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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SANTOS


CURSO SUPERIOR DE TECNOLOGIA EM GASTRONOMIA

GABRIELA LOPES DE OLIVEIRA


MARCELA PALMIERI SANTOS DA SILVA
RENATA HOBEIKA HATEM PAULO

A FERMENTAÇÃO NATURAL NA PANIFICAÇÃO

Santos
2014
1

GABRIELA LOPES DE OLIVEIRA


MARCELA PALMIERI SANTOS DA SILVA
RENATA HOBEIKA HATEM PAULO

A FERMENTAÇÃO NATURAL NA PANIFICAÇÃO

Trabalho acadêmico apresentado à disciplina


Seminários de Pesquisa em Gastronomia do
curso superior de Tecnologia em Gastronomia
da Universidade Católica de Santos para
obtenção de nota parcial.
Orientadores: Prof. Cezar de Azevedo e Prof.
Rodrigo Anunciato

Santos
2014
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RESUMO

O pão é onipresente na alimentação mundial desde os primórdios da civilização,


porém os métodos tecnológicos de fabricação de fermentos vêm evoluindo para acelerar o
processo produtivo das padarias, e, por consequência, diminuindo o nível de saudabilidade
dos pães que são fabricados a partir dos mesmos. Os atuais fermentos biológicos
industrializados são produzidos em massa e não metabolizam apropriadamente o amido do
trigo em micronutrientes para serem absorvidos pelo sistema digestivo. Por outro lado, a
fermentação natural, empregada há séculos de forma artesanal, oferece uma alternativa mais
saudável nesse aspecto, além de fornecer pães mais saborosos, aromáticos, duráveis, com
menor teor de glúten e de índice glicêmico. Por esses motivos, sua popularidade tem
aumentado exponencialmente nos últimos anos. Apesar de exigir modificações no processo
produtivo das padarias por necessitar de tempo prolongado para seu preparo, os pães de
fermento natural possuem um apelo comercial muito extenso e atingem um público-alvo
disposto a investir na compra desses produtos de valores mais elevados.

Palavras-chave: fermento; natural; pão; panificação, fermentação; padaria; levain.


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ABSTRACT

Bread has been widespread in human nourishment ever since civilizations first
developed. However, the evolution in technologies for manufacturing baker’s yeast have
decreased modern bakeries production time and, as a consequence, they have also decreased
the health content of breads made with such yeast. These modern products are based in
industrialized mass-produced baker’s yeast which does not appropriately metabolize wheat
starch into micronutrients to be readily absorbed by the human digestive system. On the other
hand, ancient artisan methods of natural fermentation offer healthier alternatives in what
comes to micronutrients bioavailability, besides creating bread that is more flavorful and
aromatic, and has a longer shelf-life, a lower gluten rate and a lower glycemic index. Due to
all of this, sourdough bread popularity has boosted exponentially over the past few years.
Even though it requires changes in bakery’s production process because of its longer
fermentation time, sourdough bread has an outspread commercial appeal, aiming at a target
market which is willing to spend more for buying these products.

Keywords: yeast; natural; bread; baking; fermentation; sourdough; bakery; levain.


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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.................................................................................................................5

OBJETIVO........................................................................................................................6

MÉTODO..........................................................................................................................7

1. FERMENTAÇÃO NA PANIFICAÇÃO...................................................................8
1.1 HISTÓRIA DO PÃO....................................................................................................8
1.2 CONCEITO DO FERMENTO NATURAL.................................................................9
1.3 VARIANTES E APLICAÇÕES DO FERMENTO NATURAL...............................10

2. O FERMENTO SOB A ÓTICA NUTRICIONAL.................................................11


2.1 AVALIAÇÃO NUTRICIONAL.................................................................................11
2.1.1 A questão do glúten.................................................................................12
2.1.2 A questão do açúcar................................................................................12

3. MERCADO DE PANIFICAÇÃO............................................................................13
3.1 VISÃO GERAL DO MERCADO E APLICAÇÃO DA FERMENTAÇÃO
NATURAL..................................................................................................................13
3.2 VANTAGENS E DESVANTAGENS DO FERMENTO NATURAL......................14
3.3 INOVAÇÕES PRODUTIVAS...................................................................................15

