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NEUROPSICOPATOLOGIAS

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Sumário
NOSSA HISTÓRIA .................................................................................. 2

A neuropatologia correlata às esquizofrenias .......................................... 3

Lesões estruturais e funcionais do encéfalo associadas a síndromes


psicóticas semelhantes às esquizofrenias ...................................................... 3
Síndromes psicóticas induzidas por drogas............................................. 6

Alterações neurobiológicas associadas às esquizofrenias................... 7


Achados neuropatológicos nas esquizofrenias .................................. 11
Neuropsicopatologia dos Núcleos da Base ........................................... 13

Organização e Função dos Circuitos Fronte estriado-Pálido-Talam


corticais......................................................................................................... 14
Circuitos Frontoestriatais Não-Motores E Transtornos
Neuropsicopatológicos.................................................................................. 16
Coréia de Sydenham: Um Modelo Autoimune de Disfunção de
diferentes Circuitos Frontoestriatals.............................................................. 19
Neuropsicopatologia das endocrinopatias ............................................. 21

Referencias............................................................................................ 40

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NOSSA HISTÓRIA

A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de


empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de
Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como
entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior.

A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de


conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a
participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua
formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais,
científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o
saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação.

A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma


confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica,
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido.

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A neuropatologia correlata às esquizofrenias
Os neurobiólogos, em seu entusiasmo, consideram-nas amplamente
reconhecidas como doença cerebral.

Lesões estruturais e funcionais do encéfalo associadas a


síndromes psicóticas semelhantes às esquizofrenias

Sabe-se que numerosas condições clínicas produzem sintomas psicóticos


que se assemelham às esquizofrenias. Estas observações geraram muitas
hipóteses relativas à "disfunção" cerebral, que poderiam elucidar a sua
neuropatologia correlata.

1. Anormalidades genéticas

Sabe-se que várias doenças genéticas estabelecidas, além de produzir


anomalias físicas, produzem sinais e sintomas psicóticos que muito se asseme-
lham às esquizofrenias.

2. Transtornos congênitos do desenvolvimento nervoso

Várias anomalias neurológicas congênitas foram correlacionadas com


sintomas psicóticos, incluindo agenesia do corpo caloso, estenose do aqueduto,
cistos aracnídeos, porencefalia, hamartoma cerebral e cavum do septo pelúcido.
Relatos dessas associações trazem apoio à hipótese neurodesenvolvimento das
esquizofrenias, que postula que está se associa à ruptura de processos básicos
do neurodesenvolvimento como a proliferação, migração e eliminação de
neurônios durante a vida fetal, especialmente durante o crítico segundo
trimestre.

3. Complicações perinatais

A pesquisa sugere que lesões neurológicas, resultantes de complicações


da gravidez e do parto, associam-se a psicoses esquizofrênicas na vida adulta.
Postula-se que as complicações perinatais podem perturbar a estrutura e o
funcionamento do cérebro de um modo que facilita o desenvolvimento de
percepções, pensamentos e comportamento psicóticos. Por exemplo, a

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interferência com a migração neuronal no hipocampo (que é especialmente
sensível à hipóxia no segundo trimestre), pode levar à hipoplasia grosseira da
formação hipocampal e à histoarquitetura aberrante das células piramidais em
partes do hipocampo. Autores demonstraram que a exposição do feto à influenza
durante o segundo trimestre se associa a um aumento do risco de desenvol-
vimento das esquizofrenias. Lesões cerebrais perinatais podem contribuir para
o espectro heterogêneo da síndrome esquizofrênica, e podem auxiliar a explicar
a sua discordância em gêmeos monozigóticos e variações na idade de início dos
sintomas deficitários e seu curso.

4. Transtornos neurológicos na infância e na vida adulta

Relataram-se muitos transtornos neurológicos como ocasionalmente


associados a sinais e sintomas psicóticos. Transtornos neurológicos que podem
se apresentar com psicose:

4a. Epilepsia. Uma frequência maior de psicose é observada em


pacientes com epilepsia do que seria esperado na população em geral. Isso é
especialmente verdadeiro para focos no lobo temporal esquerdo, uma
observação que levou-se a postular uma disfunção lateralizada para a esquerda
na esquizofrenia. Autores demonstraram que, mesmo na epilepsia crônica do
lobo temporal, a psicose esquizofreniforme não ocorria ao acaso. Ao invés, a
psicose a) estava significativamente associada a lesões que se originaram na
vida fetal, b) apresentava neurônios afetados no lobo temporal mediaI, e c)
produzia a primeira crise em idade precoce.

4b. Traumatismo cerebral. Muitos estudos de psicoses subsequentes a


traumatismo de crânio foram relatados. Traumatismos dos lobos frontal e
temporal parecem ter mais possibilidade de produzir características psicóticas,
com a lesão do lobo temporal esquerdo produzindo sintomas positivos e a do
frontal produzindo principalmente sintomas negativos.

4c. Tumores cerebrais. Muitos pacientes psicóticos morreram em


instituições de internamento prolongado com tumores cerebrais à necropsia; os
tumores nas áreas temporal, hipofisária, supra selar e supratemporal têm uma
tendência particular a produzir aspectos esquizofreniformes. Tumores do terceiro

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ventrículo têm forte semelhança com a esquizofrenia catatônica; alucinações e
delírios são mais prováveis com tumores temporais, frontais e hipofisários.

4d. infecções do cérebro. Vários tipos de encefalites foram associados a


sintomas psicóticos, como as sequelas da encefalite letárgica epidêmica em
1920, a Coréia de Syndenham-pós-reumática e a sífilis.

4e. Doenças neurodegenerativas. Sabe-se que sintomas psicóticos


acompanham ou são um aspecto principal das doenças dos gânglios da base,
bem como de outras doenças degenerativas (por exemplo, doença de Alzheimer,
doença de Pick, atrofia óptica hereditária de Leber).

4f. Doenças desmielinizantes. Até 50% dos pacientes com esclerose


múltipla exibem sintomas psiquiátricos, incluindo psicose.

4g. Narcolepsia. Tem sido relatado seguidamente que esta doença do


ciclo sono-vigília, do sono com movimentos rápidos dos olhos (REM) manifesta
alucinações hipnagógicas do sono, que eram consideradas sintomas psicóticos.

4h. Doença cerebrovascular. Delírios paranoides e experiências


alucinatórias foram associados à hemorragia subaracnóide, embolia gordurosa,
oclusão bilateral da artéria carótida, malformações arteriovenosas, acidente
vascular cerebral e hematoma subdural.

5. Doenças sistêmicas

Muitas doenças clínicas sistêmicas influenciam a função cerebral


fisiológica e/ou metabolicamente, e podem produzir sintomas psicopatológicos.
Foi relatado ser comum uma doença física no início de psicoses catatônicas.
Doenças clínicas que podem produzir manifestações psicóticas:

5a. Infecções. Infecções que envolvem o tecido cerebral podem resultar


em sintomas psicóticos.

5b. Doenças inflamatórias. Doenças inflamatórias, como a cerebrite,


podem produzir sintomas psicóticos.

5c. Endocrinopatias. Essas incluem a doença de Addison, o


hipotireoidismo, o hipertireoidismo, o hipoparatireoidismo, o hiperparatireoidismo
e o hipohipofisarismo.

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5d. Doenças clínicas sistêmicas. Essas doenças incluem insuficiência
renal e uremia, encefalopatia hepática, hiponatremia, hipercalcemia, hipo-
glicemia e miastenia gravis.

5e. Estados de deficiência nutricional. Deficiências de tiamina, a vitamina


B1 (síndrome de Wernicke-Korsakoff), vitamina B12 e folato (anemia
megaloblástica) e niacina também podem produzir manifestações psicóticas.

Síndromes psicóticas induzidas por drogas

Reconhece-se que numerosas reações psicóticas observadas na clínica


são associadas ao uso de drogas ilícitas e drogas de prescrição médica. Al-
gumas psicoses induzidas por drogas ilícitas são quase indistinguíveis da
esquizofrenia (como as psicoses pelas anfetaminas e pela fenilciclidina [PCP]),
enquanto outras podem produzir síndromes psicóticas parciais inespecíficas,
algumas vezes com aspectos tóxico-orgânicos. Classes de drogas que podem
produzir síndromes psicóticas:

1. Estimulantes. Os estimulantes que podem produzir manifestações


psicóticas incluem anfetamina, cocaína e metilfenidato (Ritalina). Acredita-se
que seu mecanismo de ação seja via liberação de dopamina ou efeitos de seus
agonistas.

2. Alucinógenos. Os alucinógenos, como a dietilamida do ácido lisérgico


(LSD-25), a mescalina, a psilocibina e a dimetiltriptamina, geralmente, produzem
alucinações visuais e comportamento bizarro.

3. Fenilciclidina. O PCP, conhecida como pé-de-anjo, produz uma mistura


de sintomas positivos e negativos que são indistinguíveis da esquizofrenia
crônica.

4. Drogas catecolaminérgicas. Essas incluem a levo dopa (L-dopa), a


amantadina e a efedrina.

5. Anticolinérgicos. Numerosas drogas psicotrópicas têm atividade


anticolinérgica, incluindo os antidepressivos tricíclicos (ATC) e agentes
antiparkinsonianos, por exemplo, triexafenidil (Artane) e benzotropina.

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6. Depressores do SNC. Esses incluem o álcool e os benzodiazepínicos
hipno-indutores.

7. Glicocorticoides. Os glicocorticoides podem exagerar uma psicose


preexistente ou, em doses suficientes, produzir sintomas psicóticos em uma
pessoa não-psicótica.

8. Metais pesados. Os metais pesados que podem produzir síndromes


psicóticas incluem o chumbo, mercúrio, manganês, arsênico e tálio.

9. Outros. Outras drogas que podem produzir manifestações psicóticas


incluem a digital (Digoxina), o dissulfiram (Antietanol), a cimetidina (Tagamet) e
os brometos.

Alterações neurobiológicas associadas às esquizofrenias


A maioria dos sinais e sintomas psíquicos das esquizofrenias são
consistentes com anormalidades "neurológicas".

1. Alterações cerebrais regionais in vivo nas esquizofrenias

A aplicação da tomografia computadorizada (TC) e ressonância


magnética (RM) ao estudo in vivo do cérebro levou à descoberta de várias anor-
malidades estruturais regionais nas esquizofrenias. De modo similar, o
desenvolvimento e uso do exame do fluxo sanguíneo cerebral regional (PSCr),
da tomografia computadorizada por emissão de fótons isolados (TEFI) e da
tomografia por emissão de pósitrons (TEP) acrescentaram novas informações
significativas sobre os transtornos funcionais de certas regiões do cérebro nas
esquizofrenias. Faço a seguir, um resumo das patologias estruturais e/ou
funcionais de várias regiões do cérebro associadas às esquizofrenias.

