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Governo Federal

Dilma Vana Rousseff


Presidente

Ministério da Educação
Aluísio Mercadante
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CAPES
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Presidente

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João Carlos Teatini de Souza Clímaco

Governo do Estado
Ricardo Vieira Coutinho
Governador

UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA


Marlene Alves Sousa Luna
Reitora

Aldo Bezerra Maciel


Vice-Reitor

Pró-Reitor de Ensino de Graduação


Eli Brandão da Silva

Coordenação Institucional de Programas Especiais – CIPE


Secretaria de Educação a Distância – SEAD
Eliane de Moura Silva

Assessora de EAD
Coord. da Universidade Aberta do Brasil - UAB/UEPB
Cecília Queiroz
Adriana Rodrigues Pereira de Souza
Fabiene Araújo Batista
Francisca Maria de Mélo

Teorias Linguísticas III

Campina Grande-PB
2012
Universidade Estadual da Paraíba
Marlene Alves Sousa Luna
Reitora
Editora da Universidade
Estadual da Paraíba
Aldo Bezerra Maciel
Vice-Reitor
Diretor
Pró-Reitora de Ensino de Graduação
Cidoval Morais de Sousa
Eliana Maia Vieira
Coordenação de Editoração
Arão de Azevedo Souza Coordenação Institucional de Programas Especiais-CIPE
Secretaria de Educação a Distância – SEAD
Eliane de Moura Silva
Conselho Editorial
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Rosilda Alves Bezerra - UEPB
Waleska Silveira Lira - UEPB Projeto Gráfico
Arão de Azevêdo Souza

Revisora de Linguagem em EAD


Rossana Delmar de Lima Arcoverde (UFCG)

Revisão Linguística
Maria Divanira de Lima Arcoverde (UEPB)

Diagramação
Arão de Azevêdo Souza
Gabriel Granja

FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL - UEPB


410
S729t Souza, Adriana Rodrigues Pereira de.
Teorias linguísticas III./Adriana Rodrigues Pereira de Souza; Fabiene Araújo
Batista; Francisca Maria de Mélo;UEPB/ Coordenadoria Institucional de
Programas Especiais, Secretaria de Educação a Distância._Campina Grande:
EDUEPB, 2012.
178 p.: Il. Color.

ISBN 978-85-7879-110-0

1. Linguística. 2. Funcionalismo Linguístico. 3. Análise do Discurso. I.


Titulo. II. Batista, Fabiene Araújo. III.Mélo, Francisca Maria de. IV.EDUEPB/
Coordenadoria Institucional de Programas Especiais.
21. ed.CDD
EDITORA DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA
Rua Baraúnas, 351 - Bodocongó - Bairro Universitário - Campina Grande-PB - CEP 58429-500
Fone/Fax: (83) 3315-3381 - http://eduepb.uepb.edu.br - email: eduepb@uepb.edu.br
Sumário

I Unidade
Formalismo e Funcionalismo Linguístico..............................................7

II Unidade
Funcionalismo Linguístico Norte-Americano......................................23

III Unidade
Funcionalismo Linguístico Europeu: Linguística
Sistêmico-Funcional e Multimodalidade............................................39

IV Unidade
A fundação da análise do discurso: o projeto audacioso...................61

V Unidade
Os Conceitos da Construção da Maquinaria do Discurso..................87

VI Unidade
As mudanças conceituais da Análise do Discurso............................107

VII Unidade
Os novos horizontes conceituais da Análise do Discurso..................121

VIII Unidade
Chegando à praia da Linguística Aplicada......................................139
I UNIDADE

Formalismo e
Funcionalismo Linguístico

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  7


Apresentação
Prezado(a) aluno (a),
Queremos iniciar parabenizando vocês que conseguiram
chegar a este período e já desejar muito sucesso nesta nova
etapa. É importante ser perseverante e fazer parte da história
da EAD como sujeito protagonista que encontra novos sen-
tidos e constrói significados para o que até então não era
conhecido.
Nossa disciplina, Teorias Linguísticas III, contempla no-
vas abordagens da Linguística Funcional para o estudo da
língua. Na primeira unidade faremos uma breve revisão do
polo formalista e posteriormente introduziremos o funciona-
lismo linguístico, dedicando a este assunto as três primeiras
unidades. Posteriormente, nas unidades IV, V, VI e VII serão
apresentadas para vocês, aprendentes, as fases de desen-
volvimento da Análise do Discurso de linha francesa, na qual
iremos tratar de discursos, sujeitos, formações discursivas e
suas análises. E por fim, na unidade VIII, contemplaremos
noções sobre a ciência Linguística Aplicada.
Logo no início da leitura deste material, vocês irão perce-
ber que iremos analisar textos, ora na perspectiva da Análise
do Discurso, ora na perspectiva do funcionalismo que se
desdobrará em outras áreas que são: Linguística Sistêmico-
-funcional e Multimodalidade que representa uma das mais
atuais áreas de estudos da linguagem.
As atividades apresentadas foram pensadas com o intui-
to de auxiliá-los na leitura do livro-texto, como também as
sugestões bibliográficas que se encontram no final de cada
unidade. A proposta é que vocês leiam para pesquisas e
aprofundamentos nos temas.

Bom êxito para todos!

 8 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Objetivos

Ao término desta aula esperamos que você:

• Revise de forma crítica os estudos linguísticos que compõem o


Polo Formalista;
• Compreenda as ideias gerais que caracterizam o Funcionalismo
Linguístico e que se contrapoem ao polo formalista;
• Reconheça as novas abordagens da língua;
• Reflita sobre as novas tendências da Linguística;

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  9


Revisando o polo formalista
dos estudos linguísticos
Vocês lembram que no início do curso, na disciplina Teorias Lin-
guísticas I, estudamos as concepções de língua nas perspectivas de
grandes linguistas como Saussure e Chomsky? Também lembram que
comparamos as diferenças de visão da língua desses autores com as de
Benveniste e Bakhtin? Pois é, com esta reflexão, vamos iniciar nossa
disciplina compreendendo que a forma de estudar a língua no estrutu-
ralismo representa uma perspectiva de estudo que se enquadra em um
polo denominado de formalista.

Para revisar ...

Atividade I
Para representar como a língua é estudada no estruturalismo, podemos
imaginar a seguinte representação da relação linguagem < língua / fala:

1. Essa imagem se resume no enunciado de Saussure (1988, p. 92): “A língua


é para nós a linguagem menos a fala”. A partir desta imagem, explique como
os estudos de Saussure, de cunho estruturalista, abordam língua e fala.
(se necessário, consulte a III Unidade do livro-texto da disciplina Teorias
Linguísticas I)

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

 10 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Para início de conversa ...
Segundo Carvalho (2011, p. 53), “(...) a língua é homogênea
e social. Se opomos essas características às da fala, podemos
deduzir que a fala é heterogênea e individual, (...) E assim,
a homogeneidade e o fato de ter sua existência vinculada
ao social são determinantes para que a língua seja tomada
como o objeto de estudo da Linguística. Por ser homogênea,
ela representa um sistema passível de ser analisado em seus
elementos, o que não é possível de ser feito com a fala. Por
ser a realização concreta de cada falante, a fala é marca-
da pela assistematicidade, pela imprevisibilida de, comporta
uma gama de variação. Portanto, não constitui um objeto de
estudo confiável..

