado em um meio,


um objeto sofre a ação de uma força que o empurra para cima, essa força é o
empuxo. Uma das consequências desse princípio é o fenômeno conhecido como

120
TÓPICO 2 | APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA

peso aparente. Se você já atravessou uma piscina andando e percebeu como é


mais fácil saltar de baixo da água, então você já experimentou a sensação que dá
nome a esse fenômeno. O peso aparente é a força resultante entre o empuxo e o
peso do objeto mergulhado. Considerando a equação (2.47), você já entendeu que
quando o objeto mergulhando é menos denso, uma força resultante o empurra
para a superfície, mas quando a densidade do objeto é maior que a do meio, ele
afunda lentamente? Suponha que você tenha que levantar um objeto que está no
fundo de uma piscina. Julgando pela sua experiência prévia em levantar aquele
objeto fora da água, você tem uma boa ideia de quanto ele pesa.

→  →
→ 
Pap= E − P. (2.51)

Ao levantar o objeto dentro da água, você se surpreende que ele seja mais


leve ali. Por que ele pesa menos dentro da água? Porque o peso aparente Pap é a
→ →
força resultante da subtração entre o empuxo E e o peso P. O peso aparente é o
quanto aquele objeto pesa, naquele meio, no mesmo campo gravitacional.

DICAS

Este é um assunto muito interessante, pois envolve propriedades materiais dos


dois meios envolvidos. Por aqui, você está no caminho para o entendimento da hidráulica,
hidrostática e hidrodinâmica. É com essa diligência que gostaríamos de sugerir a leitura do
trabalho “Um aparato experimental para o estudo do princípio de Arquimedes”, de Barbosa e
Breitschaft, (2006), pulicado na Revista Caderno Brasileiro de Ensino de Física. Nele, os autores
propõem a utilização de um aparato para o ensino do princípio de Arquimedes em sala de
aula. Há uma boa discussão do tópico e a apresentação da aplicação prática do aparato.
Disponível em: <https://bit.ly/2GH4aWJ>.

10 FORÇAS ELÉTRICA, MAGNÉTICA E ELETROMAGNÉTICA


Assim como a gravitação, a força elétrica, que você sente ao brincar com
uma barra eletrizada pelo efeito de esfregá-la com uma flanela, por exemplo,
também é uma força de ação a distância. E mais interessante ainda: tem a mesma
forma do inverso do quadrado da distância.

Em ambos os casos, imagina-se um campo gerado por uma fonte, seja o


gravitacional gerado por um objeto de grande massa ou o elétrico gerado por
uma carga em repouso. Há outra particularidade muito interessante na relação
entre essas duas forças. A força gravitacional é muito mais fraca, em intensidade,
do que a força elétrica gerada pela interação entre duas cargas pontuais:

121
UNIDADE 2 | DINÂMICA


→ 1 qQ →  qQ →

=FE = r C 2 r.
4πε 0 r 2
r (2.52)

Essa é a Lei de Coulomb, batizada em homenagem ao físico francês


Charles-Augustin de Coulomb (1736-1806), outro ícone no desenvolvimento da
teoria do eletromagnetismo. Seu retrato pode ser observado na Figura 18 (a). A
constante de proporcionalidade C = 9 X 10⁹ N m²/C² é também conhecida como
constante de Coulomb, e isso demonstra a importância histórica de grande
cientista. Talvez a simples observação da equação (2.52) não seja óbvio, a força
elétrica é de fato bastante fraca. Se você calcular a atração gravitacional entre dois
elétrons e dividir pela repulsão entre eles, em uma relação do tipo Fe/Fg, obterá
uma relação de algo em torno de (4,17 x 10⁴²). Isso significa que a força elétrica
Fe é 4.17 x 10⁴² vezes mais intensa que a gravitacional. Isso explica o esforço
tamanho da força gravitacional para vencer a força elétrica que mantém a maçã
presa ao galho de uma árvore.

FIGURA 18 – (A) CHARLES-AUGUSTIN DE COULOMB; (B) JOSEPH JOHN


THOMSON

(a) (b)
FONTE (a): Disponível em: <goo.gl/SS9Nko>; (b) <goo.gl/upY1wZ)>. Acesso
em: 9 mar. 2018.

Perceba a implicação Fe / Fg = − ( C / G )( qe / me ) 2 . A razão (G/C) é


uma relação entre as constantes de proporcionalidades envolvidas e ( qe / me )
é a importante relação carga-massa, investigada pelo físico inglês Joseph John
Thomson (1856-1940) e publicada em 1897, quando apresentou seus resultados.
Fundamental para o desenvolvimento da física em sua era moderna, o retrato
de Thomson pode ser observado na Figura 18(b). Thomson investigou a razão
carga-massa do elétron com o auxílio de um equipamento chamado tubo de
raios catódicos. Um tubo de vidro, evacuado, que funcionava como uma válvula
acelerando elétrons emitidos por algum tipo de filamento contra um anteparo.
Basicamente, a engenharia por trás dos antigos e obsoletos televisores de tubo.
122
TÓPICO 2 | APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA

Observando tal razão, podemos concluir que a importância de conhecer a


proporção entre a carga e a massa de um elétron era fundamental para entender a
intensidade da força elétrica, em comparação com uma força que nos é muito mais
familiar, a da gravidade. Mas Thomson não ficou famoso apenas por investigar
essa proporção, ele é o pai do elétron. Foi este distinto cientista quem descobriu a
existência do elétron e, por sua vez, contribuiu muito para o entendimento dessa
propriedade da matéria.

Embora não seja esse o escopo do livro, talvez seja interessante discutirmos
aqui o conceito de carga elétrica. Assim como a massa, a carga elétrica é uma
propriedade da matéria. Corpos compostos por átomos e elétrons possuem
alguma carga, seja ela positiva, negativa ou nula. Então, da mesma forma que a
massa de um corpo está associada a uma força atrativa em relação a outros corpos,
a quantidade líquida de carga de um corpo, considerando a soma de todas as
cargas negativas e positivas, se não nula, está associada a uma força elétrica.

Ainda sobre a equação (2.52), repare na constante ε0, ela é conhecida como
a permissividade elétrica do meio e no nosso = caso ε 0 8, 8541878176 ×10−12 F /m
faz referência ao vácuo. Esta é uma quantidade relacionada à propriedade do meio
de se submeter

à polarização elétrica e tem muito a ver com o conceito de campo
elétrico E, que não abordaremos aqui. Ela pode influenciar consideravelmente
fenômenos elétricos, mas, por ora, o assunto fica fora do nosso escopo.

DICAS

Para satisfazer sua curiosidade sobre o assunto, sugerimos a leitura do trabalho


“A carga específica do elétron: um enfoque histórico e experimental”, de Barbosa e Breitschaft,
(2006), pulicado na Revista Caderno Brasileiro de Ensino de Física. Nele, os autores propõem
um método para a determinação da razão carga-massa do elétron. O trabalho é bastante
fundamentado na contextualização histórica do momento, e assim quatro experimentos
são detalhadamente apresentados como sugestão para o ensino do tema em nível médio.
O trabalho apresenta também resultados preliminares para investigação. Disponível em:
<https://bit.ly/2IZMYBe>.

Outra força muito importante em nosso dia a dia é aquela associada aos
fenômenos magnéticos. A força magnética é a responsável por explicar como
ímãs funcionam, ou como uma guitarra emite suas notas, ou como você consegue
utilizar um telefone celular. A definição de força magnética é, de certa forma,
indissociável do conceito do campo magnético, também fora do nosso escopo
aqui, e está relacionada também à velocidade →v de propagação de um elétron no
espaço, como apresentado na equação (2.53):

→  →
→ 
FM= qv × B. (2.53)

123
UNIDADE 2 | DINÂMICA

Obviamente, ficamos limitados a uma abordagem mais superficial do


tema, pois ele foge um pouco de nossas pretensões com este livro, mas o assunto é
com certeza muito interessante e um aprofundamento no âmbito fenomenológico
pode ser proveitoso.

DICAS

Desse modo, gostaríamos de sugerir a leitura do trabalho “A carga específica do


elétron: um enfoque histórico e experimental”, de autoria de L. C. M. da Silva, W. M. S. Santos e
P. M. C. Dias (2011), pulicado na Revista Caderno Brasileiro de Ensino de Física. Nele, os autores
trabalham o desenvolvimento fenomenológico dos conceitos de campo elétrico e campo
magnético sob a ótica histórica. É uma leitura bastante interessante, principalmente porque
não apela ao uso de uma matemática muito refinada, o que significa que mesmo um aluno
que acaba de iniciar seus estudos em física pode aprender bastante. Disponível em: <https://
bit.ly/2IZMYBe>.

Dois dos maiores nomes por trás de nosso entendimento sobre as forças
magnéticas são o do francês André-Marie Ampère (1775-1836), que estudou a
relação entre a corrente elétrica e o campo magnético por ela gerado, e também o
do inglês Michael Faraday (1791-1867), que apesar de não dominar a matemática
que descrevia tais fenômenos é considerado um dos maiores físicos experimentais
da história, principalmente por trabalhos que relatavam a próxima relação
entre os campos elétrico e magnético. Quando associamos a teoria dos campos
→ →
elétricos E àquela dos campos magnéticos B, passamos a trabalhar no terreno
do eletromagnetismo, essa→ →
sim é uma teoria mais completa, que descreve a já
conhecida relação entre E e B.

→  →
→  →
(
FM= q E + v × B . ) (2.54)

O que temos aqui é uma boa introdução para nosso próximo tópico: as
forças que atuam em escala infinitamente pequena, em nível atômico ou nuclear.
Os trabalhos de cientistas, como o neozelandês Ernest Rutherford (1917-1919), que
descobriu o próton e foi aluno de Thomson, e também o inglês James Chadwick
(1891-1974), que descobriu o nêutron e foi aluno de Rutherford, assim como o do
próprio Joseph John Thomson pavimentou o caminho para o entendimento do
muito pequeno, do mundo das partículas elementares e das forças que atuam
nessa escala.

124
TÓPICO 2 | APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA

11 FORÇAS DE INTERAÇÃO NUCLEAR


Há basicamente duas formas de interação em escala nuclear, as forças
nucleares forte e fraca são responsáveis pela interação entre partículas e pelo
eventual decaimento energético.

A força nuclear forte comanda o espetáculo nuclear, em uma escala


da ordem de 10⁻¹⁵ m, ou, um fentômetro fm. Aliás, essa escala é geralmente
referida como Fermi, em homenagem ao físico italiano Enrico Fermi (1901-1954),
famoso por seu trabalho em física nuclear e de partículas. Fermi foi promissor
no campo das reações nucleares. Desenvolveu um método estatístico, o qual
ainda utilizamos, para analisar e "catalogar" os diferentes tipos de partículas que
habitam o núcleo e a órbita dos átomos. Fermi ainda foi um propositor da teoria
da força fraca. Lembre-se de que dentro do núcleo, as distâncias são pequenas,
a força colombiana é imensa, mas isso não impede que núcleos se mantenham
estáveis. Daí vem a qualidade robusta dessa força. Você pode perceber que a
intensidade da força nuclear forte é incrivelmente maior que aquela da força
eletromagnética. É necessário um choque tremendo entre uma partícula em
altíssima velocidade para fragmentar um núcleo atômico, porém o alcance de
tal força acaba sendo reduzidíssimo, pois é perfeitamente possível separar duas
cargas. Você faz isso quando remove um fio de cabelo que se prendeu a sua
roupa devido à "eletricidade estática". Por esse motivo, não faz sentido pensar
em interação forte entre objetos em maior escala. As distâncias envolvidas são
muito grandes. Só o núcleo atômico é submetido a essa interação. O sinal da
força nuclear varia com a proximidade entre as partículas envolvidas. É atrativo
quando se afastam em relação a um determinado valor e repulsivo quando se
aproximam demais. Esse valor representa apenas 25% do Fermi F.

A força nuclear fraca também tem alcance bastante reduzido, menor


até que aquele da força nuclear forte. Sua intensidade também é muito menor,
daí o nome. A força fraca tem uma intensidade compatível com uma posição
intermediária entre a força eletromagnética e a força gravitacional. Essa força é
especializada no decaimento - β . Esse é o fenômeno da emissão de elétrons, ou
de seus antielétrons, os pósitrons, altamente energéticos, o que significa que eles
são bastante velozes. Note que esse é um processo radioativo. Essa é uma força
bastante complexa, pois seu desenvolvimento teórico envolveu a quebra de uma
quantidade associada à simetria das partículas, chamada de paridade.

O problema aqui é que tanto a força nuclear fraca como a forte tendem a
se tornar complexas demais para serem tratadas com uma abordagem clássica,
porém muito trabalho tem sido feito, especialmente com foco na unificação dessas
teorias. Essa física aqui é a moderna, é um tópico que melhor se encaixará mais à
frente na lista de temas que abordaremos em sua carreira acadêmica.

A união das teorias que explicam os fenômenos eletromagnéticos assim


como as interações forte e fraca compõem o que chamamos de "modelo padrão"
da física de partículas. Todo esse conjunto de leis e teoremas, testados diariamente

125
UNIDADE 2 | DINÂMICA

nos aceleradores de partículas, encerra nosso conhecimento do mundo a escalas


atômicas e subatômicas. O modelo padrão é tão confiável que através de décadas
muitas partículas foram previstas, principalmente pelas conclusões que podemos
obter com essa teoria, e muitas já foram encontradas, com sua descoberta
normalmente limitada por nossa capacidade de desenvolver aceleradores mais
potentes. Isso significa dizer que até hoje, a principal ameaça que tal modelo
sofre é provida por nossas restrições técnicas e não por falhas teóricas do modelo.
Isso é incrível. Prótons, nêutrons, elétrons e uma infinidade de outras partículas
foram geradas a partir da combinação de entidades fundamentais. Conhecidos
como quarks, o modelo prevê partículas fundamentais que compõem prótons,
nêutrons e todo um zoológico particular.

DICAS

Gostaríamos de citar aqui a leitura do livro “Física nuclear e de partículas: uma


introdução”, de Mizrahi e Galetti (2016), para um aprofundamento maior sobre o assunto.
Ele traz lições introdutórias àqueles que desenvolveram curiosidade sobre o assunto a
respeito das notações adotadas, das propriedades nucleares, da radioatividade, formulações
semiempíricas de equações para a massa desses núcleos, além de tratar as forças nucleares e
as reações entre as partículas que compõem os núcleos dos átomos. Muitos outros assuntos
são discutidos, como modelos nucleares, decaimentos, transições eletromagnéticas fissão e
fusão nucleares, a energia nuclear como e partículas fundamentais. É uma leitura interessante
a respeito de um tópico ainda pouco presente em nosso cotidiano.

DICAS

Para um aprofundamento na história da física eu gostaria de sugerir a leitura do


livro “Para Gostar de Ler a História da Física” Bassalo e Farias (2010) Nele, os autores fazem uma
cobertura da história da física, com discussões muito interessantes sobre tópicos abordados
nesse livro e mais. Muitos personagens marcantes da história são abordados, como Galileu
Galilei e Isaac Newton, mas também alguns físicos brasileiros ilustres, como César Lattes e
José Leite Lopes. Vale a leitura!

126
TÓPICO 2 | APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA

LEITURA COMPLEMENTAR

O QUE É FORÇA?

Feynman, Leighton e Sands

Apesar de ser interessante e valer a pena estudar as leis físicas simplesmente


porque elas nos ajudam a entender e a fazer uso da natureza, devemos parar de
tempos em tempos e pensar: “O que elas realmente significam?” O sentido de
qualquer afirmação é um assunto que tem interessado e atormentado filósofos desde
tempos imemoriais, e o significado das leis físicas é ainda mais interessante, porque
geralmente acredita-se que essas leis representam alguma forma de conhecimento
real. O sentido do conhecimento é um profundo problema na filosofia, e é sempre
importante perguntar: “O que significa isto?”

