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FISIOTERAPIA

RESPIRATÓRIA E
EM TERAPIA
INTENSIVA
Desmame e
extubação
Naylla Morais de Souza

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

>> Reconhecer as características do desmame da ventilação mecânica.


>> Descrever o procedimento de extubação.
>> Demonstrar o papel do fisioterapeuta no desmame e extubação do paciente.

Introdução
Os procedimentos de desmame e extubação integram o papel do fisioterapeuta
dentro da unidade de terapia intensiva (UTI) com seus cuidados contínuos com o
paciente; para isso, é necessário conhecer as características do procedimento e
seus requisitos básicos, de modo a reconhecer o paciente elegível e diminuir suas
chances de complicações durante a jornada na terapia intensiva.
O desmame da ventilação mecânica envolve um processo de observação con-
tínua e trabalho em equipe, em que o fisioterapeuta atua com técnicas e métodos
para promover a melhora da capacidade funcional do paciente, colaborando
com sua transição da ventilação mandatória para a espontânea, vencendo o
procedimento da extubação e posterior alta da UTI. As características, os escores
e índices apontados nesse contexto são de grande importância nas escolhas do
fisioterapeuta intensivista.
Neste capítulo, você vai conhecer mais sobre as principais características
do desmame da ventilação mecânica e da extubação, os principais parâmetros
preditivos e critérios para a sua realização, assim como o papel do fisioterapeuta
no processo de desmame e extubação.
2 Desmame e extubação

Características do desmame da ventilação


mecânica
O desmame da ventilação mecânica (DVM) é uma etapa importante para a
transição do paciente da ventilação mecânica invasiva para a ventilação
espontânea. Além disso, também é importante para a equipe multidisciplinar,
que demonstra atenção com seu paciente diante da resolução parcial ou
completa da patologia que culminou na internação e de várias possibilidades,
como os requisitos de desmame de acordo com diferentes patologias e a rápida
intervenção para evitar complicações associadas aos período prolongado e
de longo prazo em ventilação mecânica (VM).
O desmame envolve dois conceitos diferentes: a retirada do paciente
da ventilação mecânica — o desmame, que pode ocorrer de forma rápida,
gradual ou difícil —, e a remoção do tubo endotraqueal, um processo cha-
mado extubação — além disso, se o paciente for traqueostomizado será
feita a decanulação. O procedimento da traqueostomia precoce é uma opção
que ocorre até 48 horas do início da VM nos pacientes com previsão longa
permanência nessa ventilação, ou seja, é uma intervenção que visa reduzir
complicações como a pneumonia associada à VM, tempo de internação em
UTI e redução de mortalidade (GOLDWASSER, 2007).
Estima-se que cerca de 70 a 80% dos pacientes ventilados mecanica-
mente passam pela etapa de desmame de forma rápida e fácil, mas existe
uma parcela de pacientes que permanecem em VM por tempo prolongado.
Cerca de 40 % do tempo total de internação do paciente em VM é destinado
ao processo de desmame (MACHADO, 2013), com variações relacionadas à
etiologia da patologia do paciente, como a insuficiência respiratória (NEMER;
BARBAS, 2011). O DVM aborda a retirada gradual ou abrupta do da ventilação
mecânica invasiva e tem o objetivo de estabelecer um prognóstico para esse
processo com base na opinião clínica da equipe e com fundamentação nos
parâmetros do paciente, como dados do teste de respiração espontânea (TRE),
relação frequência respiratória (FR)/volume corrente (VC) ou Índice de Tobin e
a pressão inspiratória máxima (PImáx), além de um conjunto de outros fatores
que devem ser analisados em associação ao diagnóstico clínico do paciente
(NEMER; BARBAS, 2011). Esse processo de decisão clínica deve ser feito com
agilidade e metodologia adequada às condições clínicas do paciente; por
isso, a seguir, você conhecerá as principais características do desmame e os
parâmetros preditivos mais usados na prática diária em UTI.
Desmame e extubação 3

