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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR RELATOR DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE

JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

LUCIANA DE OLIVEIRA MARÇAIOLI, brasileira, Defensora Pú blica em


atividade junto ao Departamento de Inquéritos Policiais da Capital, vem, respeitosamente, à
presença de Vossa Excelência, com fundamento no art. 5º, inciso LXVIII, da Constituiçã o
Federal, e nos arts. 647 e seguintes, do Có digo de Processo Penal, impetrar

HABEAS CORPUS
com pedido de ordem liminar

em favor de RODOLFO PEREIRA DA SILVA JUNIOR, portador do RG nº 49281882/SP, filho de


Rodolfo Pereira da Silva e Ana Maria Xavier da Silva, contra ato do MM. Juízo de Direito do
Departamento de Inquéritos Policiais (DIPO) da Comarca da Capital (autos nº 0082454-
67.2012.8.26.0050, DIPO 3.1.2, Preventa a 28ª Vara Criminal), pelos motivos que passa a
expor.

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I - DOS FUNDAMENTOS DE FATO E DE DIREITO

O paciente foi preso em flagrante no dia 28 de agosto de 2012 por ter,


supostamente, infringido o artigo 33 da Lei 11.343/2006, eis que teria sido detido na posse de
44,5 gramas de cocaína e, ainda, naquela ocasiã o, teria afirmado que estaria no local
comercializando referidas substâ ncias.

Apó s ser comunicado dos referidos fatos, o nobre Juízo de 1ª Instâ ncia
converteu a prisã o em flagrante em prisã o preventiva, com base, em suma, no argumento
principal de que o paciente teria praticado crime de extrema gravidade, fato este que tornaria
necessá ria a manutençã o da custó dia para garantia da ordem pú blica.

Data máxima vênia, a justificativa utilizada pelo M.M. Juízo do Departamento


de Inquéritos Policiais para a manutençã o da custó dia nã o merece prevalecer. Vejamos:

a) Da não configuração do crime de tráfico de drogas

Inicialmente, da leitura dos autos, podemos inferir a nã o ocorrência do delito


em tela.

Com efeito, consta dos autos que, na data dos fatos, o paciente estaria parado
em determinada via pú blica, quando fora abordado por agentes policiais, sendo que em sua
posse teriam sido encontrados 44,5 gramas de cocaína.

Ora, além de nã o ter sido presenciada qualquer situaçã o de mercancia, a


quantidade de entorpecente supostamente encontrada em poder do paciente poderia, por
patente, consubstanciar guarda, aquisiçã o, transporte de entorpecente para uso pessoal –
conduta prevista no artigo 28 da Lei Nº 11343/06 – hipó tese na qual sequer se pode cogitar a
manutençã o da custó dia e cuja pena não envolve a restriçã o de liberdade.

Outrossim, não há que se falar que a quantia de drogas apreendida é indicativo


seguro de traficâ ncia, má xime quando o Colendo Superior Tribunal de Justiça no RHC

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24.349/MG, 6ª Turma, Rel. Ministra Jane Silva, já se posicionou nesse sentido, assegurando
como pequena a quantidade 31 (trinta e um) invólucros de maconha, in verbis:

PROCESSUAL PENAL – RECURSO ORDINÁ RIO EM HABEAS CORPUS –


TRÁFICO DE DROGAS – PRISÃ O EM FLAGRANTE DELITO – LIBERDADE
PROVISÓ RIA – RESGUARDO DA ORDEM PÚ BLICA – GRAVIDADE ABSTRATA
DO DELITO – REPERCUSSÃ O SOCIAL – ANTECIPAÇÃ O DO CUMPRIMENTO DA
REPRIMENDA – AFRONTA À GARANTIA CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃ O
DE NÃ O-CULPABILIDADE – PEQUENA QUANTIDADE DE DROGAS – TRINTA
E UM INVÓLUCROS DE MACONHA – IMPOSSIBILIDADE DE COMPARAÇÃO
COM OS GRANDES TRAFICANTES QUE ASSOLAM O PAÍS – VEDAÇÃO LEGAL
– IMPOSSIBILIDADE – RECURSO PROVIDO. 1. A gravidade abstrata do delito
atribuído ao agente é insuficiente para a manutençã o de sua prisã o provisó ria,
sob pena de afronta à garantia constitucional de presunçã o de nã o-
culpabilidade.
Precedentes. 2. Da mesma forma, a invocação da repercussão social do
delito não se presta para a justificação da constrição cautelar, sob pena
de antecipação do cumprimento da reprimenda, vedada pelo
ordenamento jurídico pátrio, notadamente quando a quantidade de
drogas encontrada em poder dos agentes não se mostra expressiva.
Precedentes. 3. Unicamente a vedaçã o legal contida no artigo 44 da Lei
11.343/2006 é insuficiente para o indeferimento da liberdade provisó ria,
notadamente em face da ediçã o da Lei 11.464/2007, posterior e geral em
relaçã o a todo e qualquer crime hediondo e/ou assemelhado. Precedentes. 4.
Dado provimento ao recurso para deferir ao recorrente os benefícios da
liberdade provisó ria. (RHC 24.349/MG, Rel. Ministra JANE SILVA
(DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/MG), SEXTA TURMA, julgado em
11/11/2008, DJe 01/12/2008).

Frisa-se que a quantidade da substâ ncia encontrada é um dos critérios


estabelecidos por tal diploma legal para estabelecer a distinçã o entre condutas com o fim de
trá fico e as com o fim de uso pró prio. E não se pode sequer alegar que este nã o é o momento
processual adequado para decidir sobre a desclassificaçã o da conduta delitiva (apenas conferir
a regularidade formal do flagrante), pois a simples modificaçã o da imputaçã o feita a paciente
determinaria a mudança do tratamento jurídico-penal como um todo: passa-se de uma
conduta equiparada a hedionda a outra que sequer tem como uma das penas previstas – em
hipó tese de sentença condenató ria com trâ nsito em julgado – a privaçã o da liberdade.