Então perguntemos: “Qual é o significado das leis físicas de Newton, que


escrevemos como F = ma? Qual é o significado da força, massa e aceleração?”
Bem, podemos perceber intuitivamente o significado da massa, e podemos definir
aceleração se sabemos os significados de posição e tempo. Não discutiremos esses
significados, mas iremos nos concentrar no novo conceito de força. A resposta é
igualmente simples: “Se um corpo está acelerando, então existe uma força sobre
ele”. Isto é o que as leis de Newton dizem, então a definição mais bela e precisa
de força imaginável talvez simplesmente consista em dizer que força é a massa
de um objeto vezes sua aceleração. Vamos supor que temos uma lei que diz que
a conservação do momento é válida se a soma de todas as forças externas for
zero; então surge a questão: “O que isto significa, que a soma de todas as forças
externas é zero?” Uma maneira agradável de definir esta afirmação seria: “Quando
o momento total é uma constante, então a soma das forças externas é zero”. Deve
ter algo errado com essa definição, porque ela simplesmente não nos diz nada de
novo. Se descobrirmos uma lei fundamental, que nos assegura que a força é igual
à massa vezes a aceleração, não descobrimos nada. Poderíamos também definir
força querendo dizer que um objeto em movimento, sem nenhuma força agindo
sobre ele, continua a se movimentar com velocidade constante em uma linha reta.
Se então observarmos um objeto que não está se movimentando em uma linha
reta com uma velocidade constante, poderíamos dizer que existe uma força sobre
ele. Agora, tais coisas certamente não podem ter origem na Física, porque são
definições andando em círculos. A afirmação newtoniana acima, entretanto, parece
ser a definição mais precisa de força, e numa forma que agrada aos matemáticos;
todavia é completamente inútil, porque previsão alguma pode ser feita a partir de
uma definição. Podemos sentar em uma poltrona o dia todo e definir palavras ao
nosso bel-prazer, mas descobrir o que acontece quando duas bolas colidem uma
contra a outra, ou quando um peso é pendurado em uma mola, é completamente
diferente, porque o modo como os corpos se comportam é algo completamente fora
de qualquer grupo de definições.

127
UNIDADE 2 | DINÂMICA

Por exemplo, se decidirmos dizer que uns objetos deixados por conta
própria mantêm sua posição e não se movem, e então quando observarmos algo
sendo impulsionado, poderíamos dizer que isto ocorre devido a uma “gorça” – uma
gorça é a taxa de mudança da posição. Agora, temos uma maravilhosa nova lei, tudo
permanece inerte exceto quando uma gorça age. Veja, isto seria análogo à definição
de força acima, e não conteria nenhuma informação. O conteúdo real das leis de
Newton é este: que a força supostamente contém algumas propriedades independentes,
em adição à lei F = ma; mas as propriedades independentes específicas que a força
possui não foram descritas completamente por Newton ou por ninguém mais, e,
portanto, a lei física F= ma é uma lei incompleta. Ela implica que se estudarmos a
massa vezes a aceleração e chamarmos o produto de força, ou seja, se estudarmos
as características da força como objeto de interesse, então descobriremos que as
forças possuem uma certa simplicidade; a lei é uma boa ferramenta para analisar
a natureza, isso é uma sugestão de que as forças são simples.

Agora, o primeiro exemplo de tais forças foi a lei completa da gravitação,


que nos foi dada por Newton, e ao declarar a lei ele respondeu à pergunta: “O que
é a força?” Se não existisse nada além da gravitação, então a combinação dessa
lei e a lei da força (a segunda lei do movimento) seria uma teoria completa, mas
existe muito mais do que a gravitação, e queremos usar as leis de Newton em
muitas situações diferentes. Portanto, para podermos prosseguir, devemos falar
mais sobre as propriedades da força.

Por exemplo, uma pressuposição implícita sempre feita ao lidarmos com


forças é que a força é igual a zero a menos que algum corpo físico esteja presente,
que se encontrarmos uma força que não seja igual a zero também encontramos
algo nas redondezas que é a fonte desta forca. Este pressuposto é completamente
diferente do caso da “gorça” apresentado anteriormente. Uma das características
mais importantes da força é que ela possui uma origem material, e isto não é apenas
uma definição.

Newton também nos deu uma regra sobre a força: que as forças entre corpos
interagentes são iguais e opostas – ação igual à reação; essa regra foi verificada, não
é exatamente verdadeira. De fato, a lei F = ma não é exatamente verdadeira; se ela
fosse uma definição, deveríamos dizer que ela é exatamente verdadeira; mas ela não é.

Um estudante pode objetar: “Eu não gosto desta imprecisão, eu gostaria


de ter tudo definido exatamente; na verdade, é dito em alguns livros que qualquer
ciência é uma área exata, na qual tudo é definido”. Se você insistir em uma definição
precisa de força, nunca a terá! Primeiro, porque a Segunda Lei de Newton não é
precisa e, segundo, porque para entender as leis físicas é preciso que você entenda
que todas elas são algum tipo de aproximação.

Qualquer ideia simples é aproximada; como ilustração, considere um objeto,


... o que é um objeto? Os filósofos estão sempre dizendo: “Bem, pegue uma cadeira,
por exemplo”. No momento em que eles dizem isto, sabemos que eles não sabem
mais do que estão falando. O que é uma cadeira? Bem, uma cadeira é uma certa

128
TÓPICO 2 | APLICAÇÕES DO CONCEITO DE FORÇA

coisa lá... certa? Quão certa? Os átomos dela estão evaporando de tempos em tempos
– não muitos átomos, mas alguns – poeira cai sobre ela e dissolve-se em sua tinta;
então, para definir uma cadeira precisamente, para dizer quais átomos são cadeira,
e quais átomos são ar, ou quais átomos são poeira, ou quais átomos são tinta que
pertence à cadeira, é impossível. Logo, a massa de uma cadeira pode ser definida
apenas aproximadamente. Da mesma forma, para definir a massa de um único
objeto é impossível, porque não existem muitos objetos únicos e independentes do
ambiente no mundo – cada objeto é uma mistura de várias coisas, logo podemos
lidar com eles apenas como uma série de aproximações e idealizações.

O truque reside nas idealizações. Para uma excelente aproximação de talvez


uma parte em 10¹⁰, o número de átomos na cadeira não muda em um minuto, e
se não formos muito precisos, podemos idealizar a cadeira como algo definitivo;
da mesma forma iremos aprender sobre as características da força, de forma
ideal, se não formos precisos demais. Alguém pode ficar insatisfeito com a visão
aproximada da natureza que a física tenta obter (a tentativa é sempre aumentar
a precisão da aproximação), e pode preferir uma definição matemática; mas
definições matemáticas nunca podem funcionar no mundo real. Uma definição
matemática será́ adequada para a matemática, na qual toda a lógica pode ser
sequenciada completamente, mas o mundo físico é complexo, como já indicamos
em vários exemplos, tais como os das ondas do oceano e um copo de vinho. Quando
tentamos isolar pedaços dele, falando de uma massa, do vinho e do copo, como
podemos saber quem é quem, quando um se dissolve no outro? As forças sobre
uma única coisa já envolvem aproximações, e se temos um sistema de discurso
sobre o mundo real, então este sistema, pelo menos nos dias atuais, deve envolver
algum tipo de aproximação.

Este sistema é bem distinto do caso da matemática, na qual tudo pode ser
definido, e então não sabemos sobre o que estamos falando. Na verdade, a glória
da matemática é que não precisamos dizer sobre o que estamos falando. A glória é que
as leis, os argumentos e a lógica são independentes do que “esta coisa” seja. Se
tivermos qualquer outro conjunto de objetos que obedeça ao mesmo sistema de
axiomas, como a geometria euclidiana, e em seguida construímos novas definições
e as seguirmos com a lógica correta, todas as consequências daí estarão corretas, e
não importa qual seja o sujeito delas. Na natureza, entretanto, quando desenhamos
uma linha ou estabelecemos uma linha usando um feixe de luz e um teodolito,
como quando fazemos em medições, estamos medindo uma linha sob a luz de
Euclides? Não, estamos fazendo uma aproximação; a mira possui alguma largura,
mas uma linha geométrica não possui largura, e assim, quer a geometria euclidiana
possa ser usada para medições, ou não, é uma questão física, e não matemática.
Entretanto, de um ponto de vista experimental, e não matemático, precisamos
saber se as leis de Euclides aplicam-se ao tipo de geometria que usamos ao medir
terrenos; e assim fazemos a hipótese que elas se aplicam, e que funciona muito
bem; mas elas não são precisas, porque nossas linhas de medição não são realmente
linhas geométricas. Quer estas linhas de Euclides, que são realmente abstratas, se
apliquem às linhas da experiência, ou não, é uma questão para a experiência; não
é uma questão que possa ser resolvida pela razão pura.

129
UNIDADE 2 | DINÂMICA

Da mesma forma, não podemos apenas chamar F= ma de uma definição,


deduzir tudo puramente através da matemática, e transformar a mecânica em uma
teoria matemática, quando a mecânica é uma descrição da natureza. Ao estabelecer
postulados adequados sempre é possível fazer um sistema de matemática, assim
como Euclides o fez, mas não podemos fazer uma matemática do mundo, porque
cedo ou tarde temos que descobrir se os axiomas são válidos para os objetos da
natureza. Então, imediatamente nos envolvemos com estes objetos complicados e
“sujos” da natureza, mas com aproximações cada vez mais precisas.

FONTE: Disponível em: <https://bit.ly/1khRFD7>. Acesso em: 22 maio 2018.

130
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• É possível realizar uma demonstração geométrica dos vetores de força


envolvidos em uma situação hipotética, representada, por exemplo, por um
retrato de quatro cavalos puxando uma carroça com toras.

• Definimos tal representação geométrica como o diagrama de forças e em


seguida, com o auxílio de um sistema de referências, da trigonometria e das
leis de Newton, decompomos essas forças em suas projeções referenciais.

• Forças gravitacionais, que regem os corpos celestes e objetos massivos em


geral.

• O atrito gerado, quando duas superfícies se movem uma em relação a outra,


dissipa energia e é uma força não conservativa.

• O empuxo nos fluidos é uma força imposta por eles a objetos neles mergulhados.

• As forças de interação nuclear regem o mundo subatômico e nuclear, habitado


por partículas elementares ou não.

131
AUTOATIVIDADE

1 Vimos que a força de atrito está associada à fricção entre duas superfícies e
que a intensidade dessa fricção, para diferentes objetos, de mesma massa,
dependerá dos coeficientes de atrito, estático e cinético. Assinale o coeficiente
de atrito de estático µ e , sabendo que a força necessária para superar o atrito
entre uma caixa de 200 kg e uma determinada superfície é de 450 N.

a) ( ) 1,0
b) ( ) 0,84
c) ( ) 0,50
d) ( ) 0,23
e) ( ) 0,0

2 Na figura a seguir, uma caixa de massa M = 150 kg, submetida a uma


força F = 450 N está no limite de entrar em movimento. Estabeleça um
sistema de referências e complete o diagrama de forças da figura. Assinale
o coeficiente de atrito estático µ e entre a caixa e a superfície, de modo a
saber quanta força deve ser feita na direção horizontal para mover a caixa,
caso um ângulo θ = 45° seja aplicado:

FIGURA 19 – BLOCO SOB AÇÃO DE FORÇAS VARIADAS

FONTE: O autor

F
) µe
a) (= = cosθ 0.76
N
F
b) (=
) µe = cosθ 0.16
N
F
c) (=) µe = sin θ 0.16
N
F
d) (=) µe = sin θ 1.16
N
F
e) ( ) µ=
e = 0.16
N

132
3 Considerando a figura da questão anterior (Figura 19) e imaginando que
o bloco deslizou, e se mantém dessa forma, com aceleração de a = 1,5 m/
s2, assinale o coeficiente de atrito cinético μc, entre a caixa e a superfície.
Considere esta como a única alteração nas condições do problema.

N
a) ( ) µ c =µ e − =0 , 007
ma
a
b) ( ) µ c = µ e − = 0 , 7
g
c) ( ) µ c = a − µ e =0 , 007
g
a
d) ( ) µ c = µ e − = 0 , 007
g
a
e) ( ) µ c = µ e − = 1, 007
g

4 Considere o plano inclinado na figura a seguir (Figura 20) e, fazendo uso do


diagrama de forças, assinale a aceleração do bloco em função de seu ângulo
de inclinação θ e do coeficiente de atrito cinético μc .

FIGURA 20 – BLOCO EM PLANO INCLINADO SOB AÇÃO DE FORÇAS


VARIADAS

FONTE: O autor

a) ( ) a g ( µ c cosθ − sin θ )
=

=
b) ( ) a g ( cosθ − µc sin θ )

=
c) ( ) a g ( sin θ − µc cosθ )

133
d) (
= ) a g ( sin θ − µc tan θ )

=
e) ( ) a g ( tan θ − µc cosθ )

5 Ainda considerando a Figura 20, imaginando que o bloco não deslizou,


assinale o coeficiente de atrito estático μe.

a) ( ) µ e = ( Fat / Px )

b) ( ) µ e = ( Fy / Ny )

c) ( ) µ e = ( Py / Px )

d) ( ) µ e = ( Px / Py )

e) ( ) µ e = ( Px / P )

6 Considere o plano inclinado na Figura 21 e, fazendo uso do diagrama de


forças, assinale a aceleração do sistema quando o bloco for solto de sua
posição original em função de seu ângulo de inclinação θ e do coeficiente
de atrito cinético μc e a constante da mola κ.

FIGURA 21 – BLOCO EM PLANO INCLINADO SOB AÇÃO DE FORÇAS


VARIADAS

FONTE: O autor

(
a) ( ) a = g cosθ − µ c sin θ − (κ x / mg ) )
b) ( ) a =g ( sin θ − µ c cosθ − ( mg / κ x ) )

c) ( ) a =g ( sin θ − µ c cosθ − (κ x / mg ) )

134
(
) a g µ c sin θ − cosθ − (κ x / mg )
d) ( = )
) a
e) ( = g ( µ c sin θ − cosθ − ( mg / κ x ) )

7 Ainda considerando a Figura 21, uma vez solto, assinale a distância percorrida
pelo bloco até que a ação da mola e do atrito impeça seu movimento e ele
pare, em termos do ângulo θ, coeficiente de atrito e constante de mola
considerados.

( Px − Fat ) / κ =
a) ( ) x = ( P / κ )( sinθ − µ e cosθ )
( Px − Fat ) / κ =
b) ( ) x = ( P / κ )( sinθ − µ e cosθ )
( Px − Fat ) / κ =
c) ( ) x = ( P / κ )( sinθ − µ e cosθ )
( Px − Fat ) / κ =
d) ( ) x = ( P / κ )( sinθ − µ e cosθ )
( Px − Fat ) / κ =
e) ( ) x = ( P / κ )( sinθ − µ e cosθ )

135
136
UNIDADE 3

APLICAÇÕES DA DINÂMICA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• introduzir os conceitos de energia mecânica e conservação de energia me-


cânica;

• enunciar o trabalho realizado por uma força;

• definir o conceito de trabalho-energia;

• apresentar o conceito de potência.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade, você en-
contrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – ENERGIA MECÂNICA, CONSERVAÇÃO DA ENERGIA


MECÂNICA E TRABALHO

TÓPICO 2 – CONSERVAÇÃO DE ENERGIA

TÓPICO 3 – MOMENTO LINEAR, CONSERVAÇÃO DO MOMENTO


LINEAR E ESTUDO DAS COLISÕES

137
138
UNIDADE 3
TÓPICO 1

ENERGIA MECÂNICA, CONSERVAÇÃO DA ENERGIA


MECÂNICA E TRABALHO

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico, trataremos do conceito de energia mecânica, uma combinação
entre energia potencial e cinética, que em sistemas ideais tende a ser conservada
em relação a um determinado evento no tempo. Você entenderá que a energia
mecânica, assim como sua conservação são instrumentos altamente sofisticados
para a realização de previsões em sistemas mecânicos.

Discutiremos também o trabalho realizado por uma força, que atua


deslocando um corpo por uma determinada distância. O conceito de trabalho
deriva da ideia de que energia é sempre consumida quando o evento da aplicação
de uma força sobre um corpo toma lugar. Como a dinâmica trata da origem do
movimento, focaremos aqui na energia necessária para mover um corpo, com o
auxílio de uma força. Através do teorema trabalho-energia, poderemos mostrar
que o trabalho gerado por uma força é uma forma de energia em trânsito, entre
cinética e potencial, por exemplo. Poderemos também calcular a potência associada
à realização de trabalho. Por fim lidaremos com o princípio da conservação de
energia mecânica, presente em situações em que não há dissipação de energia,
ou seja, quando não há energias envolvidas que não possam ser convertidas de
cinética para potencial e de potencial para cinética.

2 ENERGIA MECÂNICA E CONSERVAÇÃO DA ENERGIA


MECÂNICA
Passemos agora a tratar mais uma grandeza de grande importância:
falaremos da energia e de sua conservação. Um dos principais nomes associados a
esse tema da física é aquele que dá nome à unidade de medida de comparação para
a grandeza da energia. O físico inglês James Prescott Joule (1784-1858), nasceu em
Salford, cidade próxima a Manchester, na Inglaterra. Joule ficou conhecido por
estabelecer uma relação entre o calor e o trabalho mecânico, com uma experiência
que ficou conhecida como "Equivalente mecânico do calor". Seu retrato pode ser
visto no lado (a) da Figura 1. Seu pai foi um cervejeiro rico que o educou em casa
durante boa parte de sua infância. Joule aprendeu matemática com John Dalton

139
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA

(1766-1844), um dos precursores da teoria atômica. Joule trabalhou também com


as propriedades magnéticas dos materiais e ainda trabalhou com o físico irlandês
William Thomson (1824-1907), também conhecido por Lord Kelvin, na obtenção
de uma escala de temperatura. Mais adiante em sua vida, foi eleito para a Royal
Society of London, a real sociedade de Londres, entidade dedicada à divulgação
das ideias da ciência. Joule morreu aos 70 anos, na cidade de Sale, também às
redondezas de Manchester.

