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URGÊNCIA-URGENTÍSSIMA

Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do


Estado de São Paulo
Paciente – M, brasileiro, separado judicialmente, empresá rio, portador da Cédula de
Identidade RG-SSP-SP nú mero 4..., inscrito no CPF-MF sob o nú mero..., com endereço à Rua
Roberto C..., 1..., 1... Andar, Bairro Alto de Pinheiros – Sã o Paulo – Capital.
Autoridade Coatora – Exmo. Senhor Juiz de Direito da Meritíssima 2ª Vara Cível do
Foro Regional de Pinheiros
Ato praticado pela Autoridade Coatora no processo número 4001386-
13.2013.8.26.0011 [fls. 258 a 260]
Paulo Antonio Papini, brasileiro, solteiro, Advogado, inscrito na Ordem dos Advogados do
Brasil, Seccional de Sã o Paulo sob o nú mero 161.782 e Ariston Pereira de Sá Filho,
brasileiro, solteiro, Advogado, inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional de Sã o
Paulo, sob o nú mero 355.664, vêm, respeitosamente, à elevada presença desta Excelsa
Corte de Justiça, com supedâ neo legal no artigo 5º, inciso LXVIII da Constituiçã o da
Republica Federativa do Brasil, impetrar em favor do Paciente M..., o competente
Habeas Corpus com Pedido de Liminar[1]
Pelas razões fático-jurídicas a seguir expostas:
Cabimento
O artigo 5º, LXVII, da Constituiçã o Federal dispõ e que:
“conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer
violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder.”
O artigo 647, do Có digo de Processo Penal, por sua vez, é claro ao dizer que:
“Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer
violência ou coação ilegal na sua liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição
disciplinar.”
E explica o artigo 648 o que seria uma coaçã o ilegal, entre outras hipó teses:
“A coação considerar-se-á ilegal:
I – quando não houver justa causa.” (grifos e destaques nossos)
Assim, Excelências, conforme será demonstrado a seguir, a coaçã o impetrada ao Sr. Milton
Antonio Salerno nã o está munida de justa causa, estando justificado, portanto, o
cabimento do presente habeas corpus, pois objetivando a cessaçã o da violência ilegal ao
direito de ir e vir do ora paciente.
Aliá s, o Superior Tribunal de Justiça, no Habeas Corpus 39608, concedeu a ordem em caso
de ordem de prisã o civil por infiel depositá rio. Citamos abaixo a ementa do venerando
aresto:
PROCESSO CIVIL - HABEAS CORPUS - LIMINAR - ATO DE DESEMBARGADOR -
CABIMENTO DA IMPETRAÇÃO - EXCEPCIONALIDADE - DEPÓSITO DE BENS FUNGÍVEIS
- CONTRATO VINCULADO A OPERAÇÕES DE AQUISIÇÃO DO GOVERNO FEDERAL (AGF)
- AÇÃO DE DEPÓSITO INCABÍVEL - NATUREZA DE MÚTUO - PRISÃO CIVIL -
IMPOSSIBILIDADE.
Como adiante demonstraremos, tanto o caso paradigma, supracitado, quanto o caso
presente tratam de violaçã o literal de disposiçã o do Pacto de Sã o José da Costa Rica, razã o
pela qual a ordem deverá ser conhecida e, liminarmente, provida.
Dos Fatos
1. = O paciente é devedor da credora G... Veículos e Peças Ltda, da importâ ncia de R$
253.299,42 (duzentos e cinquenta e três mil e duzentos e noventa e nove reais e quarenta e
dois centavos), dívida esta representada por título de crédito.
1.1 = Esta dívida está ajuizada[2] perante a MM. 2ª Vara Cível do Foro Regional de
Pinheiros, da Comarca de Sã o Paulo[3].
1.2 = Por conta deste processo, no qual o paciente defendera-se através de Curador de
Ausentes, fora determinada, com ampla repercussã o na imprensa, diga-se de passagem, a
apreensã o do Passaporte e da Carteira Nacional de Habilitaçã o, como meio de coerçã o para
que seja “estimulado” o paciente a quitar sua obrigaçã o[4] pecuniá ria[5].