Deixar de se constatar qual seria, a priori, o tipo penal a que se adequaria a


conduta do paciente importa em arbitrariedade exercida pela autoridade judiciá ria, que teria
como uma das principais conseqü ências o constrangimento ilegal de quem, em verdade,
precisaria de tratamento e advertência sobre os efeitos das drogas.
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Portanto, considerando a ausência de qualquer situaçã o de mercancia, bem
como a pequena quantidade de drogas apreendida, forçosamente, nesse momento, se concluir
que o paciente é, no má ximo, usuá rio de droga.

E, em se tratando de usuá rio, na pior das hipó teses, poderia o indiciado estar
incurso no delito previsto no Art. 28 da Lei n.º 11.343/06, cujo rol de penas não inclui a
privaçã o de liberdade, senã o vejamos:

I – Advertência sobre os efeitos das drogas;


II – Prestaçã o de serviços à comunidade;
III – Medida educativa de comparecimento a programa ou
curso educativo.

Assim, se não há que se impor prisã o ao fim, nã o há que ora se manter a


prisã o em flagrante efetuada.

Mesmo que, diante do alegado, restem dú vidas quanto à ocorrência do crime


de trá fico ou sua desclassificaçã o para conduta que vise ao uso - ou, em outras palavras, entre a
aplicaçã o de um crime equiparado a hediondo e outro que nem sequer comporta prisã o em
flagrante e reclusã o com sentença condenató ria com trâ nsito em julgado -, torna-se mister que
a dúvida deve ensejar a aplicação de medida mais favorável aos réus, com aplicação do
princípio favor rei. Esta iniciativa garante a proteçã o do paciente contra acusaçõ es temerá rias
sem farto embasamento fático-probató rio.

Ressalte-se:

HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. TRÁ FICO DE DROGAS. PRISÃ O


PREVENTIVA. FUNDAMENTOS. GRAVIDADE CONCRETA DOS DELITOS NÃO
CARACTERIZADA. QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA INSUFICIENTE
PARA CARACTERIZAR PERIGO À ORDEM PÚBLICA. RECURSO PROVIDO.
1. A prisã o cautelar, para ser satisfatoriamente motivada em razã o da
gravidade em concreto do delito, deve evidenciar fato concreto que demonstre
a possibilidade de se atingir grande nú mero de usuá rios, seja pelo seu modus
operandi, seja pela quantidade de droga apreendida.
2. Argumentação abstrata e sem vinculação com os elementos dos autos,
somente com base na citação dos motivos autorizadores da medida,
elencados no art. 312 do Código de Processo Penal, não constitui
embasamento idôneo para a prisão cautelar.

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3. Recurso provido. (STJ. HC 24185/MG – Rel. Min. Jane Silva – Sexta Turma –
DJ: 20/11/2008)

Entorpecentes - Trá fico - Desclassificaçã o para uso - Possibilidade - Provas que


nã o sã o seguras para uma condenaçã o pelo trá fico - Princípio do "in dú bio pro
réu" - Apelaçã o do Ministério Pú blico nã o provida. (TJSP ACR 990081177242 –
Des. Rel. Pedro Menin – DJ: 12/03/2009)

TRÁ FICO DE SUBSTÂ NCIA ENTORPECENTE - TRÁ FICO NÃ O CARACTERIZADO


- RECURSO PROVIDO. Nã o havendo prova robusta da mercancia realizada pelo
agente da droga apreendida, deve ser procedida a desclassificaçã o para o crime
de uso de substâ ncia entorpecente. (TJSP - AC 1.0431.06.031014-8/001 – Des.
Rel. Maria Celeste Porto – DJ 08/01/2008)

Cumpre destacar, também, que nã o merece acolhimento eventual alegaçã o de


que a suposta confissã o do paciente, alegada no termo de depoimento de um dos condutores
do caso, seria o suficiente para manter a prisã o pela prá tica do crime de trá fico de drogas.

Ressalte-se, neste ponto, que nã o existe a figura da “confissã o informal a


policiais”. Até porque, diante da violência e opressã o que representa a autoridade policial
(armada e impositiva de vá rias formas), diz-se não raras vezes, o que nã o se fez. E com isso nã o
podemos coadunar, muito menos usar como fundamento para a manutençã o de uma pessoa no
cá rcere.

Sobre o tema, GRINOVER-GOMES FILHO-SCARANCE FERNANDES apontam que


“o STF também já considerou inadmissível como prova incriminadora gravaçã o de conversa
informal do indiciado com policiais, sublinhando que a falta e advertência sobre o direito ao
silêncio faz ilícita a prova que, contra si mesmo, forneça o indiciado ou acusado (STF, HC
80.949-RJ, rel. Sepú lveda Pertence, RTJ 180/1001).

Assim também decidiu o STJ, que “caracteriza prova ilícita o depoimento


prestado por Delegado de Polícia, relativamente a conversa informal que manteve com o
indiciado, na fase inquisitorial’” (HC 32.056, rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 13.04.2004) 1 .

Ante todo o exposto, verificando-se que a suposta conduta do paciente não se


enquadra no disposto no art. 33 da Lei de Drogas, a defesa espera seja relaxada a sua prisã o.

1
As nulidades no processo penal, 11ª ed., São Paulo, RT, p. 76.
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b) Da ausência dos requisitos para a manutenção da custódia

Caso nã o seja este o entendimento deste E. Tribunal, deve ser concedida ao


paciente a liberdade provisó ria, ante à ausência dos requisitos necessá rios à decretaçã o da
prisã o preventiva.