Seu principal objeto de estudos foi o calor. A teoria que os cientistas da


época aplicavam para tentar explicar essa propriedade, considerava o calor uma
espécie de fluido autorrepelente chamado de "calórico", que podia transitar dos
corpos mais quentes para os mais frios. A teoria do calórico não vingou e Joule
ajudou a enterrá-la quando mostrou que o calor era mais uma das formas de
energia que reconhecemos.

Joule desenvolveu um mecanismo, que pode ser visto no lado (b) da


Figura 1, com o qual conseguiu provar que o calor era uma forma de energia,
como você ainda verá mais a fundo. O mecanismo consistia de um calorímetro:
uma espécie de panela com um revestimento termicamente isolante, pás para
mover a água contida dentro do calorímetro e um sistema de polias.

FIGURA 1 – (A) JAMES PRESCOTT JOULE; (B) APARATO PARA A MEDIÇÃO DO


EQUIVALENTE MECÂNICO DO CALOR

(a) (b)
FONTE: Disponível em: <goo.gl/PZHJcj>. Acesso em: 23 mar. 2018.

140
TÓPICO 1 | ENERGIA MECÂNICA, CONSERVAÇÃO DA ENERGIA MECÂNICA E TRABALHO

A ideia era deixar um peso cair com a aceleração da gravidade, amarrado


a uma corda, que através de um sistema de polias fazia as pás girarem, agitando
e aquecendo a água. O ponto é que ele conseguiu mostrar que havia uma espécie
de conservação da energia da queda do peso, sendo transferida de forma térmica
para a água. Joule realizou o experimento, fez suas medições e estabeleceu
a relação 1 cal= 4,18 J entre uma caloria – a então unidade usada para medir
a energia necessária – para aumentar a temperatura de 1 g de água em 1 grau
Celsius. Mas isso é assunto para um livro de termodinâmica. Vamos focar aqui
na importância de Joule. Seu experimento provou o fenômeno da conservação de
energia, e isso lhe rendeu uma homenagem.

Não é muito fácil definir o conceito de energia, mas todos temos uma ideia
particular a respeito dela, normalmente associada a altas temperaturas, grandes
velocidades ou agitações em geral. Para entender o conceito de conservação de
energia devemos associar essas percepções à matemática.

Vamos considerar novamente o aparato de Joule, apresentado na Figura


2. Você já sabe que o objetivo é o de demonstrar o fenômeno da conservação da
energia. Ao cair, de forma que um movimento de queda livre e livre da resistência
do ar, o peso deve converter sua energia associada à queda em uma energia
associada ao aquecimento da água, porém, aqui, vamos focar nossa atenção em um
desses pontos do experimento, trataremos das energias associadas apenas à queda.

FIGURA 2 – APARATO PARA A MEDIÇÃO DO EQUIVALENTE MECÂNICO DO CALOR

(a) (b)
FONTE: Disponível em: <goo.gl/PZHJcj>. Acesso em: 23 mar. 2018.

Primeiramente, você vai lembrar que já discutimos a queda livre na


Unidade 1, quando debatemos a cinemática dos corpos acelerados. Recapitulamos
que foi Evangelista Torricelli quem descreveu o movimento de queda dos corpos,
desconsiderando o tempo de queda, apenas sob o prisma da altura e inclinação
dos corpos envolvidos.

141
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA

Suponha que não há perdas de energia devidas ao aparato. Nem as polias,


nem o cabo exercem resistência considerável à queda. Perceba também que
cortamos o fio que conectava o peso ao aparato. Escolhemos o aparato de Joule,
pois queremos abordar esse problema de dois referenciais distintos: um centrado
no peso e outro entre as pás que movem a água. Do ponto de vista do peso, a
velocidade de sua queda, após o fio ser cortado, pode ser descrita como:

v 2f = vi2 + 2 g ∆h (3.1)

Em que ∆h = (yf - yi) é a diferença de alturas do objeto nos instantes inicial


(i) e final (f). Já do ponto de vista central, entre as pás teríamos:

v f= vi + 2 gh sin θ (3.2)

em que →
∆y
Note que sin θ = h é o vetor posição do peso, em relação ao
κ
referencial das pás. Aplicando a equação (3.1) para as posições finais, teremos:

v 2f = (
vi2 + 2 g y f − yi ; ) (3.3)

v 2f − 2 gy f =−
vi2 2 gyi ;

1 2 1
v f − gy f = vi2 − gyi ;
2 2

Observe que o objeto possui velocidade inicial vi quando está na posição


yi e que o mesmo vale para a velocidade final vi também associada à posição yf.
Logo, não importa em que altura o objeto esteja, o termo v² - 2gy será conservado.

Você vai concordar que, de forma geral, o valor da massa m da partícula


não sofreu alteração alguma entre as posições inicial e final. Se multiplicarmos a
equação (3.3) pela massa do objeto que cai, teremos apenas a mesma conservação
de antes, ampliada em valor por uma ordem de m. Então teremos:

1 2 1
mv − mgy f = mvi2 − mgyi . (3.4)
2 f 2

Fica claro que o primeiro dos termos, anteriormente citado, representa


a energia associada ao movimento em velocidade v do objeto. Essa energia é
conhecida como cinética K, ou kinesis, palavra grega para movimento. A energia
cinética é definida como:

1
K = mvi2 . (3.5)
2

142
TÓPICO 1 | ENERGIA MECÂNICA, CONSERVAÇÃO DA ENERGIA MECÂNICA E TRABALHO

Já o segundo termo faz referência à energia associada à altura y. Note


que, diferente do primeiro termo, não há uma impressão muito contundente
de movimento. Energias potenciais "armazenam" energia. Pense, por exemplo,
em um sistema massa-mola oscilando sobre gelo, praticamente sem atrito,
como estudamos anteriormente. Nesse sistema, uma massa fica oscilando
entre comprimir e estender uma mola. Esse sistema só pode ser razoavelmente
periódico se a velocidade da massa se altera a cada novo ciclo de oscilação. Isso
significa uma inversão no sinal do vetor velocidade, o que significa que a massa
deve parar em algum momento, o que implica K = 0:

U = mgy. (3.6)

Esse sistema só pode ser razoavelmente periódico se a velocidade da


massa se altera a cada novo ciclo de oscilação. Isso significa uma inversão no sinal
do vetor velocidade, exprimindo que a massa deve parar em algum momento,
o que implica K = 0. Para onde foi a energia cinética? Ela fica guardada tanto
na compressão como no estiramento da mola. No caso, a energia potencial
gravitacional U é diretamente proporcional à altura do objeto à superfície. A
energia potencial gravitacional é definida então como na equação (3.6). Quando
incluímos a massa, não alteramos a grandeza conservada, até porque o produto
se dá em todos os termos, mas obtemos algo muito interessante. Observe as
unidades dos termos envolvidos:

kgm
 mv 2 − mgy  = mv 2  = 2 m =Nm =J (3.7)
    s

Note que ambos os termos apresentam unidades de força vezes


deslocamento. Esse produto (Nm) ficou conhecido como o Joule (J), unidade da
grandeza conservada aqui. Mas vamos pensar um pouco sobre isso. O primeiro
termo da equação (3.4) faz referência à velocidade com que o objeto se move.
Sabemos que é necessário despender uma certa quantidade de energia para mover
um objeto de massa m. Da mesma forma é necessário despender certa quantidade
de energia para posicionar um objeto de massa m a uma altura y, em relação a
um sistema de referência. Você pode pensar a energia dessa forma: ela é o preço
que você paga para realizar uma determinada ação, seja levantar e derrubar um
peso ou apenas aquecer água. O que vimos aqui foi a descrição da conservação
da energia mecânica de um sistema em que duas ações foram tomadas. Esse foi o
trabalho de James Prescott Joule, e a unidade (J) é uma homenagem a ele. Para o
sistema que discutimos, podemos definir a energia mecânica como:

1 
∑  2 mv
2
=E n
− mgyn  (3.8)
n 

143
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA

Em que n = 1,2,3... representa o n-ésimo corpo do sistema. Lembre-se


de que, para sistemas diferentes, com formas diferentes de energia, a energia
mecânica pode tomar outra forma. Há termos diferenciados para sistemas
térmicos, para sistemas hidráulicos ou eletromagnéticos.

Todas as suposições que fizemos obtiveram sucesso por que vivemos


em um ambiente com um "campo gravitacional" uniforme. Isso significa dizer
que todos os pontos do espaço tridimensional estão submetidos ao campo
gravitacional com as mesmas regras. Não há direções preferenciais para o campo
gravitacional e em última instância, para a força gravitacional. Essa suposição
é perfeitamente cabível para regiões próximas à superfície da Terra, de modo
que a dedução anterior reflete precisamente nova experiência cotidiana. Em
cursos mais avançados de Física, principalmente no âmbito da relatividade geral,
você entrará em contato com campos gravitacionais não uniformes, o que torna
o problema da descrição da conservação de energia um pouco mais complexo.
Não se preocupe por enquanto em entender por completo o conceito de campo
gravitacional, você vai construir, aos poucos, essa concepção.

Os conceitos de energia e também de sua conservação foram cruciais


para o desenvolvimento científico e tecnológico, em que cientistas e engenheiros
puderam desenvolver máquinas, aprimorar métodos e aumentar a eficácia de
processos, como o cultivo de alimentos ou produção de bens. É fundamental que
você tenha esse conceito em mente e também de suas aplicações.

DICAS

É com esse espírito que sugerimos a leitura do artigo intitulado “um interessante
problema de vestibular envolvendo a não conservação da energia mecânica em um referencial
acelerado”. Disponível em: <https://bit.ly/2jYuzGZ>, para um maior entendimento da evolução
das concepções que associamos ao conceito de energia. Nele, os autores discutem um
problema proposto em uma prova de vestibular. O problema se tratava da oscilação de um
sistema massa-mola não energeticamente conservativo, em um referencial acelerado. Havia
o interesse de se descobrir a amplitude da oscilação do sistema, que começaria logo após o
referencial deixar de ser acelerado. É um trabalho interessante e pode ajudá-lo a reinterpretar
conceitos como força, sistemas de coordenadas e conservação de energia.

DICAS

Outro trabalho que pode despertar sua curiosidade é o artigo intitulado


“Evolução do conceito de energia mecânica: aplicando a história da ciência em uma aula de
física do ensino médio”. Disponível em: <https://bit.ly/2rEyb4R>, para um maior entendimento

144
TÓPICO 1 | ENERGIA MECÂNICA, CONSERVAÇÃO DA ENERGIA MECÂNICA E TRABALHO

da evolução das concepções que associamos ao conceito de energia. Nele, apresentam um


texto utilizado com alunos do ensino médio, com o objetivo de discutir o conceito de energia
mecânica sob uma abordagem histórica e comentam os benefícios observados durante a
aplicação desse método. É um trabalho interessante, pois nos alerta a não desconsiderar o
contexto histórico para entender quais são as motivações para o desenvolvimento científico
e como esses avanços se deram.

O trabalho é um conceito associado à força que atua em um determinado


corpo e causa sobre o mesmo algum tipo de deslocamento. Considere, por exemplo,
um martelo que atinge um prego. Se você não possuir muita habilidade no ramo
da marcenaria, pode precisar de várias tentativas até terminar de pregar um prego
na parede ou onde for. Nesse caso, observe o lado (a) da Figura 3, que representa
um martelo momentos antes de atingir um prego. A pintura de ambos foi feita com
café, por falar nisso. É uma obra da pintora contemporânea Nancy Nichols.

FIGURA 3 - COFFEE PAINTING OF HAMMER HITTING A NAIL (PINTURA EM CAFÉ DE


UM MARTELO ATINGINDO UM PREGO)

FONTE: Disponível em: <goo.gl/uwa2ra>. Acesso em: 23 mar. 2018.

Muito bem, observe agora o lado (b) da Figura 3.
Estudaremos o impacto


do martelo sobre o prego. Note a previsão da força do martelo e do respectivo
deslocamento do prego. Obviamente ambos ocorrerão durante o impacto, em

apenas um momento. Vejamos então: a força F será imposta à cabeça do prego e
este, por sua vez, sofrerá um deslocamento em direção ao interior da madeira onde
está sendo pregado. Você pode pensar também naqueles equipamentos utilizados
para enterrar longas pilastras de concreto no solo, de modo a fundamentar a
construção de um prédio, conhecidos como bate-estacas.

Voltando ao nosso martelo, perceba que é necessário empregar uma força

F para mover o prego de uma distância → d, e só quem já pregou muitos pregos
sabe como essa atividade é cansativa. O ponto é que você precisa transformar

145
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA

uma parte da energia potencial química de seu corpo em energia mecânica. A


essa energia, necessária para a realização de uma tarefa que exija a aplicação de
uma força, damos o nome de trabalho W.

O trabalho é uma forma de energia e é medido em unidades de energia J. É
interessante tentar distinguir essas duas grandezas: força e energia. Primeiramente,
uma delas é um vetor e a outra um escalar, como você já sabe. Mas pense por um
momento que você vai visitar sua mãe e ela lhe pede para ajudá-la com uma caixa.
Primeiro, ela lhe entrega a caixa nas mãos para dar uma última olhada no que tem
dentro, você sente um determinado peso, faz uma força, mas acha que está tudo
bem. Depois, ela lhe pede para colocar a caixa na última prateleira do armário.
Agora sim, você percebe que realmente está realizando trabalho, porque precisa
mover a caixa. São duas situações diferentes: na primeira, você emprega uma
força à caixa, mas só depois você realiza trabalho. Assim, o trabalho é também o
resultado do produto escalar:

 →
→ 
W= F ⋅ d . (3.9)

→ →
entre o vetor de força F aplicado à caixa e o vetor deslocamento d da caixa. No
primeiro momento, não há deslocamento da caixa, você a recebe em mãos. Mas
no segundo, há deslocamento da caixa, você deve colocá-la no topo do armário e
por consequência acaba realizando trabalho. Por se tratar de um produto escalar
entre vetores, você sabe que o trabalho também pode ser definido como o produto:

W = Fd cosθ , (3.10)

entre os módulos da força F e do deslocamento d e o cosseno do ângulo entre os


vetores →
F e→
d.

DICAS

Sugerimos a leitura do artigo intitulado “A história da evolução do conceito


físico de energia como subsídio para o seu ensino e aprendizagem – parte I”. Disponível em:
<https://goo.gl/hchMvQ>, para um maior entendimento da evolução das concepções que
associamos ao conceito de energia. Nele, o autor discute os aspectos mais relevantes do
processo de formulação do conceito de energia que temos hoje, fornecendo aos professores
subsídios diversos para o trabalho do tema em sala de aula. De Thomas Young, passando
por Johan Bernoulli, Galileu Galilei, René Descartes, até Gottfried Leibniz. Um a um, as
contribuições dos teóricos para o tema são debatidas.

146
TÓPICO 1 | ENERGIA MECÂNICA, CONSERVAÇÃO DA ENERGIA MECÂNICA E TRABALHO

3 TRABALHO REALIZADO POR UMA FORÇA


Anteriormente, definimos o trabalho realizado por uma força F constante
para deslocar um objeto de uma distância d. Vamos discutir agora o trabalho
gerado por uma força variável. Imagine um sistema em que um determinado
objeto é submetido à ação de uma determinada força. Os detalhes do sistema não
são importantes aqui, estamos interessados na matemática envolvida. A força
então poderia ter a forma:



F = Fx ( x ) iˆ + Fy ( y ) ˆj + Fz ( z ) kˆ. (3.11)

A equação (3.11) é uma representação espacial da força e, para agilizar


nossos cálculos, vamos escolher apenas uma das direções e então abandonar o
índice x. Mas todo raciocínio desenvolvido aqui vale para as demais dimensões.
Teremos então:


F = Fx ( x ) iˆ. (3.12)

Vamos imaginar então que F (x) atua sobre o objeto de nosso sistema.
Vimos anteriormente que para realizar essa ação é necessário despender uma
determinada quantidade de energia, à qual nos referimos como trabalho. Aqui
não é diferente, para realizar o deslocamento ∆x do objeto, a força realiza um
trabalho dado por:

∆W= F ( x ) ∆x. (3.13)

Até então não definimos uma função específica para a força, mas ainda
podemos prosseguir mais antes disso. Vamos imaginar que para que a força F (x)
atue sobre o objeto, isso implica em movê-lo por uma distância infinitesimal dx
e para isso a força realizará um trabalho dW, também infinitesimal. Do ponto de
vista da equação (3.13), teríamos:

dW = F ( x ) dx. (3.14)

Essa é uma expressão interessante, ela mostra o trabalho como uma


espécie de área, com uma base formada por um deslocamento dx e uma altura
dada F(x). Observe a equação (3.15) e note que podemos aplicar uma integração,
entre dois pontos quaisquer xi inicial e xf final, em ambos da igualdade de (3.14)
e teremos:

w xf

∫dW = ∫ F ( x ) dx.
0 xi
(3.15)

147
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA

w
Temos então que a soma integral de todos os particulares trabalhos ∫dW
é dada pela xi. x
0
f

Soma integral de todas as particulares áreas ∫ F ( x ) dx .


xi
Para deixar

isso tudo mais claro, vamos considerar o sistema massa-mola, com sua força

reparadora de tipo:

Frep  x   kx.
º x. (3.16)

O gráfico da equação (3.16) é apresentado na Figura 4. Adotamos valores


modestos para a constante de mola κ, para facilitar os cálculos. A linha sólida
(azul) representa a força reparadora Frep(x) para κ = 1 N/m; a linha tracejada
(vermelha) representa a força reparadora Frep(x) para κ = 2 N/m; e a linha
com traços e pontos (verde) representa a força reparadora Frep(x) para κ = 3
N/m. Você observará também três áreas acinzentadas cujos quadrantes estão
enumerados, elas representam os dois momentos em que estamos interessados
aqui. As áreas cinzas do quadrante 1 fazem referência ao trabalho realizado pela
mola em um deslocamento negativo, antes do ponto de equilíbrio x = 0. As áreas
cinzas do quadrante 2 fazem referência ao trabalho realizado pela mola em um
deslocamento positivo, após x = 0. Preste atenção a isso, essas áreas acinzentadas
têm uma importância muito grande.

