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Disciplina Sistema Gastrointestinal Aula 15

Tópico Clínica Médica: Gastroenterologia Tipo Teórica


Conteúdos Gastroenterite Aguda Duração 2h

Objectivos de Aprendizagem
Até ao fim da aula os alunos devem ser capazes de:
1. Definir os diferentes tipos de diarreia pelo seu mecanismo de produção (osmótica, secretora,
exsudativa e motora), descrevendo as suas características clínicas básicas e, relacionando-os
com agentes etiológicos concretos.
2. Definir os diferentes tipos de diarreia pela sua apresentação clínica (aguda ou crónica, com
sangue, e com pus), descrevendo as suas características clínicas básicas e, relacionando-os
com agentes etiológicos concretos.
3. Listar por grupos (infecciosas, tóxicas, medicamentosa e outras) as causas principais de
diarreia aguda.
4. Descrever as possíveis características da diarreia (apresentação, características das fezes,
relação com alimentos e medicamentos, dor acompanhante, perda de peso, febre, distensão),
relacionando-as com agentes etiológicos específicos.
5. Enumerar os sinais físicos esperáveis numa diarreia aguda, indicando aqueles que se
relacionam com agentes etiológicos específicos
6. Listar os exames a serem realizados em um doente com diarreia aguda.
7. Enumerar os resultados laboratoriais esperados numa diarreia aguda, indicando aqueles que se
relacionam com agentes etiológicos específicos.
8. Descrever a estratégia de diagnóstico diferencial etiológico da diarreia aguda, com base em
sintomas, sinais e laboratório.
9. Indicar as etiologias mais comuns relacionadas com condições predefinidas (crianças,
HIV/SIDA).
10. Classificar a gravidade da diarreia aguda com base em critérios clínicos e laboratoriais.
11. Descrever a estratégia terapêutica da diarreia aguda, incluindo a evolução esperada,
enumerando as indicações de transferência.
12. Explicar o tratamento (oral e parenteral) da desidratação, incluindo a sua monitoria clínica e
laboratorial.
13. Enumerar as indicações para realizar o tratamento antibiótico específico e as dosagens destes.
14. Listar as condições de notificação obrigatória, definindo as medidas higiénicas e de isolamento
que deverão ser tomadas em cada caso.

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Estrutura da Aula
Bloco Título do Bloco Método de Ensino Duração

1 Introdução à Aula

2 Gastroenterites Agudas (GEA): Definição e


Generalidades

3 Diagnóstico

4 Diagnóstico Diferencial das GEAs e Conduta

5 Pontos-chave

Equipamentos e meios audiovisuais necessários:

Trabalhos para casa (TPC), exercícios e textos para leitura – incluir data a ser entregue:

Bibliografia (referências usadas para o desenvolvimento do conteúdo)


 Cook G, Zumla A. Doenças tropicais de Manson (Manson’s tropical diseases). Elsevier; 2008.
 MISAU. Manual de prevenção e tratamento da cólera e outras doenças diarreicas. Disponível
em: www.misau.co.mz, acessado em 25.12.10
 Schechter M, Marangoni DV. Doenças infecciosas: Conduta, diagnóstica e terapêutica. Brasil:
Guanabara Koogan; 1994.

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BLOCO 1: INTRODUÇÃO À AULA
1.1. Apresentação do tópico, conteúdos e objectivos de aprendizagem.
1.2. Apresentação da estrutura da aula.
1.3. Apresentação da bibliografia que o aluno deverá manejar para ampliar os conhecimentos.