Pelo menos esta ideia de que a fala “não constitui um objeto de


estudo confiável” é uma forma de compreensão que caracteriza um
dos polos das investigações linguísticas, o polo formalista, representado
pelos estruturalistas e gerativistas. E mais adiante, vamos constatar que
esta forma de encarar a fala opõe esses estudos da Linguística aos que
são contextualizados na perspectiva funcionalista.
Mas, para entendermos melhor o que caracteriza cada polo, vamos
nos inteirar mais sobre o polo formalista, este que assim é denominado
por priorizar a forma ou estrutura, entendendo a língua como sistema
autônomo, sem influência de fatores externos, ou seja, da situação co-
municativa. Focalizando os aspectos estruturais e formais da sentença.
Como vimos especificamente na disciplina Teorias Linguísticas I, esta
ciência apresenta vários momentos que são identificados pelas concep-
ções de língua e linguagem de vários teóricos que marcaram a história
da Linguística, entre outros ressaltam-se Saussure e Chomsky. E é a par-
tir destes teóricos que podemos delinear dois paradigmas linguísticos
que marcaram o polo formalista.: behaviorismo e cognitivismo

Atividade II

1. Faça pesquisa em livros didáticos de Língua Portuguesa e retire duas


atividades que apresentam influência do estruturalismo no ensino de língua
materna e elabore um texto comentário sobre estas atividades e justifique sua
análise com citações retiradas deste texto ou de artigo científico (acadêmico)
pesquisados em sites, anais de congressos ou livros acadêmicos. Socialize
seus textos no AVA, de acordo com as orientações do professor. (Não esqueça dica. utilize o bloco
de informar a fonte das citações). de anotações para
responder as atividades!

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  11


Continuando nossa revisão...
Estruturalismo (Behaviorismo) – Segundo Marcuschi (2008, p. 30),

O quadro epistemológico saussuriano vigorou para


além de meados do século XX, inclusive na Amé-
rica do Norte, onde paralelamente se instalara a
perspectiva bloomfieldiana, similar à de Saussure,
o que não ocorria em Leonard Bloomfield (1887
– 1949), um behaviorismo despretensioso sob o
ponto de vista epistemológico. Mesmo a contra-
gosto do autor, as propostas saussurianas e suas
derivadas culminaram num estruturalismo formal.

É importante lembrar aqui que Saussure instaurou uma série de


dicotomias para definir o objeto da Linguística, destacando-se como
mais importante para este objetivo a distinção entre langue (visão da
língua no plano social, convencional) e parole (visão da língua no pla-
no das realizações individuais).
Nesta perspectiva formal, levou-se a ignorar uma série de aspec-
tos hoje considerados centrais na investigação linguística. Em especial,
ignorou-se quase tudo o que estava ligado à semântica, à pragmática e
historicidade. Para deixar mais claro o que isto que dizer, ao observar
o texto do gênero charge de Lila a seguir, retirado dos arquivos do
Jornal da Paraíba, um estudo da língua, em uma abordagem formal, a
partir desta charge só levaria em consideração os aspectos formais do
texto como a sentença “Assista agora os noticiários ...”. Dessa forma,
o que interessa ao estudo formal em um texto como o exemplificado
é a regência do verbo “assistia”, o elemento circunstancial “agora”, a
transitividade verbal e seu objeto, entre outros. Isto considerando os
estudos formais da língua com base nos pressupostos estruturalistas.

Disponível em: http://jornaldaparaiba.globo.com/charges.php?pag=2

Sendo assim, o contexto e situação comunicativa em que a senten-


 12 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
ça foi escrita, os interlocutores e os elementos visuais são ignorados. E
não precisa entrar em detalhes para dizer o quanto estes outros aspec-
tos são importantes para o sentido do texto, não é mesmo?

Atividade III

1. A partir da leitura da charge de Lila, exposta anteriormente, considerando


o contexto, a situação comunicativa, os interlocutores, as imagens e a frase
“Assista agora os noticiários ...”. Produza um texto explicando como se
constitui o sentido nesta charge.

Uma observação ...


Durante o século XX, pode-se dizer, que o polo formalista divide-se
em dois momentos marcantes da Linguística , pois o behaviorismo e o
empirismo predominaram até o final dos anos 50. Já a partir dos anos
60 começou-se a observar de forma acentuada, cada vez mais, o do-
mínio do cognitivismo. Esta palavra ao ser usada na Linguística remete
inicialmente ao Chomsky que deu uma grande contribuição ao estudos
cognitivistas. Mas o que significa mesmo a palavra cognitivismo?

Atividade IV
1. Pesquise no dicionário e na wikipédia o que é cognitivismo linguístico e
socialize no AVA, de acordo com as orientações do professor.
dica. utilize o bloco
de anotações para
responder as atividades!

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  13


Continuando nossa
conversa...
Sobre o Cognitivismo – segundo Mélo e Ramos (2009, p. 194),

a diferença básica entre as duas correntes (estru-


turalimo e cognitivismo) situa-se na tese defendida
por Chomsky de que o falante tem uma capacida-
de inata para a linguagem – o inatismo. Ou seja,
todo falante de língua materna domina as regras
da língua, isto é, tem uma gramática internaliza-
da que lhe permite formular/gerar inúmeras frases,
por isso o nome de gramática gerativa, como tam-
bém julgar a sua aceitabilidade – o que vem a ser
a competência linguística.

Mélo e Ramos (op.cit) ainda afirmam que para Chomsky, a compre-


ensão de uma gramática implica a compreensão dessa competência
linguística em oposição à performance, que se relaciona ao uso efeti-
vo de língua em situações concretas. Em seus estudos, para demons-
trar a transformação da competência linguística para a performance,
Chomsky usava um esquema de diagrama arbóreo.
Este modelo teórico foi desenvolvido e reformulado diversas vezes
durante as décadas de 1960 e 1970, tendo sido abandonado na déca-
da de 1990, segundo Kenedy (2008, p. 133), “em favor de uma visão
que não mais representava estruturas, e sim as derivava”. Em resumo,
Chomsky busca uma compreensão científica da gramática gerativa (in-
ternalizada) dominada pelo falante, porque, para ele:

a capacidade humana de falar e entender uma lín-


gua (pelo menos), isto é, o comportamento linguís-
tico dos indivíduos, deve ser compreendida como
o resultado de um dispositivo inato, uma capaci-
dade genética e, portanto, interna ao organismo
humano (e não completamente determinada pelo
mundo exterior, como diziam os behavioristas), a
qual deve estar fincada na biologia do cérebro/
mente da espécie e é destinada a constituir a com-
petência linguística de um falante. Essa disposição
inata para a competência linguística é o que ficou
conhecido como faculdade da linguagem.(KENE-
DY, 2008, p. 129)

Mélo e Ramos (2009) ao analisarem as palavras deste autor, con-


 14 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
sideram que a linguística gerativa apresenta outros avanços, os quais
afetam, consequentemente, a ideia de competência linguística e cede
lugar para um novo foco – o da hipótese de gramática universal, norte-
ada pela teoria de princípios e parâmetros. Esta apresenta duas fases:
a da regência e da ligação e o programa minimalista. Neste contexto, o
objetivo é estudar a sintaxe buscando identificar as estruturas sintáticas
que são comuns entre todas as línguas do mundo.
Esta ideia parece não ter origem no gerativismo. A preocupação
com uma gramática universal é interesse da filosofia aristotélica, muito
antes do surgimento e confirmação da linguística como ciência, mo-
tivada pelo interesse de estudar um esquema universal de linguagem
subjacente a todas as línguas do mundo, retomado pela chamada Gra-
mática de Port Royal1 (1960).
Apesar das mudanças de foco, que são comuns no quadro evoluti- 1
A Gramática de Port-Royal “Gramática
vo de todas as ciências e teorias, o gerativismo não abandonou o prin- geral e razoada contendo os fundamentos
cípio básico desta corrente - a tese da faculdade da linguagem como da arte de falar, explicados de modo cla-
ro e natural”) foi um trabalho pioneiro na
parte notável da capacidade mental humana. área da filosofia da linguagem, publicado
em 1660 por Antoine Arnauld e Claude
Lancelot. (http://pt.wikipedia.org/wiki/
Gram%C3%A1tica_de_Port-Royal)

Atividade V
1. Produza um texto explicando o que opõe o modelo de análise linguística
gerativista ao modelo estruturalista/behaviorista e publique no seu blog do
AVA.