1.3 = Como alhures mencionamos, nã o entramos aqui no mérito da açã o executiva, visto
que nã o é esta o objeto desse Remédio Heroico, mas por conta desta açã o executiva, como
extensamente noticiado pela mídia jurídica, a Autoridade Coatora determinou a apreensã o
e/ou suspensã o do Passaporte, da Carteira Nacional de Habilitaçã o e dos Cartõ es de Crédito
do Paciente[6]. Colamos abaixo a imagem do Site www.jusbrasil.com.br:
1.4 = Com efeito, a decisã o atacada baseia-se no artigo 139, inciso 4º do Novo Có digo de
Processo Civil[1].
1.5 = Entendem os Impetrantes, Exmos. Senhores Desembargadores, que houve excesso – e,
por conseguinte – violaçã o da norma Constitucional no momento em que determina a
apreensã o/suspensã o dos documentos do Paciente, sobretudo, como já dito, da Carteira
Nacional de Habilitaçã o e do Passaporte.
1.6 = Antes de adentrarmos na parte Jurídica e numa abordagem constitucional do
despacho guerreado[2], comentaremos algumas observaçõ es feitas pela Autoridade
Coatora que, em tese, justificariam a suspensã o/apreensã o do Passaporte do Paciente.
1.6.1 = Diz a Autoridade Coatora que se o Paciente nã o tem condiçõ es de solver a dívida
descrita naquele processo em discussã o[3], entã o também nã o teria condiçõ es de arcar
com viagens internacionais[4], razã o pela qual, entã o, justificar-se-ia a apreensã o do
Passaporte.
1.6.2 = Foquemos um pouco nessa frase. A autoridade coatora entende que é irrazoá vel
permitir-se uma viagem para fora do país do paciente, sendo devedor de processos, vez que
com os valores gastos ele – o paciente – poderia tentar honrar seus débitos. Pois bem, se
considerarmos, como as imagens abaixo coladas demonstram, de forma indene de qualquer
dú vida, que uma passagem aérea de ida e volta para Natal, Porto Velho, ou Fernando de
Noronha, frequentemente custam mais caro que uma passagem aérea para Miami, nã o
seria (partindo-se da premissa que o ato da Magistrada Autoridade Coatora nã o viola a
Constituiçã o) irrazoá vel, entã o, que a mesma determinasse a expediçã o de ofícios ao D. A.
C./ANAC proibindo, dessarte, o paciente de pegar determinados ou quaisquer voos.
1.6.3 = Colamos abaixo as imagens comparativas de passagens aéreas para Miami (EUA) e
as outras localidades supracitadas[5], isso para nã o falarmos que uma passagem aérea para
Macapá custa, em média, R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais)[6]:
1.6.4 = Com efeito, Excelência, pela linha argumentativa da Autoridade Coatora se se faz
razoá vel a apreensã o do passaporte do paciente, também se faria razoá vel, sem sombra de
dú vidas, a expediçã o de ofício para ANAC que determinasse a impossibilidade do Paciente
pegar determinados voos[1].
1.6.5 = Eis uma breve síntese do processo que justifica o manejo deste Habeas Corpus
Constitucional.
Do Direito – Da Decisão Atacada e da Violação ao Direito – Constitucional – de Ir e Vir -
a ilegal ordem de apreensão do passaporte
1.7 = Feita a breve exposiçã o acima, caberá , a seguir discutirmos as questõ es legais
afrontadas pela respeitá vel decisã o proferida pela Autoridade Coatora.
2 = Abaixo, citamos o despacho que enseja o manejo deste Remédio Constitucional Heroico:
2.1 = Com efeito, é evidente a violaçã o ao artigo 5º, incisos XV, LIII e LXVIII, da Constituiçã o
da Repú blica[1].
2.1.1 = A Constituiçã o da Republica Federativa do Brasil assegura, como é a norma geral
nos Estados Democrá ticos de Direito, asseguram aos seus cidadã os o Direito de Ir e Vir.