BLOCO 2: GASTROENTERITES AGUDAS (GEA): DEFINIÇÃO E GENERALIDADES


As gastroenterites constituem uma das afecções mais comuns em todo o mundo, e afectam
principalmente os países do terceiro mundo, devido a natureza precária das condições
socioeconómicas, educacionais, e outras associadas ao subdesenvolvimento. As gastroenterites
agudas estão entre as 5 principais causas de mortalidade infantil em Moçambique.
A GE é uma síndrome aguda associada a diarreia, náuseas, vómitos e desconforto abdominal, podendo
ser causada por afecções intestinais (infecções, alergias alimentares) ou extra-intestinais (doenças e
infecções sistémicas).
A diarreia pode ser aguda, quando dura menos de 2 semanas, e crónica, quando dura mais de 2
semanas (algumas bibliografias referem 4 semanas).
A diarreia consiste na eliminação de fezes com consistência diminuída, (pastosas, semi-líquidas ou
líquidas) associada ao aumento do número de evacuações (3 vezes no mínimo) num intervalo de 24
horas, por mais de 2 dias.
2.1. GEA (Gastroenterite Aguda)
GEA é uma síndrome diarreica, que evolui com náuseas, vómitos e desconforto abdominal com
evolução inferior a 2 semanas.
Representa uma resposta aguda inespecífica do intestino a diversas agressões como infecções,
infestações parasitárias, auto-imunidade, isquémica, reacções a drogas, cirurgias e neoplasias.
A GEA pode ser classificada quanto a:
 Etiologia em:
o Primária ou intestinal: quando resulta de afecções intestinais, de natureza não infecciosa,
ou infecciosa (bacteriana, viral, protozoários, etc.).
o Secundária ou extra intestinal: quando a diarreia não resulta de afecções intestinais
directas, podendo ser causada por doenças sistémicas como diabetes, infecções como
malária, infecções das vias respiratórias superiores, cancros, stress, entre outras.
 Fisiopatologia em:
o Osmótica, motora, secretora e exsudativa (ver descrição abaixo sobre fisiopatologia das
diarreias agudas).

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Tabela 1. Resumo das etiologias de GEAs.

Extra-intestinais ou
Intestinais ou Primárias
Secundárias
Não
Não infecciosa Infecciosas Infecciosa
infecciosa
Medicamentos: - Infecções Vírus Bactérias Protozoários Outros - Pós cirurgia
- Antibióticos das vias
aéreas -Astrovirus -Shigella -Trichuris -E. Histolytica - Doenças
- Laxantes -Calicivirus -Salmonella trichiura -G. lamblia auto-imunes
superiores.
- Alergias -Adenovirus -E. Coli -Strongyloides -Balantidium coli
transitórias - Infecções
das vias -Coxsacke -Yersinia stercoralis -Cryptosporidium
aéreas -Rotavirus -Cólera -Schistosoma parvum*
inferiores. mansoni - Isospora beli*
Infecções do -Trichinella - Fungos
tracto spiralis
- Mycobacterium
urinário
tuberculosis*
- Malária

2.2. Fisiopatologia das Diarreias Agudas


Para que ocorra a diarreia, é necessária a ocorrência de uma série de eventos, desde a irritação
dos intestinos, até a hipersecreção. Porém, como é de se notar, as diarreias têm diferentes
apresentações e isso deve-se aos diferentes mecanismos fisiopatológicos.
2.2.1. Osmótica:
Ocorre quando certas substâncias que não podem ser absorvidas permanecem no intestino.
Estas substâncias fazem com que uma quantidade excessiva de água permaneça nas fezes,
provocando uma diarreia. Certos alimentos (como algumas frutas, os feijões, doces e
pastilha elástica) podem provocar diarreia osmótica. Também pode ser provocada por uma
deficiência de lactase. Esta é uma enzima que normalmente se encontra no intestino
delgado e que converte o açúcar do leite (lactose) em glicose e galactose, de tal forma que
podem ser absorvidos e passar para a corrente sanguínea. Quando as pessoas com
deficiência de lactase bebem leite ou consomem produtos lácteos, a lactose não é
transformada. Ao acumular-se no intestino, provoca diarreia osmótica.
A intensidade da diarreia osmótica depende da quantidade de substância osmótica que se
tenha consumido. O quadro cessa logo que se deixe de ingerir ou de beber aqueles
produtos. É uma diarreia abundante, pastosa (pode ser aquosa em algumas situações), com
distensão abdominal ligeira e flatulência.
2.2.2. Exsudativa:
Decorre da invasão do patógeno na mucosa intestinal (E.coli enteroinvasiva, Salmonella,
shigella e outras) provocando uma reacção inflamatória, ou da agressão imunomediada,
com perda da integridade da mucosa, citólise e necrose celular, originando a secreção de
muco, sangue e células inflamatórias.
A diarreia exsudativa é caracterizada por febre moderada, diarreia com sangue e/ou muco,
dor abdominal e tenesmo.
2.2.3. Secretora:
Como o próprio nome menciona, há grande secreção de fluidos e electrólitos para o
intestino. Esta secreção aumentada decorre de vários factores, entre eles, da acção de
toxinas que interferem no sistema adenilciclase com estímulo do AMP cíclico (p.ex. Vibrio