1a. Sistema ventricular. Estudos demonstram uma dilatação


significativamente patológica do sistema ventricular cerebral nas esquizofrenias,
particularmente dos ventrículos laterais e do terceiro ventrículo. Esse aumento
ventricular tornou-se um dos achados neurobiológicos mais bem estabelecidos
nas esquizofrenias, implicando a perda de tecido cerebral nas regiões Peri
ventriculares em muitos pacientes, embora não em todos.

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Clinicamente demonstra-se que a ventriculomegalia não está
consistentemente relacionada com o(s) tratamento(s) recebido(s) ou com a dura-
ção da doença. Muitos estudos demonstraram uma correlação entre a
ventriculomegalia e certas variáveis clínicas, incluindo complicações obstétricas,
ajustamento pré-mórbido deficiente, história familiar de psicose, perturbação
neuropsicológica, má resposta às drogas neurolépticas, sintomas negativos pro-
eminentes e a presença de movimentos involuntários. Contudo, outros estudos
falharam em achar correlações com várias destas variáveis clínicas.

Várias correlações biológicas da ventriculomegalia nas esquizofrenias


também foram relatadas, incluindo aumento da serotonina e aminoácidos no
sangue e no líquor (LCR); ácido 5-hidroxiindolacético (5-HIAA) no LCR, ácido
homovanílico (HV A), ácido diidroxifenilacético (DOPAc), adenosina monofosfato
cíclica (AMPc) e hidroxilase beta da dopamina (DBH); dificuldade no seguimento
suave com movimentos dos olhos; sinais neurológicos leves; diminuição do sono
de ondas lentas; atenuação temporal da onda auditiva (P300) e falta da relação
inversa da prolactina sérica com escores de psicose.

Embora o aumento ventricular não seja específico das esquizofrenias, tem


aqui um significado especial para a patogênese e a evolução clínica. A pesquisa
tem-se concentrado em determinar se a ventriculomegalia nas esquizofrenias é
estática ou progressiva. Autores não encontraram diferenças no tamanho médio
dos ventrículos após 3 anos, sugerindo que a dilatação ventricular é estática,
indicando assim a probabilidade maior de lesão no neurodesenvolvimento do
que uma lesão degenerativa. Embora esse achado tenha sido corroborado por
outros, dados recentes demonstraram progressão no tamanho dos ventrículos
em, pelo menos, um subgrupo de pacientes esquizofrênicos.

1b. Cérebro e crânio. Demonstrou-se que os pacientes esquizofrênicos


têm crânios e cérebros menores, no corte mediossagital pela RM. Peso cerebral
menor na esquizofrenia (uma redução de 5-8%) também foi relatado em
estudos post-mortem verificaram que a redução do tamanho do cérebro nas
esquizofrenias é particularmente pronunciado em pacientes com história familiar
de esquizofrenia. De modo geral, os achados de cérebro e crânio menores em
pacientes com esquizofrenia são consistentes com um transtorno de

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crescimento e neurodesenvolvimento, possivelmente mais sob controle genético
programado do que por agressão ambiental incidental.

1c. Alargamento dos sulcos. Estudos confirmaram a presença de


alargamento dos sulcos e fissuras corticais nas esquizofrenias. Correlações
clínicas com o alargamento dos sulcos corticais incluem deficiência cognitiva,
sintomas negativos e pouca resposta à terapia antipsicótica. Além disso,
verificou-se que a proeminência dos sulcos pré-frontais está inversamente re-
lacionada com a resposta à clozapina (Leponex) na esquizofrenia crônica.

1d. Atrofia do vermis cerebelar. Estudos relataram uma frequência mais


alta do que parece ser uma "atrofia" do cerebelo (alargamento dos sulcos
do vermis, aumento do quarto ventrículo e das cisternas cerebelares). De modo
geral, cerca de 9% dos pacientes esquizofrênicos, em comparação com 4% de
controles, exibem estas alterações cerebelares, que se relatou também estarem
associadas a um aumento do terceiro ventrículo.

1e. Assimetrias cerebrais reversas. Os estudos com TC, examinando a


assimetria dos hemisférios cerebrais nas esquizofrenias, relataram assimetrias
estruturais do cérebro anormais nas esquizofrenias, comparadas com
indivíduos-controle. O significado dessa anormalidade pode ser explicado pelo
transtorno do crescimento do hemisfério cerebral e o desenvolvimento das
esquizofrenias.

1f. Lobos frontais. A disfunção dos lobos frontais tem sido implicada na
esquizofrenia. Muitas das manifestações da esquizofrenia, tais como sintomas
negativos, incapacidade de planejamento, mau julgamento e cognição deficiente
foram atribuídas à disfunção do lobo frontal, devido à forte semelhança com a
síndrome que se segue à lesão dos lobos frontais. Contudo, embora haja alguma
evidência de anormalidades estruturais nos lobos frontais, em imagens de RM
na esquizofrenia, a maior parte da evidência para transtornos do lobo frontal em
pacientes esquizofrênicos é de perturbação do funcionamento.

Estudos de fluxo sanguíneo cerebral (FSC) e de TEP indicaram uma


diminuição relativa no fluxo sanguíneo e no metabolismo da glicose no lobo
frontal, mas a cronicidade e/ou uso de neurolépticos foram implicados nesta
"hipofrontalidade". Foi demonstrado que com a inalação de xenônio 133 que o

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FSCr no córtex pré-frontal dorsolateral (CPFDL) estava significativamente
reduzido em pacientes esquizofrênicos versus sujeitos-controle, durante o
desempenho do teste de classificação de cartões de Wisconsin ( Wisconsin Card
Sorting test – WCS), que presumivelmente ativa o CPFDL.

Os lobos frontais são muito importantes na neuropatologia das


esquizofrenias. Contudo, necessitamos aprender muito mais sobre sua estrutura
e função antes que seu papel seja definido. Em vista das extensas projeções
entre os lobos frontais e muitas outras regiões do cérebro, não é possível concluir
atualmente se a perturbação de funções dos lobos frontais nas esquizofrenias
está relacionada a uma lesão primária ou secundária.

1g. Lobos temporais. Além da associação entre as psicoses


esquizofreniformes e lesões no lobo temporal (por exemplo, epilepsia, tumores,
traumatismo e infartos), a literatura na localização de sintomas psicóticos sugere
que os delírios e alucinações de Kurt Schneider, comumente observados nas
esquizofrenias, podem refletir patologia do lobo temporal, especialmente nas
áreas temporolímbicas. O lobo temporal medial está emergindo como uma
estrutura-chave na neurobiologia das esquizofrenias, por suas importantes
conexões com áreas corticais superiores. Anormalidades morfológicas
grosseiras dos lobos temporais têm sido reveladas em imagens de TC e RM em
pacientes esquizofrênicos, incluindo redução da substância cinzenta temporal,
do tamanho do lobo temporal esquerdo, aumento do corno temporal, redução do
volume límbico temporal e atrofia cortical focal temporal.

1h. Gânglios da base. Nestes últimos 30 anos, a hipótese da


dopaminérgica das esquizofrenias foi o principal modelo patofisiológico para
essa doença. Em vista das maiores proporções de dopamina se encontrarem
nos gânglios da base, é lógico considerar os gânglios da base como um
importante componente da neurobiologia das esquizofrenias. Além disso, sabe-
se que doenças dos gânglios da base como a Coréia de Huntington, que produz
degeneração do núcleo estriado, associa-se a uma psicose esquizofreniforme.
Além de atribuir anormalidades motoras das esquizofrenias à patologia dos
gânglios da base, outros parâmetros como recompensa, memória, atenção e
funções cognitivas superiores também foram associados aos gânglios da base
e suas projeções corticais. Mais recentemente, a pesquisa com TEP demonstrou

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que os gânglios da base podem estar metabolicamente hiperativos nas
esquizofrenias não-medicadas, e uma possível relação dessa anormalidade com
o transtorno do pensamento foi proposta.

1i. Lobos parietais. Alguns relatos sugeriram que os lobos parietais


possam estar perturbados nas esquizofrenias. É feita uma referência particular
ao papel do lóbulo parietal inferior na atenção seletiva. Além disso, alguns
sintomas das esquizofrenias, como a discriminação tátil e distorções da imagem
corporal, a "fisionomização" do ambiente e o não-reconhecimento facial, podem
estar associados à disfunção do lobo parietal na esquizofrenia.

1j. Corpo caloso. Há mais de 30 anos tem se relatado um corpo caloso


mais espesso nos cérebros post-mortem de pacientes esquizofrênicos, têm
havido numerosos estudos post-mortem e in vivo com RM, alguns revelando
patologia e outros não. Uma ampla literatura sobre comunicações e integração
inter-hemisféricas foi estimulada pela possibilidade de um canal perturbado nas
esquizofrenias.

Achados neuropatológicos nas esquizofrenias

Estudos histopatológicos post-mortem do cérebro nas esquizofrenias


produziram muito poucos achados consistentes até a década de 70, levando a
se rotular com pessimismo a esquizofrenia como "cemitério dos
neuropatologistas". Contudo, nos anos 80, uma notável consistência emergiu
nos estudos neuropatológicos das esquizofrenias, por diferentes investigadores.
Esses estudos sugerem quase unanimemente que as esquizofrenias se
associam a um transtorno no neurodesenvolvimento, provavelmente no segundo
trimestre, indicado por alterações na histoarquitetura habitual do tecido cerebral
e na falha de certas células neuronais em migrar para sua localização final.

Embora alguns estudos neuropatológicos relatem aumento da glicose ou


degeneração celular nas esquizofrenias, a maioria dos estudos não o faz. Em
vista do tecido cerebral fetal não reagir à agressão com uma resposta glial até o
terceiro trimestre, postula-se que as lesões neuropatológicas nas esquizofrenias
ocorreram precocemente no desenvolvimento (primeiro e segundo trimestres).

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Achados recentes relativos a alterações macro e microscópicas no
cérebro de pacientes esquizofrênicos, indicam uma evidência crescente de um
contexto do neurodesenvolvimento para a neurobiologia e neuropsicopatologia
das esquizofrenias. Se os achados continuarem a ser replicados, ficará mais
provável que a base das alterações estruturais do cérebro está principalmente
sob controle genético, com alguma modulação por fatores do ambiente perinatal
e outros fatores que contribuem para a heterogeneidade da síndrome esquizo-
frênica. E bem possível que a lesão neurodesenvolvimental nas esquizofrenias
seja qualitativamente similar na maioria dos pacientes, mas quantitativamente
diferente através dos subtipos clínicos.