É importante atentar-se para o fato de que a duração da VM é determinada


pela gravidade da patologia e dos distúrbios do paciente. Muitas práticas
devem ser revisadas diariamente com o objetivo de retirá-lo o mais breve
possivel da VM. Nesse contexto, uma prática comum é a da sedação profunda
e o uso de benzodiazepínicos, como midazolam e lorazepam, que estão as-
sociados a atrasos no desmame (MARINO, 2015). Os critérios de aptidão que
indicam que o suporte ventilatório pode ser descontinuado e que o paciente
é um candidato para um TRE são demonstrados na lista de verificação para
identificação de candidato para essa prática (Figura 1).

Figura 1. Lista de verificação para identificação de candidato para um teste de respiração


espontânea. PaCO2: pressão parcial de dióxido de carbono; PaO2: pressão alveolar de oxigênio;
SaO2: saturação arterial de oxigênio; FiO2: fração inspiratória de oxigênio; PEEP: pressão
expiratória final positiva; PA: pressão arterial; BPM: batimento por minuto.
Fonte: Adaptada de Marino (2015).

É fundamental que os parâmetros presentes nessa lista sejam verificados


diariamente pela equipe, como o nível de consciência do paciente por meio
da escala de coma de Gasglow e dos ajustes no modo de ventilação mecâ-
nica, propiciando ao paciente modos ventilatórios que favoreçam o drive
respiratório, estimulando a sua independência dos modos controlados para
os modos assistidos e conduzindo-o para uma ventilação de suporte. Uma
recomendação de Machado (2013) para otimizar o desmame é identificar
as causas que podem contribuir para a dependência da VM em pacientes
ventilados por um periodo maior que 24 horas; pacientes com insuficiência
respiratória devem ser submetidos a uma avaliação formal de interrupção.
Alguns critérios que podem ser adotados são os da lista de evidências de
reversão do fator causal da insuficiência respiratória (Quadro 1).
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Quadro 1. Lista de evidências de reversão do fator causal da insuficiência


respiratória

Oxigenação adequada

PaO2/FiO2 > 200 mmHg

PaO2/FiO2 ≥ 0,35, onde PaO2 é a pressão alveolar de O2 < 350 mmHg para FiO2 =
1,0

PEEP ≤ 5 a 8 cm H2O e FiO2 ≤ 40 a 50 %

Estabilidade hemodinâmica

Sem evidência de isquemia miocárdica

Frequência cardíaca < 140 bpm

Sem terapia vasopressora

Afebril (temperatura < 38º)

Acidose respiratória não-significativa

Hemoglobina adequada (> 8 a 10 g/dL)

Adequado estado mental (escala de Gasglow


> 13, sem infusão de sedativos)

Estado metabólito normal

Fonte: Adaptado de Machado (2013).

Nesse contexto, há métodos para sugestão de desmame, como a resolução


da fase aguda da doença e a avaliação da capacidade do paciente de iniciar
esforço respiratório com uma permanência de 30 a 120 minutos fora do res-
pirador, o que demonstra que é possível iniciar o processo de DVM. De forma
contrária, algumas medidas que mostram insucesso são a piora do status
mental, início ou piora do desconforto respiratório, sudorese e aumento do
trabalho respiratório (MACHADO, 2013). Outros elementos que dificultam o
DMV são apresentados na Figura 2, a seguir.
Desmame e extubação 5

Figura 2. Elementos que dificultam o desmame da ventilação mecânica.


Fonte: Adaptada de Sengupta, Chakravarty e Rudra (2018).

De acordo com Sengupta, Chakravarty e Rudra (2018), são exemplos desses


fatores que dificultam o desmame: edema, fibrose, atelectasia, secreções
pulmonares, derrame pleural, obesidade e a síndrome de hipoventilação por
obesidade, broncoconstrição, hiperinsuflação dinâmica em doença pulmonar
obstrutiva crônica (DPOC), via aérea artificial bloqueada, edema ou obstrução
da via aérea neuromiopatia e miastenia. Além desses sinais, existem critérios
para definir a falha no desmame (Quadro 2) e que devem ser usados como
meio de prevenção de falhas e complicações.

