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UNIVERSIDADE PAULISTA – UNIP

Instituto de Ciências Humanas


Curso de Psicologia
Disciplina: Intervenções Clinicas Breves – Atendimento Clinico na Abordagem
Fenomenológica-Existencial
Professor: Lia Spadini da Silva
Aluno: Aline dos Santos Medeiros – RA: T910765

POMPEIA, J. A.; SAPIENZA, B. T. Liberdade. In: Os Dois Nascimentos do Homem:


Escritos Sobre Terapia e Educação na Era Técnica. São Paulo: Via Verita, 2011. p.13
– 29.

É grande a frequência com que as diversas concepções sobre a liberdade tomam


espaço no entendimento comum; dentre elas a liberdade de expressão, liberdade de
escolha, liberdade a ser conquistada e aquela que precisa ser bem usada. No que tange
a liberdade é mais fácil imagina-la quando ocorre o impedimento da realização de um
feito ou quando há a obrigatoriedade de que algo seja realizado. Entende-se, portanto,
que a liberdade é inicialmente interpretada como o poder de fazer aquilo que é
desejado.
A liberdade é comumente tida mais como um desejo, um anseio e uma busca e
do que como um fato, uma realidade. Algumas linhas de pensamentos levam a um
entendimento menos ingênuo acerca do conceito de liberdade, tais como os preceitos
propostos por Marx ou o estudo dos genes como determinantes do comportamento
humano, apontados por Darwin. A contra partida, tem-se as tradições religiosas que
apontam para uma concepção de liberdade do homem vinculada à sua predisposição
de se abster de determinadas coisas. A vista disso, compreende-se que essa questão
pode ser abordada a partir de diversas referências.
A reflexão expressa no capítulo em questão segue em direção ao entendimento
da liberdade a partir da perspectiva da Daseinsanalyse. Ser livre é a forma de ser do
Dasein e esse ser livre manifesta-se em três dimensões: o ser aberto nas
possibilidades, o ser fundado nas possibilidades e o ser lançado nas possibilidades.
O ser livre do Dasein é aberto em possibilidades, porque o homem é um ser
dotado da capacidade de falar e constituir linguagem, desse modo, configurar não só o
que é, mas também o que pode ser. Ele é fundado nas possibilidades pois todo o
sentido da ação humana se dá a partir do objetivo que essa ação visa alcançar. Algo
que ainda não existe, uma possibilidade que fundamenta a ação do homem. Por fim o

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ser livre é lançado em possibilidades, porque o possível ultrapassa o real e não se limita
a ele.
Pensando o homem no seu Dasein, no ser-aí, a liberdade aparece como um dom
na sua forma de ser, sendo este, aberto dentro de suas possibilidades. A cada um, cabe
encarar a liberdade como uma condição que lhe é imposta e diante dela escolher por
submeter-se a condenação de ser livre ou acolhe-la, apropriando-se desse dom,
tomando-a pra si como algo que faz parte da sua existência.
Apropriar-se do seu ser livre é concordar em ser aberto, fundado e lançado nas
possibilidades de ser. Apropriar é também possuir, e tomar posse de um dom quer dizer
empunha-lo, efetivar o modo de ser-no-mundo. O dom de ser livre, além de precisar ser
empunhado, é principalmente um chamado. A forma ideal de ser livre é responder a
esse chamado e aceitar a vocação que ele corresponde.
Uma outra premissa importante sobre a liberdade para o Dasein é que ser livre
implica escolhas e decisões. Ser lançado na possibilidade de escolher é também ter
que escolher. Pode-se até escolher não escolher, o que por si só já é uma escolha.
Precisar escolher acarreta uma série de desconfortos e aflições, entre elas, a renúncia.
Quem não está livre para renunciar não consegue escolher. O fundamento do poder
escolher não é possuir, mas sim renunciar. Em primeiro lugar porque escolher uma
coisa é abrir mão de outra. Em segundo, porque a escolha não dá o privilégio de não
se submeter a nada, não estar obrigado. Para Dasein a liberdade envolve
comprometimento, ser livre é sê-lo para comprometer-se e é comprometendo-se como
a escolha feita que se exerce a liberdade. O terceiro ponto de atenção é que para o
Dasein ser livre significa servir como ocasião para que os entes se manifestem em sua
verdade. Sendo aberto nas possibilidades, o Dasein é aberto ao que ainda não é mas
pode ser, ao que já foi e não é mais e ao que seria possível. Aberto nas possibilidades,
ele escapa dos limites do real e essa escapatória o convoca a voltar para o real,
cuidando da realização do possível. O ser livre do Dasein o faz ultrapassar o real para
retornar ao real. O modo de ser livre consiste em se dispor a servir e atuar como
oportunidade de abertura e desvelamento do possível.
Cabe também uma quarta colocação a despeito da escolha e do ser livre: Poder
escolher é antes de mais nada principalmente poder obedecer. Obedecer é se dispor a
dar ouvidos e atenção a algo. Poder ser livre é, portanto, poder ouvir, ouvir o

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que lhe é solicitado, aos três apelos que convocam o Dasein continuamente. O apelo
de si mesmo, de ser leal e fiel a si e com confiança correspondendo a sua própria
essência que é existir. Confiar em si é poder confiar no vir-a-ser. Além de ouvir a si
mesmo, ser livre é ouvir também o chamado do mundo. É responder à convocação de
um mundo que se dispõe como uma oportunidade, uma ocasião. Por fim, ao ouvir a si
mesmo e ouvir o mundo o Dasein se abre à possibilidade de ouvir o apelo do outro, um
outro Dasein. O que nos remete à máxima de que o limite da minha liberdade vai até
onde começa a liberdade do outro. Entretanto, a limitação de minha liberdade está para
além do outro, o limite dela é a minha finitude, meu ser mortal. Somente quando deixo
de ser, deixo de ser livre.

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