Embora a neuropsicopatologia exata das esquizofrenias permaneça um


mistério, indícios neurobiológicos estão se acumulando a passo rápido. Lesões
praticamente em todos os locais do cérebro foram associadas com psicoses
esquizofreniformes, sendo as lesões nas regiões frontal, temporal e límbica,
mais prováveis do que as outras na produção das manifestações psicóticas.
Várias linhas de evidência indicam agora a importância de fatores do
neurodesenvolvimento na esquizofrenia. Muitos dos achados neurobiológicos da
esquizofrenia podem ser explicados com um modelo do neurodesenvolvimento.
A pesquisa futura deverá enfocar fatores do neurodesenvolvimento, inclusive
genéticos e ambientais, na neurobiologia da esquizofrenia. Uma região par-
ticularmente promissora no presente é o lobo límbico temporal e suas projeções.

Entretanto, nós, psicólogos e psiquiatras continuamos vendo as


esquizofrenias como um desafio ao nosso conhecimento. É um verdadeiro poço
clínico sem fundo no qual, se o paciente não se encaixar em algum outro
diagnóstico, é lançado ao seu interior. O próprio autor do termo, o psiquiatra
suíço Eugen Bleuler, chamou-a de o Grupo das Esquizofrenias, tal a diversidade
de formas clínicas de como ela é descrita. Mas, não sejamos ortodoxos em
nossa heterodoxia em relação à neurociência. Percebam que o problema da
Relação Cérebro-Mente ganha enorme destaque neste dilema.

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Neuropsicopatologia dos Núcleos da Base
Os núcleos da base são uma série de agrupamentos neuronais, de origem
Telê encefálica, localizados na base do cérebro, na intimidade da substância
branca.

Anatomicamente, vários grupos neuronais telem cefálicos podem ser


considerados núcleos da base, mas, do ponto de vista funcional,
apenas o núcleo caudado, o putâmen e o globo pálido o podem. O conjunto do
caudado e do putâmen constitui o estriado. Existem ainda as porções ventrais
do estriado e do globo pálido, denominadas, respectivamente, estriado ventral,
representado pelo núcleo accumbens, e pálido ventral. A substância negra,
apesar da origem mesocefálica, e o núcleo subtalâmico, de origem diencefálica,
também são estudados como núcleos da base por comporem circuitos
funcionais com estes.

A partir de estudos clínicos e anatomopatológicos realizados em


pacientes com doenças de Wilson e de Huntington, condições hereditárias
marcadas por movimentos involuntários coreicos e/ou disfônicos,
correlacionaram-se inicialmente os núcleos da base a funções motoras. Nesses
pacientes, foram observadas significativas alterações degenerativas nos núcle-
os da base, sobretudo no estriado.

Estudos posteriores com outros distúrbios do movimento, como a doença


de Parkinson, corroboram o papel dos núcleos da base na função motora, sendo
estabelecido o conceito de sistema extrapiramidal. O termo extrapiramidal tem a
finalidade de contrapor-se ao sistema piramidal, representado pelo trato
corticoespinhal que passa pelas pirâmides bulbares e está envolvido no controle
voluntário dos movimentos. Apesar de a dicotomia piramidal/extrapiramidal ser
bastante discutível por questões anatômicas e funcionais, apresenta valor
heurístico na clínica neurológica, onde ainda é empregada.

Nas três últimas décadas, o envolvimento dos núcleos da base em


funções não-motoras vem sendo bastante valorizado. Vários trabalhos
estabeleceram cinco circuitos paralelos fronte-subcorticais (ou frontoestriado-
talamocorticais, ou apenas frontoestriatais), ligando determinadas áreas do
córtex frontal ao estriado, ao globo pálido e ao tálamo. Dois desses circuitos têm

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função motora e três, funções cognitivas e comportamentais. Ressalte-se que
funções cognitivas, classicamente atribuídas ao córtex frontal pela
neuropsicologia (função executiva, memória de trabalho e atenção seletiva),
estão, na realidade, associadas aos circuitos iniciados nesta área e que se
dirigem a estruturas subcorticais. Portanto síndromes neuropsicopatológicas
associadas originalmente a disfunções dos lobos frontais podem também ser
determinadas por lesões e/ou alterações em outros pontos subcorticais do
circuito, como estriado, putâmen e tálamo.

Organização e Função dos Circuitos Fronte estriado-Pálido-


Talam corticais
Os cinco circuitos fronte estriado-pálido-talam corticais têm uma
organização básica similar, apesar de diferenças anatômicas e funcionais. Os
circuitos originam-se em áreas distintas do córtex frontal. Os três circuitos
envolvidos com funções cognitivas são nomeados, inclusive, a partir do nome
destas áreas de origem. Assim, os circuitos dorsolaterais, orbito frontal e do
cíngulo anterior iniciam-se nas áreas correspondentes do córtex pré-frontal. Os
circuitos motores e oculomotor originam-se, respectivamente, na área motora
suplementar e no campo visual frontal.

Esses circuitos projetam-se primeiramente para o estriado, podendo ser


o putâmen, o caudado ou o estriado ventral (núcleo accumbens). O núcleo
putâmen participa do circuito motor, enquanto o núcleo caudado, dos demais
circuitos. O núcleo accumbens participaria de um sexto circuito, denominado
orbito frontal medial, que estaria relacionado anatômica e funcionalmente ao
circuito do cíngulo anterior, constituindo o circuito límbico ou medial.

Simplificadamente, o putâmen estaria envolvido com o funcionamento


motor, enquanto o caudado e o núcleo accumbens, com funções mais complexas
do comportamento. Entretanto, trabalhos definiram uma forma alternativa de
divisão do estriado baseada na coloração para acetilcolinesterase: o
compartimento matriz (80%) e o compartimento estrio soma (20%). O primeiro
participaria do processamento sensoriomotor e o segundo, das demais funções
atribuídas aos núcleos da base.

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As fibras provenientes do córtex cerebral são glutamatérgicas, portanto,
excitatórias; e fazem sinapse com o neurônio do estriado denominado célula
espinhosa média, que constitui cerca de 90% da população neuronal desse
núcleo. Sobre esse neurônio convergem fibras colinérgicas e gabaérgicas
provenientes de interneurônios estriatais e também fibras dopaminérgicas
originadas na parte compacta da substância negra (SNc). Tendo em perspectiva
a série de fibras que convergem para a célula espinhosa média, pode-se inferir
que esse neurônio constitui um importante sítio de processamento de
informações. No estriado, o circuito pode assumir uma via direta, conectando o
estriado ao segmento interno do globo pálido e à parte reticulada da substância
negra (GPi/SNr), ou uma via indireta, ligando o estriado ao segmento externo do
globo pálido (GPe), em seguida ao núcleo subtalâmico (NST) e, finalmente, à
GPi/SNr.

Ressalte-se que os neurônios estriatais que participam da via direta são


estimulados pelas fibras dopaminérgicas provenientes da SNc por possuírem
receptores do tipo D1, enquanto os envolvidos na via indireta, que expressam
receptores D2, são inibidos. As duas vias modulam a atividade talâmica.
Enquanto a primeira estimula o tálamo, a segunda inibe. Como há predomínio
da atividade nesta última, o funcionamento simultâneo das duas vias
determina ilhas de excitação no meio de áreas maiores de inibição da atividade
talâmica e, por conseguinte, do córtex cerebral. Esse funcionamento diferencial
e simultâneo das vias direta e indireta permite a focalização da atividade
neurônica cortical.

Como entender, então, o funcionamento do circuito motor? Classicamente


prevalecia o conceito de que os núcleos da base se correlacionavam com a
iniciação e a finalização dos movimentos. Entretanto estudos neurofisiológicos
questionaram o envolvimento do circuito motor dos núcleos da base na iniciação
do movimento. Isso porque a ativação dos neurônios dos núcleos da base ocorre
apenas após o início do movimento. Acredita-se atualmente que o circuito motor
participe da execução automática de sequências motoras, além de facilitar
movimentos desejados ou inibir movimentos indesejados conforme a ativação
das vias direta e indireta, respectivamente.

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A atividade inibitória preponderante dos núcleos da base sobre o tálamo
resultaria na inibição de movimentos indesejados, enquanto a atividade
facilitadora focalizada possibilitaria a execução do movimento pretendido. Assim,
os núcleos da base não seriam responsáveis pela geração ou iniciação dos
movimentos, que seriam funções do córtex cerebral e do cerebelo, mas pela
facilitação dos mesmos por supressão de movimentos conflitantes. Esse modelo
é respaldado pela fisiopatologia de transtornos do movimento, tanto
hipercinéticos como hipocinéticos.

Nos quadros de hemibalismo vascular, síndrome hipercinética


caracterizada por movimentos involuntários coreicos ou balísticos no hemicorpo,
há usualmente lesão isquêmica do núcleo subtalâmico, o que determina
hipoatividade na GPi/SNr e, portanto, menor inibição talâmica e maior ativação
ou liberação do córtex motor. Por sua vez, na doença de Parkinson, protótipo
clínico da síndrome hipocinética, existiria uma hiperatividade na
GPi/SNr, resultando em maior inibição talâmica e cortical. Nessa doença, a
hiperatividade na GPi/SNr seria determinada pela degeneração das fibras
dopaminérgicas originadas na SNc e que convergem para o estriado,
correlacionando-se com hiperatividade na via indireta e hipoatividade na via
direta.

Contudo existem alguns problemas com o atual modelo de funcionamento


dos núcleos da base. Por exemplo, ele não é capaz de explicar as significativas
diferenças entre os distintos movimentos involuntários hipercinéticos, como
Coréia, distonia e tiques. Não confere ainda justificativa para a eficácia da
palidotomia, que determina hipoatividade do segmento interno do globo pálido
(GPi), no tratamento das discinesias induzidas pela levo dopa na doença de
Parkinson.

Circuitos Frontoestriatais Não-Motores E Transtornos


Neuropsicopatológicos
O raciocínio proveniente dos circuitos motores pode ser extrapolado para
os circuitos não-motores frontoestriatais. Uma série de transtornos
neuropsicopatológicos caracterizados pela incapacidade de suprimir ou inibir
pensamentos ou comportamentos, como o transtorno de hiperatividade com

16
déficit de atenção (THDA), a síndrome de Tourette e o transtorno obsessivo-
compulsivo (TOC), estaria associada à disfunção dos circuitos frontoestriatais.
Isso porque esses circuitos seriam responsáveis pelo controle cognitivo, ou seja,
pela supressão de respostas cognitivas ou comportamentais conflitantes.