Trata-se, esse Direito daquilo que Norberto Bobbio chama de Direitos [Fundamentais] de
Primeira Geraçã o. Como anota a Dra. Luíza Cassale[2]:
O direito de ir e vir é parte integrante do direito à liberdade pessoal. É direito
fundamental inerente às características essenciais da natureza humana. Pertence ao
grupo denominado por Norberto Bobbio de "direitos de primeira geração", colocado
que está dentre os direitos à vida, à dignidade humana, à segurança, à liberdade de
manifestação do pensamento, à liberdade de consciência, de crença, de associação e
de reunião. É também conhecido como direito de locomoção ou de liberdade de
circulação. Consiste na faculdade de o indivíduo entrar e sair do território nacional
e, dentro do país, de deslocar-se pelas vias públicas ou afetadas ao uso público
[...]Após transcorridos mais de 500 anos da assinatura da Magna Carta, outra
declaração de direitos dos homens, a "Declaração de Direitos da Virgínia", de 16 de
junho de 1776, apesar de não ter garantido, de forma expressa, o direito de
locomoção, deixou-o estabelecido, de forma implícita, na seção I (garantia ao direito
à vida e à liberdade) e na seção VIII (garantia ao direito ao devido processo legal). Na
França, como conseqüência da vitória da revolução burguesa de 1789, foi
promulgada a "Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão", pela Assembléia
Nacional, em 26 de agosto de 1789. Essa declaração, assim como a "Declaração de
Direitos da Virgínia", não menciona, de forma expressa, como o fez a Magna Carta, a
liberdade de locomoção como um dos direitos individuais. Essa garantia, contudo,
está implícita no art. 4º, que se refere ao exercício dos direitos naturais de cada
homem, que tem como limite apenas o direito dos outros. Certamente, dentre os
direitos naturais do homem está o da liberdade de ir e vir e fixar sua residência onde
lhe for mais conveniente.[...]
2.2 = Contudo, muito maior que a previsã o Constitucional, o Direito de Ir e Vir está inserto
no artigo 13 da Declaraçã o Universal dos Direitos do Homem que assim o diz:
I) - Todo homem tem direito à liberdade de locomoção e residência dentro das
fronteiras de cada Estado. II) - Todo o homem tem direito de deixar qualquer país,
inclusive o próprio, e a este regressar.
2.3 = Mais ainda, é importante observar-se que o Ordenamento Jurídico Constitucional,
reconhece, no artigo 5º em seus pará grafos 1º a 4º a aplicabilidade imediata de normas
definidoras de Direitos Fundamentais e, também, aqueles que versem sobre Direitos
Humanos.
2.4 = Posto isto, naquilo que diz respeito à apreensã o do Passaporte, impede, de modo
indene de qualquer dú vida, o exercício prá tico desse direito.
2.5 = Por seu turno o artigo 20 do Decreto 1983 de 1996, elenca as seguintes condiçõ es
como sendo as necessá rias para a obtençã o do Passaporte:
Art. 20. São condições gerais para a obtenção do passaporte comum, no Brasil:
I - ser brasileiro;
II - comprovar sua identidade e demais dados pessoais necessários ao
cadastramento no banco de dados de requerentes de passaportes;
III - estar quite com a justiça eleitoral e o serviço militar obrigatório;
IV - recolher a taxa ou emolumento devido;
V - submeter-se à coleta de dados biométricos; e
VI - não ser procurado pela Justiça nem impedido judicialmente de obter passaporte.
§ 1o Para comprovação dos incisos I a IV, será exigida a apresentação, em original,
dos documentos relacionados em ato do Departamento de Polícia Federal.
§ 2o Havendo fundadas razões, poderá a autoridade concedente exigir a
apresentação de outros documentos além daqueles aludidos no § 1o.
§ 3o Em casos de impossibilidade previstos em ato ministerial, o requerente poderá
ser dispensado da coleta de impressões digitais ou assinatura.
2.6 = Considerando o fato que o Direito de Ir e Vir é enquadrado [e de fato o é] Direito
Fundamental, é certo que a interpretaçã o que deve ser feita do inciso “VI” deverá ser
restritiva, isto é, onde está escrito Justiça deve-se ler: “Justiça Criminal”.
2.6.1 = A limitaçã o ao Direito de Ir e Vir é algo tã o grave quanto a pró pria limitaçã o da
Liberdade, razã o pela qual é necessá rio, apenas pelo quanto aqui arguido, seja reconhecida
a abusividade da Ordem.