CONSIDERAÇÕES FINAIS.........................................................................................17
REFERÊNCIAS..............................................................................................................18
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INTRODUÇÃO

No âmbito da panificação, a fermentação natural corresponde à ação de leveduras


presentes no ar, na água e no trigo que se alimentam dos açúcares contidos na farinha quando
a mesma é misturada a uma proporção de água. Esses micro-organismos produzem gás
carbônico, álcool e ácidos durante esse processo de digestão dos açúcares, ajudando a massa
a se expandir e ganhar sabor e aroma característicos.
Embora a história do pão seja mais antiga que a dos fermentos naturais, eles vêm
evoluindo juntos há milhares de anos. Esse foi o método principal de fabricação de pães até o
surgimento do fermento biológico industrializado no século XIX através de pesquisas
desenvolvidas por Louis Pasteur e, desde então, o fermento natural foi amplamente
substituído pela versão industrial. No entanto, atualmente, o fermento natural vem retomando
seu espaço no mercado gastronômico, uma vez que seus benefícios nutricionais elevados
estão sendo cada vez mais ressaltados na mídia e na literatura.
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OBJETIVO

Apresentar os conceitos, as bases e a aplicação da fermentação natural no processo de


panificação, bem como seus benefícios à saúde.
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MÉTODO

O procedimento realizado foi por meio de pesquisa bibliográfica com uso e revisão de
documentos, livros e artigos relacionados ao tema.
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1. FERMENTAÇÃO NA PANIFICAÇÃO

1.1 HISTÓRIA DO PÃO

Ligado à civilização ocidental há seis mil anos e inventado na região da Mesopotâmia,


o pão foi uma das maiores descobertas químicas da humanidade, completamente ligado ao
cultivo do trigo e do centeio e relacionado à economia, religião e política.
O pão com levedura teria surgido no Egito por volta de 300 a.C. e a partir de lá, a arte
dos pães atingiu todo o Oriente Médio e chegou ao povo grego, que por sua vez,
disseminaram o pão pela Europa. Em Roma, o pão se tornou um alimento mais valorizado do
que a carne. O governo romano distribuía farinha e disponibilizava à população fornos para
que pudessem assar seus pães.
Produzido em praticamente todas as culturas, desde o pão árabe da Bíblia até pães no
vapor na China, passou por muitas alterações até chegar ao produto que conhecemos hoje. O
pão sofreu grandes modificações principalmente no aspecto e na forma de preparo,
resultando em uma enorme variedade de métodos, técnicas, tipos e qualidades. Inicialmente,
eram feitos de farinha misturada com o fruto do carvalho (também chamado de lande ou noz)
e tinham características de rigidez, secura e amargor. Antes do consumo, era realizada a
tradição de lavar o pão algumas vezes em água quente e depois assá-lo sobre pedras ou sob
cinzas.
Nos tempos antigos, o pão era fermentado naturalmente, porém modernizações foram
surgindo com o passar dos séculos. Por exemplo, a espuma de leveduras da cerveja
possibilitava uma fermentação mais rápida e era vendida por proprietários de destilarias
holandesas para os padeiros até 1780. Outro avanço foi o processo vienense de 1867, que
consistia em retirar a espuma das leveduras, filtrá-la, lavá-la e comprimi-la em ‘bolos’. Já em
1872, Charles Fleischmann patenteou um processo otimizado para produzir e comprimir o
fermento biológico fresco que é utilizado até os dias atuais. (KLIEGER, p. 13, 2004). As
próximas modernizações foram o desenvolvimento do fermento biológico ativo seco na
década de 1950 e do fermento biológico instantâneo seco, que apresentaram maior tempo de
estocagem em relação ao fermento fresco (CANELLA-RAWLS, 2003, p. 134). Em suma, o
fermento biológico comercial resulta de um cultivo industrial de bactérias selecionadas.
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1.2 CONCEITO DO FERMENTO NATURAL

O fermento natural, também conhecido como levain, é a mistura de uma proporção de


água e farinha e micro-organismos que, durante sua metabolização anaeróbica de
carboidratos – processo chamado de glicólise –, transformam o ácido pirúvico em etanol e
produzem gás carbônico e ácidos como o acético e lático – substâncias que inibem processos
enzimáticos de micróbios, o que ajuda a criar um ambiente seletivo onde apenas
determinadas bactérias conseguem sobreviver, ajudando a preservar os alimentos.