Isto porque nã o se pode alegar ser a manutençã o da custó dia necessá ria à
garantia da ordem pú blica, da ordem econô mica, por conveniência da instruçã o criminal, ou
para assegurar a aplicaçã o da lei penal. E a nã o ser que tais critérios estejam demonstrados
pormenorizadamente quando da decretaçã o da prisã o preventiva, nã o se sustentaria a
assunçã o de sua existência pela simples alusã o ao fato típico que está sendo imputado ao
paciente. Nem caberia a esta a comprovaçã o da sua ausência. Nã o se pode inverter a presunçã o
de inocência prevista como princípio constitucional basilar.

No que tange à garantia da ordem pública, ressalta-se que o crime


supostamente praticado pelo paciente nã o se caracteriza pela violência ou grave ameaça,
revelando-se inadmissíveis as assertivas lombrosianas acerca da periculosidade do agente e
sobre sua medida de responsabilidade no fomento de outras ocorrências.

Nã o há fundamento, de outra sorte, para que deva ser mantida a prisã o do


paciente como exigência para assegurar a instrução criminal, uma vez que não há nos autos
prova de que, em qualquer momento, possíveis testemunhas tenham sido ameaçadas de
alguma maneira pelo paciente.

No tocante à hipó tese de que deve ser assegurada a aplicação da lei penal,
cumpre ressaltar que o paciente possui residência fixa, conforme afirmou em sede
administrativa, nã o havendo motivos, portanto, para se afirmar que aquele se furtará à
eventual aplicaçã o da lei penal.

De qualquer forma, convém mencionar que o fato de o indiciado nã o ter


comprovado documentalmente possuir residência fixa ou, ainda, ocupaçã o lícita, nã o pode ser
tido, de forma alguma, como um obstá culo à concessã o da liberdade ora pretendida, na medida
em que tal exigência não existe em lei e, sequer, em regulamento. De mais a mais, convolar tais
direitos constitucionais (moradia e trabalho) em deveres pressupostos para o gozo de
liberdade nã o condiz com as regras de um Estado Democrá tico de Direito.
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Oportuno citar:

“HABEAS CORPUS. INDEFERIMENTO DE PEDIDO DE REVOGAÇÃ O DE PRISÃ O


PREVENTIVA DO PACIENTE, POR AUSÊ NCIA DE DOMICÍLIO FIXO E DE
OCUPAÇÃ O LÍCITA, ALIADO AO FATO DE ESTAR PORTANDO ARMA QUANDO
DA PRÁ TICA DO CRIME TENTADO E À CIRCUNSTÂ NCIA DE TRATAR-SE DE
CRIME HEDIONDO. IMPETRAÇÃ O DENEGADA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE
JUSTIÇA, QUE CONSIDEROU ENCONTRAR-SE A CUSTÓ DIA FUNDADA NA
GARANTIA DA ORDEM PÚ BLICA E NA APLICAÇÃ O DA LEI PENAL. Decisõ es
carentes de fundamentaçã o vá lida, tendo em vista que: - a revelia do acusado,
mormente quando citado por edital, não justifica, por si só, a prisão
preventiva; o mesmo sucedendo com a ausência de comprovação de
residência fixa e ocupação lícita; - o porte de arma, por outro lado, constitui
circunstâ ncia relacionada com o pró prio crime de tentativa de homicídio
mediante uso de arma de fogo, enquanto que a existência de dois inquéritos
por receptaçã o, um já arquivado, sem a necessá ria relaçã o com o crime sob
enfoque não pode ser tomada por indicativos de risco à ordem pú blica; - a
natureza hedionda do crime praticado, por fim, nã o basta para fundamentar a
custó dia. Quanto ao pedido de expediçã o de ofício, nã o restou demonstrada a
sua necessidade ou o prejuízo que a sua falta pode acarretar ao estado de
liberdade do paciente. Habeas corpus conhecido em parte e, nesta, deferido.”
(STF – HC 80805/SP – Min. Rel. Ilmar Galvã o – DJ em 21/8/2001 – Grifos
inseridos) 

Inclusive a pró pria Corte Maior, guardiã de nossa Constituiçã o da Repú blica,
em caso semelhante, já decidiu que a falta de comprovaçã o de residência não é fator
indispensá vel à concessã o de liberdade provisó ria, nos seguintes termos:

EMENTA: AÇÃ O PENAL. Prisã o preventiva. Decreto fundado na gravidade do


delito e no fato de o réu ser morador de rua. Inadmissibilidade. Razõ es que nã o
autorizam a prisã o cautelar. Constrangimento ilegal caracterizado.
Precedentes. HC concedido. É ilegal o decreto de prisão preventiva que se
funda na gravidade do delito e na falta de residência fixa do acusado,
decorrente de sua condição de morador de rua. (HC 97177, Relator(a): 
Min. CEZAR PELUSO, Segunda Turma, julgado em 08/09/2009, DJe-191
DIVULG 08-10-2009 PUBLIC 09-10-2009 EMENT VOL-02377-02 PP-00360)
grifou-se.

A Constituiçã o Federal, entendida como dirigente, ao estabelecer o rol de


direitos sociais sinaliza o dever do Estado em viabilizar ou pelo menos facilitar a sua
concretizaçã o. Desta forma, tem como pressuposto fundamental o estabelecimento de açõ es e
políticas que concretizem as garantias materiais mínimas para assegurar o estabelecimento de
um padrã o de vida adequado. É importante assinalar que, em verdade, o sistema normativo
impõ e uma obrigaçã o – qual seja a do Estado, em observar e proporcionar as necessidades
bá sicas à dignidade humana enquanto direitos. Nã o caridade. Assim, com certeza nã o se está
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diante de um dever do pró prio acusado de nã o apenas ter moradia fixa como uma
comprovaçã o documental de tal propriedade.