FIGURA 4 – TRABALHO W REALIZADO POR UMA FORÇA VARIÁVEL

FONTE: O autor

148
TÓPICO 1 | ENERGIA MECÂNICA, CONSERVAÇÃO DA ENERGIA MECÂNICA E TRABALHO

Observe como o sinal da força reparadora da mola Frep(x) = -κx é sempre


invertido em relação a sua posição. Quando x = 1m, Frep(x) = -1N, e quando x
= -1m, Frep(x) = 1N, isso ocorre porque temos uma constante de conversão de
unidades que assume apenas valores positivos κ > 0, o que deixa para x a total
responsabilidade do valor do sinal de Frep(x). O sinal do trabalho passa então a
depender duplamente do sinal do deslocamento x:

W= - k ∆x (∆x) (3.17)

Como foi dito anteriormente, as três áreas acinzentadas, sob as curvas


Frep(x), no gráfico, representam os trabalhos realizados por Frep(x) para cada
valor de κ. Você pode imaginar uma sobreposição de gráficos, em que o trabalho
realizado pela força reparadora aumenta com κ, daí o motivo de escolhermos três
tons diferentes de cinza.

Observe a seguir a Figura 5, ela é similar à Figura 4, mas aqui adicionamos
um sistema massa-mola sobre o eixo-x. Vamos avaliar a relação entre a convenção
de sinais para o trabalho e o que ele significa fisicamente. Comecemos pela origem
do sistema. Quando na posição de equilíbrio x = 0 a mola está relaxada, nem
comprimida, nem estirada, essa ausência de deslocamento implica em Frep(x = 0)
= 0, o que significa que nenhum trabalho foi realizado, nem pela mola, nem sobre
a mola.

Considere agora que a mola é comprimida, como a massa sendo deslocada


para perto da origem do sistema, isso máxima a força reparadora Frep(x). Note a
equação (3.18), ela mostra a sinalização necessária, considerando a força Frep(x) e
o deslocamento a partir da origem ∆x = xf - xi = x, para definirmos a convenção de
sinais para os trabalhos envolvidos. O lado x < 0 da Figura 5 apresenta uma força
de valores positivos Frep(x) > 0. Considerando a equação (3.17), temos:

W1 > 0; (3.18)

(
+ Frep ( x )
W1 = )(− x );
(
=+ −κ x )( − x ) ;
( )( )
+ κ x x > 0.
=

Em que W1 é o trabalho realizado pela mola através da força reparadora


Frep(x), que tem sentido positivo. As quatro linhas centrais do quadro anterior
discutem as condições necessárias para W1 > 0. Tomaremos os módulos das
grandezas Frep(x) e x para podermos evidenciar com mais eficiência a discussão
dos sinais. A segunda linha contém a representação do trabalho realizado por
uma mola. Na terceira linha aplicamos a equação (3.16) e vemos que agora há
duas contribuições negativas, cujo produto gera um sinal positivo (+) para W1.

149
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA

Essa é a reação à compressão da mola, o sinal positivo representa o trabalho


realizado pela mola durante sua compressão, como pode ser visto na Figura 5,
com o vetor → Fres apontando na direção de movimento da massa e com sentido
positivo. Quando a massa passa pela posição de equilíbrio, não há a atuação da

força reparadora, com Fres (x) = 0, e nem trabalho realizado, porém, quando a
massa se encontra adiante da posição de equilíbrio, há o estiramento da mola:

FIGURA 5 – TRABALHO W REALIZADO EM UM SISTEMA MASSA-MOLA, POR E SOBRE


A MOLA

FONTE: O autor

No instante em que a massa passa da posição de origem e x > 0, a mola


começa a apresentar uma força reparadora que aponta também na mesma direção
de propagação da massa, entretanto com sinal negativo → Fres < 0. O trabalho
necessário para restaurar a mola a sua posição de equilíbrio é negativo.

W2 < 0; (3.19)

(
− Frep ( x )
W2 = )(+ x );
( )( + x ) ;
=+ −κ x
− (κ x )( + x ) < 0.
=

Observe a equação (3.19) e perceba que agora discutimos a condição para


W2 < 0. Na primeira segunda linha você notará que reescrevemos o trabalho como
função da força reparadora e de x, e que também utilizamos módulo para termos
mais controle sobre os sinais. Veja que agora, com x > 0, o sinal do trabalho passa
a depender apenas do sinal da força reparadora, daí W2 < 0.

150
TÓPICO 1 | ENERGIA MECÂNICA, CONSERVAÇÃO DA ENERGIA MECÂNICA E TRABALHO

Fisicamente, o sinal do trabalho, uma grandeza escalar, traz a informação


sobre o que ocorre no sistema. Quando x > 0, a mola está estirada, então Frep(x)
= -κx aponta no sentido negativo do eixo-x, pois tenta trazer a massa novamente
para a posição de equilíbrio x = 0, em que Frep(x) = 0. Por outro lado, quando x
< 0, a mola está comprimida, dessa vez Frep(x)= +κx aponta no sentido positivo
do eixo-x, pois tenta trazer a massa novamente para a posição de equilíbrio.
Em condições reais, em que o atrito com a superfície não tenha sido eliminado,
o sistema oscilará em torno da posição de equilíbrio algumas vezes, mas
eventualmente parará em x = 0.

Vamos calcular o trabalho (3.15) realizado pela força reparadora (3.16).


Teremos então que o trabalho realizado no quadrante 1, quando a massa se move
de x = -1 para x = 0 será:

0 0

∫dW1 = −κ ∫ x dx
−1 −1
(3.20)
0
 1 0
êWx =  −1; 2 2 
W1 1   2k º x   −1;
 2  1
 1 2
ê =  −; ( −1) 
 1 2 
   k º  1  ; 
2

  1  
2
ê . = −
2 
 1  
  k º .
 2 

Analisando a equação (3.21) e observando novamente a Figura 4, podemos


perceber que o trabalho realizado no quadrante 1 é proporcional à metade do valor
da constante da mola κ. O trabalho realizado pela mola, reagindo à compressão,
é o triângulo sobre Frep(x). Mas há também o quadrante 2, vamos calcular o
trabalho realizado nele, com:

1 1

∫dW2 = −kê ∫xdx;


0 0
(3.21)

1
 1 
W₂
êWx2 = ;− kx 2  ;
 2 0
 1 2
ê  −; 2 k ( −1)  ;
=
 
 1 
ê . =  − k .
 2 

151
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA

Aqui, ao contrário do quadrante 1, o trabalho realizado tem valor positivo,


pois a força reparadora passa a atuar em sentido oposto. No fim das contas, o
trabalho total realizado será nulo, como podemos ver na equação (3.23):

Wtotal= W1 + W2 ; (3.22)
1  1 
ê= ê K
;  −  K ;
2  2 
=0

Esse resultado faz todo sentido físico, uma vez que estamos considerando
um sistema massa- mola ideal, sem atrito e nenhuma perda de energia. Em um
sistema assim, a massa oscilaria para sempre e isso só seria possível se o sistema
não perder energia. É claro que em um sistema real, em que as perdas de energia
precisam ser consideradas, não há conservação de energia e a massa para.

DICAS

Sugerimos a leitura de um trabalho escrito para a obtenção de grau de mestre


em ensino de Física na instituição UFRGS – Instituto de Física, Programa de Pós-Graduação
em Ensino de Física – intitulado Introdução ao conceito de energia (textos de apoio ao
professor de Física) (BOCUSSI, 2007). Disponível em: <https://goo.gl/rkPgrr>. No trabalho, o
autor introduz o conceito físico de energia e apresenta as etapas de saber científico e saber
escolar, lidando com a transposição didática desse que é um dos conceitos mais intrigantes
da natureza. É uma boa leitura, pois nos traz muita informação a respeito da história do
tratamento do conceito de energia, por muitos pensadores, influenciados por resultados
obtidos a partir de muitas áreas distintas da Física.

3.1 TEOREMA TRABALHO-ENERGIA


O teorema
→ →
trabalho-energia é responsável por combinar o trabalho realizado
por uma força F ( r ) durante um deslocamento dx à variação de energia cinética
associada ao movimento descrito pelo corpo. Ele nos mostra que o simples ato de
mover um corpo, sob a ação de uma força e gerando uma aceleração → a, incorre na
óbvia variação da velocidade desse corpo entre o instante inicial →
vi e o instante final
v→f.

O que se passa é que, como vimos anteriormente, podemos escrever o


trabalho realizado
→→ →
por uma força como a soma integral das áreas delimitadas
pelo produto F (r).dr, entre as posições inicial xi e final xf. Tomando aqui uma
única dimensão, para simplificar os cálculos, teremos a expressão:

152
TÓPICO 1 | ENERGIA MECÂNICA, CONSERVAÇÃO DA ENERGIA MECÂNICA E TRABALHO

xf

W = ∫ F ( x ) dx (3.23)
xi

1  1 
ê ==ê  ; k −  k ;
2  2 
=0

É claro que podemos reescrevê-la em termos do produto entre a massa m


do objeto sobre o qual atua a força F(x), e a taxa de variação da velocidade d v ,
como é mostrado na primeira linha da equação (3.24) a seguir: dt

xf
d  (3.24)
Wi → f = ∫ m  v  dx;
xi  dt 
xf

= ∫ mvdx;
xi

1 2 1 2
= mv − mv ;
2 f 2 i
= K f − Ki ;
= ∆K .

Note que, já na segunda linha, podemos rearranjar a equação, de modo


que ficamos com uma soma integral sobre a variação da velocidade envolvida.
Isso faz sentido também, uma vez que a aplicação de uma força sobre um objeto de
massa m envolve, invariavelmente, a alteração do estado de movimento do objeto
e, dessa forma de sua velocidade v. Perceba então que os limites de integração
também acabam por serem alterados, mas estes estarão sempre relacionados com
a velocidade inicial vi na posição inicial xi e com a velocidade final vf na posição
final xf. A integral restante tem uma forma conhecida pelo leitor e bastante
simplificada, e o resultado dessa integração sobre a variação da velocidade é dado
na terceira linha. A quarta e quinta linhas apresentam apenas a conclusão final
do raciocínio, mostrando que o trabalho W realizado por uma força F(x) sobre
um corpo de massa m, durante um deslocamento dx é equivalente à variação de
energia desse corpo dento do mesmo espaço de deslocamento.

Analisando a equação (3.24) percebemos que se a energia cinética K


aumenta, indo de i → f, ou seja, ∆K > 0, então o trabalho será positivo. Caso
a energia cinética diminuir durante o percurso, ∆K < 0, então o trabalho será
negativo. O teorema trabalho-energia nos mostra que assim como é necessária
uma força para alterar o estado de movimento de um corpo, o trabalho realizado
ao se realizar essa alteração é proporcional à diferença de energia cinética
d
associada às mudanças no vetor velocidade, ou seja, à aceleração a = v.
dt

153
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA

DICAS

Sugerimos a leitura do artigo intitulado A história da evolução do conceito


físico de energia como subsídio para o seu ensino e aprendizagem – parte II (GOMES, 2015).
Disponível em: <https://goo.gl/NqXPM6>, como fonte para um entendimento mais elaborado
sobre a evolução do conceito físico de energia. Nesse trabalho, o autor arremata a tarefa
iniciada na parte I, citada anteriormente, de discutir a evolução gradual de nossa definição
para o conceito de energia. As visões de cientistas como Julius von Mayer, James Joule,
William Thomson (Lord Kalvin) e Sadi Carnot são debatidas e sua leitura pode fomentar a
criatividade do leitor, com boas sugestões de abordagem do tema.

3.2 POTÊNCIA
A potência é um conceito interessante que relaciona a energia despendida
em um evento com o tempo que tal evento levou para acontecer. A potência é a
taxa temporal com que a energia é despendida em um determinado evento. Por se
tratar de uma taxa de variação, podemos defini-la em termos da razão entre duas
variações do tipo ∆, como pode ser visto a seguir, na equação de número (3.25:

∆E (3.25)
P= .
∆t

Quanto mais energia um evento ou objeto conseguir despender, e


quanto mais rápido fizer isso, mais potência terá. Vamos considerar dois objetos
extremos, em termos de potência. Imagine que você precisa construir um túnel
que atravessa uma montanha e, para tal, precisa cavar através da rocha. Você
pode escolher entre dois métodos para isso: um deles é o uso de dinamite, rápido,
instantâneo; o outro método é uma técnica mais antiquada, você contrata pessoas
para realizar a tarefa com pás e picaretas. Faz sentido considerar que a quantidade
de energia gasta nos dois métodos seja a mesma, mas o tempo para que isso
aconteça será bem diferente. Potência é isso, é a diferença entre despender a
mesma quantidade de energia, levando tempos diferentes.

d ∆E
P
= = E lim . (3.26)
dt ∆t → 0 ∆t

Como você já percebeu, a potência é uma taxa de variação e tem a unidade


[P ] = J/s=W. A unidade W é o Watt e não deve ser confundida com o trabalho W,
ela foi concedida à potência em homenagem ao engenheiro escocês James Watt
(1736-1819), retratado no lado (a) da Figura (6) pelo pintor sueco Carl Frederik
von Breda (1759-1818). Watt nasceu no ano de 1736, em Greenock, Escócia. Filho
de um carpinteiro autodidata, teve uma infância difícil devido a condições de
saúde fastidiosa, gostava de matemática.
154
TÓPICO 1 | ENERGIA MECÂNICA, CONSERVAÇÃO DA ENERGIA MECÂNICA E TRABALHO

FIGURA 6 – (A) JAMES WATT, DE CARL FREDERIK VON BREDA, 1791; (B) DIAGRAMA DO
MOTOR A VAPOR DE NEWCOMEN

(a) (b)
FONTE: Disponíveis em: <goo.gl/aBcmEm>; <goo.gl/nDztoZ>. Acesso em: 23 mar. 2018.

Watt atingiu a idade adulta na era da primeira Revolução Industrial,


iniciada em 1760 e morreu antes desse período de fortes modificações nos processos
industriais terminar entre os anos de 1820 a 1840. Portanto, foi um período muito
favorável ao talento e às ambições do jovem engenheiro. Os motores a vapor
estavam em voga na época e Watt se envolveu com o aperfeiçoamento de um
deles, o famoso motor a vapor de Newcomen. Thomas Newcomen (1664-1729) foi
o talentoso inventor inglês do primeiro motor atmosférico a vapor funcional, em
1713. O motor funcionava condensando vapor em um cilindro, criando um vácuo,
diminuindo a resistência à ação da pressão atmosférica, que forçava um pistão
dentro do cilindro. Esse era o princípio básico do primeiro motor capaz de realizar
trabalho mecanizado, muito útil para bombear água de minas, o que fortaleceu
muito a economia britânica. Um diagrama para tal máquina é apresentado no
lado (b) da Figura (6). A fama de Watt veio de uma melhora no aproveitamento
energético do equipamento, tornando a queima do combustível mais eficiente. Por
esse avanço na engenharia das máquinas, que impulsionou a economia britânica e
mundial, Watt foi homenageado com a unidade para a potência.