Quadro 2. Critérios para definir a falha no desmame

Sinais de intolerância à respiração espontânea (falha de desmame)


PaO2 < 50-60 mmHg com FiO2 > 0,5
SaO2 < 88-90% com FiO2 > 0,5
PaCO2 > 50 mmHg ou elevação em mais de 8 mmHg
pH < 7,32 ou redução em mais de 0,07
FR (frequência respiratória) > 35 ciclos/min ou elevação em mais de 50%
FC (frequência cardíaca) > 140 bpm ou elevação em mais de 20%
PAS (pressão arterial sistêmica) > 180 mmHg ou < 90 mmHg
Agitação psicomotora incontrolável
Redução do nível de consciência
Sudorese excessiva e cianose
Evidência de elevado esforço muscular respiratório

Fonte: Adaptado de Nemer e Barbas (2011).


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No método de prevenção de falhas, devem ser observados os critérios


considerados como subjetivos do DMV, como a análise da taquipneia, diafo-
rese (sedação, transpiração intensa), instabilidade hemodinâmica e sinais de
desconforto respiratório. Diariamente, esses valores devem ser observados,
com os índices integrados na avaliação do paciente que envolvem elementos
de complacência da parede torácica, níveis de oxigenação e de pressão,
índices de desmame e o índice de respiração rápida e superficial (IRRS) ou
índice de Tobin, com o qual é calculada a frequência respiratória dividida pelo
volume corrente (em L) — esse índice é muito usado no teste de tubo T, como
preditor de desmame bem-sucedido (SENGUPTA; CHAKRAVARTY; RUDRA, 2018).
Além desses, outros escores, como o Sequential Organ Failure Assessment
(SOFA) e o Acute Physiology and Chronic Health Evaluation (APACHE), assim
como várias ferramentas, incluindo Burn, Morganroth e Corgian, têm sido
usados no​​ DMV (DEHGHANI; ABDEYAZDAN; DAVARIDOLATABADI, 2016; SENGUPTA;
CHAKRAVARTY; RUDRA, 2018).
Os testes de respiração espontânea (TRE) amplamente usados nesse
processo podem ser conduzidos com o uso de circuito do ventilador ou des-
conectando o ventilador. De acordo com Nemer e Barbas (2011), esse teste
pode ser feito considerando um período de tempo entre 30 minutos e 2 horas,
em Pressure Support Ventilation (PSV, ventilação com suporte pressórico)
de 7 cmH2O, em Continuous Positive Airway Pressure (CPAP, pressão positiva
contínua nas vias aéreas) ou em respiração espontânea não assistida através
do tubo T, sendo recomendada a opção por algum desses antes da extubação.
De acordo com Marino (2015), algumas medidas podem ser usadas para
prever um teste de TRE bem-sucedido (Quadro 3), usando o circuito do venti-
lador, com a vantagem de monitorização de VC e frequência respiratória (FR),
uma vez que o aumento do índice de Tobin indica um desconforto respiratório
com uma respiração rápida e superficial, característica comum em pacientes
que falham no TRE. No Quadro 3, são indicadas medidas de previsão desse
tipo de falha, em que se considera a necessidade do teste dos dois minutos
iniciais de respiração espontânea e a razão de verossimilhança, que é a pro-
babilidade de que a medida preverá o sucesso dividida pela probabilidade
de que a medida preverá a falha — a partir disso, as decisões clínicas podem
ser tomadas em relação aos parâmetros (MARINO, 2015).
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Quadro 3. Medidas usadas para prever um teste de respiração espontânea


bem-sucedido

Faixa de razão de
Medida Limiar de sucesso verossimilhança

VC 4 a 6 mL/ kg 0,7 – 3,8

FR 30 a 38 rpm 1,0 – 3,8

Razão FR/VC 60 a 105 rpm/ L 0,8 – 4,7

Pressão Inspiratória -15 a -30 cmH2O 1,0 – 3,0


máxima (PImáx)

Fonte: Adaptado de Marino (2015).