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cholera, E. coli enteropatogénica), da secreção de hormônios (Vipoma, carcinóide) ou da
lesão das vilosidades intestinais (rotavírus).
Exemplo clássico deste tipo de mecanismo fisiopatológico é aquele causado pelo vibrião
colérico. Este assunto será profundamente abordado na aula sobre cólera.
O paciente refere uma diarreia aquosa, volumosa, e de evolução rápida. Facilmente
desenvolve sinais de desidratação (sede, pele com prega cutânea, mucosas secas, pulso
fino). Em geral, esta diarreia não evolui nem com sangue nem com muco.
2.2.4. Motora:
Resulta de alterações da motilidade intestinal, a qual está sob influência do sistema nervoso
autónomo e central.
Doenças que promovem uma hipermotilidade intestinal, como o hipertireoidismo e alguns
casos de diabetes, são exemplos de patologias que causam diarreia motora.

BLOCO 3: DIAGNÓSTICO
3.1. História Clínica do Paciente com GEA
A grande maioria das diarreias agudas é de origem infecciosa e tem um curso autolimitado e, por
isso, raramente necessitam de exploração física com meios auxiliares diagnósticos. Quando se faz
a anamnese de um doente com síndrome diarreico, deve-se aprofundar o seguinte:
3.1.1. Forma de apresentação e curso da diarreia
Este dado é de grande ajuda para orientar na localização e prognóstico da diarreia. As
diarreias que têm origem no cólon esquerdo são de baixo volume, estão associadas ao
tenesmo rectal, e dor hipogástrica na fossa ilíaca e na região sacral.
Deve-se descrever a evolução da diarreia, se teve um início agudo com evolução insidiosa,
ou se teve uma evolução rápida, com intervalos calmos.
3.1.2. Características das fezes
Consistência: está relacionada com a quantidade de água e fibras que tem nas fezes.
Quanto mais aquosas as fezes forem, maior o risco de desidratação e maior a necessidade
de reposição hídrica.
Sangue: a presença de sangue misturado nas fezes indica lesão da mucosa intestinal, que
pode ser por invasão pelos microrganismos na mucosa (E.coli enteroinvasiva, Salmonella,
shigella e outras), ou por infiltração tumoral.
Muco: pode ser causada por um processo inflamatório abundante, formação de abcessos ou
fístulas rectais.
Cor: a cor das fezes vária segundo o conteúdo predominante nelas, e também depende das
transformações químicas e mecânicas que elas sofreram. Por exemplo, na mal-absorção as
fezes são pálidas ou acinzentadas, na cólera, temos água com cor de “água de arroz”, nas
diarreias por protozoários podem ser esverdeadas, e se estivermos perante um doente que
também faz tratamento com sal ferroso, podemos ter fezes pretas.
3.1.3. Relação com os alimentos
Deve-se interrogar sobre a possibilidade da diarreia ter iniciado após uma certa refeição. O
surgimento da diarreia aguda em vários indivíduos que estiveram no mesmo sítio e comeram
a mesma comida sugere uma intoxicação alimentar. A diarreia por mecanismo osmótico é