Após a mistura inicial de farinha, água e outro ingrediente se desejar – como frutas,
que auxiliam na fermentação –, é necessário um período de ‘incubação’ da massa que leva
geralmente de 15 a 20 dias, período durante a qual a cultura de bactérias se estabiliza e vai
ganhando sabor e aromas mais azedos. Essa massa mãe precisa ser alimentada
periodicamente para que não morra e pode ser mantida sob refrigeração para que não seja
necessário alimentá-la com tanta frequência. Somente então esta mistura pode ser utilizada
como um agente de crescimento para a produção de outros produtos de panificação,
auxiliando no aroma e textura da mesma.

Os micro-organismos citados incluem bactérias (esquizomicetos), ficomicetos,


ascomicetos, basidiomicetos e fungos imperfeitos. Cada tipo será adequado à fermentação de
um produto específico, seja leite, grãos ou outros. Para os pães, os mais relevantes são as
bactérias, como Lactobacillus acidophilus, Lactobacillus casei e Lactobacillus
sanfranciscensis – a última é responsável pela produção do famoso pão sourdough de São
Francisco e só pode ser encontrada nessa região dos EUA; os ascomicetos, como
Saccharomyces cerevisiae. Saccharomyces carlsbergensis, e Saccharomyces exiguous, –
considerados o fermento de fato, que metabolizam o carboidrato e se reproduzem
assexuadamente –; e os fungos imperfeitos.

Em relação à fermentação de alimentos em geral, “certas estimativas informam que


cerca de um terço de toda a comida ingerida por seres humanos ao redor do mundo é
fermentada” (KATZ, p. 1, 2012). De modo geral, os benefícios da fermentação consistem
em: tornar os alimentos resistentes à deterioração por micróbios e ao desenvolvimento de
toxinas alimentares; diminuir a probabilidade de um alimento transferir micro-organismos
patogênicos; conservar os alimentos entre os momentos de colheita e consumo; modificar o
sabor original dos ingredientes e, muitas vezes, aumentar o valor nutricional. (STEINKRAUS
apud KATZ, 2012, p. 18)
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1.3 VARIANTES E APLICAÇÕES DO FERMENTO NATURAL

É importante ressaltar que a base de farinha de trigo e água não é a única


possibilidade de preparo do fermento natural, também conhecido como massa mãe, massa
lêveda, massa azeda, pré-fermento, levain ou pâte fermentée na França, sourdough ou starter
nos Estados Unidos, biga na Itália, e poolish na Polônia. Embora o trigo e o centeio sejam os
cereais mais utilizados, muitos outros cereais – e mesmo tubérculos – podem entrar no
preparo conforme a região. Além disso, a água pode ceder lugar a ingredientes líquidos como
cerveja, iogurte, leite azedo, kefir, kombucha, rejuvelac, suco de frutas fermentado, e as bases
utilizadas apenas para iniciar a fermentação podem incluir cebolas, maçãs, uvas, batatas, e
diversos outros vegetais. As taxas de hidratação variam conforme o tipo de fermento entre
65% e 100%.

Os métodos de fermentação de cereais e tubérculos para a fabricação de pães são tão


amplos e diversos quanto suas plantações pelo mundo. Cada cultura desenvolveu sua própria
maneira de armazenar excedentes de produção e reutilizá-los posteriormente ou de usar os
excedentes para fabricar produtos que tivessem grande durabilidade. Segundo a Organização
das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), os cereais mais importantes na
alimentação mundial em ordem de consumo por quantidade são milho, trigo, arroz, cevada,
sorgo, milhete, aveia e centeio; e os tubérculos mais importantes são batata, mandioca, batata
doce, inhame e cará (FAO apud KATZ, p. 417, 2012).

Alguns métodos incluem a demolhagem e a germinação dos grãos antes da


fermentação, outros grãos são maltados, outros são cozidos para formar um mingau antes de
serem juntados à massa de um pão, alguns tubérculos são demolhados e triturados. Além
disso, os pães podem ser fritos na chapa – como alguns pães árabes –, fritos por imersão em
gordura – por exemplo, os donuts –, cozidos no vapor – método comum na China –, cozidos
em água – como os bagels –, ou assados – o método mais tradicional na Europa e América.