No caso de disfunção da via direta (ou facilitadora), poderia ocorrer


interrupção recorrente de comportamentos em curso ou da atenção,
determinando o THDA. O comprometimento da via indireta (ou inibitória) poderia
acarretar pensamentos intrusivos e/ou comportamentos repetitivos e irrefreáveis,
que caracterizam o TOC e a síndrome de Tourette. Alternativamente,
considerando-se a hipótese de hiperfunção das vias, o aumento da atividade na
via direta estaria associado a pensamentos e comportamentos repetitivos,
enquanto, na via indireta, à interrupção recorrente de comportamentos.

Entretanto a teoria de que os núcleos da base atuam freando ou liberando


a atividade talam cortical não é suficiente para explicar quais pensamentos ou
comportamentos seriam facilitados ou suprimidos. Seria necessário a ocorrência
de mecanismos horizontais de integração da atividade neuronal, ou seja,
a conversa cruzada entre os circuitos para explicar a seleção de determinado
comportamento conforme o contexto. Estudos recentes sugerem que estímulos
dopaminérgicos de origem mesocefálica sobre os neurônios estriatais poderiam
ser responsáveis por essa integração horizontal.

Seguindo a organização básica dos circuitos frontoestriatais, a via direta


do circuito dorsolateral origina-se no córtex pré-frontal dorsolateral (áreas 9 e 10
de Brodmann), projeta-se para a cabeça do núcleo caudado, em seguida para
as porções dorso medial do GPi e rostrolateral da SNr, e, finalmente, para os
núcleos dorso medial e Antero-ventral do tálamo. Esse circuito está envolvido
primariamente com as funções executivas, que incluem habilidades de
planejamento, estabelecimento de estratégias, sequenciamento temporal,
flexibilidade mental e evocação de memórias.

Pacientes com lesões do circuito dorsolateral poderiam, então, mostrar-


se perseverantes, concretos, distraídos, com comportamento desorganizado e
com alterações na memória de evocação, mas com a capacidade de
reconhecimento preservada. Algumas dessas características cognitivas, como

17
pensamento concreto e perseverante e desorganização do comportamento,
podem mesmo ser observadas em pacientes com esquizofrenia.

De fato, uma série de estudos neuropsicológicos, de neuroimagem


funcional e estrutural demonstrou disfunção do circuito dorsolateral na
esquizofrenia. Considerando-se a complexidade fenomenológica da
esquizofrenia, não é surpresa a disfunção de outros circuitos frontoestriatais
nesta condição, como o circuito límbico que envolve o núcleo accumbens.

As demências subcorticais são quadros de declínio cognitivo que


acompanham doenças neurodegenerativas marcadas por distúrbio dos
movimentos, como a doença de Parkinson, a paralisia supra nuclear progressiva
e a doença de Huntington. Disfunção executiva, caracterizada por lentificação
psíquica, com comprometimento da abstração, da flexibilidade mental e da
memória de evocação, com reconhecimento preservado, é característica das
demências subcorticais. Assim, nestas, além de comprometimento do circuito
dorsolateral, há também comprometimento dos circuitos frontoestriatais motores.

O circuito orbito frontal origina-se no córtex pré-frontal orbito frontal lateral


(áreas 10 e 11 de Brodmann), projeta-se para a porção ventromedial do
caudado, em seguida para as porções dorso medial do GPi e rostromedial da
SNr e, finalmente, para os núcleos dorso medial e Antero-ventral do tálamo. O
circuito orbito frontal apresenta um trajeto bastante similar ao do circuito
dorsolateral, constituindo com este os circuitos denominados pré-frontais. O
circuito orbito frontal é responsável pelo controle do comportamento conforme o
contexto, ou seja, pela supressão de comportamentos inadequados.

Portanto, a disfunção deste circuito pode determinar desinibição, descon-


trole de impulsos e labilidade emocional. Na antiga literatura neuropsicológica, a
síndrome orbito frontal era conhecida como síndrome pseudopsicopática, sendo
observada no caso clássico do paciente Phineas Gage (este caso é citado, por
exemplo, no livro "Erro de Descartes" de Antônio Damásio).

O circuito do cíngulo anterior origina-se na porção anterior do giro do


cíngulo (área 24 de Brodmann, face medial do cérebro), projeta-se para o
estriado ventral, que inclui o núcleo accumbens, e, em seguida, para o pálido
ventral, terminando no núcleo Antero-ventral do tálamo. Esse circuito está

18
intimamente relacionado a outro circuito que se inicia na porção medial do córtex
orbito frontal, compondo o circuito límbico ou medial. O primeiro está associado
ao comportamento motivacional. Uma lesão deste circuito pode acarretar graus
variáveis de redução da motivação, desde apatia, abulia até mutismo acinético.

Apatia é uma condição frequentemente observada em quadros


demenciais subcorticais e na demência de Alzheimer. Autores correlacionaram
apatia na doença de Alzheimer com redução de fluxo cerebral no cíngulo
anterior. Redução da atividade no córtex orbito frontal medial foi também
relacionada a quadros depressivos que acompanham doenças neurológicas,
como a epilepsia e a doença de Parkinson.

Por outro lado, o aumento da atividade no córtex orbito frontal, no cíngulo


e no caudado é demonstrado consistentemente em indivíduos com TOC.
Interessantemente, tanto a farmacoterapia quanto a terapia comportamental
foram capazes de normalizar a atividade nos circuitos frontoestriatais no TOC.
No caso de dependência de drogas, em que há um comportamento compulsivo
de busca e consumo destas, postula-se a desregulação do mecanismo
fisiológico de recompensa. Esse mecanismo envolve o circuito límbico,
principalmente a via dopaminérgica que se origina na área tegmentar ventral
situada no mesencéfalo, e projeta-se para o núcleo accumbens e à amígdala.

Coréia de Sydenham: Um Modelo Autoimune de Disfunção de


diferentes Circuitos Frontoestriatals
A Coréia de Sydenham (CS) é uma das maiores manifestações de febre
reumática, afetando crianças na faixa etária escolar e predominando no sexo
feminino. Caracteriza-se pela ocorrência de sinais neurológicos, como
movimentos involuntários coreicos, tiques e alteração do tônus muscular, e de
sintomas psicopatológicos, como labilidade afetiva, hiperatividade e sintomas
obsessivo-compulsivos.

Postula-se que a CS seja determinada por processos autoimunes


mediados principalmente por auto anticorpos que interfeririam na atividade dos
núcleos da base. De fato, estudos de neuroimagem estrutural e funcional na CS
demonstraram comprometimento dos núcleos da base. A análise dos sintomas

19
neurológicos e comportamentais da CS também reforça a concepção de
comprometimento dos núcleos da base e, portanto, de diferentes circuitos
frontoesrriatais.

A presença de movimentos involuntários na CS, como coréia e,


ocasionalmente, tiques, indica o comprometimento do circuito frontoestriatal
motor. Recentemente demonstrou-se maior suscetibilidade desses pacientes
para desenvolverem parkinsonismo induzido por neurolépticos, o que aponta
disfunção da via nigroestriatal que integra o circuito motor. A ocorrência de
sacadas hipométricas nos pacientes com CS sugere interferência no circuito
oculomotor.

Como os sintomas obsessivo-compulsivos e de hiperatividade são


comuns na CS, é provável o comprometimento de circuitos frontoestriatais não-
motores. Surgiram evidências nesse sentido que demonstram
menor performance de pacientes com CS em tarefa cognitiva que exija a inibição
de uma resposta conflitante (ou mudança de set comportamental). Esse
resultado significaria deficiência de controle cognitivo em pacientes com CS e,
consequentemente, disfunção dos circuitos pré-frontais, principalmente
orbitofrontolateral. Aplicando-se tarefa de fluência verbal em pacientes com CS,
foi observado comprometimento da fluência fonética, sugerindo também
disfunção do circuito dorso lateral.

Recentemente, autores norte-americanos passaram a buscar evidências


do papel da infecção estreptocócica no desenvolvimento do TOC e da síndrome
de Tourette na infância, fato que já assinalamos em outro artigo. Esses autores
identificaram um subgrupo de pacientes com TOC e/ou transtorno de tiques, sem
critérios para febre reumática, que apresentavam o curso dos sintomas variável
conforme a ocorrência de infecções estreptocócicas. Cunharam o termo Pediatric
autoimmune neuropsychiatric disorders associated with streptococcai
infections (PANDAS) para designar este subgrupo de pacientes, que incluiria
também indivíduos com THDA. A despeito das inúmeras críticas e controvérsias
associadas ao conceito de PANDAS, existe um substrato neurobiológico
plausível para o mesmo. Como as teorias correntes sobre a fisiopatologia de CS,
TOC, síndrome de Tourette e THDA sugerem disfunção dos circuitos
frontoestriatais, o fenótipo clínico do transtorno neuropsicopatológico pós-

20
estreptocócico seria resultado do comprometimento diferencial dos circuitos pelo
processo auto-imune.

Os circuitos frontoestriatais constituem as bases neuroanatômicas para


os processos de controle dos comportamentos motor, cognitivo e emocional.
Transtornos neuropsicopatológicos marcados pela incapacidade de suprimir ou
inibir comportamentos conflitantes ou indesejados, como TOC, síndrome de
Tourette, THDA e coréia de Sydenham, estariam associados primariamente à
disfunção dos circuitos frontoestriatais. Algumas características clínicas de
outros transtornos neuropsicopatológicos podem também ser relacionadas à
disfunção de determinados circuitos frontoestriatais. Nas demências
subcorticais, o comprometimento de funções executivas, sob responsabilidade
do circuito dorso lateral, é uma importante característica. Alterações da
personalidade e desinibição são evidentes na disfunção do circuito orbitofrontal.
Síndromes não-motivacionais foram correlacionadas com disfunção do circuito
medial ou límbico.

Neuropsicopatologia das endocrinopatias


Os sintomas neuropsicopatológicos são proeminentes em muitos
transtornos endócrinos e, em alguns casos, o primeiro contato pode ser com o
clínico psi. Na maioria dos casos, o tratamento imediato da endocrinopatia leva
à resolução dos sinais e sintomas neuropsicopatológicos. Para promover um
diagnóstico rápido, os clínicos devem se familiarizar com os sintomas e sinais
característicos e os exames de triagem preliminares.