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

Outra observação ...


Apesar de em alguns tipos de pesquisas linguísticas ainda hoje se
fundamentarem nos princípios formalistas, o que se justifica, muitas ve-
zes por seus objetivos, há um outro paradigma que se opõe às concep-
ções formalistas que é o funcionalismo.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  15


O polo funcionalista
dos estudos linguísticos
O Funcionalismo representa o polo funcionalista cujo foco de análise
é a função desempenhada pela forma linguística no contexto de uso
– contexto este não restrito à escrita, mas incluindo a fala. Nessa pers-
pectiva, a forma linguística é elaborada para atender às necessidades
comunicativas do falante, cujas intenções podem ser de argumentar,
descrever, ordenar, pedir, entre outras ações.
A interferência de fatores externos (já que a comunicação pressu-
põe um locutor e um destinatário, um objetivo comunicativo, um efeito)
compreende o que Marcuschi (2008) denomina de virada pragmática.
Logo, o funcionalismo, por entender a língua como prática social, leva
em conta os princípios da Pragmática, vertente que se volta para o es-
tudo dos atos de fala (locutório, ilocutório, perlocutório) bem como das
estratégias de proteção da face. Pode-se dizer descontraidamente que
o funcionalismo possibilita à volta dos aspectos excluídos nos estudos
da língua, como por exemplo, a fala deixada de lado por Saussure e
o contexto sócio histórico que foram desconsiderados pelos teóricos
estruturalistas e cognitivistas.

Atividade VI
1. Considerando que os fatores externos interferem no uso da língua, já
que a comunicação pressupõe um locutor e um destinatário, um objetivo
comunicativo, um efeito, elabore um texto resposta, explicando como os fatores
externos aos elementos linguísticos interferem no sentido da seguinte charge.

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

Disponível em: http://jornaldaparaiba.globo.com/upload_arquivos/05072011235530.jpg

 16 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Continuando
nossa conversa ...
Os estudos realizados dentro do polo funcionalista se opõem total-
mente ao estruturalismo e gerativismo, pois segundo Cunha (2008, p.
157) o funcionalismo é uma corrente linguística que “se preocupa em
estudar a relação entre a estrutura gramatical das línguas e os diferen-
tes contextos comunicativos em que elas são usadas” além de conceber

a linguagem como instrumento de interação social,


alinhando-se, assim, à tendência que analisa a re-
lação entre linguagem e sociedade. Seu interesse
de investigação linguística vai além da estrutura
gramatical, buscando na situação comunicativa –
que envolve os interlocutores, seus propósitos e o
contexto discursivo – a motivação para os fatos da
língua..

Para Cunha (2008, p.158),

na análise de cunho funcionalista, os enunciados


e os textos são relacionados às funções que eles
desempenham na comunicação interpessoal. Ou
seja, o funcionalismo procura essencialmente tra-
balhar com dados reais de fala ou escrita retirados
de contextos efetivos de comunicação, evitando li-
dar com frases inventadas, dissociadas de sua fun-
ção no ato da comunicação.

Os estudos funcionalistas divergem dos gerativistas quando estes afir-


mam que a existência dos universais linguísticos2 derivam de uma heran-
ça genética comum à espécie humana, pois para aqueles “é a universa-
lidade dos usos a que a linguagem serve nas sociedades humanas que
explica a existência dos universais linguísticos” (CUNHA, 2008). 2
Cunha (2008) esclarece que em sentido
estrito, “universal linguístico” é um termo
Outra divergência entre funcionalistas e gerativistas é quanto ao designativo de uma propriedade que todas
as línguas têm (por exemplo, todas as lín-
processo de aquisição da linguagem. Enquanto os gerativistas por um guas têm elementos que são foneticamente
lado explicam a aquisição como uma capacidade humana específica vogais). Mais recentemente, admite-se que
para a aprendizagem da língua, por outro lado, os funcionalistas ten- os universais linguísticos não são absolu-
tos, mas uma questão de grau de tendência,
dem a explicar esse processo como desenvolvimento das necessidades de modo que refletem uma propriedade que
e habilidades comunicativas da criança na sociedade. se manifesta na maioria das línguas.

A criança é dotada de uma capacidade cognitiva


rica que torna possível a aprendizagem da lingua-
gem, assim como outros tipos de aprendizagem. É
com base nos dados linguísticos a que é exposta
em situação de interação com os membros de sua
comunidade de fala que a criança constrói a gra-
mática da sua língua. (CUNHA, 2008, p.158).
Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  17
Por fim, nos estudos funcionalistas, ainda segundo Cunha, “língua
não constitui um conhecimento autônomo, independente do compor-
tamento social, ao contrário, reflete uma adaptação, pelo falante, às
diferentes situações comunicativas.”.

Atividade VII
1. Elabore um resumo sobre as principais divergências entre os estudos
realizados dentro do polo funcionalista com o estruturalismo e o gerativismo.

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

Continuando ...

O modelo de estudo funcionalista de análise linguística caracte-
riza-se por duas propostas básicas, primeiramente a de que a língua
desempenha funções que são externas ao sistema linguístico em si; se-
gundo que as funções externas influenciam a organização interna do
sistema linguístico. Dessa forma, a língua reflete uma adaptação, pelo
falante, às diferentes situações comunicativas. Diante disto, os estu-
dos funcionalistas são organizados em dois grupos: o funcionalismo
europeu que pode ser representado pelos linguista Michael Halliday
e o holandês Simon Dik enquanto o funcionalismo norte-americano é
representado pelos trabalhos Givón, Sandra Thompson, Paul Hopper
e Thompson. Nas unidades seguintes iremos conhecer as principais
ideias introdutórias de cada grupo funcionalista.

 18 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Atividade VIII
De acordo com a leitura sobre os princípios que norteiam os polos formalista
e funcionalista, preencha o quadro a seguir com as principais divergências
apresentadas entre ambos.

COMPARAÇÃO DOS FOCOS NA VISÃO DA


LINGUÍSTICA ESTRUTURAL E FUNCIONAL
LINGUÍSTICA “ESTRUTURAL” LINGUÍSTICA “FUNCIONAL”