Cabe ressaltar, ainda, que quaisquer dú vidas quanto ao comparecimento do


indiciado aos atos necessá rios do processo ou quanto à viabilidade de sua citaçã o pessoal
devem ser interpretadas EM SEU BENEFÍCIO, observando o princípio-base de toda a legislaçã o
processual penal e consagrando o dogma constitucional da presunçã o de inocência. Nã o devem
tais incertezas justificar a manutençã o do encarceramento, medida excepcional – nunca regra.

Concluindo: ausentes estão os requisitos autorizadores da constrição


cautelar.

Outrossim, quanto à alegaçã o de que o crime de trá fico de entorpecentes seria


de extrema gravidade, cabe ressaltar: a fundamentaçã o da decretaçã o ou manutençã o da
prisã o é vinculada. Eventuais riscos (art. 312 do CPP) quanto à soltura da indiciada à sociedade
deve estar lastreado em indícios veementes constantes dos autos, nã o em meras conjecturas,
presunçõ es ou vaguezas – ou a alegaçã o quanto à gravidade abstrata do delito. Desta feita,
está -se diante de obrigatoriedade de fundamentaçã o da decisã o judicial, nã o importando se
decrete ou denegue esta a prisã o (consoante o disposto no artigo 315 do Có digo de Processo
Penal). Nã o basta alusã o aos critérios previstos, e sim o seu aferimento inconteste no caso
concreto.

Assim:

EMENTA Habeas corpus. Processual penal. Homicídio qualificado. Prisã o


preventiva mantida na sentença de pronú ncia. Inexistência de fundamentos
idô neos que justifiquem a manutençã o da custó dia. Concessã o da ordem.
Precedentes da Corte. 1. Embora o crime seja de natureza hedionda, importa
reconhecer que o decreto constritivo nã o apresenta fundamentaçã o concreta e
individualizada a justificar a segregaçã o cautelar. 2. Para que o decreto de
custó dia cautelar seja idô neo, é necessá rio que especifique, de modo
fundamentado, elementos fá ticos concretos que justifiquem a medida, o que
nã o ocorre na espécie. 3. É da jurisprudência da Corte o entendimento de que
"a legalidade da decisã o que decreta a prisã o cautelar ou que denega liberdade
provisó ria deverá ser aferida em funçã o dos fundamentos que lhe dã o suporte,
e nã o em face de eventual reforço advindo dos julgamentos emanados das
instâncias judiciá rias superiores (...). A motivaçã o há de ser pró pria, inerente e
contemporâ nea à decisã o que decreta (ou que mantém) o ato excepcional de
privaçã o cautelar da liberdade, pois a ausência ou a deficiência de
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fundamentaçã o nã o podem ser supridas 'a posteriori'." (HC nº 98.821/CE,
Segunda Turma, Relator o Ministro Celso de Mello, DJe de 16/4/10). 4. Ordem
concedida para revogar a preventiva do paciente e, de ofício, estendida ao
corréu, se por outro motivo nã o estiverem presos. (HC 101980/SP – Min. Rel.
Dias Toffoli – DJ em 11/05/2010 –)

Entendimento este seguido por este E. Tribunal de Justiça do Estado de Sã o


Paulo, em decisã o recente no Habeas Corpus Nº 990.10.204732-6:

“Pensa-se, que, para o caso haveria de ser dispensá vel a custó dia preventiva. É
que, o douto Magistrado de origem, para recepcionar pleito de prisã o
preventiva, reportou-se apenas à garantia de ordem pú blica, a conveniência da
instruçã o criminal e a eventual aplicaçã o da lei penal, de maneira
absolutamente genérica. Afinal de contas, não se visualiza, no decisó rio que
deferiu a prisã o preventiva, fundamentaçã o adequada para a grave restriçã o
de liberdade. Fala-se em garantia da ordem pública, conveniência de
instrução criminal e aplicação da lei penal, sem se gastar uma linha
sequer para esclarecer a motivação, na exata diretriz da norma do artigo
312 do código de Processo Penal.”

No mais, tratando-se de delito cometido sem violência ou ameaça à pessoa, e,


ainda, sendo o paciente PRIMÁ RIO (vide Folha de Antecedentes), em caso de prolaçã o de
sentença condenató ria, ao fim, haverá a incidência do pará grafo 4º do mencionado artigo 33,
que preconiza uma causa obrigató ria de diminuiçã o de pena, cf. segue:

“Art. 33 Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir,


vender, expor à venda, (...), entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que
gratuitamente, sem autorizaçã o ou em desacordo com determinaçã o legal ou
regulamentar”.
Pena-reclusã o de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500
(quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.
(...)
§4º Nos delitos definidos no “caput” e no §1º deste artigo, as PENAS
poderão ser REDUZIDAS DE UM SEXTO A DOIS TERÇOS, vedada a
conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja
PRIMÁRIO, DE BONS ANTECEDENTES, não se dedique às atividades
criminosas nem integre organização criminosa.” (g.n.)

Assim é que, a depender o redutor a ser aplicado, o paciente, caso condenado,


poderá ter direito ao sursis do Có digo penal (artigo 77- pena de até 2 anos). Poderá também
ter direito a regime aberto ou a pena substitutiva à de prisão, cf. reiterada e pacificamente
decidido pelo Eg. Superior Tribunal de Justiça:

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“A Turma concedeu a ordem de habeas corpus a paciente condenado pelo
delito de trá fico de entorpecentes a fim de garantir-lhe a possibilidade de
substituiçã o da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos, conforme
orientaçã o adotada pelo STF no HC 97.256-RS, julgado em 1º/9/2010, que
declarou a inconstitucionalidade dos arts. 33, § 4º, e 44 da Lei n. 11.343/2006”.
(HC 163.233-SP, Rel. Min. Napoleã o Nunes Maia Filho, julgado em 28/9/2010,
publicado no informativo 449, STJ, de 27 de setembro a 1º de outubro de
2010). (Grifou-se.)