Embora as manifestações neuropsicopatológicas variem entre as


diferentes endocrinopatias, as de severidade e duração similares tendem a
compartilhar manifestações neuropscopatológicas. Desse modo, anormalidades
moderadamente severas com duração de semanas a meses, muitas vezes,
manifestam uma combinação de sintomas afetivos e ansiosos. A maioria dos
pacientes com tais anormalidades tem comprometimento cognitivo leve. Em
contraste, endocrinopatias de longa duração, leves a moderadas, têm mais
probabilidade de apresentar alterações da personalidade caracterizadas por
apatia ou demência.

21
Um transtorno agudo severo ou um transtorno de longa duração que
progride para um transtorno severo tendem a induzir delirium agudo, que pode
anunciar um final catastrófico. Em alguns casos, o delirium é claramente ligado
a transtornos metabólicos secundários. Sintomas psicóticos podem muitas vezes
ocorrer com delirium. Algumas endocrinopatias severas (e ocasionalmente
moderadas) induzem automatismos, despersonalização ou percepção sensorial
exacerbada. Nesses casos, o paciente pode ser diagnosticado incorretamente
como tendo epilepsia do lobo temporal ou transtorno somatoforme.

A suspeita de uma endocrinopatia subjacente deve ser elevada em


síndromes afetivas ou ansiosas atípicas resistentes ao tratamento, nas quais
queixas vegetativas ou cognitivas sejam desproporcionais com outros sintomas.
Também transtornos da personalidade de início tardio caracterizados por apatia,
"neurastenia", despersonalização ou automatismos indicam uma avaliação
endócrina. Finalmente, pacientes psicóticos atípicos ou resistentes ao
tratamento e todos os pacientes com demência devem ter excluída uma doença
endócrina.

Hormônio da Tireóide

O termo hipertireoidismo é algumas vezes limitado à produção excessiva


de hormônio pela glândula tireóide, mas aqui é utilizado para significar
tireotoxicose de qualquer etiologia. O lítio interfere com a biossíntese e liberação
do hormônio e pode acelerar a tireoidite auto-imune. Hipotireoidismo ocorre em
cerca de 10% de pacientes em uso de lítio, sendo mais comum naqueles com
reserva reduzida de tireóide, particularmente mulheres e cicladores rápidos.
Pode ocorrer cedo ou após vários anos de tratamento. O lítio tem sido associado
ao hipertireoidismo, mas a conexão pode ser coincidente.

Hipertireoidismo

Aspectos diagnósticos. Cerca de 10% dos pacientes (independentemente


do diagnóstico) exibem elevações transitórias da triiodotironina total (T3), tiroxina
(T4) no soro e o índice de T4 livre (não-ligada), aparentemente pela estimulação
hipofisária ou hipotalâmica. Desse modo, pacientes psiquiátricos com níveis

22
elevados de hormônio tireóideo na internação devem ter os testes repetidos duas
semanas mais tarde. Intoxicação aguda por drogas, particularmente com
psicoestimulantes, pode imitar o hipertireoidismo e também pode produzir
hipertireoidismo transitório.

Pacientes com hipertireoidismo podem ser diferenciados dos com


transtornos de ansiedade primários pela pele quente, ao invés de fria, pelo
apetite aumentado e uma incapacidade descrita de associar a ansiedade a idéias
ou preocupações específicas. O hipertireoidismo pode ser diferenciado da
mania, em geral, pelo nível diminuído de energia e atividade. Por outro lado,
hipertireoidismo em pacientes bipolares é facilmente ignorado, porque o hiper-
tireoidismo pode precipitar mania, e o tratamento subseqüente com lítio pode
levar a uma resposta parcial (por suas ações antitireoidéias e antimaníacas).

Pormenores de manifestações neuropsiquiátricas.

Ansiedade generalizada, insônia e disforia tensa são comuns. Os


pacientes podem estar lacrimejando e chorando sem razão, perplexos com esse
fato. Pode ocorrer depressão, mas ela raramente é proeminente em pacientes
mais jovens. Os testes psicológicos, embora confirmando a presença de
ansiedade e depressão aumentadas, raramente se encaixam nos padrões
prescritos de transtornos mentais. Os idosos, contudo, que estão muitas vezes
apáticos, podem exibir a melancolia clássica.

Concentração e memória diminuídas são queixas freqüentes em todos os


pacientes hipertireóideos, e podem ser confirmados por baterias psicológicas
padrão. Muitos desses sintomas são observados em sujeitos-controle que
recebem hormônio da tireóide. Psicose, ocasionalmente, é observada como
parte de um delirium e pode anunciar uma tempestade tireóidea potencialmente
fatal. Psicose foi diagnosticada mais freqüentemente no passado, talvez pela
prevalência mais alta de endocrinopatia severa e o uso excessivamente zeloso
do termo psicose.

Tratamento.

23
Os sintomas neuropsicopatológicos (incluindo a síndrome de
personalidade putativa) geralmente são revertidos com o tratamento
antitireóideo, mas pode ser necessário um ano para a recuperação completa.
Psicose pode ocorrer ou ser exacerbada pela medicação antitireóidea, e
neurolépticos podem induzir uma síndrome semelhante à tempestade tireóidea
e síndrome neuroléptica maligna em pacientes hipertireóideos psicóticos. A
evidência disponível sugere que os neurolépticos de baixa potência são tolera-
dos em pacientes hipertireóideos e que, assim, devem ser prescritos quando
indicado.

Hipotireoidismo

Aspectos diagnósticos. Os pacientes com hipotireoidismo primário


podem ser divididos em três grupos, correspondendo a graus de severidade dos
sintomas e deficiência hormonais. Pacientes com hipotireoidismo leve
("subclínico") (isto é, grau III) podem-se apresentar somente com sintomas
psicopatológicos. O hipotireoidismo de grau III só pode ser diagnosticado pela
medida da resposta da tirotrofina (TSH) ao hormônio de liberação da tirotrofina
(TRH) do hipotálamo, porque os níveis de hormônio da tireóide e o TSH estão
normais. Geralmente, o TSH é obtido nos testes de triagem para hipotireoidismo.
Embora o T4 total esteja diminuído em casos severos de hipotireoidismo, pode
estar normal em casos moderados, que necessitam de reposição de tireóide (isto
é, de grau II).

Em vista de deficiência moderada de hormônio poder imitar a ansiedade


e a depressão primárias (particularmente transtornos pós-parto), é razoável
requisitar de rotina os níveis de TSH nesses casos. O teste de rotina do TRH
(para excluir hipotireoidismo de grau III) em pacientes com doenças afetivas não
pode ser recomendado até que a incidência e significado destes transtornos
leves e os benefícios do tratamento de reposição de tireóide (ou qualquer
tratamento diferente do regime padrão de antidepressivos) tenham sido
claramente estabelecidos.

Pormenores das manifestações neuropsicopatológicas. O


hipotireoidismo agudo, e especialmente o de longa duração, estão associados a

24
alterações na cognição e no estado afetivo. As alterações na cognição podem
ocorrer isoladamente ou parecer mais gerais do que os transtornos do humor.
Transtornos afetivos abrangendo de depressão leve à psicose e tendência
suicida ocorrem em mais da metade dos pacientes com hipotireoidismo de grau
I. Depressão e, em extensão menor, ansiedade, podem ocorrer logo nas
primeiras três semanas do início do hipotireoidismo, particularmente em
pacientes com história de transtornos afetivos. lrritabilidade marcante, labilidade
emocional e insônia são observados freqüentemente. Os pacientes têm uma
quantidade reduzida dos estágios 3 e 4 do sono, similar ao observado na de-
pressão. Ocorre psicose em 10% dos pacientes com hipotireoidismo de grau I,
mas raramente pode ser vista em casos mais leves. A qualidade da psicose não
é específica e geralmente é parte de um delirium.

Alterações na concentração podem ser aparentes já nas 3 primeiras


semanas depois do início do estado hipotireóideo, antes que outras funções
cognitivas estejam alteradas. Segue-se uma lentificação progressiva dos proces-
sos mentais, caracterizada por diminuição da iniciativa e perturbação da
memória e da concentração (facilmente identificada ao solicitar ao paciente que
faça subtrações em série). Muitos pacientes relatam perder coisas e cometer
enganos "estúpidos". Embora inicialmente muito frustrantes, ao final, o paciente
acaba indiferente a eles. A doença de longa duração induz à demência marcante.

Tratamento. Pode-se antecipar uma recuperação quase completa dos


déficits cognitivos e afetivos com a reposição da tireóide em adultos com
hipotireoidismo grau I. Os sintomas neuropsicopatológicos podem ser os
primeiros a se resolver, com os pacientes recuperando-se completamente ao
curso de poucos dias, com a reposição da tireóide, embora a recuperação
completa possa levar até 6 meses. Doses moderadas de neurolépticos são em
geral bem toleradas, embora os pacientes que ficaram psicóticos possam não
se recuperar completamente. Muitos acreditam que os sintomas afetivos são
resistentes ao tratamento exclusivo com antidepressivos.

O hormônio da tireóide alivia os sintomas físicos em pacientes com


hipotireoidismo de grau lI. Contudo, estudos definitivos ainda não estabeleceram
se o transtorno afetivo associado com o hipotireoidismo de grau II ou III responde
preferencialmente ao hormônio da tireóide isolado ou à combinação com a

25
terapia antidepressiva padrão. O hipotireoidismo precisa ser corrigido len-
tamente, porque pode ocorrer descompensação cardíaca ou
neuropsicopatológica aguda com a reposição rápida, particularmente nos idosos.
Finalmente, o hipotireoidismo em pacientes recebendo lítio pode-se resolver
espontaneamente. Se isso não ocorrer, a terapia de reposição com T4 deve ser
instituída, e o T4 e o TSH devem ser monitorizados para excluir tanto o tratamen-
to excessivo como o inadequado.

Cortisol

A síndrome de Cushing pode se apresentar como uma síndrome orgânica do


humor, ansiedade ou personalidade, ou com delirium. A síndrome de Cushing
iatrogênica, e ocasionalmente outras causas da síndrome de Cushing, podem
induzir uma síndrome delirante orgânica ou alucinose orgânica. As alterações
neuropsicopatológicas, particularmente depressão ou transtornos da
personalidade, podem ser os únicos sintomas manifestos.

A insuficiência supra-renal pode ser acompanhada por uma síndrome


orgânica do humor ou da personalidade. Um delirium pode pressagiar uma crise
supra-renal. Tanto no hipercortisolismo como na insuficiência supra-renal,
períodos de sintomas neuropsicopatológicos podem ser interrompidos pelo
retorno ao funcionamento pré-mórbido.