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

As novas tendências
da Linguística
Cada momento é importante para o desenvolvimento da ciência da
linguagem. No entanto, ao se tratar de estudos científicos da lingua-
gem, ainda hoje são realizadas pesquisas que seguem cada um destes
paradigmas, dependendo do objeto de estudo e do intuito das pes-
quisas. Por exemplo, para estudos descritivos com intuito de elaborar
gramáticas normativas de dialetos falados em países sem língua oficial,
recorre-se aos fundamentos do estruturalismo; para os estudos sobre
aquisição da linguagem, seja de uma segunda língua ou de língua
materna desenvolvem-se as linhas de pesquisa que encontram funda-
mentos no cognitivismo; e por fim, para pesquisas que focam o estudo
da língua contextualizada sociohistoricamente, como as variações lin-
guísticas , segue-se os princípios funcionalistas.
Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  19
No entanto, a linguagem tem se desenvolvido a ponto destas pers-
pectivas teóricas não serem suficientes para analisar outras modalida-
des de linguagem, além da verbal. Dessa forma, a Linguística se mostra
uma ciência “limitada” para explicar estes outros novos elementos.
Neste contexto, surge a necessidade da Linguística recorrer aos ou-
tros campos de estudo, que no século XX, a partir dos anos 1950 –
1960, pode-se citar algumas denominações de caráter eminentemen-
te interdisciplinares do tipo: Linguística-de-texto, Análise do discurso,
Análise da conversação, Sociolinguística, Psicolinguística e entre outras
cabe citar a Linguística Aplicada
Recentemente, com a influência dos estudos linguísticos da Linguís-
tica Sistêmico-Funcional, outras abordagens são dadas aos estudos da
língua, observando sua natureza intrínseca com outras linguagens visu-
ais, as linguagens das cores, entre outras. Criando um campo de estudo
de olho nas multimodalidades presentes em um texto que são interliga-
das, representando sentidos constituídos sóciosemioticamente. Dá-se
este foco aos estudos linguísticos de gêneros textuais que apresentam
várias semioses, como é comum aos gêneros digitais que circulam na
internet. Dessa forma, estudaremos nas próximas unidades os pressu-
postos da Análise do discurso de linha francesa e noções introdutórias
sobre a os estudos da multimodalidade e o ensino de língua materna.

Leitura recomendada
Manual de Linguística: Mario Eduardo Martelotta
Gênero: Linguistica
Editora: CONTEXTO
Sinopse: Este ‘Manual de linguística’ - pensado e elaborado para alu-
nos de letras, linguística e áreas afins - a obra apresenta princípios e
conceitos básicos de várias correntes da linguística moderna, conci-
lia informações de caráter tradicional, dialoga com outros manuais e
aponta tendências. Além disso, estimula o leitor a navegar nos rumos
do funcionamento da linguagem através de uma abordagem instigante.

 20 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Resumo
O polo formalista ignora uma série de aspectos hoje considerados
centrais na investigação linguística. Em especial, quase tudo o que esta-
va ligado à semântica, à pragmática e historicidade. O modelo de estu-
do funcionalista de análise linguística caracteriza-se por duas propostas
básicas, primeiramente a de que a língua desempenha funções que são
externas ao sistema linguístico em si; segundo que as funções externas
influenciam a organização interna do sistema linguístico. Além disso,
a linguagem tem se desenvolvido a ponto destas perspectivas teóricas
não serem suficientes para analisar outras modalidades de linguagem,
além da verbal. Dessa forma, a Linguística se mostra uma ciência “limi-
tada” para explicar estes outros novos elementos.

Autoavaliação
Para sistematizar o que você aprendeu nesta unidade, comente a citação
a seguir, explicando o que você entendeu, como também elaborando
questionamentos sobre o assunto que podem ser socializados em chat com
colegas e professora. Assim, segundo Cunha (2008, p. 157), o funcionalismo é
uma corrente linguística que

(...)se preocupa em estudar a relação entre a estru-


tura gramatical das línguas e os diferentes contex-
tos comunicativos em que elas são usadas” além
de conceber “a linguagem como instrumento de
interação social, alinhando-se, assim, à tendência
que analisa a relação entre linguagem e socieda- dica. utilize o bloco
de. Seu interesse de investigação linguística vai de anotações para
além da estrutura gramatical, buscando na situa- responder as atividades!
ção comunicativa – que envolve os interlocutores,
seus propósitos e o contexto discursivo – a motiva-
ção para os fatos da língua.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  21


Referências
CARVALHO, Eneida Oliveira Dornellas de. Teorias Linguisticas 1.
Campina Grande: EDUEPB, 2011.178 p.

CUNHA, Maria Angélica Furtado da. Funcionalismo In: MARTELOTTA,


Mário Eduardo (Org.). Manual de Linguística. São Paulo: Contexto,
2008.

KENEDY, Eduardo. Gerativismo. In: MARTELOTTA, Mário Eduardo


(Org.). Manual de Linguística. São Paulo: Contexto, 2008.

MARCUSCHI, L. A. Produção textual, análise de gêneros e compreensão.


São Paulo: Parábola Editorial, 2008.

MÉLO, Francisca Maria de. E RAMOS, Marta Anaísa Bezerra. Sintaxe


e Ensino: velhos dilemas, novos olhares. In: ARANHA, S. D. G.;
PEREIRA, T. M. A.; ALMEIDA, M. L. L. (Orgs.). Gêneros e Linguagens:
diálogos abertos. João Pessoa: Editora Universitária da UFPB, 2009.

 22 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


II UNIDADE

Funcionalismo Linguístico
Norte-Americano

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  23


Apresentação

Na aula anterior estudamos algumas ideias que norteiam


os estudos realizados no polo funcionalista versus as que nor-
teiam o polo funcionalista da Linguística. Nesta aula vamos
continuar os estudos centrando-se na Linguística Funcional
que visa analisar a língua a partir de uma gramática dinâmi-
ca, que estuda uma língua que está em constante mutação,
pois em virtude do surgimento de novas expressões ou da
adequação de algumas já existentes, faz-se necessário que
a gramática se adapte a esse ritmo de uma língua viva.
Sendo assim, faremos nesta unidade uma análise e des-
crição funcionalista de fenômenos sintáticos, realizados no
discurso oral ou escrito, bem como refletiremos sobre os
principais paradigmas teóricos da linguística funcional nor-
te-americana, com ênfase especial nos fenômenos da gra-
maticalização e da iconicidade.
Esta é uma unidade que exigirá de você muita aplicação
no trato com as atividades propostas, pois as mesmas cum-
prem a função de auxiliar a fixação do conteúdo que está
sendo estudado. Portanto, faz-se necessária muita disciplina
e empenho.
Bons estudos!

 24 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Objetivos
Ao término desta aula esperamos que você:

• Compreenda em que consiste os estudos funcionalistas;


• Enxergue o processo de gramaticalização em usos reais da lín-
gua portuguesa;
• Entenda o princípio da iconicidade;
• Saiba aplicar a linguística funcional na prática docente.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  25


Continuando nossa conversa
sobre funcionalismo
linguístico...
Focalizado na análise do uso real da língua e entendendo a gra-
mática como sendo algo dinâmico, o funcionalismo parte da tese de
que as formas linguísticas acomodam-se as necessidades dos falantes.
Você pode está se perguntando onde e como surgiu a teoria funcio-
nalista. É possível afirmar que os estudos funcionalistas surgiram com
a Escola de Praga, a qual possui uma nítida preocupação em entender
função como sendo o cerne da reflexão, ou seja, une o estrutural e o
funcional enxergando a dinâmica que permeia todo o constante desen-
volvimento da linguagem. Desta feita, ao funcionalismo interessa os fins
a que servem as unidades linguísticas; se ocupa, pois, das funções dos
meios linguísticos de expressão.
Nos trabalhos da Escola Linguística de Praga, os termos função e
funcional são muito empregados. Na tradição gramatical, entende-se
por função o papel de uma palavra numa proposição; para o funcio-
nalismo, função refere-se à relação existente entre os elementos linguís-
ticos, bem como a finalidade deles. O termo funcional, por outro lado,
é entendido, na teoria funcionalista, como estando atrelado à compe-
tência comunicativa.
A perspectiva funcionalista de análise dos fenômenos linguísticos
tem se constituído importante paradigma para estudos que buscam o
conhecimento de fenômenos inerentes ao uso real da língua, incluído
aspectos evidentes como a variação, a mudança, a emergência das
funções e a organicidade das formas que as realizam.
Ocorre que, para criar novos rótulos, o falante não inventa arbi-
trariamente sequências novas de sons, mas tende fortemente a utilizar
material já existente na língua, estendendo o sentido de palavras ou
criando palavras novas.