Sobre o assunto, imperioso citar recente liminar deste E. Tribunal de


Justiça de São Paulo:

“A defensora pú blica Luciana de Oliveira Marçaioli impetra este habeas corpus,


com pedido de liminar, em favor de Marcus Vinicius Soares, alegando que o
paciente sofre constrangimento ilegal porque, nã o obstante preencha os
requisitos necessá rios à concessã o da liberdade provisó ria, o benefício foi-lhe
negado em decisã o que nã o está devidamente fundamentada. Tece
consideraçõ es sobre o mérito da causa. Alega que nã o estã o presentes os
requisitos autorizadores da prisã o preventiva. Aduz que milita em favor do
paciente o princípio constitucional da presunçã o de inocência. Requer,
liminarmente, a expediçã o de alvará de soltura em favor do paciente. Defere-se
a liminar. Esta Relatoria apurou que o paciente é primário e sem
antecedentes. O Supremo Tribunal Federal, em recentíssima decisão
plenária, declarou inconstitucional a vedação de substituição da pena
segregativa por restritivas de direito, ínsita no § 4º, do artigo 33, da Lei
Federal nº 13.343/06, de sorte que, em tese, neste caso concreto, na
hipótese de o paciente vir a ser condenado, a pena poderá dosar-se em
montante inferior a 04 anos, portanto não se justifica aguardar preso a
tramitação da ação penal para, depois de condenado, alcançar a aludida
alternativa penal. Portanto, nada, em tese, afasta a possibilidade de eventual
aplicaçã o de pena alternativa, de sorte que ora não se justifica a excessiva
cautela de manter-se preso o paciente até o julgamento do processo. Diante
disso, se faz desnecessá ria a cautela de impedir que aguarde o paciente em
liberdade o julgamento do mérito. É, pois, duvidosa a imperiosa
necessidade de sustentar-se a prisão cautelar do paciente, que frise-se foi
preso com pequena quantidade de droga (11,4 gramas de cocaína) e,
portanto, se condenado, poderá, em tese, ser beneficiado com a pena
mínima do artigo 33, caput (05 anos) e a redução máxima prevista no seu
§ 4º (2/3). Assim, de mister seja o paciente Marcus Vinicius Soares,
incontinenti, posto em liberdade provisó ria, formalizando-se o compromisso
em primeiro grau. Expeça-se alvará de soltura clausulado. Processe-se,
requisitando-se informaçõ es por fac-símile.” (Despacho Habeas Corpus
Processo nº 0101907-38.2011.8.26.0000. Relator: FERNANDO MIRANDA.
Ó rgã o Julgador: 7ª Câ mara de Direito Criminal. Data da decisã o: 24 de maio de
2011)

EMENTA: HABEAS CORPUS. TRÁ FICO DE DROGAS. ART. 44 DA LEI


11.343/2006: IMPOSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DA PENA PRIVATIVA DE
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LIBERDADE EM PENA RESTRITIVA DE DIREITOS. DECLARAÇÃO
INCIDENTAL DE INCONSTITUCIONALIDADE. OFENSA À GARANTIA
CONSTITUCIONAL DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA (INCISO XLVI DO ART.
5º DA CF/88). ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA.
1. O processo de individualizaçã o da pena é um caminhar no rumo da
personalizaçã o da resposta punitiva do Estado, desenvolvendo-se em três
momentos individuados e complementares: o legislativo, o judicial e o
executivo. Logo, a lei comum nã o tem a força de subtrair do juiz sentenciante o
poder-dever de impor ao delinqü ente a sançã o criminal que a ele, juiz,
afigurar-se como expressã o de um concreto balanceamento ou de uma
empírica ponderaçã o de circunstâ ncias objetivas com protagonizaçõ es
subjetivas do fato-tipo. Implicando essa ponderaçã o em concreto a opçã o
jurídico-positiva pela prevalência do razoá vel sobre o racional; ditada pelo
permanente esforço do julgador para conciliar segurança jurídica e justiça
material.
2. No momento sentencial da dosimetria da pena, o juiz sentenciante se
movimenta com ineliminá vel discricionariedade entre aplicar a pena de
privaçã o ou de restriçã o da liberdade do condenado e uma outra que já não
tenha por objeto esse bem jurídico maior da liberdade física do sentenciado.
Pelo que é vedado subtrair da instâ ncia julgadora a possibilidade de se
movimentar com certa discricionariedade nos quadrantes da alternatividade
sancionató ria.
3. As penas restritivas de direitos sã o, em essência, uma alternativa aos efeitos
certamente traumá ticos, estigmatizantes e onerosos do cá rcere. Nã o é à toa
que todas elas sã o comumente chamadas de penas alternativas, pois essa é
mesmo a sua natureza: constituir-se num substitutivo ao encarceramento e
suas seqü elas. E o fato é que a pena privativa de liberdade corporal nã o é a
ú nica a cumprir a funçã o retributivo-ressocializadora ou restritivo-preventiva
da sançã o penal. As demais penas também sã o vocacionadas para esse
geminado papel da retribuiçã o-prevençã o-ressocializaçã o, e ninguém melhor
do que o juiz natural da causa para saber, no caso concreto, qual o tipo
alternativo de reprimenda é suficiente para castigar e, ao mesmo tempo,
recuperar socialmente o apenado, prevenindo comportamentos do gênero.
4. No plano dos tratados e convençõ es internacionais, aprovados e
promulgados pelo Estado brasileiro, é conferido tratamento diferenciado ao
trá fico ilícito de entorpecentes que se caracterize pelo seu menor potencial
ofensivo. Tratamento diferenciado, esse, para possibilitar alternativas ao
encarceramento. É o caso da Convençã o Contra o Trá fico Ilícito de
Entorpecentes e de Substâ ncias Psicotró picas, incorporada ao direito interno
pelo Decreto 154, de 26 de junho de 1991. Norma supralegal de hierarquia
intermediá ria, portanto, que autoriza cada Estado soberano a adotar norma
comum interna que viabilize a aplicaçã o da pena substitutiva (a restritiva de
direitos) no aludido crime de trá fico ilícito de entorpecentes.
5. Ordem parcialmente concedida tão-somente para remover o óbice da
parte final do art. 44 da Lei 11.343/2006, assim como da expressão
análoga “vedada a conversão em penas restritivas de direitos”, constante
do § 4º do art. 33 do mesmo diploma legal. Declaração incidental de
inconstitucionalidade, com efeito ex nunc, da proibição de substituição
da pena privativa de liberdade pela pena restritiva de direitos;
determinando-se ao Juízo da execução penal que faça a avaliação das
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condições objetivas e subjetivas da convolação em causa, na concreta
situação do paciente.
(HC 97256 / RS. Relator(a):  Min. AYRES BRITTO Julgamento: 
01/09/2010. Órgão Julgador:  Tribunal Pleno. Publicação 16-12-2010)