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influenciada pela ingestão de determinados alimentos e geralmente cessa após a suspensão
do mesmo.
3.1.4. Origem iatrogénica
A toma de medicamentos por muito tempo pode levar ao desequilíbrio flora bacteriana
intestinal e permitir o crescimento de microrganismos como clostridium difficille, que
provocam diarreia. Outros medicamentos como o cotrimoxazol e a amoxicilina podem por si
só causar diarreia. Alguns pacientes desenvolvem diarreia depois de uma intervenção
cirúrgica por recessão do intestino reduzindo assim a área de absorção (mal-absorção).
3.1.5. Sinais e sintomas acompanhantes:
Dor abdominal: a dor abdominal é um sintoma frequente nos pacientes com síndrome
diarreico. Usualmente é uma dor colicosa, difusa e de má localização. Esta dor pode
aparecer antes do início da diarreia e persistir durante a evolução toda. A dor abdominal
cessa (ou atenua), com o fim da síndrome diarreica. A dor abdominal forte está associada a
diarreias exsudativas e motoras, e as moderadas estão associadas a diarreias secretoras e
osmóticas.
Vómitos: os vómitos estão associados as diarreias altas (jejuno e ílio) embora possam estar
presentes em qualquer localização. Quando os vómitos iniciam antes ou em simultâneo com
as diarreias, deve-se suspeitar de intoxicações.
Distensão abdominal: A distensão abdominal que cursa com aumento dos borborigmos e
flatulência são secundários a fermentação colónica de hidratos de carbono mal absorvidos, e
é sugestiva de mal absorção ou diarreia secretora.
Febre: A febre pode estar presente desde o começo da diarreia ou apresentar-se de forma
tardia. Observa-se nas diarreias infecciosas por bactérias e está geralmente associada à
prostração.
Perda de peso: Não é muito comum na diarreia aguda porém, dependendo da presença de
vómitos e se for uma diarreia profusa, verifica-se uma perda de peso devida a perda dos
líquidos.
3.2. Exame Físico do Paciente com GEA
Na avaliação física do paciente com GEA, o TMG deve fazer um exame físico geral, prestando
particular atenção ao estado de hidratação (veja a tabela de avaliação da hidratação abaixo). De
igual forma, o clínico deve procurar sinais que possam orientar ao diagnóstico etiológico.
O exame físico do abdómen normalmente não revela nenhuma alteração, somente pode se
apresentar com aumento dos ruídos hidroaéreos à auscultação ou com um certo grau de distensão
abdominal.
3.3. Meios Diagnósticos
Os principais exames usados para o diagnóstico etiológico das GEAs são:
 Exame parasitológico de fezes: permite a identificação de cistos ou larvas de parasitas.
 Cultura de fezes: permite a identificação do agente etiológico específico.
 Pesquisa de sangue oculto: as perdas ocultas de sangue nas fezes estão muitas vezes
associadas a processos crónicos gastrointestinais, muitas vezes causados por parasitas.
 Hemograma: nas diarreias bacterianas pode ilustrar leucocitose, com neutrofilia. Nas
diarreias virais pode apresentar linfocitose. É normal na maioria dos doentes.

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3.4. Complicações nos Doentes com GEA
 Desidratação: resultante da perda de líquidos nas fezes e vómitos.
 Hipoglicémia: resultante da dificuldade em se alimentar (ora por causa das náuseas, ora por
causa dos vómitos), e da redução da absorção.
 Acidose metabólica: perda de electrólitos nos vómitos e fezes.
 Ílio paralítico: desbalanço electrolítico (altos níveis de cálcio e baixos de potássio) e a
infecção no próprio intestino levam ao ílio paralítico na GEA.
 IRA (insuficiência renal aguda): consequente de uma desidratação severa.
 SHU (síndrome hemolítico urémico): síndrome composta por IRA, anemia hemolítica e
trombocitopenia. Também pode ter sinais neurológicos variáveis. Muito comum em crianças
depois de uma GEA por E.coli, Shigella ou Salmonella.
 Broncopneumonias: por bronco aspiração, associada aos vómitos.
 Septicemia: por disseminação sistémica bacteriana.

BLOCO 4: DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL DAS GEAs E CONDUTA


4.1. PASSO 1: Diferenciar a Gastroenterite Aguda de Outras Condições Parecidas
 Pseudodiarreia: eliminação frequente de pequenos volumes de fezes, devido à urgência
fecal.
 Incontinência Fecal: eliminação involuntária do conteúdo fecal.
 Síndrome do Intestino Irritável: É caracterizada pela presença de uma dor (de tipo cólica)
ou desconforto a nível abdominal (usualmente mas nem sempre ao nível inferior),
recorrente, associado à mudança na frequência ou consistência das fezes e tipicamente
aliviado pela defecação.
 Diarreias crónicas: diarreias com duração de mais de 2 semanas, que no início podem ser
confundidas com as diarreias agudas (veja descrição na Aula 20).
4.2. PASSO 2: Avaliação de Sinais de Desidratação
Independentemente da causa, as GEAs sempre abrem uma possibilidade de desenvolver
desidratação. A severidade da mesma, ou a rapidez com que o paciente começa a apresentar a
desidratação, podem nos elucidar acerca da etiologia e ajudar na conduta e determinação do
prognóstico.

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Tabela 2. Critérios de avaliação da desidratação.