Após a verificação dos parâmetros qua apontam possíveis falhas e sucesso,


a aplicação do TRE se torna menos complexa. Dessa forma, quando é feito
com o paciente desconectado do ventilador, usa-se o circuito em forma de T,
uma fonte de oxigênio (O2) é fornecida ao paciente com elevada velocidade de
fluxo, maior que sua velocidade de FiO2, o que também ajuda no impedimento
de reinalação do dióxido de carbono (CO2) (Figura 3).

Figura 3. Adaptador em forma de “T” no circuito respiratório simples para TRE independente
do ventilador.
Fonte: Marino (2015, p. 546).
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A desvantagem desse método é a falta de monitorização de VC e FR (MA-


RINO, 2015), falta de controle da FiO2, colapso alveolar devido a ausência de
PEEP e resistência imposta pelo tubo traqueal, o que pode aumentar o trabalho
respiratório (MACHADO, 2013). O desmame em tubo T (Figura 4) ocorre com a
presença de estabilidade clínica e é simples, mas, devido à falta de alarmes,
é necessária atenção redobrada ao paciente nesse período.

Figura 4. Adaptador em forma de “T” no circuito respiratório simples para TRE independentes
do ventilador.
Fonte: Adaptada de Machado (2013).

O fisioterapeuta que atua em UTI necessita de amplo conhecimento


sobre a ventilação mecânica invasiva e não invasiva. As características
da ventilação não invasiva (VNI) e seus recursos são importantes no processo de
decisão após a extubação; assim, o fisioterapeuta precisa estar atualizado sobre
os melhores recursos de VNI para evitar complicações. Para saber mais sobre o
assunto, leia o artigo “Ventilação mecânica não invasiva após desmame bem-
-sucedido: uma comparação com a máscara de Venturi”, de Esra Adiyeke et al. (2016).

Estima-se que os pacientes com período prolongado de dependência de


ventilador, com três ou mais semanas, ou 21 dias, têm necessidade de testes
mais longos de respiração espontânea; portanto, apesar de ser simples, é
necessário adequar o método à condição do paciente: em tubo T, pela Syn-
chronized Intermittent Mandatory Ventilation (SIMV, ventilação mandatória
intermitente sincronizada), que admite ciclos controlados, assistidos e espon-
tâneos, ou por meio do Pressure Support Ventilation (PSV, suporte pressórico),
que oferta uma pressão de suporte ao paciente, tornando a oferta de FiO2 e VC
agradável ao paciente para a manutenção da PEEP — assim, aumentando, aos
poucos, o controle do paciente sobre a sua mecânica ventilatória, vencendo
a ventilação artificial e retomando a espontânea.
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A análise das condições de vias aéreas também deve ser observada e


pode ser feita por meio do teste de permeabilidade (ou cuff leak test), com
o qual é mensurado o volume corrente expiratório pelo tubo traqueal com o
balonete insuflado e, depois, com o balonete desinsuflado, quando se realiza
a medição novamente. Esse teste avalia a obstrução de via aérea superior por
meio da existência de escape aéreo ao redor do tubo traqueal. Ao notar que
existe espaço entre o tubo e a via aérea, o volume corrente expiratório será
menor que o volume corrente inspiratório, sugerindo menor chance de edema
laríngeo e estridor após extubação; é por isso que seu objetivo é estimar o
risco de estridor pós-extubação traqueal em pacientes com permanência
igual ou maior que 48 horas em ventilação mecânica (GOLDWASSER, 2007).