TRÁ FICO DE ENTORPECENTES. MINORANTE DO ART. 33, § 4º, DA LEI N.


11.343/2006. APLICAÇÃ O DA FRAÇÃ O MÁ XIMA. POSSIBILIDADE DE
IMPOSIÇÃ O DE REGIME PRISIONAL DIVERSO DO FECHADO. REGIME INICIAL
ABERTO E SUBSTITUIÇÃ O DA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS
DE DIREITOS.
1. A escolha do redutor previsto no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 deve
ser feita de forma motivada e proporcional, levando em conta, também, a
quantidade, a natureza e a qualidade de droga apreendida.
2. No caso, inexistindo circunstâ ncias desfavorá veis, fixada a pena-base no
mínimo legal e apreendida pequena quantidade de droga (5,51 gramas de
cloridrato de cocaína, acondicionados em vinte e dois invó lucros de papel de
alumínio), nã o é razoá vel a reduçã o em apenas 1/3 (um terço) da pena. Esse
conjunto de fatores justifica a aplicaçã o da fraçã o de 2/3 (dois terços), redutor
mais condizente com a realidade posta nos autos.
3. Considerando a quantidade de pena aplicada (um ano e oito meses de
reclusão), a primariedade do réu e as demais circunstâncias favoráveis,
cabível o estabelecimento do regime aberto para o cumprimento da
privativa de liberdade.
4. A Sexta Turma reconhece a possibilidade de conversão de pena
também aos condenados por tráfico de entorpecentes em casos como o
dos autos. Há também precedente do Supremo nesse sentido. Do STJ, HC
n. 118.776/RS, Relator Ministro Nilson Naves, DJe de 23/8/2010; e do
STF, HC n. 97.256/RS, Relator Ministro Ayres Britto, DJe de 16/12/2010.
5. Habeas corpus concedido para a reduçã o das penas aplicadas ao paciente a
um ano e oito meses de reclusã o e cento e sessenta e sete dias-multa,
estabelecer o regime aberto para o cumprimento da reprimenda e substituir a
privativa de liberdade por prestaçã o de serviços à comunidade e limitaçã o de
fim de semana.
(Processo HC 141360. Relator Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR
CONVOCADO DO TJ/SP) (8175) Ó rgã o Julgador T6 - SEXTA TURMA Data do
Julgamento 12/04/2011 Data da Publicaçã o/Fonte DJe 02/05/2011)

Neste sentido, imperioso ressaltar, ainda, que recentemente o Senado


Federal publicou a Resolução nº 5, de 2012, suspendendo, nos termos do art. 52, inciso
X, da Constituição Federal, a execução de parte do § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343, de 23
de agosto de 2006.

Desse modo, desde o dia 16/02/2012, a parte final do § 4º do art. 33 da


Lei n.° 11.343/2006 não mais existe no mundo jurídico, ou seja, o referido artigo deverá
ser agora lido assim:

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“Art. 33. (...)

§ 4o Nos delitos definidos no caput e no § 1o deste artigo, as penas poderão ser


reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de
direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique
às atividades criminosas nem integre organização criminosa.”

Em suma, nã o mais existe, na legislaçã o brasileira, vedaçã o para que o juiz, ao


condenar o réu pelo "trá fico privilegiado" (art. 33, com a reduçã o do § 4º da Lei de Drogas),
substitua a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos.

Isso quer dizer que nem com eventual sentença o paciente, primá rio, terá sua
segregaçã o social decretada - revela, portanto, verdadeiro contrassenso a sua prisã o
processual, já que, nem ao fim será encarcerado.

Foi percebendo tal absurdo que o legislador editou a Lei 12.403/2011, que
altera, em parte, o  Có digo de Processo Penal, especialmente no que se refere à prisã o
processual, fiança, liberdade provisó ria e outras medidas cautelares.

Frisa-se que referido diploma legal vem ao encontro da idéia da prisã o


processual como sendo a ultima ratio, isto é, a ú ltima opçã o ou alternativa, como medida
extrema, nos moldes como vem sendo defendida pela doutrina penal e criminoló gica moderna.