2.7 = Importante dizer que no Julgamento do Recurso de Agravo de Instrumento nú mero
2045624-53.2014.8.26.0000 este Tribunal de Justiça do Estado de Sã o Paulo indeferiu o
requerimento de bloqueio de passaporte sob o seguinte argumento:
(...) Quanto à apreensão dos passaportes, medida que poderia impedir a viagem dos
sócios, não cabe ao Juízo Cível tomar esta providência que poderá caracterizar como
modalidade de Interdição do direito de locomoção.(...)
2.8 = Com efeito essa aqui é a grande questã o: penas restritivas de direitos somente podem
ser conferidas ou por ó rgã os administrativos (Tribunal de É tica da OAB ou do CRM, por
exemplo), ou por Juízos Criminais, nã o cabendo a usurpaçã o dessa competência ao
Magistrado que atua na á rea cível ou trabalhista.
2.9 = E nem se diga que o artigo 139 do Novo Có digo de Processo Civil dá esse poder ao
Magistrado na medida em que ele passa a ser uma clá usula aberta. O inciso XXXV[3] da
Constituiçã o Federal dava ao Magistrado, já há quase trinta anos, o mesmo poder hoje
conferido pelo conferido pelo Novo CPC.
2.10 = Em que pese a importâ ncia dada pelo legislador na questã o chamada
“Constitucionalizaçã o do Processo Civil”[4], é certo que o Novo CPC, por mais notá vel que
tenha sido a comissã o de juristas que o formou, nã o pode sobrepor-se à Constituiçã o da
Repú blica, como pretende a Autoridade Coatora.
Do Direito – da Decisão Atacada – da violação do Direito de Ir e Vir - da ilegal e
inconstitucional ordem de Apreensão da Carteira Nacional de Habilitação do Paciente
2.11 = A mesma linha argumentativa que aponta ser ilegal e inconstitucional a ordem de
apreensã o do passaporte do paciente, também é vá lida para a apreensã o da Carteira
Nacional de Habilitaçã o.
2.12 = Em primeiro lugar, é importante salientar que alguém pode ser proprietá rio de um
veículo e nã o o dirigir, ou, por outra, saber dirigir, estar habilitado a tanto, e, contudo, nã o
ser proprietá rio de veículo automotor algum.
2.13 = Como dissemos anteriormente, nã o conhecemos detalhes da vida do Paciente e
pouco importa a estes Impetrantes. O que motiva a impetraçã o deste writ é o abuso
cometido contra a Constituiçã o e, numa escala mais ampla, contra um Direito Fundamental.
2.14 = Colocada a questã o sob esse prisma, cabe ressaltar que as hipó teses passíveis de
cassaçã o/suspensã o do Direito de Dirigir [que também é ligado, de forma indelével, ao
Direito de Ir e Vir] nos sã o dadas, apenas e tã o-somente, pela Lei 9.503/1.997.
2.15 = É importante aqui que se destaque que os artigos 293 a 295 desta norma
estabelecem que a suspensã o do Direito de Dirigir deve ser definida por um período de
tempo específico[5], que a mesma deve prescindir de procedimento pró prio e exija,
necessariamente, o trâ nsito em julgado [podendo excepcionalmente ser concedida em
cará ter cautelar em açã o penal[6]].
2.16 = Francamente, Excelências, nã o nos parece tenha sido a intençã o do legislador, em
momento algum, dar ao Juiz da Vara Cível uma gama de poderes maior que aquela
conferida ao Juízo da Vara Criminal.
2.16.1 = Se assim o é nos parece irrazoá vel e desproporcional, que se permita ao
Magistrado numa açã o de cobrança [que tramita na Vara Cível] a prá tica de um ato
apenató rio que sequer poderia ser praticado pelo Juízo da Vara Criminal.