Procedimento de extubação
Os pacientes que têm sucesso no TRE devem ser avaliados para o processo
de extubação, ou seja, para a retirada da via aérea artificial. Aqui, o objetivo,
além de retirar a via aérea artificial, é analisar a capacidade do paciente de
manter a ventilação espontânea, de eliminar secreção das vias aéreas e avaliar
o risco de edema sintomático da laringe como precaução de complicações
após a extubação (MARINO, 2015). Para a extubação, é necessária a boa hi-
gienização pulmonar e oral, ou seja, se houver secreção subglótica, deve ser
considerado o procedimento de aspiração, e é necessário que o paciente esteja
sentado e recostado (fowler ou semi-fowler) (ULTRA, 2009) ou com elevação
da cabeceira em uma angulação entre 30 e 45° (GOLDWASSER, 2007). Os sinais
vitais são verificados e, se houver normalidade, o cuff é esvaziado e, assim
que o paciente realizar a expiração, o tubo pode ser retirado e o paciente é
orientado a tossir logo em seguida. Como forma de precaução, é importante
que a oxigenoterapia esteja preparada, sendo os macronebulizadores e
máscara de Hudson os mais adequados devido a umidificação e oferta maior
de O2 se necessário (ULTRA, 2009).
Com o término do procedimento de retirada do tubo, deve ser instalada
a oxigenoterapia e feita a ausculta pulmonar. Após 30 minutos, é feita a
gasometria arterial, e o paciente permanecerá em vigilância (ULTRA, 2009); a
partir desse momento, serão definidas estratégias de assistência ventilatória
diferenciadas de acordo com a evolução do paciente.
É necessário estabelecer um plano de falha de extubação e conhecer quais
mecanismos de ventilação não invasiva (VNI) imediata podem ser usados
após extubação, caracterizando o uso profilático e os riscos conhecidos
como: hipercapnia, insuficiência cardíaca congestiva, tosse ineficaz ou se-
10 Desmame e extubação

creção retida em vias aéreas. Considera-se com risco de falha o paciente


com histórico de mais de um fracasso no TRE, com várias comorbidades, com
obstrução das vias aéreas superiores, idade maior que 65 anos, avaliado por
um Acute Physiology and Chronic Health Evaluation (APACHE) maior que 12
no dia da extubação, com tempo de ventilação mecânica maior que 72 horas
ou, ainda, que seja portador de doenças neuromusculares ou que seja obeso
(BARBAS et al., 2014).
Algumas estratégias após extubação, de acordo com a condições clínicas do
paciente, como a VNI intermitente, ou seja, o Bilevel Positive Pressure Airway
(BIPAP, via aérea de pressão positiva de dois níveis) ou Continuous Positive Airway
Pressure (CPAP, pressão positiva contínua nas vias aéreas), manobras de higiene
brônquica, posicionamento adequado, manobras reexpansivas, otimização da
tosse e posicionamento fora do leito assim que possível (após 24 horas após a
extubação) (ULTRA, 2009) não serão aplicadas no caso de insucesso da extubação,
também chamado de reintubação, que é considerada precoce quando ocorre
em menos de 48 horas após a extubação — uma das suas principais falhas é o
edema de laringe (GOLDWASSER, 2007). Por esse motivo, a análise das condições
de vias aéreas através do teste de permeabilidade é tão relevante.

Os preditores de complicações em UTI são recursos que podem


ser usados como auxiliares no processo de decisão clínica após a
extubação. Conheça o cuff leak test, um teste simples e não invasivo que indica
a ocorrência de complicações das vias aéreas superiores e é amplamente usado
como preditor de complicações pós-extubação na dissertação de Verônica
Farias de Vargas (2016).