Com efeito, a lei 12.403/11, cujo propó sito principal é tentar corrigir os
excessivos e abusivos decretos de prisã o preventiva, encampou a idéia de que a prisã o, antes
do trâ nsito em julgado da sentença condenató ria, deve ser reservada à s situaçõ es em que, de
fato e devidamente comprovado e fundamentando, nã o for possível a substituiçã o por outra
medida cautelar, medidas estas previstas, agora, no artigo 319 do Có digo de Processo Penal.

Em suma, a nova lei se resume na observaçã o do princípio da presunçã o da


inocência: simplesmente coloca o diploma processual penal em sintonia com a Constituiçã o
Federal, no sentido de que a prisã o processual apenas e tã o-somente poderá ser decretada,
caso realmente nã o haja outro meio para garantir a satisfaçã o da futura e eventual tutela
jurisdicional. Conforme a Carta Magna, a liberdade é a regra, e a prisã o, a exceçã o.

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Ainda, de acordo com o jurista Luiz Flá vio Gomes, a prisã o preventiva nã o é
apenas a ultima ratio. Ela é a extrema ratio da ultima ratio. A regra é a liberdade; a exceçã o sã o
as cautelares restritivas da liberdade (art. 319, CPP). (Prisã o e Medidas cautelares –
Comentá rios à Lei 12.403/2011. Sã o Paulo: RT, 2011.)

Fernando Pereira Neto, por seu turno, traçando críticas positivas à nova lei,
afirma: “O que faz a nova lei, em apertada síntese, é simplesmente efetivar o tão badalado
princípio da presunção de inocência consagrado em nossa Constituição. A reforma da Lei
12.403 elimina a péssima cultura judicial do país de prender cautelarmente os que são
presumidos inocentes pela Constituição Federal, tendo como base, única e exclusivamente,
a opinião subjetiva do julgador a respeito da gravidade do fato.” (FERNANDO PEREIRA
NETO, http://rionf.com.br/archives/1187). (g.n.).

Por fim, imperioso observar que a vedaçã o imposta pelo art. 44 da Lei nº
11.343/06 nã o é também fundamento suficiente para se negar a liberdade provisó ria ao
paciente. Vem se entendendo continuamente, tanto em doutrina quanto em jurisprudência,
que o supracitado dispositivo feriria patentemente a presunçã o de inocência, a garantia do
devido processo legal e o pró prio princípio da proporcionalidade, consagrados na Constituiçã o
Federal Aliá s, vale mencionar recente julgado do STF, em que o Ministro Celso de Mello
reconhece a inconstitucionalidade da norma em questã o:

“Essa vedaçã o apriorística de concessã o de liberdade provisó ria, reiterada no


artigo 44 da Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas), tem sido repelida pela
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que a considera incompatível,
independentemente da gravidade objetiva do delito, com a presunção de
inocência e a garantia do due process, dentre outros princípios
consagrados pela Constituiçã o da Repú blica”2. (Negrito nosso)

E tanto o Superior Tribunal de Justiça quanto o Supremo Tribunal Federal já


decidiram recentemente que tal proibiçã o (inconstitucional) foi revogada com o advento da Lei
11.464/2007. Vejamos :

“Processo Penal. Trá fico de drogas. Liberdade provisó ria. Possibilidade.


Vedaçã o legal do art. 44 da L. 11.343/06 que deve ser afastada. A gravidade
abstrata do delito atribuído ao agente é insuficiente para a manutençã o de sua
prisã o provisó ria, sob pena de afronta à garantia constitucional de presunçã o

2
Med. Caut. em HC 96.715-9/SP
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de não-culpabilidade. Precedentes. Da mesma forma, a invocação da
repercussão social do delito não se presta para a justificação da
constrição cautelar, sob pena de antecipação do cumprimento da
reprimenda, vedada pelo ordenamento jurídico pátrio notadamente
quando a quantidade de drogas encontrada em poder dos agentes não se
mostra expressiva. Precedentes. Unicamente a vedação legal contida no
artigo 44 da Lei 11.343/2006 é insuficiente para o indeferimento da
liberdade provisória, notadamente em face da edição da Lei
11.464/2007, posterior e geral em relação a todo e qualquer crime
hediondo e/ou assemelhado. Precedentes. Dado provimento ao recurso para
deferir ao recorrente os benefícios da liberdade provisó ria” (STJ – 6ª T. – RHC
24.349 – rel. Jane Silva – j. 11.11.2008 – DJU 01.12.2008)

EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL, PROCESSUAL PENAL E CONSTITUCIONAL.