Hipercortisolismo

Aspectos diagnósticos. Os pacientes com a síndrome de Cushing podem


assemelhar-se a pessoas com alcoolismo que, por outro lado, podem ter todos
os sinais físicos e bioquímicos da síndrome de Cushing. Em vista da depressão
da síndrome de Cushing poder ser cíclica e ocorrer na ausência de sintomas
físicos, ela se assemelha muito à doença afetiva primária.

A semelhança entre o hipercortisolismo e a depressão levaram


investigadores a postular um elo fundamental entre as duas doenças. Uma hi-
pótese popular, que o excesso do fator de liberação da corticotrofina (CRF)
causa hipercortisolismo e depressão na doença psíquica primária, não poderia,

26
contudo, explicar os sintomas neuropsicopatológicos na doença de Cushing,
porque o CRF é suprimido prematuramente.

O abuso de corticosteróides não pode ser diagnosticado medindo-se os


níveis basais de esteróides (porque a produção endógena é suprimida e os
agentes orais estão presentes em quantidades pequenas), mas pode ser
suspeitado se o paciente não mostra evidência de insuficiência supra-renal, mas
ainda assim tem uma resposta diminuída à estimulação pelo hormônio
adrenocorticotrófico (ACTH).

Pormenores de manifestações neuropsicopatológicas. Depressão e


ansiedade (com e sem ataques de pânico) são observadas em cerca da metade
dos pacientes com a síndrome de Cushing. Alterações cognitivas (mais
marcadas na ideação espacial e visual) são igualmente comuns, embora menos
pronunciadas, e podem ser uma conseqüência da depressão.

Os pacientes, geralmente, enfatizam a tristeza, diminuição da libido,


insônia, preocupações somáticas, despersonalização e perturbação da
concentração. De modo diferente da maioria dos pacientes com transtornos
afetivos primários, contudo, os pacientes com a síndrome de Cushing observam
labilidade do humor e negam anedonia, culpa inapropriada e desesperança.
Mania e hipomania puras são infreqüentes (exceto com corticosteróides orais) e,
o quadro se parece com um estado maníaco e depressivo misto. A preocupação
e ação suicida é incomum. A severidade da depressão tem sido relacionada aos
níveis da produção de esteróides.

Psicoses ocorrem em 20% dos casos. Um delirium está muitas vezes


presente e pode ser o resultado de transtorno eletrolítico, insuficiência cardíaca
congestiva, encefalopatia hipertensiva ou diabetes não-controlado. Tanto os
sintomas maníacos, como os depressivos, podem se acompanhar de paranóia,
alucinações auditivas e visuais e desorientação. Os pacientes, freqüentemente,
queixam-se de sobrecarga sensorial e podem ficar em mutismo.

Os sintomas neuropsicopatológicos podem ocorrer em pacientes tratados


com prednisona (Meticorten), estando relacionados com a dose e a duração do
tratamento. A resposta aguda observada na maioria dos pacientes inclui euforia
leve, aumento do apetite, insônia, irritabilidade e inquietação. Os pacientes

27
podem ficar deprimidos com a supressão dos esteróides, levando ao uso ilícito
continuado. Psicose, com ou sem alterações da consciência e da cognição, tem
sido relatada em até 20% dos pacientes recebendo 80mg/dia ou mais de
prednisona, podendo ser mais comum nas mulheres.

Tratamento. Os sintomas neuropsicopatológicos melhoram em paralelo


com a normalização do cortisol livre na urina, embora a recuperação completa
possa levar meses ou anos. A diminuição da libido fica defasada em relação à
recuperação de outros sintomas.

O tratamento de sintomas mentais em pacientes com a síndrome de


Cushing iatrogênica é muitas vezes um desafio, pela possibilidade de recidiva
da condição subjacente à supressão dos esteróides e a freqüente dificuldade de
se identificar a causa das exacerbações neuropsicopatológicas. Se possível, os
pacientes devem realizar o tratamento em dias alternados, recebendo
medicação pela manhã, para simular o padrão diurno e reduzir a insônia.

Os antidepressivos tricíclicos (Tofranil, Tryptanol, Anafranil) podem


exacerbar a depressão secundária ao hipercortisolismo, particularmente se o
paciente é psicótico. O tratamento ótimo da depressão não foi determinado,
embora a eletroconvulsoterapia possa auxiliar. O carbonato de lítio e os
neurolépticos parecem ser eficientes na prevenção e tratamento da mania.

Hipocortisolismo

Aspectos diagnósticos. Fraqueza, anorexia, náusea, vômitos e perda de


peso são os sintomas clássicos presentes na insuficiência supra-renal. Os
pacientes podem ter hipotensão e hiperpigmentação. A discutível "síndrome da
fadiga crônica", caracterizada por pelo menos 6 meses de fadiga, febre, mialgias,
artralgias e depressão após uma infecção aguda, foi recentemente relacionada
em relatos preliminares à insuficiência supra-renal.

O pan-hipo-hipofisarismo, muitas vezes, apresenta-se com sinais e


sintomas de insuficiência supra-renal (exceto pelo bronzeamento fácil). Em ge-
ral, é causado por lesão hipofisária ou hipotalâmica e, com menos freqüência,
por necrose isquêmica (por exemplo, pós-parto), aneurismas ou radiação.

28
Embora a apatia e a fraqueza sejam geralmente sintomas proeminentes, o
transtorno pode se apresentar como hipogonadismo ou hipotireoidismo.

Pacientes com insuficiência supra-renal podem se parecer muito com


pacientes com depressão maior ou anorexia nervosa, e é fácil deixar passar o
diagnóstico correto. O início recente de bronzeamento fácil e prolongado;
transtornos gastrointestinais; hipotensão; outras doenças clínicas (por exemplo,
tuberculose, amiloidose e carcinoma) e particularmente doenças auto-imunes
podem ser indícios auxiliares.

Pormenores das manifestações neuropsicopatológicas. Ansiedade


flutuante, depressão e desconfiança são observados em cerca da metade dos
pacientes com hipocortisolismo. Em quase todos os casos com ansiedade,
também está presente depressão. O paciente pode ter anorexia nervosa e a voz
pode ser fraca e lamurienta. A função intelectual não tem sido avaliada
cuidadosamente. Ocasionalmente, a história é a de uma demência progressiva.
Os pacientes, muitas vezes, exibem (mas raramente estão a par de) uma
acuidade sensorial aumentada, que tem sido relacionada à latência diminuída de
respostas evocadas.

Essas alterações podem contribuir para o diagnóstico ocasional de


transtorno somatoforme. A diminuição do sono de ondas lentas (estágios 3 e 4)
tem sido documentada. Finalmente, psicose franca geralmente ocorre no
contexto relatado de delirium, com alucinações visuais, paranóia, posturas
bizarras e catatonia.

Tratamento. O uso de drogas psicotrópicas e a normalização do estado


afetivo subseqüente à reposição de glicocorticóides não têm sido ade-
quadamente estudados. A persistência de sintomas mentais pode indicar outras
endocrinopatias concomitantes (por exemplo, hipoparatireoidismo). Em alguns
casos, os sintomas mentais, particularmente psicose, podem ser atribuídos a
comprometimento metabólico secundário; contudo, a recuperação completa não
ocorre até que os glicocorticóides tenham sido repostos.

Pacientes com hipocortisolismo são notoriamente sensíveis a


depressores do sistema nervoso central (SNC) e são suscetíveis particularmente

29
a drogas que induzam hipotensão. O lítio pode alterar as necessidades de
reposição mineralocorticóide, e pode ser difícil manter níveis estáveis de lítio.

As Paratireóides e a regulação do calcio serico

A hipercalcemia pode se apresentar como uma síndrome orgânica do humor


ou da personalidade, demência ou delirium. Tem mais probabilidade que outras
endocrinopatias de se apresentar como uma síndrome orgânica delirante. Como
com o hipotireoidismo, o hipercortisolismo e o hipocortisolismo, as alterações
mentais ocorrem precocemente e podem ser os únicos sintomas proeminentes. Isso
é particularmente verdadeiro no idoso, em quem alterações mínimas podem induzir
pseudo-demência, reversível. A hipocalcemia pode ser um transtorno crônico com
sintomas mentais proeminentes, mas com mínimos sintomas neuromusculares. O
lítio induz leve aumento do hormônio paratireóideo (PTH) em cerca de 80% dos
pacientes, dentro dos primeiros meses de tratamento, mas aumentos significativos
podem ocorrer e relacionam-se com a dose e duração do tratamento.

Hiperparatireoidismo e hipercalcemia

Aspectos diagnósticos. A faixa normal do PTH varia com o método de


dosagem. Em vista da hipercalcemia ser comum e poder imitar muitas condições
neuropsicopatológicas, e por serem os níveis de cálcio baratos e facilmente obtidos,
o transtorno deveria ser excluído na maioria das avaliações psíquicas diagnósticas.

Pormenores das manifestações psicopatológicas. Encontram-se


sintomas mentais em 66% dos pacientes com hiperparatireoidismo em estudos
prospectivos. Fadiga, apatia, redução do apetite e da concentração e depressão
ocorrem em cerca da metade dos pacientes. A tendência suicida não é incomum e
ocorreram vários suicídios. Uma mudança da personalidade pode ocorrer no curso
dos anos e uma pessoa previamente ativa e sociável pode-se tornar
progressivamente reclusa, incapacitada e deprimida. Os sintomas são similares em
qualidade, mas diminuídos em intensidade, dos da depressão primária. Testes
cognitivos revelam comprometimento da memória verbal, embora não seja claro se
isso relaciona-se com a depressão ou outros efeitos da hipercalcemia.

Estados psicóticos paranóides agudos, com ou sem depressão, têm ocorrido


com o sensório claro. Os pacientes podem se tornar extremamente violentos e
homicidas. Delirium com alucinações e delírios proeminentes ocorrem com níveis
altos de cálcio sérico. Os idosos são muito sensíveis à hipercalcemia, e podem

30
desenvolver demência com aumentos muito leves do cálcio sérico. Alterações
eletroencefalográficas (EEG) não são uma ferramenta diagnóstica sensível.

Tratamento. Se o transtorno não é crônico, os sintomas cognitivos e afetivos


geralmente são revertidos pela normalização do cálcio sérico. Em particular, os
pacientes idosos com demência e que também têm hiperparatireoidismo,
geralmente, exibem considerável melhora, se a cirurgia é realizada dentro dos
primeiros 2 anos da doença. A melhora é evidente em questão de dias e parece
estabilizar-se aos 3-6 meses.