Os pacientes que tiveram falha nesse processo precisam de pelo menos


24 horas de ventilação mecânica enquanto a equipe reavalia as falhas e
as posteriores estratégias para extubação. Esse processo da reintubação
representa um risco maior de mortalidade para o paciente em comparação
com os que tiveram sucesso no desmame e extubação, o que requer maior
atenção ao DMV, uma vez que até mesmo o uso de drogas vasoativas em doses
maiores que 5 mg/kg pelo peso corporal podem interferir nesse processo,
pois indica insucesso na extubação no momento do TRE.
Outro teste relevante preditor de falha é o teste do cartão branco, em
que se insere um cartão branco a 1 ou 2 cm da entrada do tubo orotraqueal
e solicita-se ao paciente que realize três ou quatro esforços de tosse. O re-
sultado positivo ocorre se o cartão voltar com qualquer umidade, indicando
a capacidade do paciente para o procedimento, e o resultado negativo é
Desmame e extubação 11

indicativo de insucesso do desmame (FARIA; TEIXEIRA; FARIA, 2019), ou seja,


a clínica do paciente é soberana e todos os seus parâmetros e preditores
clínicos devem ser cuidadosamente avaliados para o seu retorno a ventilação
espontânea. Se hover falha na extubação ou o seu insucesso, deve-se conhecer
o seu motivo e, enquanto isso, o paciente retorna ao processo de desmame.

Atuação fisioterapêutica no desmame


e na extubação do paciente
A atuação fisioterapêutica em UTI é benéfica aos pacientes com disfunções
musculares, neurológicas, cardíacas e respiratórias que, desde o momento de
internação, necessitam de cuidados intensivos para evitar complicações nos
procedimentos aos quais são submetidos. Neste tópico, veremos a atuação
do fisioterapeuta no desmame e na extubação, que são etapas importantes
para a independência do paciente do ambiente de terapia intensiva.
A reabilitação precoce e regular nos pacientes hemodinamicamente estáveis
está relacionada a menor duração da VM (MARINO, 2015). O fisioterapeuta é
responsável pelo diagnóstico fisioterapêutico e posterior tratamento de pacien-
tes internados em UTI, na condução inicial na adaptação à VM, nas estratégias
empregadas, na monitorização contínua e na mobilização precoce, que precisa
ser iniciada preferencialmente nas 72 horas do início da VM (BARBAS et al.,
2014), assim como no desmame, na extubação, no transporte intra-hospitalar,
na decanulação, dentre outros. Além desses procedimentos, deve-se proceder
com a reabilitação e o uso de técnicas de auxílio e aumento da tosse, tosse
assistida manual (ROSE et al., 2017), adequação da oxigenoterapia e escolha da
interface, avaliação e treino da musculatura respiratória, manobras de higiene
brônquica, como posicionamento, insuflação manual, vibração e compressão
torácica, aspiração nasotraqueal de secreção pulmonar e posicionamento que
auxilie no reestabelecimento da ventilação espontânea adequada.
São inúmeras as desvantagens no período prolongado em terapia intensiva,
como o excesso de secreção, que pode interferir negativamente na extuba-
ção, assim como a fraqueza muscular respiratória, muitas vezes gerada pela
ventilação mecânica controlada a longo prazo que interfere no desmame,
os distúrbios ventilatórios preexistentes ou não, os neuromusculares e os
efeitos da sedação. No DMV, é necessária a monitorização da sedação, que
pode ser por meio das escalas Sedation and Agitation Scale (SAS, Escala de
Sedação e Agitação) ou Richmond Agitation and Sedation Scale (RASS, Escala
de agitação e sedação de Richmond) (BARBAS et al., 2014), sendo essencial a
sua retirada total para o sucesso do desmame.
12 Desmame e extubação

O paciente deve ser reavaliado diariamente pelo fisioterapeuta, que realiza


a avaliação respiratória constatando se existem anormalidades (Figura 5) ao
auscultar crepitações (ruídos anormais descontínuos), se o fluxo aéreo gerado
pelo paciente é capaz de movimentar secreções ou líquidos em vias aéreas,
se existem sibilos (sons agudos e finos), que indicam estreitamento das vias
aéreas, e roncos (sons graves e grossos), indicadores de vibrações geradas
quando o ar flui em alta velocidade. Verifica-se a frequência respiratória, se
apneico (ausência de respiração), bradipneico (frequência respiratória lenta
< 12 respirações por minuto-rpm), eupneco (frequência respiratória normal
(12 a 20 rpm) ou taquipneico (frequência respiratória rápida > 20 a 30 rpm), e
também os ritmos respiratórios, se Kussmaul, Cheyne-stokes ou Biot, além
da saturação arterial de oxigênio (SatO2) e de dados de gasometria arterial.