Voltando à definição de potência P, perceba que ela tem uma função


bastante interessante, principalmente nos campos da engenharia. A potência
indica o quão rápido algum trabalho pode ser realizado, considerando-se a
mesma quantidade de energia despendida, uma vez que possamos controlar o
tempo que ele pode ser realizado. Esse processo de transformação da energia,
de e para diferentes formas será tratado mais adiante. Mais adiante quando
tratarmos de processos de transformação de energia, discutiremos que tipos de
forças são capazes de interferir nos processos de conversão de energia e que tipos
de energias estarão envolvidas.
155
RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico, você aprendeu:

• Acerca do conceito de energia mecânica, evidenciamos o papel e a importância


de James Prescott Joule para o desenvolvimento da teoria de conservação de
energia mecânica, focando em sua experiência que demonstrou o equivalente
mecânico para o calor.

• Joule contribuiu para o entendimento da energia como uma propriedade que


pode tomar muitas formas, inclusive a potencial e a cinética, cuja soma define
a energia mecânica de um sistema.

• Há um conceito, chamado trabalho, associado ao deslocamento de um corpo


quando submetido à aplicação de uma força.

• Acerca do trabalho realizado por uma força, e para isso abordamos um sistema
massa-mola, entendemos o potencial reparador que a constante da mola oferece
ao problema.

• A respeito do trabalho total envolvido em um sistema massa-mola sem atrito,


sua nulidade faz completo sentido, uma vez que possamos negligenciar perdas
de energia.

• O sistema massa-mola é muito interessante para o entendimento das forças


conservativas.

• O teorema trabalho-energia relaciona o trabalho realizado por uma força, ao


alterar o estado de movimento de um corpo à diferença entre os valores da
energia cinética desse corpo, antes e depois de seu vetor velocidade ter sido
alterado.

• O conceito de potência e como ela relaciona o trabalho realizado em um sistema


ao intervalo de tempo necessário para realizá-lo.

• James Watt, um dos pesquisadores mais importantes do período da Revolução


Industrial, ficou famoso por suas contribuições à engenharia de motores a
vapor e pelo seu aperfeiçoamento do motor de Thomas Newcomen.

156
AUTOATIVIDADE

1 O trabalho do físico inglês James Joule foi fundamental para o melhor


entendimento da natureza física da grandeza que conhecemos como
energia. Seu experimento com os pesos evidenciou uma correspondência
fundamental nesse campo. Recordando nossa discussão anterior, a respeito
da biografia de Joule, considere as seguintes afirmações e classifique-as
como verdadeiras (V) ou falsas (F):

a) ( ) Destacou-se pelo estudo do calor. 



b) ( ) Mostrou que o calor é uma forma de energia. 

c) ( ) Dá nome à unidade para a potência. 

d) ( ) Definiu uma relação entre as unidades do obsoleto calórico e da nova
teoria de energia. 

e) ( ) Contribuiu em um trabalho com Lord Kelvin para o desenvolvimento
de uma escala térmica.

2 Considere uma esfera metálica sólida, deixada cair do alto de uma sacada,
com altura h = 20 m. Considerando a queda livre e valendo-se do princípio
de conservação de energia mecânica, calcule a velocidade com que a esfera
atinge o solo. 


3 Imagine que um martelo atinge a cabeça de um prego de 10 cm com uma


força de intensidade F = 150 N, o que faz o prego penetrar 80% de seu
comprimento. Qual é o trabalho realizado pelo martelo sobre o prego? 


4 Considere uma força do tipo → F = (150 î + 100 ĵ - 250 k)^ N atuando em um


corpo no espaço. Ela desloca o corpo da posição r→ ^
i = (10 î + 6 ĵ + 15 k) m para
a posição → ^ m. Calcule o trabalho realizado.
ri = (-20 î + 10 ĵ - 32 k)

5 Sabendo que um sistema massa-mola ideal foi montado em um suporte


e que a mola é comprimida em 10 cm por uma força de 80 N, calcule a
constante κ da mola. 


6 A obra de James Joule não se limitava apenas à descrição do calor dos corpos,
se aplica a outras formas de energias, em sistemas distintos. Recordando
nossa discussão anterior, a respeito da biografia de Joule, considere as
seguintes afirmações e classifique-as como verdadeiras (V) ou falsas (F):

a) ( ) Em um sistema massa-mola ideal o trabalho total realizado pela e


sobre a mola.
b) ( ) A força de atrito pode ser considerada conservativa.

c) ( ) A força reparadora da mola atua no sentido oposto ao do deslocamento
da massa.


157
d) ( ) O princípio de conservação da energia mecânica se torna inválido em
sistemas não conservativos.
e) ( ) Em um sistema massa-mola a força reparadora mantém a direção e o
sentido do deslocamento da massa. 


7 Considere que uma empresa prepara a explosão de um trecho de montanha


com a intenção de fazer passar por ali uma rodovia. A quantidade de energia
liberada foi de E = 4,184 × 10⁹ J, e a explosão levou apenas ∆t = 1 ms. Calcule
a potência da explosão. 


158
UNIDADE 3
TÓPICO 2

CONSERVAÇÃO DE ENERGIA

1 INTRODUÇÃO
Você já percebeu que o conceito de conservação de energia foi crucial para
o desenvolvimento da física, com ele podemos prever o que acontece em um
sistema definido. Com ele foi possível fazer avançar o desenvolvimento científico
e tecnológico do período entre o fim do século XIX e o começo do século XX.
Nesse tópico vamos tratar dos diferentes cenários nos quais forças podem atuar e
interferir na conservação de energia.

Falaremos das forças conservativas, responsáveis pela geração de


trabalho em sistemas conservativos, que não dissipam energia. Veremos que em
tais sistemas o trabalho é uma função apenas das posições inicial e final, sendo
independente do trajeto realizado. Então discutiremos sistemas conservativos e a
conservação da energia mecânica de tais sistemas.

Por fim vamos debater as forças não conservativas, responsáveis pela


dissipação de energia em sistemas não conservativos. Trataremos aqui das forças
resistivas, de atrito, de arrasto, à frente nos casos de perdas energéticas.

2 FORÇAS CONSERVATIVAS
Para discutir a importância da força para a conservação de energia de
sistemas fechados, aqueles definidos claramente e que não sofrem interferência
do ambiente, vamos rever o conceito de força. Considere a Figura 7, nela vemos
a obra do pintor holandês Johannes Vermeer (1632-1675), intitulada Senhora
escrevendo carta com sua criada, de 1670, hoje exposta na National Gallery of
Ireland, em Dublin, Irlanda.

159
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA

FIGURA 7 – SENHORA ESCREVENDO UMA CARTA COM SUA


CRIADA, DE JOHANNES VERMEER, 1670

FONTE: Disponível em: <goo.gl/dtiRFH>. Acesso em: 23 mar. 2018.

Podemos observar uma criada que aguarda sua senhora escrever uma
carta, um pouco distraída, aparentemente contemplando o mundo pela janela.
Vemos também alguns objetos, talvez uma vela e um pedaço de papel, ou um
livro, em frente à mesa, caídos ao chão.


Pensando na queda desses objetos e imaginando que ambos se
encontravam inicialmente sobre a mesa e então caíram ao chão, talvez por causa
do vento ou alguma instabilidade da mesa, vamos discutir o trabalho realizado
pela força peso → → durante toda a altura h = yf - yi que separa o chão e o
P = -mg,
tampo da mesa. Observe o diagrama de forças à esquerda, na Figura 8:

→ →
FIGURA 8 – DIAGRAMA DE CORPO LIVRE (A), TRABALHO REALIZADO PELA FORÇA
PESO P. (B) TRABALHO REALIZADO PELA FORÇA F

(a) (b)
FONTE: Adaptado de: <goo.gl/dtiRFH>. Acesso em: 23 mar. 2018.

160
TÓPICO 2 | CONSERVAÇÃO DE ENERGIA

O interessante aqui é a discussão a respeito da queda e como, ou por quais


trajetos, d1 (linha sólida) ou d2 (linha pontilhada) o material poderia ter caído
ao chão. Faz alguma diferença, em termos do trabalho realizado pelo peso, se o
papel caiu diretamente ao solo, pelo percurso mais curto d1 ou se foi planando,
em zigue-zague, pelo percurso d2?

Observe que durante todo o tempo a força peso P, aponta verticalmente
para baixo, logo o trabalho realizado pela força gravitacional aqui tem a forma:

yf
→ →
WP = ∫ P . dy ;

 (3.27)
yi
y

= − mg ∫dy ;
yi
y
= −  mgy  y f ;
i

= − mg ∆y ;
= − mgh.


O que vemos na equação (3.28) é que o trabalho realizado pela força
peso P é completamente independente do percurso que a folha realiza ao cair,
ele depende apenas das posições iniciais yi e finais yf, ou mais precisamente da
diferença entre essas posições. Ou seja, se yf > yi então WP < 0, se yf < yi então
WP > 0 e se yf = yi então WP = 0. Isso responde a nossa pergunta anterior com um
retumbante "não". Não faz diferença, em termos do trabalho realizado pela força
peso, se o papel cai ao chão através do percurso mais curto d1 ou se ele paira
lentamente, realizando voltas no ar, como no percurso d3. O trabalho realizado
pela força peso não dependerá do trajeto realizado.

Esse é essencialmente o conceito



de uma força conservativa, sempre que
o trabalho realizado por uma força F for independente do percurso descrito pelo
objeto, sobre o qual se aplica a força, mas depender apenas dos pontos inicial A
e final B, diremos que essa é uma força conservativa. Suponha então que agora a
criada apanhe a vela e os papéis caídos ao chão e os retorne a sua posição inicial
→ →
yi, sobre a mesa. Para isso, ela aplica uma força resultante proporcional Fc= mg ao
peso desses objetos. O trabalho realizado pela criada terá então, a forma:
yf


W = ∫ Fc dy ;

 (3.28)
Fc
yi
y

= mg ∫dy ;
yi
y
=  mgy  y f ;
i

= mg ∆y ;
= mgh.

161
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA

Aqui, o sinal do trabalho inverte em relação à ∆y, ou seja, se yf > yi então,


WF→ > 0 se yf < yi então WF→ < 0 e se yf = yi então WF→ = 0 . Considerando a soma
c c
dos trabalhos realizados, tanto pela força peso durante a queda das folhas, quanto
c

pela força realizada pela criada ao erguê-las, teremos:

= WP→ + WF→ ;
Wtotal (3.29)
0.
− mgh + mgh =
=

Isso significa que, em um percurso fechado yi → yf → yi, o trabalho total


Wtotal é nulo, o que implica que WP→ = WF→ . Esse é um conceito muito importante
na Física, ele nos permite conceber que a mesma quantidade de energia necessária
c

para mover um objeto, em um circuito fechado, de um ponto inicial até um


ponto final, é igual àquela necessária para trazê-lo de volta ao ponto inicial. A
nulidade do trabalho total realizado nesse circuito demonstra a conservação das
energias envolvidas, daí o nome "Forças conservativas", pois as forças envolvidas
conservam e não desperdiçam energia, transformando parte dela em formas não
mecânicas e, portanto, não reutilizáveis, de energia.

As principais forças conservativas com as quais você manterá contato


nesse livro são a gravitacional, como vimos aqui, a elétrica e as forças elásticas,
como a restauradora do sistema massa-mola ideal. Um ponto importante que
devemos

manter em mente aqui é que o trabalho realizado tanto pela força peso

P quanto pela força da criada Fc , para levantar e recolocar o papel sobre a mesa,
é idêntico à energia potencial associada à altura h. Ou seja, podemos definir a
energia potencial associada a uma força como a soma integral do produto escalar
da força F pelo deslocamento dr→do objeto sobre o qual aplicamos a força, assim

→→
 
teremos, para uma força F ( r ) = Fxiˆ + Fyjˆ + Fzkˆ que causa um deslocamento
dr = dxiˆ + dyjˆ + dz kˆ :



rf
 → →
∫ ( r ) ⋅ dr ;

U total
= F (3.30)

ri
→
rf

= ∫  Fxiˆ + Fyjˆ + Fzkˆ  ⋅  dxiˆ + dyjˆ + dz kˆ  ;



ri
xf yf zf

= ∫ Fx dx + ∫ Fy dy + ∫ Fz dz ;
xi yi zi

= U ( x) + U ( y ) + U ( z ).

Considerando o exemplo anterior, a energia potencial gravitacional Ug


pode ser associada ao trabalho realizado pela força peso →P; que derrubou a folha da
altura (h = yf m), uma vez que consideramos (yi = 0) até a altura (h = yi = 0 m), ou ao
trabalho realizado pela força →Fc, que a criada aplica à folha para levá-la da altura

162
TÓPICO 2 | CONSERVAÇÃO DE ENERGIA

(h = yi = 0 m) até (h = yf m). Assim, a energia potencial gravitacional Ug = mgh


dependerá apenas da massa m do objeto, da altura h em que ele se encontra, em
relação a uma origem referencial preestabelecida e da aceleração da gravidade.
É claro que, se considerarmos a discussão anterior, a respeito da aceleração da
gravidade e de como ela pode variar com a altura h, ela se tornará também uma
variável. Entretanto, se pudermos considerar que as alturas associadas à energia
potencial gravitacional Ug se encontram dentro de uma margem em que não
há significativas variações em g, então a aceleração da gravidade poderá ser
considerada constante. No espaço tridimensional, a energia potencial total de
uma partícula é dada pela soma das energias potenciais em cada uma das direções
nas quais o objeto se move sob a ação de uma força →F por um deslocamento dr.→

3 CONSERVAÇÃO DA ENERGIA MECÂNICA


Vimos que a ideia da conservação da energia mecânica nasceu da relação
formada em um sistema em que um objeto se encontra inicialmente na eminência
de entrar em movimento, apresentando, portanto, uma energia potencial U, e
passa então a entrar em movimento, apresentando uma energia cinética K. Porém
a ideia de conservação da energia mecânica se restringe a sistemas em que perdas
energéticas, por atrito, aquecimento, sons, podem ser negligenciadas. Vamos
conhecer agora como funciona um sistema conservativo.

Um bom exemplo que podemos apresentar aqui é o de um bate-estacas,


que realiza o trabalho de estaqueamento de vigas de sustentação para as fundações
de um prédio. É um objeto massivo e bastante denso, amarrado a um cabo de
aço e alçado a uma determinada altura e que cai, em queda livre, sobre a estaca,
afundando-a lentamente no solo. Podemos supor que muito pouco da energia
potencial gravitacional do objeto é perdido, quando este cai, a partir do repouso
e acerta a estaca com energia cinética equivalente à queda.

Outro bom exemplo para nossas considerações é a do esqueitista que


desce uma rampa em "U". Inicialmente ele se encontrará com energia potencial
gravitacional proporcional à altura da rampa, porém quando este desce até a parte
plana da rampa, se encontrará apenas com energia cinética, não mais potencial
gravitacional. Essa transformação de energia de uma forma para outra ocorre
gradualmente.

Quando podemos eliminar os efeitos dissipativos em nosso sistema,


entramos no reino da conservação de energia. Uma vez que não admitimos
perdas energéticas, somos forçados ao conceito de conservação de energia. Repare
atentamente que quando falamos em dissipação de energia, não estamos supondo
que uma porção da energia do sistema desapareça, ela apenas se transforma em
formas menos recuperáveis e aproveitáveis de energia.

163
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA

Uma vez que estabelecemos que a conservação implica sistemas


idealizados, sem perdas energéticas e que há uma relação muito próxima entre
forças e energia, vamos focar inicialmente no conceito de forças conservativas,
estas associadas aos sistemas conservativos que pretendemos descrever, em
oposição às forças dissipativas.

4 FORÇAS NÃO CONSERVATIVAS


Falamos anteriormente sobre o conceito de forças conservativas e como
o trabalho gerado por elas é independente do percurso assumido pelo objeto
sobre o qual elas atuam, o que pode ser visto nas equações (3.28) e (3.29). Falamos
também sobre como elas conservam, com o perdão da redundância, o trabalho
em um circuito fechado, o que pode ser verificado com a equação (3.30).

Vamos agora tratar das forças ditas não conservativas e você já pode
imaginar que as forças desse tipo contradizem os dois enunciados citados
anteriormente, ou seja, o trabalho realizado por elas depende do percurso
realizado, e o trabalho total realizado, dentro de um circuito fechado, não se
conserva.

Considerando, por exemplo, as forças de atrito, é de se concluir óbvia a


dependência delas com o trajeto percorrido pelo corpo, sobre o qual uma força
resistiva ao movimento atua. Quando tratamos anteriormente desse tipo de força,
vimos que ela pode ser escrita em termos da força normal N →e do coeficiente de
atrito, como visto a seguir:
→ 

Fat = µ N ; (3.31)

Imagine que você move um pesado guarda-roupa de um lado para outro


do quarto. A todo momento, enquanto o móvel se encontra em movimento e
em contato com o solo, ele estará dissipando, sob forma de calor, ruído ou até
danificando o móvel, parte da energia que você disponibilizou para movê-lo.
Ou seja, a força de atrito realiza trabalho, porém a energia relacionada a esse
trabalho não é aplicada para mover o guarda-roupa. Esse trabalho da força de
atrito é uma quantidade de energia, dissipada em formas não recuperáveis e não
conserváveis. Como a energia térmica, sonora ou mesmo de deformação plástica
do próprio móvel não pode ser resgatada, não podemos contabilizá-la para a
conservação mecânica.