CRITÉRIOS DE SEM COM SINAIS DE DESIDRATAÇÃO


AVALIAÇÃO DESIDRATAÇÃO (A) DESIDRATAÇÃO (B) SEVERA (C)
1. Estado De
Bom, alerta Agitado, irritado Letárgico, inconsciente
Consciência
Muito encovados e
2. Olhos Normais Encovados
secos
3. Choro Com lágrimas Sem lágrimas Sem lágrimas
4. Boca e língua Húmidas Secas Muito secas
Bebe normalmente, Tem sede, bebe
5. Sede Incapaz de beber
não tem sede avidamente
Desaparece
Desaparece Desaparece muito
6. Prega cutânea rapidamente em
lentamente lentamente
menos de 2 segundos
7. Peso perdido 3 a 5% 6 a 9% >10%
Volume reduzido e cor Anúria / oligúria
8. Fluxo urinário Normal
escura intensa
9. Respiração Normal Profunda ou rápida Rápida
10. Reenchimento
<2s +/- 2s >3s
capilar
Normal ou baixa, Baixa ou imensurável
11. Pressão sistólica Normal
hipotensão ortostática

O plano terapêutico muda dependendo do tipo de desidratação, dai a importância de se ter muita
atenção neste passo.
4.3. PASSO 3: Abordagem Terapêutica Inicial do Paciente com GEA
O tratamento empírico é feito quando não há tempo para se procurar as causas exactas da diarreia
porque o doente está muito deteriorado, ou porque com bases clínicas e epidemiológicas, pode-se
fazer um tratamento empírico. Consiste nas seguintes etapas:
 1ª Etapa: Hidratação inicial e reavaliação periódica.
 2ª Etapa: Manutenção - substituição das perdas de líquidos que vão continuando até que a
diarreia pare.
 3ª Etapa: Alimentação do doente.
O uso de antibióticos depende muito se o doente tem ou não sintomas sistémicos, se não tiver,
estes estão fortemente desencorajados.
1ª Etapa: Hidratação Inicial e Reavaliação Periódica
O regime de hidratação é baseado na classificação da desidratação (tabela 2).
Grupo A
 Tratamento em ambulatório com sais de reidratação oral (SRO) e líquidos disponíveis:
água de coco, sucos de frutas, água de arroz ou soro caseiro, evitar refrigerantes.
 Manter a alimentação habitual.
 Transferir ou internar casos graves ou os com sintomas que pioram.

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Grupo B
 Pelo menos dois sinais ou mais de desidratação (sede+, mucosas secas+, olhos
encovados, etc.).
 Pesar o paciente e mantê-lo por 3h no hospital, em uso de SRO, 1.000 ml/h adultos.
 Se tiver boa tolerância aos líquidos, alta após estabilização com SRO e alimentação.
 Se tiver má tolerância: manter SRO, iniciar solução salina 0.9% via endovenosa,
reavaliar após 2h.
o Boa tolerância: alta, SRO e alimentação.
o Agravamento clínico internar para tratamento dos pacientes graves.
Grupo C
 Líquidos endovenosos imediatamente: Ringer lactato, ou se não estiver disponível soro
fisiológico.
 Adultos: dar 100ml/Kg EV em 3 horas:
o Primeiros 30min- 30ml/Kg tão rápido quanto possível.
o As 2 horas e meia seguintes: 70ml/kg.

 Monitorizar os sinais vitais:


o Não estáveis: continuar com líquidos EV.
o Estáveis: dar SRO- 5ml/Kg/h + líquidos EV.

 Sem sinais de desidratação, continuar com a etapa 2.


2ª Etapa: Manutenção - Substituição das Perdas
Tabela 3. Esquema de reposição hídrica de manutenção na diarreia.
Quantidade de SRO depois de Cada
Idade
Dejecção

Menor de 24 meses 100ml

2-9anos 200ml

>/= 10anos Tanto quanto quiser

3ª Etapa: Alimentação do Doente


Recomeçar a alimentação com uma dieta normal quando os vómitos tiverem parado.
4.4. PASSO 4: Exclusão ou Identificação da Causa (ou causas) Específica Diagnosticável ao
Nível do TM
4.4.1. Diarreia não infecciosa: reacção adversa medicamentosa (antibióticos), Laxantes, Alergias
transitórias.
 Diagnóstico: anamnese.
 Conduta terapêutica: suspensão dos antibióticos, laxantes e do factor alérgico.
Reposição hídrica e electrolítica com base no nível de desidratação.