Figura 5. Anormalidades na frequência e no ritmo respiratório.


Fonte: Barros (2016, p. 221).
Desmame e extubação 13

No DVM, o fisioterapeuta usa seus conhecimentos sobre assistência ven-


tilatória e suas variáveis de controle:

„„ disparo, que está relacionado à fase inspiratória e pode ser a tempo,


fluxo e pressão;
„„ ciclagem, que está relacionada ao final da inspiração e pode ser a
tempo, fluxo, pressão e volume;
„„ limite, que está relacionado ao nível de um parametro que é atingido
antes do fim da inspiração e pode ser a pressão, volume ou fluxo.

A observação dessas variáveis ocorre com os modos ventilatórios, que


podem ser de ventilação mandatória, de ventilação espontânea e em modo
combinado (mandatória e espontânea). Além disso, podem ser convencio-
nais, como a Controlled Mandatory Ventilation (CMV, ventilação mandatória
controlada), a Assisted Mandatory Ventilation (A/CMV, ventilação mandatória
assistida), a Intermittent And Synchronized Mandatory Ventilation (SIMV, ven-
tilação mandatória intermitente e sincronizada), a Ventilation with Pressure
Support (PSV, ventilação com suporte pressórico) e a CPAP, dentre outras,
ou não convencionais, como a Volume Support Ventilation (VVS, ventilação
por volume de suporte), a BIPAP e a Proportional Assisted Ventilation (PAV,
ventilação assistida proporcional), dentre outras (ULTRA, 2009).
A assistência fisioterapêutica no processo de desmame envolve condutas
que possibilitem manter o sincronismo do ventilador mecânico e do paciente
a ponto de evoluir da ventilação mandatória para a combinada e espontânea.
Assim que for notada a capacidade em assumir menos tempo conectado à
ventilação mandatória com mais drives respiratórios, é iniciada a combinação
de exercícios respiratórios com exercícios sistêmicos para evitar atrofias mus-
culares, otimizar a perfusão muscular e respiratória e a redução da pós-carga
para a melhora da contratilidade miocárdica, de acordo com a sua doença de
base, a cronicidade e intervenções de sucesso e insucesso (CUELLO; AQUIM;
CUELLO, 2013). Além disso, são feitos exercícios passivos enquanto sedados
ou com comprometimento cognitivo; quando a sedação é retirada de forma
gradual, as condutas são modificadas e os exercícios passam a ativo-assistidos.
O sucesso no DVM está relacionado à extubação e à não necessidade de
VM nas 48 horas após o desmame. Não podemos confundir a falha no DVM,
que é a dificuldade do paciente de aceitar o TRE sem o suporte ventilatório,
e a falha de extubação, quando o paciente não tolera a extubação, tornando
o processo demorado e com mais riscos.
14 Desmame e extubação