164
TÓPICO 2 | CONSERVAÇÃO DE ENERGIA

DICAS

Sobre esse tópico de conservação e dissipação de energias, gostaríamos de


sugerir a leitura do trabalho intitulado: “Esfera em Plano Inclinado: Conservação da Energia
Mecânica e Força de Atrito”. Disponível em: <https://bit.ly/2rFYyXD> (SILVA, et al. 2003). Nele,
os autores propõem um dispositivo para a realização de um experimento sobre conservação
de energia. Eles sugerem o uso de uma esfera e um plano inclinado para o estudo da energia
mecânica do sistema, em diferentes ângulos de inclinação. É um trabalho interessante, pois
envolve o controle de todo o aparato, a medição dos tempos e as imprecisões que podem
ser geradas e devem ser tratadas. Além disso é um bom exercício de recapitulação de alguns
dos conceitos estudados até aqui.

DICAS

Para um maior entendimento sobre como é difundido o entendimento de


estudantes a respeito do conceito de energia, sugerimos a leitura do trabalho intitulado “O
entendimento dos estudantes sobre energia no início do ensino médio”. Disponível em:
<https://goo.gl/uojih1> (Barbosa, Borges 2006). Nele, os autores discutem a evolução do
conceito de energia, com um resgate de concepções sobre o tema e sugestões de abordagens
para o ensino-aprendizado. Os autores trabalham ainda com as diversas concepções a
que o conceito de energia está associado atualmente, e com o problema da conservação
de energia. É uma leitura bastante interessante, com abordagens sobre o tema a partir de
diferentes ângulos.

165
RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• O conceito de conservação de energia está associado não só ao movimento,


mas também a ao calor, à queda dos corpos e ao atrito.

• Os efeitos causados por forças conservativas em um sistema isolado,


principalmente em termos dos trabalhos e do trabalho total realizado por tais
forças é o de conservar a energia dos sistemas.

• Em um circuito fechado, o trabalho realizado por forças conservativas é nulo,


o que implica o princípio de conservação da energia mecânica.

• O conceito de energia mecânica está ligado à energia cinética e à energia


potencial de um corpo em um sistema e que sua conservação depende de
nossa capacidade de isolar ou considerar isolado um sistema qualquer. Além
disso, também é possível considerar conservativo um sistema cujas perdas
energéticas, seja por atrito ou outra forma qualquer, possam ser negligenciadas.

• Forças não conservativas são aquelas que dissipam a energia dos sistemas, seja
por atrito, ou arrasto, ou ruído, ou deformação plástica.

• A impossibilidade de recuperação do trabalho realizado por forças não


conservativas é o marco definidor para o termo dissipação.

166
AUTOATIVIDADE

1 A respeito da conservação de energia, considere as seguintes afirmações e


classifique-as como verdadeiras (V) ou falsas (F):

a) ( ) A conservação da energia mecânica envolve a soma de termos potenciais


e cinéticos. 

b) ( ) O atrito de superfícies gera calor, conservando assim a energia mecânica
de um sistema. 

c) ( ) A conservação de energia mecânica faz referência a forças conservativas
que atuam em circuitos fechados, ou seja, em que o trabalho total realizado
entre dois pontos, independentemente do trajeto que os conecta, é nulo.
d) ( ) Todas as forças conservam a energia mecânica de um sistema. 

e) ( ) O princípio de conservação da energia mecânica emerge da observação
de um sistema não dissipativo, em que as energias potenciais e cinéticas
envolvidas podem ser recuperadas. 


2 Considere uma esfera metálica, alçada à altura de h = 20 m. Sabendo que a


força que atua na esfera é o peso →P = mg, calcule a expressão analítica para
a energia potencial gravitacional da esfera. Calcule também quanta energia
potencial a esfera teria se sua massa fosse de m = 2 kg.

3 Sabendo que a energia potencial associada a uma força tem a forma


1
U ( x ) = − κ x 2 , calcule a expressão analítica para a força F(x) relacionada.
2
Calcule também qual deveria ser o valor de κ se uma força F (x) = 50 N
causar um deslocamento, a partir da origem, de ∆x = 10 cm.

4 A respeito das forças conservativas, considere as seguintes afirmações e


classifique-as como verdadeiras (V) ou falsas (F):

a) ( ) Forças não conservativas, quando atuantes em um circuito fechado,


geram um trabalho nulo sobre os corpos em que atuam. 

b) ( ) Forças conservativas, quando atuantes em um circuito fechado, geram
um trabalho nulo sobre os corpos em que atuam. 

c) ( ) O coeficiente de atrito estático μe pode ser entendido como a razão entre
a força de atrito que previne o movimento de um corpo e a força normal
entre tal corpo e a superfície sobre a qual ele está apoiado. 

d) ( ) Sistemas idealizados podem facilmente ser aplicados à realidade prática,
uma vez que é possível sempre eliminar todas as fontes de dissipação de
energia em qualquer sistema. 

e) ( ) O atrito é considerado uma força dissipativa de energia, uma vez que
não é possível recuperar o calor gerado pelo desgaste proveniente da fricção
entre duas superfícies. 


167
168
UNIDADE 3
TÓPICO 3

MOMENTO LINEAR, CONSERVAÇÃO DO MOMENTO


LINEAR E ESTUDO DAS COLISÕES

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico vamos explorar as aplicações para o princípio de conservação
de energia mecânica. Começaremos discutindo o momento linear de um objeto
em movimento, quantidade associada à inércia dos corpos o momento linear
ou quantidade de movimento, como também é conhecido, é uma grandeza
relacionada à interação entre corpos e sua conservação, antes e após uma colisão,
será escrutinada.

Mais adiante trataremos de um sistema de partículas discretamente


distribuídas, além do cálculo do centro de massa de tal sistema, o que também poderá
ser estendido ao entendimento dos sólidos com distribuição contínua de massa.

Lidaremos ainda com o conceito de impulso, relacionado ao tempo de


atuação de uma força de impulsão em um corpo. Introduziremos o conceito
matemático do delta de Dirac e analisaremos suas implicações.

Por fim trataremos das colisões entre os corpos, sendo elas elásticas,
totalmente elásticas ou inelásticas. Discutiremos a aplicabilidade dos conceitos
de conservação de momento e de energia mecânica, e discutiremos algumas
implicações derivadas da conservação de ambos.

2 MOMENTO LINEAR DE UM CORPO


O vetor momento linear p →de um corpo é definido como o produto da
massa m do corpo pelo vetor velocidade →
v que o corpo possui, ele tem a forma:


 →

p = mv ; (3.32)

d→ 
=m r
dt

Perceba como a definição do momento linear apresentada na primeira linha


da equação (3.32) relaciona as três grandezas físicas originais mais pertinentes
para nosso estudo sobre a natureza do movimento dos corpos no espaço, a massa

[m] = kg, a posição [r] = m e o tempo [t] = s. Quando pensamos no movimento

169
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA

como a taxa de variação temporal da posição de um corpo com uma determinada


massa, não se pode negar que o momento é a grandeza mais competente em
descrever o movimento dos corpos. Sua conservação implica a conservação do
movimento do corpo. É claro! Classicamente, não há corpos sem massa, logo um
corpo sem massa não pode estar em movimento, nem ter momento. O mesmo
ocorre para a velocidade, se a posição de um corpo não varia, em relação a um
determinado referencial, ele não se move, logo não pode ter momento.

O momento de um corpo linear, quando tratarmos de uma única direção,


está intimamente ligado ao conceito de inércia. Newton dizia que para alterar
o estado de movimento de um corpo é necessário aplicar sobre ele uma força.
Associamos no parágrafo anterior o momento de um corpo ao seu estado de
movimento. Isso significa que para criar uma variação no estado de movimento → p
→ para p→ , é equivalente a aplicarmos sobre esse corpo uma força
de um corpo de p
→ i f
F. Em termos matemáticos, podemos traduzir esse raciocínio da seguinte forma:

→ d → d → (3.33)
F =
= p  mv  ;
dt dt  
d→  → d
= m v + v m.
dt dt

Tecnicamente, você poderia argumentar que a variação da massa poderia



contribuir para a criação de uma força F, mas não é bem assim. Aplicamos a regra
da cadeia à primeira da linha da equação (3.33, mas massas não aparecem do
nada nos corpos em nosso mundo clássico. Isso não significa que não possamos
d
encontrar exemplos em que a variação m da massa de um corpo possa ser
dt
adotada. Em todas elas vamos interpretar essa contribuição como uma variação
no momento linear do corpo. Jatos comerciais, foguetes e carros no trânsito podem
representar exemplos em que a massa do corpo varia, nesses casos, porque o
combustível que move os artefatos está sendo consumido com o tempo.

O momento de um corpo está associado ao seu estado de movimento e


uma variação dele só pode ter sido criada pela ação de uma força. Temos aí uma
quantidade física muito relevante para o tratamento dos choques entre corpos, no
espaço. Estudaremos as colisões mais à frente, pois nada pode representar mais
claramente a variação do estado de movimento de um corpo do que um processo
de colisão espacial com outro corpo, de massa igual, ou não, a uma velocidade
igual, ou não.

170
TÓPICO 3 | MOMENTO LINEAR, CONSERVAÇÃO DO MOMENTO LINEAR E ESTUDO DAS COLISÕES

3 CONSERVAÇÃO DO MOMENTO LINEAR


Como discutimos anteriormente, o estado de movimento de um corpo
pode ser alterado por um choque com outro corpo. Um choque entre dois corpos
se trata de uma aplicação mútua de forças entre os corpos interagentes, e podemos
descrevê-la da seguinte forma:
d → → 
p1 = F1; 2 ; (3.34)
dt
d → →

p2 = F2 ;1 ;
dt

Em que a primeira linha representa a força F1;2 aplicada pela partícula 1


sobre a partícula 2 como a variação do momento da partícula 1. O mesmo ocorre
na segunda linha, para a partícula 2 em relação à partícula 1. Quando somamos
as forças envolvidas para encontrarmos uma força resultante total, temos:

→ 
→ 
→ (3.35)
= F1; 2 + F2 ;1 ;
Ftotal

d → d →  d →
= p1 + p2 = ptotal
dt dt dt

Entretanto, esse momento total de um sistema formado por n partículas


se mantém constante. Isso faz sentido se você pensar nesses choques como uma
troca de momentos entre as partículas que compõem o sistema, um pouco a cada
choque. Se uma delas apenas perde velocidade, reduzindo a sua quantidade
de movimento, a outra ganha velocidade, aumentando a sua quantidade de

movimento. O momento → ptot em um sistema de n partícula será dado por:

n n

→ 
→ 

ptot
=
= 1= 1

β
=pβ ∑mβ vβ ;
β
(3.36)

Essa é uma quantidade muito interessante, que diz que o somatório total
dos momentos, antes e depois de um choque será o mesmo, sempre. Isso fica
claro com a equação (3.37). Considere um sistema formado por duas partículas 1
e 2, que se aproximam e se chocam no espaço, a conservação do momento linear
desse sistema terá a forma:

 →

(3.37)
ptot ;i = ptot ; f ;

 →
 →
 →

p1;i + p2 ;i = p1; f + p2 ; f ;

 → → →
m1v1;i + m2 v2 ;i = m1v1; f + m2 v2 ; f ;

m1v1;i + m2 v2 ;i = m1v1; f + m2 v2 ; f ;

171
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA

A equação (3.37 nos mostra que não importa o que aconteça ao sistema, a
soma dos momentos de todas as massas envolvidas se manterá constante. Você
pode fazer considerações como transferência de massa no choque entre duas
pedras, por exemplo, ou levar em conta o momento de um novo pedaço, gerado
pela quebra de uma das pedras. Mais adiante, trataremos das colisões de corpos.

4 SISTEMA DE PARTÍCULAS E CENTRO DE MASSA


Observe a Figura 9, ela apresenta uma composição tridimensional, com
12 corpos de massa mi,i = 1,...,13., dispostos pelo espaço. Cada um deles ocupa
uma posição equidistante da origem do sistema, localizada no centro da imagem.
Queremos discutir aqui o conceito de centro de massa, por isso, não apenas
concederemos massa aos 12 corpos, mas também definiremos para cada um deles
uma posição nesse espaço, medido em metros.

Perceba que cada um dos corpos ocupa uma posição (x,y,z) respectiva no
espaço e que há vetores que conectam os pontos numerados à origem do sistema.
Note que os vetores de linha sólida (cor preta) 1,4,7,10 apontam para baixo e
ocupam posições cujas alturas são → z = -1.0 m em relação à origem. Os vetores
tracejados (de cor azul) 2,5,8,11 estão todos pousados no plano xy, uma vez que
para eles →
z = 0 m. Já os vetores cujas linhas têm pontos e traços (de cor vermelha)
3,6,9,12 estão no alto da descrição, em →z = 1.0 m.

FIGURA 9 – SISTEMA DE PARTÍCULAS E CENTRO DE MASSA (3D)

FONTE: O autor

É importante levar isso em conta, uma vez que, equidistantes à origem, o


módulo de todos tem a forma:

→
r = ri 2; x + ri 2; y + ri 2; z ; i =1,… ,12; (3.38)

= Mod
= 3.

172
TÓPICO 3 | MOMENTO LINEAR, CONSERVAÇÃO DO MOMENTO LINEAR E ESTUDO DAS COLISÕES

Não há nada de novo até aqui e você já conhece a definição de módulo


de um vetor. Mas a razão pela qual temos algo interessante nas mãos é a forma
que essa disposição tem, ela é uma esfera. Em uma esfera, todos os pontos em
sua superfície são equidistantes ao centro da esfera. O módulo Mod desempenha
aqui o mesmo papel que o raio da esfera executa nas coordenadas polares. O
motivo de não termos escolhido esse sistema de coordenadas é para enfatizar
no sistema cartesiano, mais familiar, o caráter espacial do conceito de centro de
massa. Observe a seguir, no Quadro 1, como os pontos situados no plano → z=0
apresentam uma compensação ∆ nas dimensões → →
x e y:

QUADRO 1 – POSIÇÕES DE i CORPOS DE MASSA mi NO SISTEMA DE PARTÍCULAS DA



FIGURA 9 ri


xi , yi , zi ri xi , yi , zi
1 (1.0 ,1.0 ,1.0 ) 7 ( −1.0 , −1.0 , −1.0)
2 (1.0 + ∆ ,1.0 + ∆ , 0.0) 8 (1.0 − ∆ , −1.0 − ∆ , 0.0)
3 ( 1.0 ,1.0 , 0.0 ) 9 ( −1.0 , −1.0 ,1.0)
4 (−1.0 ,1.0 , −1.0 ) 10 (1.0 , −1.0 , −1.0)
5 (1.0 − ∆ ,1.0 + ∆ , 0.0) 11 (1.0 + ∆ , −1.0 − ∆ , 0.0)
6 (−1.0 ,1.0 ,1.0) 12 (1.0 , −1.0 ,1.0)
FONTE: O autor

Essa compensação decorre do efeito trigonométrico em z = 0. Como há


uma dimensão a menos a ser calculada na equação (3.38 é preciso que → x = ±1.0±∆ e
y = ±1.0±∆ equilibrem o módulo |r→i| no plano xy. Isso fica bastante claro quando
observamos a Figura (10), que apresenta a projeção (2D) da disposição (3.9)
naquele plano.

Note como os vetores 2,5,8,11 são mais longos que os demais. Caso você
tenha o interesse de calcular posições intermediárias àquelas dos corpos discutidos
aqui, perceberá que, partindo do equador, até os polos, à medida que se afasta do
plano xy, os novos vetores terão ostensivamente alteradas suas compensações ∆.
É claro, que a condição do módulo |r→i| = Mod seja respeitada.

173
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA

FIGURA 10 – SISTEMA DE PARTÍCULAS E CENTRO DE MASSA (2D)

FONTE: O autor

Afinal, como se define a correção ∆ dos vetores 2,5,8,11? Para isso, você
deve imaginar que esses vetores devem possuir um módulo idêntico ao de todos
os outros, como visto na Figura (10):

→
=r 3 ; i 2 , 5, 8,11;
= (3.39)

(r (
− ∆ ) + ry − ∆ )
2 2
= x
0
+= 3;

Mod − 2
∆= ;
2

3− 2
= .
2

Definido o conceito de sistema de partículas, vamos passar para o segundo


tema de discussão desta seção. O conceito de centro de massa é importante por uma
razão estética. Quando estudamos posição, velocidade, força, sempre pensamos
em vetores associados a essas grandezas, principalmente porque elas são, de fato,
grandezas vetoriais. Mas onde se aplicam esses vetores? O que significa dizer que
um corpo se move com um vetor velocidade v?