Entre exemplos clássicos de fermento natural aplicado estão o pão pumpernickel


alemão, que contém grãos inteiros de centeio, e o famoso pain de campagne francês. Menos
tradicionais são os casos da dosa, uma panqueca indiana a base de grãos de arroz e de uma
lentilha local triturados e fermentados, e do injera, um pão fino e maleável da Etiópia feito
com uma massa fermentada de farinha do grão teff.
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2. O FERMENTO SOB A ÓTICA NUTRICIONAL

2.1 AVALIAÇÃO NUTRICIONAL

Embora seja comum pensar que a fermentação não afeta as propriedades nutricionais
dos ingredientes do pão e que a farinha de trigo continua carregando os mesmos minerais que
carregaria em qualquer outra preparação, a fermentação tem características únicas que
ajudam no desprendimento de nutrientes essenciais ao funcionamento do corpo humano.

Primeiramente, é importante lembrar que todos os grãos e cereais, a fim de serem


estocados por longos períodos para serem consumidos integralmente ou sob forma de farinha,
devem passar por um processo de secagem que reduz o teor de água a uma quantidade
mínima. Essa secagem dos grãos acaba por dificultar a digestão no sistema corporal humano.

Os micro-organismos da fermentação efetuam um tipo de pré-digestão da farinha,


tornando os nutrientes, micronutrientes, minerais, ácidos graxos e proteínas mais
biodisponíveis, isto é, mais passíveis de absorção pelo organismo, como o aminoácido
essencial lisina. Pesquisas comprovam que alguns fermentos, durante esse processo,
acumulam altos níveis de vitaminas B1 (tiamina), B2 (riboflavina) e B3 (niacina) em
comparação com os ingredientes crus antes da fermentação (KATZ, 2012, p. 24).

Ademais, os levains que contém bactérias variadas produtoras de ácido lático


apresentam maiores taxas de pré-digestão e maior disponibilidade de lisina do que massas
que contém apenas um tipo de levedura, por exemplo a levedura comercial industrializada
Saccharomyces cerevisiae, que apenas degrada o carboidrato do trigo e não aumenta tão
significativamente as quantidades de nutrientes (HAARD, p.19).

As leveduras comerciais ainda sofrem outra desvantagem em relação à massa mãe


tradicional. Uma vez que precisam de maior estabilidade e validade comercial, os fermentos
industriais passam por um processo de pasteurização cuja temperatura bloqueia seu processo
de digestão, portanto suas culturas não estão vivas e evoluindo como as de um levain.

Outra característica essencial da fermentação é a remoção de antinutrientes e toxinas


presentes em todos os cereais, leguminosas, sementes e nozes em quantidade variáveis.
Como exemplo, os fitatos são fatores antinutricionais que encapsulam minerais como cálcio,
zinco, fósforo, ferro, cobre e certas proteínas, impossibilitando a sua absorção pelo sistema
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digestivo humano. Após a fermentação, os minerais são libertados dessa ligação com o fitato
pela enzima fitase, o que aumenta sua solubilidade e facilita a absorção. (KATZ, 2012, p. 25)

2.1.1 A questão do glúten

Outra tendência do mercado gastronômico atual são os produtos sem glúten,


produzidos a partir de grãos que não contém a proteína encontrada no trigo, na cevada,
centeio e em algumas espécies de aveia. Embora o público principal para estes produtos seja
a população celíaca, várias dietas livres de glúten e lactose estão sendo adotadas por pessoas
sem nenhuma intolerância alimentar.
Diversos estudos publicados vêm demonstrando que os pães produzidos a partir
de fermentos naturais possuem um teor reduzido de glúten em relação aos pães de
fermentação rápida – com fermento industrializado –, pois o tempo de fermentação
prolongada resulta na degradação das proteínas glutenina e gliadina pela cultura da massa
mãe.
Um estudo específico da Universidade de Nápoles comprovou essa informação de
forma empírica realizando um teste com indivíduos celíacos que chegaram ao ponto de
consumir o pão de fermentação natural normalmente, sem efeitos negativos ou danos
fisiológicos (GRECO, 2011).