O fisioterapeuta pode utilizar várias técnicas, como a ventilometria,


que inclui a avaliação do índice de Tobin, cujos valores ideais são menores
de 105, e demonstra valores do padrão de respiração rápida e superficial.
A ventilometria é mensurada a partir do ventilômetro e é considerada um
teste de capacidade pulmonar cujos parâmetros de análise são volume
minuto, volume corrente, frequência respiratória e a capacidade vital do
paciente (AZEREDO, 2002; REGENGA, 2000). O fisioterapeuta pode conectar
o ventilômetro à interface escolhida, que pode ser tubo traqueal, cânula de
traqueostomia, máscara facial ou bocal com clipe nasal, de acordo com a
finalidade de sua avaliação, e deve orientar ao paciente que inspire e expire
normalmente, registrando as incursões respiratórias completas pelo período
de um minuto com o uso de um cronômetro — enquanto isso, o ventilômetro
marca o volume/minuto do paciente (AZEREDO, 2002; REGENGA, 2000).
A manovacuometria é outro teste de função pulmonar que avalia a força
muscular respiratória, o que é muito necessário no paciente em desmame devido
à fraqueza dos músculos respiratórios, que, por vezes, dificulta a retirada do
suporte ventilatório, principalmente quando o paciente não tem tosse eficiente.
Dessa forma, após o sucesso do processo de desmame e extubação, o fisiote-
rapeuta avalia a PImáx, que reflete a capacidade de expansão da caixa torácica
pelos músculos respiratórios, e a PEmáx, que reflete a força de expulsão indicando
a eficiência da tosse. Esses índices podem representar quadros de fraqueza
muscular, fadiga muscular e falência muscular (Quadro 4) e devem ser usados
como parâmetros nas condutas fisioterapêuticas de treino muscular respiratório.

Quadro 4. Alterações funcionais nos músculos respiratórios

Fraqueza muscular Fadiga muscular Falência muscular


PImáx < -60 cm H2O PImáx < -40 cm H2O PImáx < -20 cm H2O
CV < 50 ml/kg CV < 30 ml/kg CV < 15 ml/kg
PEmáx < +30 cm H2O
CV < 5 ml/kg
Sinais clínicos
Dispneia leve Taquipneia Incapacidade de manter
Inspiração profunda Tosse e inspiração pro- respiração espontânea
Capacidade de tosse funda irrealizável
Respiração paradoxal
Suporte
Treinamento muscular Assistência ventilatória Ventilação mecânica
respiratório (TMR) mais TMR

Fonte: Adaptado de Cuello, Aquim e Cuello (2013).


Desmame e extubação 15

Para os casos de fraqueza muscular, devem ser traçadas condutas que


incluam exercícios para o padrão respiratório, para o aumento da força e/ou
resistência dos músculos ventilatórios — ressaltando que, quando o paciente
demonstra fadiga muscular, é indicada assistência ventilatória e treino mus-
cular. Dessa forma, a atuação no processo de extubação do paciente pelo
fisioterapeuta consiste na monitorização continua, na perviedade das vias
aéreas superiores com técnicas de desobstrução brônquica, na aspiração
para diminuição de secreção retirada do tubo, caso necessário, e na assis-
tência com a oxigenoterapia e na escolha da máscara ou outra interface.
O acompanhamento após a extubação, quando bem-sucedida, é feito com
treinamento muscular respiratório e exercícios ativos ou ativo-assistidos para
que o paciente retorne a uma boa condição funcional e obtenha alta da UTI.
A internação em UTI é necessária para a sobrevivência de indivíduos em
algumas situações, e o fisioterapeuta é um dos profissionais responsáveis na
condução desse paciente pelo menor tempo possível nesse tipo de unidade
de internação. A atuação fisioterapêutica é ampla e necessária aos pacientes
em ventilação mecânica, pois esse período dedicado à resolução da patologia
ou do acidente que culminou na internação é acompanhado de imobilidade
no leito e declínio da capacidade funcional do paciente, principalmente
quando ocorrem perdas cognitivas e sua capacidade de compreensão é
limitada. Diversos procedimentos são fundamentais a esses pacientes, como
a monitorização contínua e condutas de reabilitação física empregadas —
desde a introdução da ventilação mecânica, seu desmame e processo de
extubação —, com condutas assertivas, pautadas no conhecimento teórico
das características do desmame para a gradual independência do paciente
até o momento de sua alta dessa unidade. Assim, o objetivo do profissional
de fisioterapia com esses pacientes é conduzir a sua internação até a alta
utilizando métodos, recursos e técnicas adequados e eficientes para que
vençam essa etapa com boa capacidade funcional para retornar a suas ati-
vidades de vida diária.

Referências
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Leitura recomendada
ADIYEKE, E. et al. Ventilação mecânica não invasiva após desmame bem-sucedido: uma
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