O centro de massa é a posição onde tudo acontece na Física. É nele onde


imaginamos a ação da força que move um corpo ou da velocidade com que ele se
move. É para o centro de massa que o vetor posição de um corpo no espaço aponta,
quando o desenhamos no papel. De fato, há dois centros importantes em um
corpo, o de massa e o de gravidade, que coincidem em um campo gravitacional
uniforme, como aquele sobre a superfície da Terra. O centro de gravidade é o
ponto no corpo onde age a força gravitacional.

174
TÓPICO 3 | MOMENTO LINEAR, CONSERVAÇÃO DO MOMENTO LINEAR E ESTUDO DAS COLISÕES

O centro de massa de um sistema de partículas é definido como a média


das posições →
ri de cada partícula, ponderada pelas massas mi de cada uma delas,
e pode ser escrito como:


→ 1 n→ 
Mn ∑
rCM = ri mi (3.40)
i =1

em que Mn = ∑ n mi define a massa total do sistema. Como estamos


i =1
considerando que todas as partículas possuem a mesma massa, ou seja, m₁= m₂=
⋯ = m12, o centro de massa → r CM está posicionado na origem do sistema de
referências.

Observe por um momento a Figura 11, ela apresenta um instante posterior


àquele da Figura 10. Aqui, todos os corpos se moveram em meio metro em cada
uma das direções, ou seja, rx; depois = rx; antes + 0,5 m, ry; depois = ry; antes +
0,5 m e rz; depois = rz; antes + 0,5 m. Note que as posições originais e do centro
de massa são agora apresentadas em cinza, embora ainda guardem as mesmas
tipificações para as linhas. Em cores e repetindo o mesmo padrão de linhas para
o caso anterior, temos a nova posição do centro de massa→ r CM; depois. A ideia é
que o centro de massa se deslocou por causa do deslocamento de cada partícula.
Perceba que, embora a posição do centro de massa tenha sido alterada no espaço,
ela não se altera em relação à disposição do sistema de partículas. A configuração
continua a mesma, porém sofreu uma translação global.

FIGURA 11 – SISTEMA DE PARTÍCULAS E CENTRO DE MASSA (3D), UM INSTANTE


DEPOIS

FONTE: O autor

Considerando o intervalo de tempo dt que o centro de massa levou para


realizar o trajeto, podemos calcular a velocidade→
vCM:
n

 1 → →

=vCM
Mn ∑(r
i =1
i ; depois
mi − ri ; antes mi ) (3.41)

175
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA

No limite ∆t → dt de um intervalo infinitesimal de tempo, teremos:



 →


 1 n ( ri ; depois mi − ri ; antes mi ) d →
=vCM = ∑
M n i =1
lim
∆t → 0 ∆t dt
rCM . (3.42)

Da mesma forma, se a velocidade →v CM com que o centro de massa se


alterar com o tempo, teremos uma aceleração→a CM do mesmo centro de massa:


 →

(vi ; depois mi − vi ; antes mi )

→ 1 n (3.43)
Mn ∑
aCM = lim .
i =1
∆t → 0 ∆t

No limite ∆t → dt de um intervalo infinitesimal de tempo, teremos também:


 

 1 n (→
vi ; depois mi − →
vi ; antes mi ) d →
=aCM = ∑
M n i =1
lim
∆t → 0 ∆t dt
vCM (3.44)

Todas as expressões apresentadas anteriormente, dão base para o


procedimento aplicado nos diagramas de corpo livre que você aprendeu ainda
na escola. Uma vez que possamos considerar que um corpo sólido extenso
é composto por um arranjo atômico que não se altera com o tempo, podemos
considerar que forças aplicadas a tal arranjo podem ser concentradas no centro
de massa do corpo mencionado. Porém, uma vez que tal arranjo se desfaça, ou
seja, no momento em que as partículas que compõem um corpo extenso, ou um
sistema de partículas, se separam, desfazendo o arranjo inicial, o centro de massa
terá também sua posição alterada. Esse raciocínio é fundamental para entender
problemas que vão do estudo de partículas nos aceleradores, passando pela
colisão entre dois veículos até a explosão de uma estrela distante, observada pelos
satélites espaciais.

Não apenas a alteração das posições das partículas que compõem o sistema
pode alterar a posição do centro de massa de um sistema de partículas, a variação
da massa também pode causar tal efeito. Considere novamente a equação (3.40):


→ 1 n→ 
Mn ∑
rCM = ri mi (3.45)
i =1

É possível perceber, claramente, que o vetor posição do centro de massa


r CM é uma média das posições r→
→ i de cada partícula, ponderada pela massa mi
de cada uma delas. As Figuras 9 e 11 apresentam dois sistemas de partículas de
mesma massa m1 = m2 = • • • = m, igualmente distanciadas da origem do sistema,
que coincide com a posição do centro de massa. Bastaria apenas que a massa de
uma das partículas fosse diferente daquela compartilhada por todas as outras
para deslocar a posição do centro de massa.

176
TÓPICO 3 | MOMENTO LINEAR, CONSERVAÇÃO DO MOMENTO LINEAR E ESTUDO DAS COLISÕES

Colisões são eventos corriqueiros em nossa vida cotidiana, lidamos com


elas todos os dias, seja quando nos chocamos com transeuntes em uma calçada
movimentada ou quando nos divertimos durante um jogo de sinuca. Com isso
em mente, vamos aqui estudar como essas colisões se dão entre corpos em
movimento relativo. Colisões ocorrem quando dois ou mais corpos entram em
contato físico direto, e exercem força uns sobre os outros, por um determinado
período de tempo. Nesse intervalo, a ação dessas forças impulsiona os diferentes
corpos em determinadas direções, dependendo da direção e sentido dos
momentos relacionados. A seguir, estudaremos o impulso associado às forças
existentes nessas colisões.

5 FORÇA E IMPULSO
Para estudar o impulso de uma força, devemos levar em conta o tempo
de atuação dessa força sobre um corpo. Para isso, vamos considerar a expressão:

I= F ∆t . (3.46)

Ela descreve o impulso como o produto entre a força F e a variação de tempo


∆t em que essa força é aplicada. Em termos gráficos, o impulso representa uma
área formada pela força aplicada e pelo tempo transcorrido. Se considerarmos uma
força dependente do tempo, podemos descrever o impulso como a soma integral
=
do produto da função força dentro do intervalo infinitesimal dt lim ∆t = lim tf −ti ,
∆t → 0 tf →t i
isso significa que o impulso é a área entre a função força F(t) e ∆tf →ti ∆tf →ti o eixo
t, dado a seguir:
tf

I = ∫ F ( t ) dt (3.47)
ti

Vetorialmente falando e considerando a Segunda Lei de Newton, podemos


ainda reescrever a força →
d →

F como a taxa de variação temporal do momento p,
como mostrado a seguir: dt


→ →

F ( t ) = ma ; (3.48)
d d 
=m x ;
dt  dt 
d 
= m v;
dt
d 
= p.
dt

177
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA

Voltando à equação (3.48), podemos reescrever o impulso em termos da


taxa de variação do momento linear →
p, o que nos deixa com:

I = ∫ tf  →
 d  (3.49)
p dt ;
ti  dt 

= ∫ tf dp→;

ti
→
= ∆p.

A equação (3.49) pode ser interpretada como o impulso de uma força


aplicada a um corpo sendo igual à variação do momento linear Δp → do corpo, o
que implica que o impulso tem unidades [I] = kgm/s, como as do momento linear.
Isso parece bastante razoável, se considerarmos o conceito de momento linear
como a variação na velocidade, ou massa, de um corpo à medida que o tempo
passa. Perceba que, pela regra da cadeia, temos:

d → d →  (3.50)
dt
p =  mv ;
 dt 
d→  → d
= m v + v m.
dt dt

Normalmente, em nossos exemplos, negligenciamos a possibilidade de


uma variação temporal da massa, mas ela não é impossível em sistema reais, como o
lançamento de um foguete, em que o combustível é queimado ininterruptamente,
aliviando a massa do artefato, ou quando uma colheitadeira deposita a safra em
caminhões de transporte ainda nos campos de cultivo. Nesses dois casos, mesmo
se os veículos mantiverem uma velocidade constante, o que faria d v = 0 , ainda
teremos variação do memento linear, pois d m ≠ 0. dt
dt
Observe a Figura 12, ela apresenta uma aplicação mais prática do conceito
que estamos estudando aqui. São, na verdade, dois gráficos. À esquerda, em uma
escala mais ampla, para evidenciar a simetria descrita pela curva da função que
escolhemos para a força que atua entre dois corpos, no instante de uma colisão e
dada por:

 

F ( t ) = mv δ (t ) ; (3.51)

Note que escolhemos uma força dependente do tempo, que pretendemos


utilizar para descrever um choque de duas esferas metálicas em rota de colisão.
A ideia é que essa força dependa do tempo de modo que possamos considerá-la
instantânea, atuante por apenas uma fração de tempo, apenas durante o toque
efetivo entre as esferas.

178
TÓPICO 3 | MOMENTO LINEAR, CONSERVAÇÃO DO MOMENTO LINEAR E ESTUDO DAS COLISÕES

FIGURA 12 – IMPULSO DE UMA FORÇA

80 80

70 70

60 60

50 50
F ( t ) (N)

F ( t ) (N)
40 40

30 30

20 20

10 10

0 0
-0.4 -0.2 0 0.2 0.4 0 0.02 0.04 0.06 0.08 0.1
∆t (s) ∆t (s)

FONTE: O autor

Para isso, vamos sacar aqui a função delta de Dirac δ(t). É essa função que
dá o formato de sino à força F da colisão, e tem a forma:
2
t 
1 − 
δ (t ) = e α 
; (3.52)
a π

Como já discutimos, o impulso associado a uma força tem a unidade do


momento linear kg m/s, isso obviamente significa que a força deve ser proporcional
à massa e à velocidade envolvida no choque, daí tiramos nossa dependência da
equação (3.51) em relação a essas grandezas. Para conseguirmos então a unidade
correta para a força da colisão, devemos atribuir ao parâmetro a da função delta
de Dirac uma unidade [a] = s, assim obteremos [F] = N, pois δ(t) = s⁻¹.

Voltando à Figura 12, observe agora o gráfico à direita. Como, por motivo
de sobriedade, não estamos interessados em discutir tempos negativos, esse gráfico
exclui valores negativos de t. Dessa forma, a origem 0 representa o instante inicial
da colisão, o momento em que as duas esferas metálicas trocam contato. É claro
que no momento em que o toque entre as esferas cessa, pelo ricochete da pancada,
a força da colisão vai imediatamente à nulidade. Vamos então experimentar por
um momento algumas possibilidades para o evento impactante. Mantendo a
simplicidade do problema, vamos considerar um choque de esferas de m = 1 kg à
velocidade v = 1 m/s. Fixamos os valores da velocidade e da massa para podermos
trabalhar com o parâmetro a. Perceba que à direita, na Figura 12, há quatro curvas
para valores sucessivamente menores de a. É visível que quanto menor o valor
de a, maior é a força e mais instantaneamente ela é aplicada. Com isso em mente,

179
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA

e comparando as equações (3.49) e (3.52), você pode perceber que a variação


d
temporal e a função delta de Dirac δ(t) desempenham papéis semelhantes
dt
para o impulso, pois ambas atuam tão somente quando há a variação, no caso de
(3.49), da velocidade v ou, no caso de (3.52), do momento p das esferas. A força da
colisão é instantânea, pois ocorre somente no exato momento em que os vetores
de velocidade→ v das esferas são alterados, depois ela some.

FIGURA 12 – IMPULSO DE UMA FORÇA


400 400

350 350

300 300

250 250
F ( t ) (N)

F ( t ) (N)

200 200

150 150

100 100

50 50

0 0
0 0.02 0.04 0.06 0.08 0.1 0 0.02 0.04 0.06 0.08 0.1
∆t (s) ∆t (s)

FONTE: O autor

Na Figura 13, nós estudamos, à esquerda, a intensidade da força de


colisão para diferentes valores de massas constantes m. À direita, a intensidade
da força de colisão para diferentes valores de velocidades constantes iniciais
v. Obviamente, os dois gráficos apresentam as mesmas tendências para o
comportamento temporal da força de colisão, uma vez que esta varia linearmente
tanto a massa quanto a velocidade.

Algo bastante interessante também é aplicar a esse problema a equação


(3.52). Teremos então:


→ →

I = ∫ tf mvδ ( t ) dt (3.53)
ti
 −  
t 
2


→ 1
= ∫ tf mv e  α   dt ;
ti a π 
 
 −  
t 
2

→ tf  1
= mv ∫ ti  a π  α   dt.
e
 

180
TÓPICO 3 | MOMENTO LINEAR, CONSERVAÇÃO DO MOMENTO LINEAR E ESTUDO DAS COLISÕES

A equação (3.53) mostra o impulso gerado durante um choque, cuja força


de colisão depende do tempo e tem a forma da equação (3.52). A segunda linha
apresenta a forma literal da força de colisão, uma dependência exponencial do
tempo, o que implica um impulso muito breve, como esperamos. Em nosso
problema fictício de colisão entre duas esferas metálicas não estamos considerando
nenhuma perda de massa, por motivos de simplificação, dessa forma a massa
constante m pode ser retirada do argumento da integral. Além disso, estamos
considerando que as esferas viajam com velocidade constante v antes do choque
e no momento t = 0 s em que este se dá, ela ainda é constante. A velocidade
é alterada durante breves instantes após o momento inicial do contato, logo
voltando a um valor constante novamente. Por esse motivo, podemos também
removê-la do argumento da integral. O que nos sobra é apenas a integração da
própria função delta, do instante inicial ti ao instante final tf do choque, porém
não precisamos definir quais instantes são estes, necessariamente. Podemos
tranquilamente considerar que o domínio dessa força se estende dos primórdios
(ti = -∞ s) do tempo até o longínquo fim do universo (tf = +∞ s). Apesar de fora de
nossas pretensões é possível mostrar e sugerimos a leitura do livro (27), que para
a equação (3.52), sob essas limitações temporais, temos:
+∞

∫ δ ( t ) dt = 1.
−∞
(3.54)

Porém, em nosso problema consideramos apenas os quadrantes com


t > 0, dessa forma, tomaremos a metade (1/2) do valor resultante da integral
(3.55). Assim, voltando à equação (3.53), temos:


→  −  
t 
2

 tf  1
→ (3.55)
I = mv ∫ e  α   dt ;
ti  a π 
 


= mv ∫ tf δ ( t ) dt ;
ti
1 →

= mv .
2

Fisicamente atribuímos a esse valor (1/2) o efeito das escolhas iniciais


para ambas esferas com mesma massa m e mesma velocidade v, por motivo
de simplificação da discussão. Sobre diferentes condições iniciais, com valores
desiguais de ambos m e v, o impulso recebido por uma bola, ou fornecido pela
outra, dependerá, obviamente, dos valores de suas massas e velocidades. Pense,
por exemplo, em comparar as colisões entre uma bola de sinuca e uma bola de
boliche, e entre uma bola de sinuca e outra bola de sinuca.

181
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA

6 COLISÕES ELÁSTICAS, TOTALMENTE ELÁSTICAS E INELÁSTICAS


Na Figura 14, nós vemos uma colisão entre as esferas (1) e (2), que seguem
na mesma direção. Ela está dividida em três instantes distintos, identificados
como o inicial t1, momento antes da colisão propriamente dita; o intermediário
t2, durante a colisão; e o final t3, após o fim da colisão. Não repare nos tamanhos
iguais para os vetores, a ideia é não se apegar à intensidade das velocidades.
Perceba que aqui ocorre uma colisão perfeitamente elástica, em que não
consideramos perdas de energia, seja por aquecimento local, ruídos produzidos
ou deformações na estrutura dos veículos.

FIGURA 14 – COLISÃO ELÁSTICA

FONTE: O autor

Podemos estudar esse evento do ponto de vista da conservação de energia,


e pela conservação do momento linear, teremos:

m1v1;i + m2 v2 ;i = m1v1; f + m2 v2 ; f (3.56)

Já pela conservação da energia mecânica, teremos:

1 1 1 1 (3.57)
m1v12;i + m2 v22;i = m1v12; f + m2 v22; f
2 2 2 2

Essas somas se conservam e você pode obter infinitas variações entre


v1,i,v2,i,v1,f ou v2,f, mas considerando um sistema ideal, a energia mecânica se
conserva. Você pode até conjecturar o que aconteceria se por acaso a bola (2)
estivesse inicialmente parada. Com v2,i = 0, teríamos:

182
TÓPICO 3 | MOMENTO LINEAR, CONSERVAÇÃO DO MOMENTO LINEAR E ESTUDO DAS COLISÕES

1 1 1
= m1v12;i m1v12; f + m2 v22; f ; (3.58)
2 2 2

=v 22 ; f 2=
m v − v 
2 2
(
 1 1;i 1; f  2  −∆K1  ; )
m m2
2∆K1
v 22 ; f = − .
m2

Essa raiz de argumento negativo da equação (3.58) pode parecer estranha,


mas faz sentido. Lembre-se de que numa situação dessas temos uma relação do
tipo v1, f < v1, i entre as esferas, de modo que v1;i 2 − v1; f 2 > 0 e logo ∆K₁ < 0. A
esfera que atinge aquela parada tende a se tornar mais lenta depois do choque.
Isso porque a primeira transfere energia cinética para a segunda, como fica claro
na relação da última linha, entre v 2, f e K1 . Essa variação advém, é claro, da
desaceleração da esfera (1).