 26 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Atividade I
Reflita e escreva algumas hipóteses que expliquem a seguinte afirmação:
Durante muito tempo houve uma resistência dos funcionalistas para estudar
o texto escrito.

Atividade II
Leia o texto a seguir para responder a questão 01:

Novo dicionário escolar reconhece termos como ‘periguete’ e ‘tuitar’

‘Aurélio Júnior’ tem lançamento na Bienal do Livro do Rio.


Edição também traz novo significado para a palavra ‘ficar’.

Lançada na Bienal do Livro, que acontece no Rio até dia 11 de


setembro, a nova edição escolar do dicionário “Aurélio” tem como no-
vidade a inclusão das palavras “periguete”, “tuitar” e outras expressões
que circulam nas bocas das novas gerações entre seus 30 mil verbetes.
Segundo definição do “Aurélio Júnior”, “periguete” significa “moça
ou mulher que, não tendo namorado, demonstra interesse por qualquer
um”, enquanto “tuitar” é definido como “postar ou acompanhar algo
postado no Twitter”.
“O uso é o que habilita uma palavra a entrar para o dicionário”,
diz a Valéria Zelik, responsável pela edição do manual. “A língua tem
muitas nuances, e o dicionário é um reflexo disso, não o contrário”,
afirma a editora.
Ela também cita os termos bullying, blog e deletar entre os verbe-
tes integrados recentemente, além do verbo “ficar”, que ganhou novo dica. utilize o bloco
significado: “trocar carinhos por período curto, mas sem compromisso de anotações para
responder as atividades!
de namoro”.
Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  27
Outra modificação nos verbetes foi a reintegração do termo “pre-
sidenta” ao manual escolar. “A solicitação da Dilma Rousseff aflorou
o uso desse feminino, que tem uma carga ideológica, é um feminino
feminista”, diz a editora. (FONTE: G1 – 02 / 09 / 2011)

1. Justifique como a teoria funcionalista enxerga o aportuguesamento e as


derivações da palavra “twitter”, bem como as transformações semânticas
pelas quais algumas palavras passaram, conforme explícito no texto acima.

2. Comente a importância da Escola de Praga para o desenvolvimento dos


estudos funcionalistas, e, além disso, discorra sobre a concepção de
função e funcional para as perspectivas estruturalista e funcionalista.

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

Voltando ao assunto...
Qual será a concepção de língua defendida pelo funcionalismo?
Uma visão funcionalista da linguagem entende que a língua ocorre
sempre em um contexto e é sensível a ele, é sempre comunicativa e é
projetada para a comunicação. Portanto, o funcionalismo assenta que
a língua é usada a serviço das intenções dos falantes e é da organiza-
ção dessas metas que surge a ação discursiva.
O interesse de analisar a língua de um ponto de vista funcional
também está presente no grupo holandês, do qual se destaca a gramá-
tica de Dik, que se centraliza no êxito dos falantes ao se comunicarem,
pois, para ele, o que mais importa é como o sujeito recebe a ação, ou
seja, uma interação mais voltada para o ouvinte.
O Funcionalismo norte-americano, de acordo com Martelotta e
Areas (2003), a linguística norte-americana surge a partir de uma ten-
dência formalista atrelada aos estudos gerativistas que ocorre paralela-
mente ao desenvolvimento de estudos de cunho funcionalista como os
trabalhos de Franz Boas, as pesquisas etnolinguísticas de Sapir e Wrorf
e os importantes trabalhos de Bolinger, Kuno, Del Himes, Labov e muito
outros etno- e sociolinguistas.
 28 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
No entanto, o funcionalismo se fortaleceu nos Estados Unidos na
década de 70, a partir dos estudos dos seus principais representantes
que são Sandra Thompson, Paul Hopper e Talmy Givón. Nesta vertente
do funcionalismo, os estudos sobre a língua observam-na “do ponto
de vista do contexto linguístico e da situação de uso”. (MARTELOTTA,
2003, p.23). Para melhor esclarecimento sobre esta forma de estudo
da língua, Silva (2005, p. 50) afirma que

o Funcionalismo comporta estudos que ressaltam a


dinamicidade da gramática, levando em conta que
as formas linguísticas se acomodam às necessida-
des informacionais dos falantes. Qualquer aborda-
gem que se pretenda funcionalista deve considerar,
basicamente, a verificação de como a língua é usa-
da nos processos comunicativos.

Nesta perspectiva de estudo da língua,

a sintaxe é uma estrutura em constante mutação


em consequência das vicissitudes do discurso. Ou
seja, a sintaxe tem a forma que tem em razão das
estratégias de organização da informação empre-
gadas pelos falantes no momento de interação
discursiva. Dessa maneira, para compreender o
fenômeno sintático, seria preciso estudar a língua
em uso, em seus contextos discursivos específicos,
pois é nesse espaço que a gramática é constituída.
(MARTELOTTA E AREAS, 2003, p. 23-24).

Dentre os princípios que dão sustentáculo ao modelo funcionalis-


ta, merece destaque a concepção teórica de Gramaticalização, que
explica fenômenos de mudança no interior da língua, e o princípio da
iconicidade, que consiste em motivações externas que levam à escolha
de determinada estrutura linguística.

Atividade III
1. Produza um texto comparando as concepções de língua do polo formalista
coma as do polo funcionalista, a partir das citações a seguir:

Segundo Carvalho (2011, p. 53), o formalismo concebe que “(...)


dica. utilize o bloco
a língua é homogênea e social. Se opomos essas características às da de anotações para
fala, podemos deduzir que a fala é heterogênea e individual, (...)” responder as atividades!

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  29


Segundo Martelotta e Areas (2003, p. 23-24), “para compreender
o fenômeno sintático, seria preciso estudar a língua em uso, em seus
contextos discursivos específicos, pois é nesse espaço que a gramática
é constituída.”

02. Observe e analise a charge:

Comente, a partir das concepções de Dik, o mal entendido ocorrido levando em


consideração a premissa de que a comunicação deve está centrada no ouvinte.

Entendendo a
Gramaticalização
É impossível estudar gramaticalização sem fazer referência à pro-
posta de Givón, pois, para ele, ela é o processo pelo qual itens e cons-
truções gramaticais passa, em determinados contextos linguísticos, a
servir a funções gramaticais e, uma vez gramaticalizados, continuam a
desenvolver novas funções gramaticais.
A gramaticalização consiste na ideia de que a gramática não está
pronta, tendo em vista a fluidez dos elementos (a mesma palavra ora
pode ser substantivo, ora adjetivo); considera a mobilidade que as pa-
lavras têm, sobretudo em situações informais do uso da língua.

 30 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Quanto mais gramaticalizado o termo, mais fixo é, por exemplo, a
palavra “tá” chama a atenção do ouvinte e nem sempre se configura
numa pergunta retórica, ou seja, está se desgramaticalizando, ou está
se descursivizando (sai da gramática e vai para o discurso)3.
Para Givón (1991)

A gramaticalização pode ser vista na diacronia,


mas do ponto de vista cognitivo ela é um processo
instantâneo que envolve um ato mental pelo qual 3
Em suma, a teoria da gramaticalização
uma relação de similaridade é reconhecida e ex- tenta explicar as trajetórias de mudança
linguística.
plorada: por exemplo, pode-se dar a um item pri-
mitivamente lexical um uso gramatical em um novo
contexto, e nesse mesmo momento ele se gramati-
caliza. (apud CHRISTIANO, SILVA e HORA, 2004,
p. 19)

Vamos entender o que Givón nos diz através de um exemplo de


gramaticalização com o verbo “ir”:
Ex. 01 - ... quando ele vai atrás ele vê apenas um gato ... ele pega o
gato ... entra no carro e vai embora... (corpus D&G/Natal)
Ex. 02 - bem, a minha opinião sobe o namoro é que está muito avan-
çado, porque esses rapazes de hoje não pensa do amanhã que vai ser.
(corpus D&G/Natal).
Você conseguiu enxergar o processo de gramaticalização nesses
exemplos? Veja bem, o verbo ir acumula as funções de verbo pleno
(exemplo 01) e auxiliar (exemplo 02), conforme haja o deslocamento
espacial ou temporal.