2.1.2 A questão do açúcar

Outro suposto benefício da fermentação natural é a redução do nível de


carboidratos na massa, novamente devido à metabolização dos carboidratos pelas bactérias
durante a fermentação longa. Isso resulta em um produto que não eleva tanto os níveis de
glicose sanguínea quanto um pão comum. “Com o sourdough, os níveis de glicose sanguínea
foram menores enquanto a insulina teve um aumento comum”, explica o professor Terry
Graham sobre um estudo na Universidade de Guelph com pessoas obesas de meia idade que
consumiram pão branco, pão integral, pão integral com centeio, e pão do tipo sourdough
(GRAHAM, 2008). Além disso, o pão de fermentação natural manteve resultados positivos
nos exames mesmo horas após o consumo e teria chegado até a regular o apetite dos
indivíduos.
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3. MERCADO DE PANIFICAÇÃO

3.1 VISÃO GERAL DO MERCADO E APLICAÇÃO DA FERMENTAÇÃO


NATURAL

O mercado de panificação no Brasil vêm se reinventando constantemente nos últimos


15 anos, profissionalizando a gestão, oferecendo novos modelos de lojas e serviços
diferenciados, sempre se ajustando às necessidades do consumidor.

Atualmente, este mercado é constituído por 63,2 mil empresas que servem
diariamente cerca de 43 milhões de clientes, conforme dados de 2013 da Associação
Brasileira da Indústria de Panificação e Confeitaria (ABIP) (MIRANDA, 2014, p.19). Além
disso, o setor de panificação vem demonstrando um crescimento vertiginoso superior aos
10% desde 2007, apenas em 2013 tendo decrescido para 8,7% devido aos preços de matéria-
prima.

A visão de futuro da ABIP é que o mercado se divida em quatro tipos de


estabelecimentos: 1 - as padarias gourmet com mais de 300m², serviços de refeições para
todos os períodos do dia, além de mix de pães e doces, que funcionam também como
cafeterias, empórios, etc.; 2 - as padarias com espaço entre 100m² e 300m² e com conceito
semelhante ao anterior, porém com menos opções; 3 - as padarias com espaços menores que
100m², com ênfase em espaços de 40m² a 50m² que não terão produção de pães in loco, mas
oferecerão um mix de produtos assados a partir de congelados; 4 - as boulangeries ou
boutiques de pão, que serão pequenas lojas que produzirão pães especiais e de fermentação
natural artesanalmente, visando um público exigente e atribuindo um valor agregado maior.

Os pães fabricados com o método tratado nesta pesquisa serão encontrados


essencialmente nos estabelecimentos 1 e 4, porém sob abordagens distintas. Nas padarias
gourmet, serão encontradas poucas opções com levain em meio à grande variedade de
produtos, já nas boulangeries será maior a diversidade desse tipo de pão e poderá se
encontrar pães com levain saborizados, entre outros.

O sucesso desse tipo de estabelecimento especializado nesse panificação artesanal foi


testado e aprovado, e vem sendo aplicado por vários empreendedores. Izabel Pereira, chef e
proprietária da boutique gourmet Marie-Madeleine e uma das pioneiras da introdução desses
pães no mercado, explica que seu sucesso:
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“(...) fez com que, entre outras coisas, padarias tradicionais investissem também na
criação de uma linha de produtos que utiliza esse tipo de fermento, e isso demonstra
que os clientes estão à procura desse tipo de pão e dispostos a investir um pouco
mais em um produto que prioriza a qualidade dos ingredientes, a técnica de
produção e o cuidado artesanal em todas as etapas do processo, já que tudo isso
reflete na saúde e no bem-estar. Em contrapartida, o maior desafio nesse mercado é
a falta de mão de obra especializada” (PEREIRA apud MIRANDA, 2014, p. 22)

Quanto ao investimento por parte do cliente neste produto artesanal, os valores podem
chegar a ser quatro vezes o do tradicional pão francês, isto é, R$39,90 por quilo, como é o
caso do produto Panesse mencionado abaixo. Já os produtos fabricados a partir de fermentos
naturais concentrados em pó apresentam valor mais baixo, como é o caso dos produtos da
Santo Trigo Padaria, em Santos, vendidos a R$22,90 por quilo.