2.16.2 = Noutras palavras, se for mantida, data má xima vênia, a sui generis decisã o contra a
qual se impetra esta medida, poderíamos chegar à estranha situaçã o: A atropela B
causando-lhe, por culpa, deformidade permanente. Em açã o criminal, além de outras penas,
A tem suspensa sua habilitaçã o por 3 anos. Em açã o cível A é condenado a pagar R$
1.000.000,00. Nã o podendo pagar esta indenizaçã o o Juiz da Vara Cível suspende a
habilitaçã o de A por tempo indeterminado. Teríamos daí a bizarra situaçã o da pena
restritiva de direitos do Juízo Cível ser, na prá tica, mais severa que aquela proferida pelo
Juízo Criminal.
Da Justificativa Apresentada pela Autoridade Coatora para a Medida Indutiva
3. = A Autoridade Coatora utiliza como justificativa para a medida o fato do devedor utilizar
subterfú gios para esconder patrimô nio. Com efeito, e sem entrar no mérito da dívida em si,
mas até onde consta, falsidade ideoló gica, uso de laranjas para esconder patrimô nio,
sonegaçã o de bens, fraude a execuçã o, estelionato, sã o tipificadas criminalmente. Cabe, se o
caso for uma expediçã o de ofício ao MP para a apuraçã o de eventual tipo penal cometido
pelo Paciente.
3.1 = Contudo, o que descabe, e é ilegal e inconstitucional é impor-se uma pena apenas e
tã o-somente em razã o da insuficiência de recursos [ainda que o paciente seja devedor em
inú meros processos, como de fato o é].
3.2 = Aliá s, o mesmo argumento utilizado pelo Exmo. Magistrado para determinar a
suspensã o/apreensã o do passaporte também seria vá lido para determinar-se a suspensã o
do CRM de um médico que nã o honrasse uma obrigaçã o pecuniá ria. Poder-se-ia dizer, tal
como o fez a Autoridade Coatora: “ora, se ele nã o tem condiçõ es de pagar seus débitos;
também nã o tem de comprar os custosos livros e materiais necessá rios à prá tica da
profissã o, logo, determino a suspensã o de seu registro profissional”.
3.3 = Com efeito, Excelência, a utilizaçã o indiscriminada do artigo 139, IV, do NCPC abre as
portas ao arbítrio, de modo que sequer na Ditadura Militar poder-se-ia imaginar. Mas nã o é
só : poderia o Magistrado em seu despacho inferir: “se o devedor nã o tem condiçõ es de
pagar suas dívidas, também nã o tem condiçõ es de comer fora de sua casa, logo, expeça-se
ofício aos restaurantes pró ximos [num raio de Xquiló metros, por exemplo] com a foto do
devedor, impedindo-se-lhe seja o mesmo servido”. O mesmo raciocínio vá lido para a CNH e
Passaporte seria plenamente aplicá vel a estes dois ú ltimos exemplos, a nã o ser é claro o
fato de uma decisã o como essa afetar direitos fundamentais e, também, violar o Princípio
da Dignidade da Pessoa Humana.
Do Direito – da não aplicabilidade da sanção apontada pelo Juízo, em relação ao
Direito de Ir e Vir, por não se tratar de Prestação Pecuniária – Da correta intelecção
do artigo 139, IV do Código de Processo Civil & Das violações ao Pacto de São José da
Costa Rica
4 = Ainda que, por apreço à dialética desconsiderá ssemos tudo o quanto argumentado e
entendêssemos viá vel a supressã o/cassaçã o[7] de um Direito Fundamental[8], temos que,
ainda que consideremos essa hipó tese, que a decisã o atacada excede o limite da norma, isto
é, o artigo 139, IV, do Có digo de Processo Civil. Senã o vejamos:
4.1 = Diz o citado inciso IV[9] que: “IV - determinar todas as medidas indutivas, coercitivas,
mandamentais ou sub-rogató rias necessá rias para assegurar o cumprimento de ordem
judicial, inclusive nas açõ es que tenham por objeto prestaçã o pecuniá ria;”. Pois bem, Exas.,
o conceito de Prestaçã o Pecuniá ria vem do Direito Penal em seu artigo 45[10] o qual diz:
Art. 45. Na aplicação da substituição prevista no artigo anterior, proceder-se-á na
forma deste e dos arts. 46, 47 e 48. (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998)
§ 1o A prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima, a seus
dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social, de importância
fixada pelo juiz, não inferior a 1 (um) salário mínimo nem superior a 360 (trezentos
e sessenta) salários mínimos. O valor pago será deduzido do montante de eventual
condenação em ação de reparação civil, se coincidentes os beneficiários. (Incluído
pela Lei nº 9.714, de 1998)
§ 2o No caso do parágrafo anterior, se houver aceitação do beneficiário, a prestação
pecuniária pode consistir em prestação de outra natureza. (Incluído pela Lei nº
9.714, de 1998)
§ 3o A perda de bens e valores pertencentes aos condenados dar-se-á, ressalvada a
legislação especial, em favor do Fundo Penitenciario Nacional, e seu valor terá como
teto – o que for maior – o montante do prejuízo causado ou do provento obtido pelo
agente ou por terceiro, em conseqüência da prática do crime. (Incluído pela Lei nº
9.714, de 1998)
§ 4o (VETADO)(Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)
4.2 = Assim, o texto do artigo 139, IV do CPC é suficientemente claro deixando apenas
para os casos de indenização por ato ilícito penal e/ou cível, essa possibilidade ao
Magistrado.