Atividade IV
01. Baseado nos exemplos abaixo, comente o processo de gramaticalização
pelo qual passa a palavra onde:

Ex. 01 - ... no banheiro nós vamos encontrar uma prateleira ... onde
fica os utensílios pessoais ... (corpus D&G/Natal)
Ex. 02 - ... depois disso ... teve a noite onde foi escolhido o grupo de
cinco pessoas mais ou menos ... (corpus D&G/Natal)
Ex. 03 - ... eu acho que ao invés das pessoas sair na rua ... pedindo
para ... ser implantado a pena de morte no Brasil ... deveria estar lutan-
do por outras ... por outros métodos ... outros objetivos ... de melhores
condições de vida ... de melhor educação para os seus filhos ... onde dica. utilize o bloco
as pessoas poderiam viver num país bom ... certo? (corpus D&G/Natal) de anotações para
responder as atividades!

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  31


02. O verbo ir, nos textos abaixo, apresenta níveis de gramaticalização que,
numa trajetória unidirecional, vai de um status menos gramatical para um mais
gramatical. Segundo Furtado da Cunha e Silva (2007, p. 68), “esta trajetória
associa-se à abstratização (ou metaforização) progressiva do sentido de ir, que
segue a escala espaço>tempo (ou concreto>abstrato)”. Explique como se dá
esse processo em cada um dos exemplos abaixo:

Ex. 01
Parto do princípio de que tenho de ser rápida
na vida. Porque, se eu não fizer agora, outra
pessoa vai fazer. (Veja – outubro de 2010)

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

Ex. 02

Disponível em: http://vmulher5.


vila.to/interacao/thumb/83/
claudia-leitte-divulgacao-83-16-
thumb-280.jpg

 32 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


O princípio da iconicidade
Sabe aqueles assuntos sobre os quais é impossível falar sem tocar
no nome de alguém? Pois bem, é impossível falar sobre iconicidade sem
citar mais uma vez Givón, grande defensor da existência de motivação
icônica na gramática, que enxerga na sintaxe das línguas naturais um
princípio icônico, o qual entende que há uma motivação na formação
da estrutura sintática. E o que seria isso? O princípio da iconicidade
compreende a forma linguística como consequência do conteúdo, ou
seja, há uma motivação que determina essa forma4.

Para Givón (1995) Um organismo pode desenvol-


ver um sistema de processamento de informações
usando exatamente as mesmas unidades de codi- 4
A centralidade do caráter icônico da língua
leva à compreensão de que a estrutura é
ficação, mas codificando funções totalmente dife-
consequência das circunstâncias discursi-
rentes. Assim, teríamos uma forma desempenhando vas e de seus contextos de produção.
mais de uma função. O mais comum, no entanto, é
a ocorrência de uma modificação estrutural para o
desempenho de uma função nova, mas similar. As-
sim, é possível que ocorram pequenas divergências
na relação forma/função, passando uma forma a
exercer duas funções, como é o caso do “aparelho
fonador”, eventualmente, também, podem ocorrer
de as duas estruturas divergirem (duas formas para
uma função). (apud SILVA, 2005).

Para Givón, três subprincípios favorecem a efetivação do fenômeno


icônico: o da quantidade, o da proximidade e o da ordenação linear.
Para o subprincípio da quantidade, o que determina a quantidade
é o valor que o sujeito dá a uma informação, bem como o caráter de
novidade e de imprevisibilidade dela. Ou seja, quanto mais complexo
o pensamento, mais complexo o enunciado.

Ex.: ... um motorista dele ... nesse tempo ele ... num era ... num era
um motorista dele não ... era do hotel ... porque ele ficou sem motorista
... (corpus D&G/Natal)

O “não” que foi substituído por “num” sofreu um enfraquecimento


fonético e, por conta disso, houve a repetição da negação com vistas
à enfatizá-la.
O subprincípio da proximidade entende que é mais fácil associar
entidades mentais se estas apresentarem proximidade no instante da
codificação.
Ex.: Há pouco tempo atrás, dois bárbaros assassinatos, o da atriz dica. utilize o bloco
Daniela Perez e o da menina que foi queimada pelos sequestradores de anotações para
ressuscitou a polêmica da pena de morte. (corpus D&G/Natal) responder as atividades!

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  33


Vê-se, pois que a introdução de um aposto (dois bárbaros assassi-
natos) entre o sujeito e o verbo enfraquece a integração entre sujeito e
predicado no plano do conteúdo, o que resulta da falta de concordân-
cia verbal.
Por fim, o subprincípio da ordenação linear afirma que existe uma
correlação entre a sequenciação temporal e a ordem de ocorrência dos
eventos descritos.

Ex.: ... o pai dela tava ... tava tomando banho ... o gato apareceu
na ... na janela lá do ... do ... do banheiro ... ele tava tomando banho
na banheira ... ele pulou dentro e rasgou o ... o ... o pai dela todinho
num matou não ... só fez arranhar né? ... depois ele pegou um co de
vassoura ... meteu no gato e o gato foi embora ... (corpus D&G/Natal)
Nesta caso, você percebe facilmente que a apresentação dos even-
tos narrados obedece à ordem cronológica e lógica em que ocorrem
as ações.

Atividade V
Comente os subprincípios da iconicidade baseado nos exemplos abaixo:

Ex. 01 - ... a nova regente ... ela não tava sabendo ...reger direito... a
regente do coral ... tava errando lá um monte de coisas ... né? (corpus
D&G/Natal)

Ex. 02 - ... e teve uma pessoa que chegou pra mim e perguntou ...
“Gerson, você aceita ficar no grupo e tudo” ... num sei que ... eu disse
...não ... num aceito não ... (corpus D&G/Natal)

Ex. 03 - ... tudo eu faço ... sabe? ... tem isso comigo não ... (corpus
D&G/Natal)

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

 34 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Concluindo
nossa conversa ...
A Linguística Funcional comporta estudos que concebem a gramá-
tica como algo dinâmico, levando em conta que as formas linguísticas
acomodam-se às necessidades informacionais dos falantes. Desta feita,
o que caracteriza o funcionalismo é a tentativa de conhecimento da lín-
gua, não atribuindo um papel secundário às formas, mas valorizando e
analisando seus aspectos múltiplos, que se manifestam a partir do uso.

Leituras recomendadas
Função e dinâmica das línguas: a linguística
funcional - Andre Martinez - Objetiva apre-
sentar uma avaliação empírico-dedutiva da
linguística.

Linguística funcional: teoria e prática - Ma-


ria Angélica Furtado da Cunha; Mariange-
la Rios de Oliveira & Mário Eduardo Mar-
telotta (Orgs.)
É um empreendimento dos integrantes do Grupo de Estudos “Dis-
curso & Gramática” (D&G), que congrega pesquisadores de 5 grandes
Universidades: 1) Estadual do Rio de Janeiro, 2) Federal do Estado do
Rio de Janeiro, 3) Federal do Rio de Janeiro, 4) Federal do Rio Grande
do Norte e 5) Federal Fluminense.