3.2 VANTAGENS E DESVANTAGENS DO FERMENTO NATURAL

Como a principal desvantagem do processo produtivo dos pães com levain está o
tempo prolongado de fermentação, que se estende de 8 a 15 horas, conforme o tipo de pão, a
temperatura e condições do ambiente. Outro ponto negativo é a manutenção do fermento
natural, que consiste de alimentá-lo com farinha e água em intervalos regulares de forma a
renovar a cultura. Esses dados interferem no custo final do produto devido à mão-de-obra
empregada e ao tempo requerido, e não tanto pelo preço elevado de matéria-prima.

Além disso, supostamente é mais difícil obter uma padronização do produto quando
se emprega o fermento natural, conforme nos informou o padeiro responsável pelo Santo
Trigo Padaria, estabelecimento localizado na cidade de Santos, durante entrevista realizada
no dia 27 de setembro de 2014. Neste ponto, o fermento biológico comercial apresentaria
maior uniformidade, além de menos acidez e maior destaque para o sabor da farinha em si.

Por outro lado, os pães fabricados pelo processo de fermentação natural apresentam
um bom tempo de conservação, de 2 dias ou mais (SEBESS, 2013, p. 65) se bem
armazenados, pois possuem um pH ácido que preserva contra o envelhecimento inibindo a
ação enzimática de micro-organismos nocivos.

Esses pães apresentam um aroma sutil e delicado, um sabor ácido único e duradouro,
e um odor azedo característico e produzem texturas mais densas, além de conferirem mais
umidade a pães integrais (CANELLA-RAWLS, 2003, p.142).
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Ademais, com este método, a padaria tem a possibilidade de diminuir gastos com
matéria-prima no que se refere aos fermentos industrializados e também aos melhoradores de
farinha, pois a incorporação do levain melhora a qualidade da massa sem necessidade de
aditivos químicos (SEBESS, 2013, p. 65).

3.3 INOVAÇÕES PRODUTIVAS

Nos últimos dois anos, surgiram diversas alternativas para oferecer um produto
semelhante ao pão de levain, porém sem incorrer o tempo necessário à fermentação
tradicional.

Um dos exemplos é a pré-mistura Bentamix Levain da marca Bunge Pro, um tipo de


fermento natural desidratado de origem francesa que substitui o uso do fermento biológico.
Este produto foi lançado em 2012 durante a FIPAN em duas versões, para pães rústicos e
para pães rústicos integrais, e supostamente oferece saudabilidade em pães saborosos e
macios e garantia de fonte de fibras, energia, maciez, sabor e textura, além de tempo de
fermentação de apenas 4 horas.

Outro produto muito conhecido no mercado de panificação é o O-tentic da marca


Puratos, que consiste de um concentrado em pó produzido a partir de uma massa madre que
traria ação fermentativa, de reforço e de sabor em massas de panificação. Está disponível em
três versões: Origin, proveniente de uma massa de centeio francesa; Durum, de uma massa de
trigo grano duro da Itália; e Napoletana, fermento com o qual é fabricada a pizza de Nápoles.
Este produto é utilizado numa porcentagem de 4% do total de farinha e tem um tempo de
fermentação reduzido semelhante ao do fermento biológico comum.

A mais recente inovação do mercado de fermentação natural é o produto Panesse.


“Oferecemos um produto semelhante ao que se come na França”, afirmou José Chaves,
gerente da marca (FLORES, 2013). A marca pertence ao grupo britânico Associated British
Foods (ABF), um dos maiores grupos na área de alimentos do mundo, outra marca que
pertence ao grupo é o fermento Fleischmann. A Panesse se trata de uma base de massa
refrigerada que chega pronta ao cliente, necessita apenas de algumas horas de fermentação e
depois ser cortada e moldada no formato desejado. A ideia proposta é de um pão artesanal
feito a partir de ingredientes importados da Europa, de qualidade superior. A massa é
hidratada, a farinha é francesa e o fermento é natural. De acordo com José Chaves, a Panesse
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não veio ao mercado com a intenção de substituir o tradicional pão francês. “A ideia é dar ao
paulistano a oportunidade de comer um pão que, antes, só era produzido na Europa”,
comentou Juliana Bastos, nutricionista da padaria Letícia (DUARTE, 2013).
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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O fermento natural para fabricação de pães artesanais apresenta mais benefícios em


relação ao fermento biológico industrializado no que se refere à saúde humana. Entre tais
benefícios, estão as citadas reduções no teor de glúten e no índice glicêmico e a maior
biodisponibilidade de minerais, nutrientes, proteínas, entre outros. Em contrapartida, a
fermentação natural agrega um valor mais alto aos produtos fabricados com esta técnica
devido ao tempo dedicado à alimentação e cuidados com a manutenção do fermento e à
fermentação adequada, além da quantidade de matéria-prima e da contratação de mão-de-
obra especializada.