4.3 = Isso significa que a possibilidade de adoçã o de medidas indutivas/restritivas de
Direitos, prevista[11] no Novo CPC nã o diz respeito a qualquer dívida, mas apenas e tã o-
somente a dívidas contraídas em razã o de ilícito civil ou penal. Lendo a inicial do processo
de execuçã o verifica-se que a dívida do Paciente para com a empresa credora nasce de
mero débito contratual/quirografá rio, impassível, dessarte, de ser alcançado pelo
apenamento previsto no artigo 139, IV, do Novo Có digo de Processo Civil.
4.3.1 = Como se trata de norma que, em tese, pode afetar/violar Direitos Fundamentais, ela
deve, necessariamente, ser interpretada restritivamente[12] pelo Magistrado e nã o em
cará ter ampliativo, como o fez a Autoridade Coatora. Com efeito, a norma nã o fala em
qualquer espécie de prestaçã o, mas, especificamente, de prestaçã o pecuniá ria, conceito
esse que nos é dado pelo Direito Penal[13].
5 = Quanto à s violaçõ es ao Pacto de Sã o José da Costa Rica, temos também que a decisã o
proferida pela Autoridade Coatora viola, também, o artigo 9º[14] daquela Convençã o, ao
ferir o Princípio da Legalidade e da Retroatividade.
5.1 = Isso significa, com efeito, que ainda que o débito do paciente fosse oriundo de um
crime e/ou ilícito civil, o que – efetivamente – nã o é o caso, apenas poderia ser aplicada a
sançã o prevista no artigo 139 do Novo Có digo de Processo Civil se o elemento formador do
débito tivesse ocorrido apó s a vigência da norma, isto é, em 18 de março de 2.016.
5.2 = Aliá s, a Convençã o de Sã o José também é expressa ao definir que: “2. Toda pessoa
tem o direito de sair livremente de qualquer país, inclusive do próprio.”.
Da ordem liminar
5.1 = O paciente está impedido de exercer seu direito fundamental de se locomover
livremente desde 25 de agosto de 2016, por um ato arbitrá rio da autoridade coatora.
Portanto, apontada a ofensa à liberdade de locomoçã o do paciente em razã o de coaçã o
ilegal em sua liberdade de ir e vir, encontra-se presente, in casu, o fumus boni iuris.
5.2 = No mesmo sentido, verifica-se a ocorrência do periculum in mora, pois, além do fato
de que a liberdade de locomoçã o do paciente, em hipó tese alguma poderia ter sido atingida
em razã o de dívida contratual, por importar em inaceitá vel e injusta violaçã o ao seu status
libertatis, é inegá vel que tal coaçã o ilegal além de poder causar graves transtornos ao
paciente, é também um violento atentado contra a Ordem Jurídica Constitucional
Vigente, razã o pela qual deve ser cessada com a má xima urgência.
5.3 = Presentes, portanto, os requisitos autorizadores da medida liminar.