O tratamento apropriado dos pacientes hiperparatireóideos, de meia-idade,


levemente hipercaIcêmicos, "assintomáticos" é controverso, embora a maioria opere
pacientes mais jovens, sadios, com base nos inconvenientes da monitorização por
toda a vida. Claramente, se os pacientes se queixam de fadiga ou fraqueza
muscular, têm a probabilidade de se beneficiar da cirurgia. A resposta de outros
sintomas, como a depressão e a ansiedade, não é previsível. Foram descritos vários
casos de psicose por paratireiodectomia tardia, autolimitada com alterações da
consciência, relacionados com a queda rápida do cálcio sérico que ocorre em
pacientes com hipercalcemia e doença óssea secundária.

Os pacientes em uso de lítio, que ficam hipercalcêmicos, deveriam primeiro


dosar a litemia, para excluir toxicidade pelo lítio (os dois cátions são manejados de
modo similar pelo rim). Se assintomático, o paciente deve ser seguido ou receber
outro agente antimaníaco. Em qualquer caso, os níveis de cálcio devem ser
revisados porque o lítio pode induzir ou acelerar o crescimento de adenomas da
paratireóide. O lítio pode ser recomeçado após a paratireoidectomia.

Hipoparatireoidismo e hipocalcemia

Aspectos diagnósticos. O cálcio sérico e o fósforo inorgânico devem ser


obtidos nos casos suspeitos de hipocalcemia e seguidos do cálcio ionizado e do
PTH, se indica da investigação adicional. O encaminhamento de pacientes com ca-
sos leves de hipocalcemia não-diagnosticada (insuficiência parcial das
paratireóides) ao clínico psi, por ansiedade resistente ao tratamento, não é
incomum. Os pacientes hipocalcêmicos ansiosos podem ter transtorno do pânico,
levando-os a hiperventilar e desenvolver tetania. Desse modo, a hipocalcemia deve

31
ser excluída em todos os casos de tetania induzida pela hiperventilação. Raramente,
o quadro assemelha-se a transtorno bipolar.

Pacientes hipocalcêmicos, que exibem movimentos coreiformes, parestesias


e convulsões atípicas, podem ser encaminhados ao clínico psi por "comportamento
histriônico". Esses pacientes podem não exibir nenhum sintoma de tetania e o EEG
pode ser normal.

Pormenores das manifestações neuropsicopatológicas. As


manifestações mentais da hipocalcemia não foram tão cuidadosamente estudadas
como as de outras endocrinopatias. Sintomas mentais, particularmente ansiedade e
demência, são comuns. Além disso, os pacientes podem parecer deprimidos,
parkinsonianos ou ter movimentos coreiformes. Convulsões típicas e atípicas são
freqüentes. O declínio intelectual progressivo é particularmente comum no
hipoparatireoidismo hereditário e no pseudo-hipoparatireoidismo.

Tratamento. Pacientes com hipocalcemia leve e sem outros sintomas,


exceto ansiedade e depressão, podem ter "insuficiência parcial das paratireóides"
que se beneficia com suplementação de cálcio. Na hipocalcemia severa,
o delirium pode levar 1-3 dias para melhorar, e pode recorrer periodicamente,
durante o período de recuperação, a despeito da "normocalcemia". Em vista do
cálcio sérico ser geralmente mantido na faixa normal inferior (para a prevenção de
litíase renal), as recorrências podem, na verdade, ser secundárias à hipocalcemia.
A demência tende a responder mal.

As convulsões e a ansiedade respondem mal a agentes anticonvulsivos e a


ansiolíticos, respectivamente. Relata-se que os pacientes hipocalcêmicos são mais
suscetíveis ao desenvolvimento de síndrome extrapiramidal (SEP) quando recebem
medicação neuroléptica, embora os níveis de cálcio (dentro da faixa normal) não
pareçam influenciar a SEP.

Insulina

Os efeitos neuropsicopatológicos do hipersinsulinismo incluem síndrome


orgânica de ansiedade, personalidade, amnésia e delirante; delirium e demência e
outras síndromes mentais orgânicas caracterizadas por sintomas dissociativos e
automatismos. A hiperglicemia pode predispor a déficits sutis em funções cognitivas
superiores. As duas complicações metabólicas maiores do diabetes melitus

32
(cetoacidose diabética [CAD] e síndrome hiperosmolar não-cetótica) induzem
o delirium e coma.

Recém-nascidos prematuros também ficam freqüentemente hipoglicêmicos.


Vários casos fatais de hipoglicemia ocorreram na anorexia nervosa e não raro,
ocorreram complicações irreversíveis em pacientes esquizofrênicos que receberam
tratamento de choque insulínico. Se a hipoglicemia ocorre abruptamente (como em
situações pós-cirúrgicas e na controversa síndrome idiopática pós-prandial),
sintomas adrenérgicos de ansiedade, tremor, diaforese e taquicardia tendem a
predominar, junto com fome e fraqueza. Em casos de hipoglicemia crônica (por
exemplo, no insulinoma), sintomas "neuroglicopênicos", incluindo perda de
concentração, confusão, labilidade emocional, automatismos e amnésia, são mais
proeminentes.

Hiperinsulinismo e hipoglicemiaAspectos diagnósticos. O diagnóstico


de hipoglicemia necessita de 1) demonstração de hipoglicemia com o jejum ou após
refeições semelhantes àquelas induzindo os sintomas (se pós-prandial); 2) a
presença de sintomas consistentes com hipoglicemia e 3) melhora com a normaliza-
ção dos níveis de glicose.

Muitos pacientes hipoglicêmicos procuram assistência clínica por sintomas


adrenérgicos pósprandiais e verifica-se ter um teste de 5 horas de tolerância à
glicose "anormal" (isto é, com a glicemia <50mg/ dL). Esses pacientes podem re-
ceber um diagnóstico de hipoglicemia, ainda que nunca tenham ficado
hipoglicêmicos com refeições normais, e muitos indivíduos não-hipoglicêmicos têm
níveis similares de glicose, mas não apresentam sintomas. Os testes psicológicos
sugerem que muitos desses pacientes têm um transtorno somatoforme.

A hipoglicemia factícia, causada pela administração sub-reptícia de insulina,


ocorre mais frequentemente devido à medicação pessoal por membros da família
de pacientes diabéticos ou pelos próprios pacientes diabéticos. Nos dois primeiros
grupos, o diagnóstico pode ser feito com níveis deprimidos do peptídeo C. Contudo,
o diagnóstico pode ser difícil em pacientes diabéticos. Relatos de casos sugerem
que esses pacientes têm, em geral, sérios transtornos de personalidade e
respondem mal à psicoterapia.

Por outro lado, pacientes com hipoglicemia podem ser diagnosticados por
engano como histéricos, epilépticos ou intoxicados porque exibem uma combinação

33
de estados dissociativos, automatismos e raiva. Em muitos casos, os pacientes
hipoglicêmicos mostraram-se agressivos e paranóides e, com isso, recebem um
diagnóstico psiquiátrico primário. Em retrospecto, contudo, esses pacientes têm si-
nais claros de delirium: redução da consciência ou desorientação. Em casos de
episódios recorrentes de hipoglicemia, o diagnóstico pode ser um desafio.

Muitos pacientes com início súbito de hipoglicemia devido ao tratamento com


insulina têm ataques de ansiedade que são difíceis para o paciente e para o clínico
de distinguir de uma doença de ansiedade primária. Além disso, pacientes com
diabetes parecem predispostos a desenvolver transtorno de ansiedade devido ao
estresse da doença e a resposta "condicionada" a episódios anteriores de
hipoglicemia.

Pormenores das manifestações mentais. A redução não-monitorizada da


glicose no sangue pode causar excitação, hiperatividade, espasmos musculares e,
finalmente, rigidez descerebrada. Em indivíduos-controle, as alterações neu-
rofisiológicas: aumento de latência do componente P300 dos potenciais evocados
cerebrais e comprometimento cognitivo sutil ficam aparentes com níveis de glicemia
na faixa de 45-70mg/dL, e aumentam proporcionalmente conforme a redução
adicional dos níveis de glicemia. A atenção e a memória parecem menos
comprometidas do que as funções cognitivas de ordem superior.

A resposta neuropsíquica de pacientes com diabetes melitus (estejam ou não


em bom controle glicêmico) é similar à de indivíduos não-diabéticos. Em particular,
ainda que os níveis basais de glicose modulem o limiar para os hormônios adre-
nérgicos e outros, envolvidos na resposta contrareguladora à hipoglicemia (isto é,
limiar diminuído para a liberação de hormônios para aqueles com controle estrito e
aumentado para os hiperglicêmicos), o limiar neuroglicopênico não se relaciona com
a glicose basal.

Muitos pacientes diabéticos perdem completamente sua resposta


adrenérgica comportamental, ou essa pode ocorrer em níveis cada vez mais baixos
da glicemia. Desse modo, esses pacientes podem depender de sinais
neuroglicopênicos para identificar a hipoglicemia. Se, contudo, a confusão é um dos
sintomas primários, o paciente pode estar incapaz de reagir de modo apropriado.
Pacientes mais idosos, e talvez aqueles com doenças mentais crônicas, também
parecem perder sua resposta adrenérgica comportamental. Episódios recorrentes

34
de hipoglicemia moderada podem produzir alterações neurofisiológicas e cognitivas
irreversíveis em recém-nascidos, em crianças e, em menor grau, em adultos.

Tratamento. Embora a recuperação de níveis moderados de hipoglicemia


seja geralmente completa (exceto por amnésia para o incidente) a recuperação da
assim denominada fase medular (isto é, com glicemia igual ou menor a 10mg/dL)
muitas vezes é prolongada e incompleta. A hipoglicemia crônica e episódios
múltiplos de hipoglicemia sintomática causam déficits irreversíveis. Na hipoglicemia
moderada, a recuperação cognitiva completa segue-se ao estabelecimento da
glicemia normal, em cerca de 1 hora.

Hipoinsulinismo e hiperglicemia

Aspectos diagnósticos. O diagnóstico de hiperglicemia geralmente não é


difícil de fazer, mas o clínico precisa permanecer alerta. Em particular, sintomas de
poliúria e polifagia em pacientes com psicopatologia não devem ser atribuídos a
efeitos colaterais da medicação ou polidipsia psicogênica até que o diabetes melitus
tenha sido excluído.