TRÁ FICO DE ENTORPECENTES. SEGREGAÇÃ O CAUTELAR. GARANTIA DA
ORDEM PÚ BLICA. AUSÊ NCIA DE INDICAÇÃ O DE SITUAÇÃ O FÁ TICA.
LIBERDADE PROVISÓ RIA INDEFERIDA COM FUNDAMENTO NO ART. 44 DA
LEI N. 11.343. INCONSTITUCIONALIDADE: NECESSIDADE DE ADEQUAÇÃ O
DESSE PRECEITO AOS ARTIGOS 1º, INCISO III, E 5º, INCISOS LIV E LVII DA
CONSTITUIÇÃ O DO BRASIL. EXCEÇÃ O À SÚ MULA N. 691/STF. 1. Liberdade
provisó ria indeferida com fundamento na vedaçã o contida no art. 44 da Lei n.
11.343/06, sem indicaçã o de situaçã o fática vinculada a qualquer das
hipó teses do artigo 312 do Có digo de Processo Penal 2. Entendimento
respaldado na inafiançabilidade do crime de trá fico de entorpecentes,
estabelecida no artigo 5º, inciso XLIII da Constituiçã o do Brasil. Afronta
escancarada aos princípios da presunçã o de inocência, do devido processo
legal e da dignidade da pessoa humana. 3. Inexistência de antinomias na
Constituiçã o. Necessidade de adequaçã o, a esses princípios, da norma
infraconstitucional e da veiculada no artigo 5º, inciso XLIII da Constituiçã o do
Brasil. A regra estabelecida na Constituiçã o, bem assim na legislaçã o
infraconstitucional, é a liberdade. A prisã o faz exceçã o a essa regra, de modo
que, a admitir-se que o artigo 5º, inciso XLIII estabelece, além das restriçõ es
nele contidas, vedaçã o à liberdade provisó ria, o conflito entre normas estaria
instalado. 4. A inafiançabilidade nã o pode e nã o deve --- considerados os
princípios da presunçã o de inocência, da dignidade da pessoa humana, da
ampla defesa e do devido processo legal --- constituir causa impeditiva da
liberdade provisó ria. 5. Nã o se nega a acentuada nocividade da conduta do
traficante de entorpecentes. Nocividade aferível pelos malefícios provocados
no que concerne à saú de pú blica, exposta a sociedade a danos concretos e a
riscos iminentes. Nã o obstante, a regra consagrada no ordenamento jurídico
brasileiro é a liberdade; a prisã o, a exceçã o. A regra cede a ela em situaçõ es
marcadas pela demonstraçã o cabal da necessidade da segregaçã o ante tempus.
Impõ e-se porém ao Juiz o dever de explicitar as razõ es pelas quais alguém deva
ser preso ou mantido preso cautelarmente. 6. Situaçã o de flagrante
constrangimento ilegal a ensejar exceçã o à Sú mula n. 691/STF. Ordem
concedida a fim de que o paciente seja posto em liberdade, se por al nã o estiver
preso. (STF – HC 100745/SC – Min. Rel. Eros Grau. DJ em 09/03/2010)

Outrossim, imperioso frisar que o Plenário do Supremo Tribunal Federal,


em 10 de maio de 2012, reconheceu, incidenter tantum, a inconstitucionalidade da
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vedação da liberdade provisória no tráfico de drogas, em razão da ofensa direta ao
princípio da presunção de inocência.

Neste sentido3:

“O relator do caso, ministro Gilmar Mendes, afirmou em seu voto que a regra
prevista na lei ‘é incompatível com o princípio constitucional da
presunção de inocência e do devido processo legal, dentre outros
princípios’.
O ministro afirmou ainda que, ao afastar a concessã o de liberdade provisó ria
de forma genérica, a norma retira do juiz competente a oportunidade de, no
caso concreto, ‘analisar os pressupostos da necessidade do cá rcere cautelar em
inequívoca antecipaçã o de pena, indo de encontro a diversos dispositivos
constitucionais’.
Segundo ele, a lei estabelece um tipo de regime de prisã o preventiva
obrigató rio, na medida em que torna a prisã o uma regra e a liberdade uma
exceçã o. O ministro lembrou que a Constituiçã o Federal de 1988 instituiu um
novo regime no qual a liberdade é a regra e a prisã o exige comprovaçã o
devidamente fundamentada.
Nesse sentido, o ministro Gilmar Mendes indicou que o caput do artigo 44
da Lei de Drogas deveria ser considerado inconstitucional, por ter sido
editado em sentido contrá rio à Constituiçã o. Por fim, destacou que o pedido de
liberdade do acusado deve ser analisado novamente pelo juiz, mas, desta vez,
com base nos requisitos previstos no artigo 312 do Có digo de Processo Penal”.

Ante todo o exposto, ausentes os requisitos necessá rios à manutençã o da


custodia, de rigor a revogaçã o da prisã o preventiva, expedindo-se em favor do paciente o
competente alvará de soltura.

II. Da Ordem Liminar

Apontada a ofensa à liberdade de locomoçã o do paciente, encontra-se


presente, in casu, o fumus boni iuris.

No mesmo sentido, verifica-se a ocorrência do periculum in mora, pois a


liberdade do paciente, primário, somente ao final importará em inaceitá vel e temerá ria
manutençã o de violaçã o ao seu status libertatis.

3
Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=207130, acesso 11/05/2012.
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Presentes, portanto, os requisitos autorizadores da medida liminar.

III. Do Pedido

Ante todo o exposto, não restando devidamente caracterizado o crime de


trá fico de drogas, requer a impetrante a concessã o LIMINAR da ordem, para que seja relaxada
a prisã o do paciente, com a imediata expediçã o de alvará de soltura em favor deste. Requer,
outrossim, seja o presente pedido de habeas corpus julgado procedente ao final, confirmando-
se a decisã o liminar.

Caso nã o seja este o entendimento deste E. Tribunal requer-se a concessã o


liminar da ordem, para que seja revogada a prisã o preventiva, ante à ausência dos requisitos
necessá rios à manutençã o da prisã o cautelar. Requer, ainda, seja o presente pedido de habeas
corpus julgado procedente ao final, confirmando-se a decisã o liminar.

Subsidiariamente, requer seja aplicada qualquer das medidas cautelares


previstas no artigo 319 do Có digo de Processo Penal, de forma preferencial, aquela consistente
no comparecimento perió dico em Juízo, de forma a privilegiar a ulima ratio da Lei
12.403/2011: a prisã o processual como medida extrema, nos moldes como vem sendo
defendido pela doutrina penal e criminoló gica moderna.

Requer-se, por derradeiro,  quando do julgamento do presente writ pela


Douta Turma Julgadora, caso já haja sentença condenatória proferida pela autoridade
coatora e sendo mantido encarcerado o paciente, seja   a ele concedido o direito de
apelar em liberdade, pelos idênticos motivos expostos na presente impetração.

Nesses termos, pede deferimento.

Sã o Paulo, 05 de setembro 2012.

Luciana de Oliveira Marçaioli


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Defensora Pública

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