Do Pedido
6. = Ante o exposto, demonstrada a ilegalidade da ordem que mantém o paciente privado
da liberdade de locomoçã o, requerem os impetrantes a concessã o LIMINAR da ordem,
determinando a imediata devoluçã o do passaporte e afastando a suspensã o da carteira de
habilitaçã o do paciente, determinando-se dessarte, expediçã o de ofício à Autoridade
Coatora para sejam tomadas as medidas cabíveis e urgentes ao desfazimento do ato por ela
praticado.
6.1 = Requerem, outrossim, seja – após a oitiva do Ministério Público, na qualidade de
fiscal da Lei – , o presente pedido de habeas corpus julgado procedente ao final,
confirmando-se a decisã o liminar.
6.2 = Requer, ao final, seja intimada a Autoridade Coatora a prestar informaçõ es.
Nestes termos,
Requer o processamento e deferimento deste Habeas Corpus.
Sã o Paulo, 08 de setembro de 2016.
PAULO ANTONIO PAPINI
OAB/SP nº 161.782
ARISTON PEREIRA DE SÁ FILHO
OAB/SP nº 355.664
Documentos que instruem o presente:
1 – cópia da decisão guerreada;
2 – acórdão paradigma do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, o qual nega a
apreensão do passaporte do devedor;
3 – cópia do acórdão do Superior Tribunal de Justiça que concede Habeas Corpus em
caso de Prisão Civil de Infiel Depositário;
4 – cópia integral do processo 4001386-13.2013.8.26.0011, em trâmite perante a
Meritíssima 2ª Vara Cível do Foro Regional de Pinheiros da Comarca de São Paulo
(autoridade coatora)

[1] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:[...]; XV - e livre a locomoção no território nacional em tempo de paz,
podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair
com seus bens;[...]; LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela
autoridade competente;[...] LXVIII - conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém
sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de
locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder;
[2] CASSALE, Luíza. Direito de Ir e Vir. Revista Jurídica número 294, página 25.
http://www.amdjus.com.br/doutrina/constitucional/18.htm
[3] XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a
direito;
[4] Algo com que concordam os impetrantes deste HC, visto que se especializam –
stricto e lato senso – em Direito Processual Civil.
[5] Algo sequer mencionado pela Insigne Autoridade Coatora em seu
respeitabilíssimo despacho de fls., o qual dá azo a este Habeas Corpus constitucional.
[6] Art. 293. A penalidade de suspensão ou de proibição de se obter a permissão ou a
habilitação, para dirigir veículo automotor, tem a duração de dois meses a cinco
anos. § 1º Transitada em julgado a sentença condenatória, o réu será intimado a
entregar à autoridade judiciária, em quarenta e oito horas, a Permissão para Dirigir
ou a Carteira de Habilitação. § 2º A penalidade de suspensão ou de proibição de se
obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor não se inicia
enquanto o sentenciado, por efeito de condenação penal, estiver recolhido a
estabelecimento prisional. Art. 294. Em qualquer fase da investigação ou da ação
penal, havendo necessidade para a garantia da ordem pública, poderá o juiz, como
medida cautelar, de ofício, ou a requerimento do Ministério Público ou ainda
mediante representação da autoridade policial, decretar, em decisão motivada, a
suspensão da permissão ou da habilitação para dirigir veículo automotor, ou a
proibição de sua obtenção. Parágrafo único. Da decisão que decretar a suspensão ou
a medida cautelar, ou da que indeferir o requerimento do Ministério Público, caberá
recurso em sentido estrito, sem efeito suspensivo. Art. 295. A suspensão para dirigir
veículo automotor ou a proibição de se obter a permissão ou a habilitação será
sempre comunicada pela autoridade judiciária ao Conselho Nacional de Trânsito -
CONTRAN, e ao órgão de trânsito do Estado em que o indiciado ou réu for
domiciliado ou residente.
[7] Algo, ao nosso ver, totalmente irrazoável e desproporcional.
[8] Por tempo indefinido, diga-se de passagem.
[9] Do artigo 139 do Novo Código de Processo Civil.
[10] Alterado pela Lei 9.714/1.998.
[11] Em tese.