Atualmente, a sociedade brasileira se encontra em uma busca constante por alimentos


funcionais que tragam benefícios e sabor agregados, perfil em que se enquadram os pães
fabricados com levain. Também está sendo vivenciada uma grande ascensão na popularidade
das padarias gourmet e boulangeries, outro ponto que colabora para a expansão das vendas
desses tipos de pães artesanais e que motivou a realização deste estudo acadêmico.

Em suma, os pontos positivos sobrepujam os pontos negativos na visão do


consumidor e atingem níveis satisfatórios na relação custo versus benefício, conforme se
relatou nas entrevistas citadas em casas especializadas neste setor da panificação. Portanto,
deve-se divulgar aos consumidores todas as informações sobre o fermento natural por meio
de pesquisas e artigos para que possam realizar as melhores escolhas de acordo com seus
critérios.
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REFERÊNCIAS

AGRICULTURAL RESEARCH SERVICE. Basic Report: Bread, french or vienna (includes


sourdough). USDA (United States Department of Agriculture): 2014. Disponível em:
<http://ndb.nal.usda.govndb/foods/show/5540?qlookup=18029&max=25&man=&lfacet=&n
ew=1 >. Acesso em: 3/9/2014.

CAMARGO, Luiz Américo. Pão Nosso: Receitas caseiras com fermento natural. São Paulo:
Editora Panelinha, 2013. 176 p.

CANELLA-RAWLS, Sandra. Pão: Arte e ciência. São Paulo: Editora Senac, 2003, 4ª ed.
rev. 348 p.

DUARTE, Marcelo. Panesse: novo tipo de pão chega ao mercado com slogan, site, SAC e
página no Facebook. SP Curiosos, 7 de novembro de 2013. Disponível em: <
http://spcuriosos.com.br/pao-caseiro-secreto-comeca-a-fazer-sucesso-nas-padarias-
paulistanas/>. Acesso em: 20/10/2014.

FLORES, Magê. Padarias recebem massa de pão com farinha francesa. Folha Comida, 11 de
outubro de 2013. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/comida/2013/12/1383467-
padarias-recebem-massa-de-pao-com-farinha-francesa.shtml>. Acesso em: 20/10/2014.

GRAHAM, Terry. Sourdough Bread Has Most Health Benefits, Prof Finds. 7 de julho de
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GRECO, Luigi. Safety for Patients With Celiac Disease of Baked Goods Made of Wheat
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9, p. 24-29, janeiro de 2011. Disponível em: < http://www.cghjournal.org/article/S1542-
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HAARD, Norman. Fermented cereals: a global perspective. Agricultural Services Bulletin,


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<http://www.fao.org/docrep/x2184e/x2184e00.HTM>. Acesso em: 3/9/2014.

KATZ, Sandor Ellix. The Art of Fermentation: An in-depth exploration of essential concepts
and processes from around the world. EUA: Chelsea Green Publishing, 2012. 531 p.

KLIEGER, P. Christiaan. The Fleischmann Yeast Family. EUA: Arcadia Publishing, 2004.
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MIRANDA, Lilian. O segredo das padarias: estabelecimentos investem em inovações,


produtos e serviços. In: FOOD SERVICE NEWS. Ano 12, nº 86, julho de 2014, p. 18-22.

OLIVEIRA, Cintia. Fermentação Natural: A multiplicação dos pães. São Paulo: Go’Where
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SEBESS, Paulo. Técnicas de Padaria Profissional. Rio de Janeiro: Senac Editoras, 2013. 2ª
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19

SINDICATO DOS PADEIROS DE SÃO PAULO. Projeto Memória. 2012. Disponível em:
<www.issuu.com/padeirosspmemoria/docs/14_2>. Acesso em: 10/9/2014.

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