A gramática funcional - Maria Helena de


Moura Neves
A gramática funcional é uma gramática do uso - ela busca, essen-
cialmente, verificar como se processa a comunicação em uma determi-
nada língua, e, para isso, não assume como tarefa descrever a língua
enquanto sistema autônomo.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  35


Gramática de usos do português - Maria
Helena de Moura Neves
A ‘Gramática de Usos do Português’
é uma obra que, diferentemente do que
se faz tradicionalmente entre nós, parte da observação dos usos real-
mente ocorrentes no Brasil, para, refletindo sobre eles, oferecer uma
organização que sistematize esses usos.

Resumo
O funcionalismo se preocupa com os fenômenos inerentes ao uso
real da língua, não desprezando as formas, mas valorizando e anali-
sando seus aspectos múltiplos que se manifestam a partir do uso. A
perspectiva funcionalista entende que o centro da gramática é a se-
mântica, pois o significado é quem domina a sintaxe; a língua tem a
sintaxe para atingir determinado conhecimento. Portanto, a perspectiva
funcionalista focaliza seus estudos em uma língua viva, vulnerável a
mudanças que na verdade são adaptações feitas em virtude das inten-
ções do falante.

 36 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Autoavaliação
Tendo em vista o processo de gramaticalização do verbo ir e suas motivações
de ordem cognitiva, pragmática e discursiva, escreva um comentário, por fim,
sobre a citação a seguir, acerca das contribuições dos estudos funcionalistas
sobre gramaticalização para o ensino de língua portuguesa:

É preciso expor ao aluno um conhecimento diversifi-


cado da realidade linguística brasileira, ajustando o
ensino de português a essa realidade. Cabe à escola
desenvolver atividades eu, contemplando a variação
linguística, observada em textos reais, levem o aluno dica. utilize o bloco
a perceber a adequação de determinados usos em de anotações para
determinadas situações, ou seja, a língua em uso”. responder as atividades!
(FURTADO DA CUNHA & SILVA, 2007, p. 80).

Referências
CHRISTIANO, M. Elizabeth A.; SILVA Camilo Rosa; HORA, Dermeval da
(Orgs.). Funcionalismo e gramaticalização: teoria, análise, ensino. João Pessoa:
Idéia, 2004.

CUNHA, Maria Angélica Furtado da, Mariangela Rios de Oliveira & Mário
Eduardo Martelotta (orgs.). Linguística funcional: teoria e prática. Rio de
Janeiro: DP&A/ Faperj, 2003.

FURTADO DA CUNHA, Maria Angélica; RIOS DE OLIVEIRA. Mariangela;


MARTELOTTA, Mário Eduardo. (Orgs.) Linguística funcional: teoria e prática.
Rio de Janeiro: DP&A/ FAPERJ, 2003.

FURTADO DA CUNHA, Maria Angélica; TAVARES, Maria Alice (Orgs.).


Funcionalismo e ensino de gramática. Natal: EDUFRN, 2007.

MARTINEZ, André. Função e dinâmica das línguas: a linguística funcional. São


Paulo: Almedina, 1995.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  37


NEVES, Maria Helena de Moura. A gramática funcional. São Paulo: Martins
Fontes, 1997.

_____. A gramática: história, teoria e análise, ensino. São Paulo: UNESP, 2002.

_____. A gramática funcional. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

_____. Gramática de usos do português. São Paulo: Editora UNESP, 2000.

_____. Texto e gramática. São Paulo: Contexto, 2006.

SILVA, Camilo Rosa. Iconicidade no uso do conector mas: um estudo


funcionalista. In: M. Elizabeth A. Christiano, Camilo Rosa Silva e Dermeval
da Hora (orgs.). Funcionalismo e gramaticalização: teoria, análise, ensino. João
Pessoa: Idéia, 2004.

_____. Mas tem um porém...: mapeamento funcionalista da oposição e seus


conectores em editoriais jornalísticos. (Tese de Doutorado). João Pessoa:
UFPB, 2005.

_____; CHRISTIANO, Maria Elizabeth A.; HORA, Dermeval da. (Orgs.)


Linguística e práticas pedagógicas. Santa Maria: Pallotti, 2006
_____. Ensino de Português: demandas teóricas e práticas. João Pessoa:
Idéia, 2007.

TAVARES, Maria Alice. A gramaticalização de e, aí, daí, e então: estratificação/


variação e mudança no domínio funcional da sequenciação retroativo-
propulsora de informações – um estudo sociofuncionalista. (Tese de
Doutorado). Florianópolis: UFSC, 2003.

 38 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


III UNIDADE

Funcionalismo Linguístico Europeu:


Linguística Sistêmico-Funcional e
Multimodalidade

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  39


Apresentação
Esta é a nossa terceira unidade, nosso terceiro momento de
discussão sobre as ideias funcionalistas. Na primeira unidade,
você deve lembrar que há dois grupos de autores que estudam
o funcionalismo e que representam duas perspectivas: a do
funcionalismo norte-americano e a do funcionalismo europeu.
Como se pode observar, na segunda unidade foram apresen-
tadas noções gerais sobre os estudos de Givón. Sendo assim,
serão discutidas, nesta terceira unidade, algumas ideias que
caracterizam os estudos da linguística sistêmico-funcional que
tem como principal representante M.A.K. Halliday.
Apesar da linguística sistêmico-funcional representar uma
outra perspectiva, esta campartilha das mesmas ideias gerais
do funcionalismo norte-americano como a forma de estudar
a língua em uso e a concepção de linguagem, além das
duas visões convergirem a respeito da oposição ao estudo
formalista da língua.
A linguística sistêmico-funcional (LSF) tem sido recorrida
como suporte epistemológico para teorias como a Multimo-
dalidade e a Análise de Discurso Crítica, pois ambas encon-
tram na LSF um suporte epistemológico para uma análise
linguística que insira o contexto cultural e a situação comu-
nicativa ao estudar os mais diversos textos.
A apresentação destes estudos, ainda de forma superfi-
cial, se faz necessária, haja vista a sua importância para fu-
turas pesquisas que foquem tanto o estudo da língua como
também o ensino da mesma, pois, estes conhecimentos, na
nossa visão, são de suma importância para compreender e
explicar o uso da língua, portanto corraboram para o ensino
de língua materna mais significativo.
Com este intuito, o material foi elaborado de forma refle-
xiva, com exercícios de análises de textos para que você pos-
sa praticar o que aprender sobre a LSF e Multimodalidade.

Bom estudo para você!!


 40 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
Objetivos

Ao término desta aula esperamos que você:

• Compreenda o que é Linguística Sistêmico-Funcional (LSF);


• Reconheça as principais ideias sobre língua e linguagem que
norteiam a Linguística Sistêmico-Funcional (LSF);
• Entenda o que é multimodalidade;
• Identifique as diferentes linguagens em textos multimodais.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  41


Para reiniciar
nossa conversa ...
Os funcionalistas de Praga enfatizaram o caráter multifuncional da
linguagem. Segundo Martelotta (2008, p. 31), vários linguistas tiveram
a preocupação de compreender as funções da linguagem, motivados
por inquietações do tipo

se a linguagem possui diferentes funções, associa-


das a comportamentos enraizados na vida social
que transcendem a mera transmissão de informa-
ções, como delimitar essas funções? Vários cien-
tistas tentaram responder a essa pergunta, como
o psicólogo alemão Karl Buhler e linguistas como
Ramon Jakobson e, mais recentemente, M.A.K.
Halliday.