[12] Neste sentido, aliás, é expresso o texto do artigo 29 do Pacto de São José da Costa
Rica: Artigo 29 – Normas de interpretação. Nenhuma disposição desta Convenção
pode ser interpretada no sentido de: a) permitir a qualquer dos Estados-partes,
grupo ou pessoa, suprimir o gozo e exercício de liberdades reconhecidos na
Convenção ou limitá-los em maior medida do que a nela prevista; b) limitar o gozo e
exercício de qualquer direito ou liberdade que possam ser reconhecidos de acordo
com as leis de qualquer dos Estados-Partes ou de acordo com outra convenção em
que seja parte um dos referidos estados; c) excluir outros direitos e garantias que
são inerentes ao ser humano ou que decorrem da forma democrática representativa
de governo; e, d) excluir ou limitar o efeito que possam produzir a Declaração
Americana dos Direitos e Deveres do Homem e outros atos internacionais da mesma
natureza.
[13] E é natural que assim o seja, pois nos negócios jurídicos existe a liberdade de
contratar, isto é, o credor tem a opção de contratar com quem possa oferecer, ou não
garantias e aceita esse risco. Já no campo dos ilícitos civis/criminais essa liberdade
deixa de existir. Noutras palavras, uma relação de crédito-débito é estabelecida
independente de qualquer ato volitivo do credor, razão pela qual justifica-se,
dessarte, uma maior proteção jurídica à reparação oriunda desta espécie de dano.
[14] Artigo 9. Princípio da Legalidade e da Retroatividade. Ninguém pode ser
condenado por ações ou omissões que, momento em que foram cometidas, não
sejam delituosas, de acordo com o direito aplicável. Tampouco se pode impor pena
mais grave que a aplicável no momento da perpetração do delito. Se depois da
perpetração do delito a lei dispuser a imposição de pena mais leve, o delinquente
será por isso beneficiado.

[1] Importante aqui fazermos a seguinte menção: Quando trazemos a questão do


preço das passagens aéreas a este Habeas Corpus não estamos a discutir fatos [o que
sabemos ser inadmissível na utilização desse meio extremo de proteção
constitucional], mas, sim, a demonstrar algo que é de conhecimento notório ao
“homus medius”.

[1] Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código,
incumbindo-lhe:[...] IV - determinar todas as medidas indutivas, coercitivas,
mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de
ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária;
[2] O qual, como abordaremos adiante, afronta o Princípio Constitucional da
Dignidade da Pessoa Humana e, também, o Direito Fundamental protegido na
Constituição da Republica Federativa do Brasil, que é a liberdade de ir e vir.
[3] Cujo mérito, repetimos, não pretendemos discutir no presente Habeas Corpus.
[4] Terceira página, 2º parágrafo do respeitável despacho impugnado por esta
medida.
[5] Em ordem, citamos os valores de passagens aéreas para Miami, Porto Velho, Natal
e Fernando de Noronha, observando-se que a menos custosa de todas elas é a com
destino para Miami, nos EUA. [sites:
http://www.decolar.com/shop/flights/results/roundtrip/SÃO/FEN/2017-01-
28/2017-02-18/1/0/0/NA/NA/YC/1/NA?from=SB; http://www.decolar.com/]
[6]http://www.decolar.com/shop/flights/results/roundtrip/SÃO/MCP/2017-01-
28/2017-02-18/1/0/0/NA/NA/YC/1/NA?from=SB

[1] Apesar de assinado através do protocolo digital do Dr. Paulo Antonio Papini, esta
petição fora elaborada em conjunto pelos Advogados Paulo Antonio Papini e Ariston
Pereira de Sá Filho.
[2] Processo que tramita sob o número 4001386-13.2013.8.26.0011.
[3] Ora Autoridade Coatora.
[4] Devemos observar que o artigo 139, IV, do NCP fala expressamente em Prestação
Pecuniária.
[5] Obrigação pecuniária essa que não é objeto deste remédio heroico, e nem poderia
sê-lo.
[6] Como essa ação objetiva assegurar a defesa constitucional e intransigente do
Direito de Ir e Vir do Paciente, apenas, o presente Habeas Corpus tratará apenas das
questões relacionadas ao Passaporte e à Carteira Nacional de Habilitação.

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