Pormenores de manifestações mentais. Em adultos, uma história de


diabetes malcontrolado (como verificado por retinopatia ou valores da hemoglobina
glicosilada) parece comprometer o aprendizado, mas o comprometimento
geralmente é de pouco significado clínico. A doença de longa duração associa-se a
alterações micro e macrovasculares, que podem causar déficits neuropsíquicos
múltiplos. As complicações metabólicas severas do diabetes melitus são a CAD e o
coma hiperosmolar. Ambos se apresentam com delirium, progredindo para o coma.
Pacientes em coma hiperosmolar, freqüentemente, têm convulsões e podem exibir
sinais neurológicos focais.

Vasopressina

A arginina vasopressina, o hormônio antidiurético, é secretada pela hipófise


posterior (neuro-hipófise) em resposta a aumentos da concentração de sódio no
plasma e da osmolaridade do plasma. O hormônio atua no néfron distal,
aumentando a reabsorção de água e é a forma principal pela qual o corpo regula o

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conteúdo de água. Os centros reguladores da secreção da vasopressina e da sede
parecem estar adjacentes um do outro ao hipotálamo.

A vasopressina em excesso pode induzir hiponatremia e intoxicação hídrica,


enquanto a deficiência de vasopressina produz poliúria e polidipsia secundária. Se
a ingesta de água não acompanha a perda de água, o paciente torna-se
hipematrêmico e delirante. Estudos demonstraram que 3-5% de pacientes mentais
crônicos têm níveis elevados de vasopressina. A excreção comprometida da água
em outros pacientes mentais é muitas vezes atribuída à hipotensão induzida pelos
antidepressivos (particularmente no idoso). A evidência atual sugere que os
neurolépticos raramente têm algum papel.

Vasopressina em excesso e hiponatremia

Aspectos diagnósticos. Muitas vezes, o diagnóstico de hiponatremia é


ignorado e pacientes mentais com convulsões secundárias a intoxicação pela água
recebem erroneamente o diagnóstico de epilepsia idiopática, sendo mantidos em
medicação anticonvulsivante (que provavelmente não reduz a incidência de
convulsões). A intoxicação hídrica (junto com outras causas secundárias) deveria
sempre ser excluída, após diagnosticar-se um transtorno convulsivo em um paciente
psicótico, particularmente se a convulsão é seguida por uma diurese em massa ou
se o paciente tem uma história de polidipsia, vômitos ou abuso prévio de álcool.

Em vista dos pacientes poderem ficar normonatrêmicos entre os episódios, o


diagnóstico pode necessitar da medida diária de alterações do peso por um período
de 1-2 semanas e da obtenção de uma história cuidadosa, enfocando os sintomas
latentes de intoxicação hídrica. Deve-se ter cuidado especial para excluir câncer de
pulmão, porque os pacientes da clínica psi são em geral grandes fumantes e o
câncer de pulmão, freqüentemente, causa a síndrome de secreção inapropriada do
hormônio antidiurético (SIADH).

Pormenores de manifestações neuropsíquicas. Hiponatremia aguda


moderada (120-130mEq/l) perturba a cognição, mas não produz transtornos afetivos
ou psicose. Em pacientes mentais, contudo, pode ocorrer agressão como resultado
da hiponatremia. Sinais e sintomas de hiponatremia desenvolvem-se em função da
rapidez da queda do sódio sérico. Assim, uma queda no nível do sódio de 10 mEq/I,
em poucas horas pode produzir sintomas, enquanto níveis notavelmente diminuídos

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(isto é, 30 mEq/l abaixo do normal) não produzem sintomas óbvios, se ocorrem em
dias ou semanas. Os sintomas podem progredir com uma queda aguda do nível do
sódio, ou o paciente pode estar assintomático, tendo então urna convulsão súbita.
Achados neurológicos assimétricos têm sido descritos.

Tratamento. Pacientes sob antidepressivos deveriam ter a pressão arterial


ortostática determinada e, se indicado, a medicação deveria ser trocada para outra
classe estrutural, não associada à hipotensão ortostática. Pacientes necessitando
de tratamento para hipertensão deveriam ter diuréticos tiazídicos trocados por outro
agente, como bloqueadores de canais de cálcio. Pacientes em carbamazepina
(Tegretol) podem exibir resolução espontânea da hiponatremia, ou resolução se a
dose é diminuída ou é acrescentado lítio (porque bloqueia as ações da
vasopressina). A nicotina, um potente estimulante para a liberação da arginina
vasopressina, contribui para alguns casos de hiponatremia e, desse modo, o
controle do tabagismo pode ajudar. Pacientes em uso de clorpromazina (Amplictil)
podem se sentir melhor, quando mudados para outro neuroléptico com menos
potencial para induzir hipotensão ortostática.

Em alguns casos de hiponatremia leve, assintomática ou episódica, o clínico


pode apenas educar o paciente e a família sobre os sinais e sintomas precoces de
intoxicação hídrica. A restrição voluntária de água pode funcionar em pacientes clí-
nicos com hiponatremia sintomática, mas raramente tem êxito com pacientes da
clínica psi. Se não estão presentes fatores reversíveis, a intoxicação hídrica em
pacientes mentais pode ser evitada pela monitorização de alterações agudas do
peso corporal e restrição de líquidos, se o peso se elevar subitamente.

Deficiência de vasopressina e hipernatremiaAspectos


diagnósticos. Embora a coleta da urina de 24 horas seja o meio ideal de diagnosti-
car poliúria, muitas vezes não é confiável em pacientes mentais. A evidência
preliminar sugere que a poliúria pode ser inferida, obtendo-se as concentrações de
creatinina da urina da tarde, que têm alta correlação com os volumes de urina de 24
horas. A deficiência de vasopressina (versus polidipsia psicogênica ou o
diabetes insipidus nefrogênico; ver adiante) pode geralmente ser diagnosticada,
impondo-se uma restrição hídrica. Após estabilizar a osmolaridade da urina, o
paciente recebe uma injeção subcutânea de vasopressina. Pacientes com polidipsia
psicogênica podem levar um longo tempo, após a restrição ser imposta, para atingir

37
uma osmolaridade estável na urina, mas geralmente aumentam sua osmolaridade
acima dos níveis do plasma e, então, exibem pouco aumento adicional com a
vasopressina.

Pode ser difícil determinar se a poliúria de pacientes psiquiátricos é devido à


polidipsia psicogênica, diabetes insipidus central ou (em certos casos)
diabetes insipidus nefrogênico induzida pelo lítio, que pode levar um ano para se
resolver após a descontinuação da droga. A polidipsia "psicogênica" é muito comum
entre pacientes mentais, ocorrendo em todas as classes diagnósticas e em até 70%
dos pacientes psicóticos crônicos. Em vista do diabetes insipidus central ser muito
menos comum do que a polidipsia primária em pacientes mentais, os clínicos,
normalmente, presumem que a polidipsia não é secundária a um defeito na secreção
da vasopressina. Contudo, o índice de suspeita clínica deve ser aumentado se, 1) o
paciente não tem um transtorno mental sério; 2) o soro é hipertônico; 3) o paciente
tem uma história de traumatismo de crânio, cirurgia ou infecção do SNC; 4) o
paciente tem uma história familiar de poliúria ou diabetes insipidus; 5) a ingesta ou
excreção de água parece variar pouco dia após dia, ou 6) o paciente tem anorexia
nervosa.

Pormenores das manifestações neuropsíquicas. A hipernatremia em


sujeitos-controle induz à sede extrema, fraqueza e perturbações da cognição. Pode
ocorrer tardiamente perturbação da consciência. Os sintomas raramente são con-
fundidos com um transtorno mental.

Tratamento. O diabetes insipidus nefrogênico induzido pelo lítio, geralmente,


responde à baixa da dose de lítio, mudança para uma única dose diária, ou
acrescentado-se amilorida com ou sem um diurético tiazídico. Deve-se ter o cuidado
de reduzir a dose de lítio, se um diurético for acrescentado.

A deficiência de vasopressina raramente é responsável pela poliúria em


pacientes mentais. Se entra em cogitação uma tentativa com vasopressina, deve-
se ter muito cuidado para evitar a intoxicação pela água. Não há tratamento eficiente
para a polidipsia psicogênica, embora várias intervenções tenham sido tentadas. A
despeito das propriedades anticolinérgicas de vários medicamentos psicotrópicos
não darem uma grande contribuição para a polidipsia (através da boca seca), os
pacientes com polidipsia deveriam ser tratados com drogas com efeitos
anticolinérgicos mínimos.

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Prolactina

A hiperprolactinemia em mulheres pode induzir a uma síndrome orgânica do


humor; em homens, pode induzir apatia. A causa mais comum de hiperprolactinemia
em pacientes mentais é a medicação neuroléptica. Mesmo baixas doses de drogas
neurolépticas podem produzir a síndrome completa de hiperprolactinemia.

Aspectos diagnósticos. O diagnóstico de hiperprolactinemia deve se


basear em pelo menos dois exames de níveis, na ausência de estresse ou gravidez.
A hiperprolactinemia pode imitar depressão, mas sintomas de excesso de prolactina
estão quase sempre presentes. Os neurolépticos raramente aumentam a prolactina
acima de l00ng/dL. Níveis mais altos sugerem a presença de um adenoma secretor
de prolactina.

Em pacientes tomando medicação neuroléptica, que consistentemente


exibem níveis elevados, como a sulpiride (Equilid), deve-se empregar dias sem
(feriado de) medicação, se possível, para avaliar se os níveis de prolactina caem.
Um relato sugeriu que 4 dias sem neurolépticos injetáveis são adequados para as
elevações induzidas pelas drogas se normalizarem.

Pormenores das manifestações neuropsíquicas. As mulheres com


hiperprolactinemia tendem a ficar deprimidas, com aumento de sintomas de
hostilidade, ansiedade e diminuição da auto-estima. Embora a severidade desses
sintomas em auto-relatos possa ser severa, os pacientes raramente procuram
tratamento psi. Homens, muitas vezes, apresentam-se com doença mais adiantada,
queixando-se de cefaléias e defeitos do campo visual. A apatia é o sintoma
neuropsíquico predominante, que pode contribuir para a demora em procurar
tratamento.

Tratamento. A depressão é melhorada com a bromocriptina (Parlodel). Os


efeitos salutares ficam aparentes em 4 semanas, mantêm-se por longos
períodos e não se relacionam com a volta das menstruações; a depressão
recorre com a supressão da droga. Tanto a amantadina como a bromocriptina
são eficientes no tratamento dos sintomas de hiperprolactinemia causados pelos
neurolépticos. Exacerbações psicóticas são raras, desde que o paciente seja
mantido com um antipsicótico. Em vista do baixo custo e poucos efeitos
colaterais, a amantadina é a preferida.

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Referencias
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behavioral disorders. New York: Norton & Company.

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