Do ponto de vista da conservação do momento linear desse sistema,


teremos uma relação de proporcionalidade entre a velocidade adquirida pela
esfera (2) v 2, f e a variação das velocidades da esfera (1) ∆v1 .

m
= v
1 1; i
m1v1; f + m2 v2 ;i ; (3.59)
m1
v2 ; f
= (v −v ;
m2 1;i 1; f
)
m
v2 ; f =
− 1 ∆v1
m2

Isso é bastante interessante, pois agora fica claro por que, nessas condições,
um tênis precisaria de uma velocidade relativamente alta para mover uma bola
de boliche. Por outro lado, se m1 = m2 então a velocidade final da esfera (2)
passa a depender apenas de ∆v1. Falando em conservação do momento linear,
precisamos ter muita atenção, pois as coisas são um pouco diferentes nesse caso.
Começando pelo sinal dos vetores velocidade → v1 e →
v2 envolvidos. Lembre-se de
que a conservação da energia mecânica depende do quadrado da velocidade, mas
o momento linear varia com a primeira potência de v, que pode assumir valores
negativos. Observe a Figura 15, por exemplo. Nela, estamos imaginando que
duas esferas (1) e (2) colidem de frente em uma superfície tal e em condições tais
que as perdas de energia podem ser negligenciadas. O que ocorre é que v 2 , i >> v1
, de modo que a esfera (2) inverte o sentido do movimento da esfera (1), como
pode ser visto no momento t3.

183
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA

FIGURA 15 – COLISÃO ELÁSTICA

FONTE: O autor

Nessas condições, teremos a seguinte expressão para a conservação de →


p

= mv:
− m1v1; f − m2 v2 ;i ;
m1v1;i − m2 v2 ;i = (3.60)
( )
m1 v1;i + v1; f − m2 v2 ;i m1 p1;i + p1; f − p2 ;i
= = ;
( )
m2 m2
    
( )

(

= = 
→ →


m1 v1;i − −v1; f  − m2 v2 ;i m1  p1;i − p1; f  − p2 ;i
  ;
)
m2 m2
m1
= ( )
v + v − v2 ;i ;
m2 1;i 1; f

Note que a segunda linha já nos mostra que a velocidade final da esfera
(2) dependerá diretamente da soma dos momentos da esfera (1), normalizada
pela massa m2 e de sua diferença com o momento inicial p2,i, da esfera (2). Para
ter uma ideia um pouco mais visual, compare a terceira linha, que traz a mesma
conclusão, mas em notação vetorial. Com a Figura 15, faça a soma vetorial, veja
como lhe parece. Por último, com a quarta linha, você também pode interpretar
esse problema como a diferença entre uma fração da soma das velocidades da
esfera (1) e da velocidade inicial da esfera (2).

Caso a esfera (2) estivesse inicialmente parada v2,i = 0, como foi discutido
no exemplo das bolas de tênis e boliche, e a esfera (1) ricocheteasse, voltando
na direção em que veio, a expressão para a velocidade final da esfera (2) seria
semelhante ao caso anterior, a menos do termo da esfera (2).

184
TÓPICO 3 | MOMENTO LINEAR, CONSERVAÇÃO DO MOMENTO LINEAR E ESTUDO DAS COLISÕES

Durante a colisão de dois corpos, a energia total envolvida sempre


se conserva, isso significa que toda a energia atribuída aos corpos envolvidos
na colisão continua existindo após dela. Porém isso não significa que toda a
energia mecânica envolvida mantém-se mecânica, ela pode sofrer algum tipo de
transformação e tomar a forma de calor, som ou uma deformação estrutural dos
corpos envolvidos.

Considere, por exemplo, a Figura 16, ela apresenta a colisão entre duas
esferas em três instantes:

FIGURA 16 – COLISÃO INELÁSTICA

FONTE: O autor

1 1
m1v12;i ≠ m2 v22;i ; (3.61)
2 2

7 COLISÕES EM DUAS OU MAIS DIMENSÕES


O cálculo de colisões em duas ou três dimensões é uma generalização
daquele discutido anteriormente. Não há diferenças em termos de conservação
de energia, uma vez que esta é uma grandeza escalar e, no caso da cinética,
depende do quadrado do módulo da velocidade, porém o momento linear é uma
grandeza vetorial e as coisas são diferentes para ele, como você já sabe. Para o
correto tratamento da conservação do momento linear, precisamos lidar com os
vetores velocidade, que podem assumir sentidos positivos ou negativos.



v = vx iˆ + v y ˆj + vz kˆ ; (3.62)

Compondo a expressão para a conservação do momento linear:

185
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA


→   
mv1; i
+ mv→2 ;i = mv

1; f
+ mv→2 ; f ; (3.63)
( ) (
m v1;i ; x iˆ + v1;i ; y ˆj + v1;i ; z kˆ + m v2 ;i ; x iˆ + v2 ;i ; y ˆj + v2 ;i ; z kˆ )
(
= m v1; f ; x iˆ + v1; f ; y ˆj + v1; f ; zkˆ ) + m ( v 2; f ; x )
iˆ + v2 ; f ; y ˆj + v2 ; f ; z kˆ ;

O que pode ser tratado isoladamente como:

mv1;i ; x iˆ + mv2 ;i ; x iˆ = mv1; f ; x iˆ + mv2 ; f ; x iˆ;


(3.64)
mv1;i ; y ˆj + mv2 ;i ; y ˆj = mv1; f ; y ˆj + mv2 ; f ; y ˆj ;
mv1;i ; z kˆ + mv2 ;i ; z kˆ = mv1; f ; z kˆ + mv2 ; f ; z kˆ.

As equações (3.65) lhe renderam três vezes o trabalho, porém agora


unidimensional. As colisões em duas e três dimensões são tratadas desagregadas
em três movimentos unidimensionais.

186
TÓPICO 3 | MOMENTO LINEAR, CONSERVAÇÃO DO MOMENTO LINEAR E ESTUDO DAS COLISÕES

LEITURA COMPLEMENTAR

O QUE É ENERGIA?

Neste capítulo, começamos nosso estudo mais detalhado dos diferentes


aspectos da física, tendo terminado nossa descrição de coisas em geral. Para
ilustrar as ideias e o tipo de raciocínio que podem ser usados na física teórica,
examinaremos agora uma das leis mais básicas da física, a conservação da energia.

Existe um fato, ou se você preferir, uma lei que governa todos os fenômenos
naturais que são conhecidos até hoje. Não se conhece nenhuma exceção a essa
lei – ela é exata até onde sabemos. A lei é chamada de conservação da energia.
Nela enuncia-se que existe uma certa quantidade, que chamamos de energia, que
não muda nas múltiplas modificações pelas quais a natureza passa. Essa é uma
ideia muito abstrata, porque é um princípio matemático; ela diz que existe uma
quantidade numérica que não muda quando algo acontece. Não é a descrição
de um mecanismo ou algo concreto; é apenas um estranho fato de que podemos
calcular algum número e, quando terminamos de observar a natureza fazer seus
truques e calculamos o número novamente, ele é o mesmo (algo como o bispo
na casa branca que, após um número de lances – sem sabermos os detalhes – ele
continua na casa branca. Essa é uma lei da natureza dele). Uma vez que essa é
uma ideia abstrata, ilustraremos seu significado por uma analogia.

Imagine uma criança, talvez “Dênis, o Pimentinha” que possui blocos que
são absolutamente indestrutíveis e não podem ser divididos em pedaços. Todos
são iguais entre si. Vamos supor que ele possui 28 blocos. A mãe dele o coloca
numa sala com os 28 blocos no início do dia. No final do dia, sendo curiosa,
ela conta os blocos muito cuidadosamente e descobre uma lei fenomenal – não
importa o que ele faça com os blocos, sempre restam 28! Isto continua por vários
dias, até que um dia onde só há 27 blocos, mas uma pequena busca mostrou que
um deles estava debaixo do tapete – ela deve procurar em todos os lugares para
se assegurar de que o número de blocos não mudou. Um outro dia, porém, o
número parece ter mudado – só há 26 blocos. Uma outra busca cuidadosa indica
que a janela estava aberta e, após uma olhada lá fora, os outros dois blocos foram
encontrados. Num dia seguinte, uma contagem cuidadosa indica que há 30
blocos! Isto causa um choque considerável, até que ela se lembrou que Bruce fez
uma visita, trazendo seus blocos, e deixou alguns na casa de Dênis. Depois de se
desfazer dos blocos extras, a mãe fecha a janela, não deixa Bruce entrar e, então,
tudo vai bem até que um dia ela os conta e só encontra 25 blocos. Entretanto, existe
uma caixa na sala, uma caixa de brinquedos, e a mãe vai abrir a caixa, quando o
menino diz: “Não, não abra minha caixa de brinquedos”. e grita. A mãe não pode
abrir a caixa de brinquedos. Sendo extremamente curiosa e um tanto engenhosa,
ela inventa um plano! Ela sabe que um cubo pesa 30 gramas (g); então, ela pesa
a caixa nesse dia, quando só tinha achado 28 blocos, e descobre que seu peso são
160 g. Da próxima vez em que ela quiser verificar os blocos, ela pesará a caixa de
novo, subtrairá os 160 g e dividirá por 30. Ela descobre o seguinte:

187
UNIDADE 3 | APLICAÇÕES DA DINÂMICA

 Blocos   ( peso da caixa ) − 160 g 


 + =constante (4.1)
 achados   30 g 

Daí, aparentemente surgem novos desvios, mas uma análise cuidadosa


indica que a água suja na banheira está mudando de nível. O menino está jogando
blocos na água e ela não consegue vê-los, pois a água está muito suja, mas ela
consegue descobrir quantos blocos estão na água acrescentando outro termo a
sua fórmula. Uma vez que a altura original da água era de 15 cm e cada bloco
eleva a água 1/2 cm, a nova fórmula é:

 
 Blocos   ( peso da caixa ) − 160 g   ( altura da água ) − 15 cm 
 + + =constante (4.2)
 achados   30 g  
 
1
cm 

 2 

No aumento gradual da complexidade do mundo dela, encontra-se uma


série de termos representando as formas de calcular quantos blocos estão em
lugares onde ela não consegue ver. Como resultado, ela encontra uma fórmula
complexa, uma quantidade que tem de ser calculada e que sempre permanece
com o mesmo valor independente da situação.

Qual a analogia disto com a conservação da energia? O aspecto mais notável


que deve ser abstraído, dessa situação apresentada, é que não existem blocos.
Retire o primeiro termo das equações (4.1) e (4.2) e perceberemos que estamos
calculando coisas mais ou menos abstratas. A analogia tem os seguintes pontos.
Primeiro, quando calculamos a energia, às vezes parte dela sai do sistema e vai
embora ou, outras vezes, parte entra no sistema. Para verificarmos a conservação
da energia, devemos ter cuidado para não colocarmos ou retirarmos energia do
sistema. Segundo, a energia tem um grande número de formas diferentes e existe
uma fórmula para cada uma. Elas são: energia gravitacional, energia cinética,
energia térmica, energia elástica, energia elétrica, energia química, energia da
radiação, energia nuclear e energia da massa. Se totalizarmos as fórmulas para
cada uma dessas contribuições, ela não mudará, exceto quanto à energia que
entra e sai.

É importante perceber que, na física atual, não temos conhecimento do


que é a energia. Não temos um quadro de que a energia vem em pequenas gotas
de magnitude definida. Isto não é assim. Entretanto, existem fórmulas para
calcular certas quantidades numéricas e ao somarmos tudo, o resultado é “28”
– sempre o mesmo número. É algo abstrato no sentido de que não nos informa o
mecanismo ou a razão para as várias fórmulas.
FONTE: FEYNMAN, LEIGHTON, SANDS, (2008)

188
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• O momento linear é uma grandeza relacionada à inércia dos corpos.



• Sua conservação está associada à ausência de uma força resultante.

• Trata-se do produto da massa de um corpo, pelo vetor velocidade que o mesmo
possui.

• É possível relacionar a variação temporal do momento de um corpo a uma


força que atua sobre ele, em completo acordo com o princípio de inércia dos
corpos.

• A conservação do momento linear é muitas vezes utilizada conjuntamente ao


princípio de conservação de energia mecânica, para o tratamento das colisões
entre corpos.

• O centro de massa de um sistema e partículas é definido como a média das


posições de cada partícula do sistema, ponderada pela respectiva massa
correspondente.

• Uma distribuição esférica de partículas de massas idênticas, guarda em seu


cerne a posição do centro de massa, e que uma ligeira variação de qualquer
posição ou massa pode deslocar essa quantidade.

• Tanto a posição quanto a massa de uma partícula, em relação a todas as outras,


pode deslocar o centro de massa da distribuição do centro geométrico dela.

• A velocidade do centro de massa pode ser entendida como uma soma das
taxas de variação temporal na posição de cada partícula do sistema estava
submetida.

• O mesmo raciocínio se aplica à aceleração do centro de massa.

• A força aplicada por um corpo sobre outro e o impulso fornecido a ela são
relacionados. O impulso é como uma soma integral do produto da força
aplicada, pelo tempo de contato entre os corpos. Introduzindo o conceito de
função impulso δ(x), ilustrada por um decréscimo exponencial adimensional.

• As colisões elásticas e inelásticas apresentam diferenças em relação às energias


envolvidas em cada tipo de colisão. Que os efeitos dissipativos indicam colisões
inelásticas e que sob tais situações o princípio de conservação de energia
mecânica não pode mais ser aplicado.

189
• As colisões em duas e três dimensões guardam as mesmas relações de
conservação e podem ser entendidas como uma coleção de três problemas
unidimensionais.

190
AUTOATIVIDADE

1 A respeito do momento angular, considere as seguintes afirmações e


classifique-as como verdadeiras (V) ou falsas (F):

a) ( ) O momento linear evoca duas grandezas fundamentais para a descrição


do movimento de um corpo, massa e velocidade. 

b) ( ) O momento linear é uma força que propulsiona corpos nos espaços. 

c) ( ) A variação temporal do momento linear está intimamente ligada ao
princípio de inércia através da Segunda Lei de Newton. 

d) ( ) A variação do momento de um corpo se dá apenas pela variação de sua
velocidade. 

e) ( ) A variação do momento linear é uma representação matemática da
alteração de seu estado de movimento. 


2 Considere um carro de m = 1000 kg em velocidade constante de intensidade


vi = 100 m/s. O carro é atingido por outro veículo, em sua traseira, e
imediatamente após o choque a velocidade do carro sobe para vf = 120 m/s.
Sabendo que tudo isso ocorre em 2 milésimos de segundo, calcule a força
com que o carro é atingido.

3 Considere novamente a situação descrita no problema anterior (questão 2) e


calcule o impulso recebido pelo carro da frente.

4 Considere que duas bolas de bilhar se chocam em um jogo de sinuca.


Supondo que uma das bolas tem uma massa m1, que a outra tem massa m2
e, que após o choque, ambas mantêm a mesma velocidade vf , calcule vf em
função das massas e das velocidades iniciais envolvidas.

5Suponha que duas massas esféricas, conectadas por um cabo


de massa desprezível, apresentam vetores de centro de massa
→ 1
=rCM ; f (
( m1 + m2 )  1 1
) ( )
 x m iˆ + y1m1 ˆj + x2 m2iˆ + y2 m2 ˆj  .Depois que um determinado

evento acontece, as massas trocam de lugar e agora o vetor centro de massa
→ 1
tem a forma = rCM ; f (
( m1 + m2 )  2 1
) ( )
 x m iˆ + y2 m1 ˆj + x1m2iˆ + y1m2 ˆj  . Demonstre

  
que a variação ∆rCM = rCM ; f − rCM ;i pode ser escrita sob a forma

→ 1
=∆rCM ( x − x )( m2 − m1 ) iˆ + ( y2 − y1 )( m2 − m1 ) ˆj  .
( m1 + m2 )  2 1 

6 Observe a colisão apresentada na Figura 17 e suponha que a esfera 1 tenha


uma massa m1 = 1 kg e que a esfera 2 tenha uma massa m2 = 2 kg. Sabendo
que a velocidade inicial da esfera 1 é de v1 = 10 m/s e que 150 J de energia
cinética foi trocada nessa colisão, calcule a velocidade da esfera 2 v2 .

191
FIGURA 17 – COLISÃO ELÁSTICA

FONTE: O autor

192
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