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4.4.2. Diarreia Viral:
 Diagnóstico: comum nas crianças com menos de 5 anos, geralmente manifesta-se com
vómitos logo no início e evolui com diarreia aquosa sem muco e sem sangue que varia
de leve a moderada, mas que também pode ser severa com quadros de desidratação
importante. A febre é comum. O hemograma pode ilustrar linfocitose, e os exames de
fezes são negativos.
 Conduta: Reposição hídrica e electrolítica com base no nível de desidratação. A diarreia
viral é autolimitada (aproximadamente 1 semana), e não requer tratamento antibiótico, a
menos que haja sobreposição de uma infecção bacteriana.
4.4.3. Diarreia Bacteriana:
 Diagnóstico: doente vem com história de início brusco de vómitos, diarreia (que pode ser
acompanhada de sangue e/ou muco), perda de apetite, dor abdominal tipo cólica,
tenesmo. Dependendo da etiologia, pode apresentar-se com febre. O hemograma pode
indicar leucocitose e neutrofilia, e o diagnóstico etiológico é feito pela cultura de fezes.
 Conduta: hidratação oral ou parenteral dependendo do grau de desidratação. Os
antibióticos estão desencorajados, a menos que haja outros sintomas como febre,
sangue e/ou muco nas fezes, septicemia, etc, que justifiquem o uso de antibióticos. O
paciente que vem com diarreia somente não requer tratamento antibiótico, mas deve
fazer reposição hídrica e manter sobre vigilância antes de decidir antibioterapia. É
importante estimular a alimentação do doente assim que ele tolerar, pois ele está a
perder muita energia.
4.4.4. Protozoários:
 Diagnóstico: a apresentação da diarreia é variável e depende do agente etiológico e do
estado de saúde basal do paciente, podendo ser assintomática, aguda ou intermitente.
Pode apresentar-se com fezes moles e fétidas com muco e/ou sangue, cólicas, tenesmo,
flatulência e sintomas gerais como mioartralgias e fadiga. Peça um exame parasitológico
de fezes.
 Conduta: desparasitação e reposição hídrica com base no grau de desidratação.
4.4.5. Extra-intestinal: doenças e infecções sistémicas
 Diagnóstico: anamnese, exame físico e meios auxiliares diagnósticos para despiste de
doenças e infecções sistémicas possivelmente associadas.
 Conduta: tratar a doença de base, reposição de líquidos e electrólitos com base no grau
de desidratação.
4.5. PASSO 5: Tratamento Específico com Base na Etiologia.
Nesta fase o tratamento é direccionado, orientado pelos resultados obtidos pela anamnese, exame
físico e meios auxiliares diagnósticos disponíveis.
4.6. PASSO 6: Educação Sanitária Preventiva
Depois de fazer o tratamento, deve-se fazer uma educação sanitária para diminuir o risco de
recidivas e de ocorrências na família e comunidade em geral. Consiste basicamente no reforço das
medidas de higiene individual e comunitária:
 Lavar as mãos antes de se alimentar e depois de usar a casa de banho;
 Clorar a água ou beber água fervida;

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 Controlar o armazenamento de água e alimentos;
 Manejo adequado de excretas (uso adequado de latrinas e balneários públicos);
 Cozer e lavar bem os alimentos.

BLOCO 5: PONTOS-CHAVE
5.1. A diarreia consiste na eliminação de fezes com consistência diminuída, associada ao aumento do
número de evacuações.
5.2. A gastroenterite aguda é uma síndrome aguda associada a diarreia e a outros sintomas como
náuseas, vómitos e desconforto abdominal. A GEA pode ter causa viral, bacteriana, parasitaria e
por protozoários. Também pode ser extra-intestinal e iatrogénica.
5.3. Quando estamos perante um doente com GEA, devemos primeiro avaliar o seu estado de
desidratação e com base nisso determinar a conduta, e só depois é que devemos nos ocupar dos
factores etiológicos da GEA.
5.4. O principal tratamento para a GEA é a reidratação. O uso de antibióticos esta limitado aos casos
em que há evidências clínica e/ou laboratoriais de infecção bacteriana.
5.5. Uma parte importante do manejo das GEAs é a prevenção que consiste em melhorar as medidas
de higiene pessoal e comunitária.

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