No Brasil, os estudos linguísticos que seguem os pressupostos do


funcionalismo europeu têm se acentuado, entre estes autores, cada vez
mais na corrente funcionalista do inglês Michael A. K. Halliday. Sua
teoria é denominada de Linguística Sistêmico-Funcional (LSF).
O Funcionalismo Europeu, de acordo com Cunha (2008), apesar
do funcionalismo linguístico se contrapor fortemente ao estruturalismo
linguístico, ele surge como movimento particular no estruturalismo, ten-
do sua origem no Circulo de Praga, fundado em 1926 pelo linguísta
tcheco Vilém Mathesius que realizou as primeiras análises na linha fun-
cionalista, focalizando a função das unidades linguísticas da fonologia
e sintaxe.
Jan Firbas, seguindo a tradição da Escola de Praga, em 1960 cria
“um modelo da estrutura informacional da sentença que buscava ana-
lisar sentenças efetivamente enunciadas para determinar sua função
comunicativa” (CUNHA, 2008, p. 161), sendo assim, as informações
de uma sentença dividem-se em duas: tema que é a informação já co-
nhecida pelo interlocutor, ou seja, representa a informação dada e que
tem menor grau de dinamismo comunicativo; e a outra denominada
de rema que corresponde à informação nova que apresenta um maior
grau de dinamismo comunicativo. Dessa forma, as partes da sentença
que tem o menor grau de dinamismo comunicativo, o tema, vem no
início da sentença, enquanto as que tem maior dinamismo, o rema,
vêm no final.

Exemplo:
1. “Políticos de cidade do cariri ficam de fora de eleição 2012.”.
Folha do Cariri, novembro de 2011, p.4.

 42 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Neste contexto, “Políticos de cidade do cariri” é o tema e “ficam de
fora de eleição” é o rema. Dessa forma, como já mencionado anterior-
mente, há uma tendência geral de que as partes que contêm o menor
grau de dinamismo comunicativo tendem a vir no início da sentença,
enquanto as partes com maior dinamismo tendem a vir no final.
Moura Neves (2001, pp. 68-69) traz mais pistas para podermos
reconhecer a organização do tema e do rema nas sentenças, sendo o
tema “aquilo que está sob mira na organização da estrutura, a entidade
sobre a qual se faz o comentário”. Este comentário é o rema . Ainda
segundo Moura Neves,

enquanto no nível da frase a análise revela uma


organização em tema/rema, no nível do texto o
que se vai relacionando são segmentos organiza-
dos entre o que é dado (apresentado pelo falante
como recuperável no texto ou na situação) e o que
é novo (não-recuperável) no sistema da informa-
ção, compondo-se por meio de grupos tonais e de
focos, uma estrutura de informação.

Para praticarmos um pouco este conhecimento, vamos fazer a ati-


vidade a seguir.

Atividade I
1. Leia as sentenças e identifique no nível da frase as partes que correspondem
o tema e o rema. Justifique sua resposta.

a) “Queimadas se prepara para as comemorações dos seus 50 anos.” (Folha


do Cariri, 2011)

b) “Saúde mapeia casos de dengue e elabora plano de combate na Paraíba.”


(http://g1.globo.com/paraiba/noticia/2011)

c) “Ator da Record é expulso de voo em Belo Horizonte”. (http://www.folha.


uol.com.br)

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  43


O que é Linguística
Sistêmico-Funcional (LSF)?
Assim como as outras correntes funcionalistas, a LSF se opõe aos
estudos formais de cunho mentalista, pois “seu foco de interesse é o
uso da língua como forma de interação entre falantes”. Esse modelo
“espelha-se numa teoria da língua enquanto escolha. É um modo de
olhar a língua como ela é usada.” (CUNHA E SOUZA, 2007, p.19).
De acordo com estas autoras, a LSF objetiva “compreender e descre-
ver a linguagem em funcionamento como um sistema de comunicação
humana”. Esta sua concepção de linguagem tem dado suporte teóri-
co-metodológico para outras teorias como a da Análise de Discurso
Crítica (de linha anglo-americana), possibilitando analisar através da
linguagem verbal as funções da linguagem nas situações comunicativas
reais, vivenciadas pelos interlocutores e como funcionam as relações
de poder existentes em uma determinada cultura e em um determina-
do contexto, através das escolhas de sistemas linguísticos utilizados na
comunicação.
Na LSF, a análise da linguagem é sempre feita considerando dois
contextos, um funcionando dentro do outro: contexto cultural e contexto
situacional. Como está representado na figura a seguir:

Níveis de estratificação na perspectiva da GSF


(HALLIDAY apud MEURER, 2006, p. 167).

O contexto cultural é a soma de todos os significa-


dos possíveis de fazerem sentido em uma cultura
particular. No contexto de cultura, falantes e ouvintes
usam a linguagem em contextos específicos, imedia-
tos, conhecidos na LSF como contexto de situação. A
combinação dos dois tipos de contexto resulta em se-
melhanças e diferenças entre um texto e outro, entre
um gênero e outro. (CUNHA E SOUZA, 2007, p.20).

 44 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Dessa forma, assim como as autoras exemplificam em seu livro,
“uma interação em que se realiza uma compra de cereais não é a mes-
ma em uma cidade do interior e em uma capital, por exemplo; uma
interação mediada pelo gênero palestra é diferente daquela em que
acontece o gênero sermão.”.
Para esclarecer melhor este termo sistêmico-funcional, Cunha e
Souza (2007, p.20) definem que “o termo sistêmica refere-se às redes
de sistemas de linguagem”; isto significa que ao interagirmos, fazemos
escolhas de sistemas linguísticos esta escolha pode ser de forma cons-
ciente ou não. E mesmo quando as escolhas são inconscientes, estas
são influenciadas pelo contexto no qual são usadas.
Para as autoras, Já “o termo funcional refere-se às funções da lin-
guagem, que usamos para produzir significados.”. Para a LSF:

a língua se organiza em torno de duas possibilida-


des alternativas: a cadeia (o sintagma) e a escolha
(o paradigma); uma gramática sistêmica é, sobre-
tudo, paradigmática, isto é, considera as unidades
sintagmáticas apenas como realizações linguísticas
e as relações paradigmáticas como o nível profun-
do e abstrato da linguagem. (CUNHA e SOUZA,
2007, p.20).

Este conceito de relações paradigmáticas vem da teoria de Saussure


quando este criou a dicotomia sintagma e paradigma.
As relações paradigmáticas querem “dizer que quando um elemen-
to linguístico é utilizado na língua, automaticamente, os outros ele-
mentos que poderiam igualmente ocupar esse espaço, estão excluídos”
(Carvalho, 2011, p. 59). Por exemplo, eu falo um enunciado: O aluno
estudou. Quando eu escolho usar o verbo estudou, eu excluo outros
verbos que poderia usar, como: pesquisou, leu, analisou entre tantas
outras possibilidades.

Atividade II
1. Disserte sobre as concepções de língua e linguagem que subjazem a
Linguística Sistêmico-funcional.

2. Na LSF, qual a relação entre os termos sistêmico e funcional com sintagma


e paradigma? dica. utilize o bloco
de anotações para
responder as atividades!

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  45


Continuando nossa conversa ...
O uso do termo funcional também tem relação com as metafun-
ções da linguagem elaboradas por Halliday: metafunção ideacional,
matafunção interpessoal e matafunção textual. De acordo com Dias
(2009, p. 56), “a linguagem, pela perspectiva da Gramática Sistêmico-
-Funcional (GSF) é utilizada para construir significados ideacionais, in-
terpessoais e textuais.”.

Atividade III
1. A partir da leitura sobre o que é linguística sistêmico-funcional, elabore uma
síntese sobre o que seja Linguistica Sistêmico-Funcional e poste no AVA em
fórum de discussão aberto pela (o) professor (a).

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

Continuando
nossa conversa ...
Thompson (1996), fundamentado em Halliday
(1994), afirma que as pessoas utilizam a língua
para representar seus mundos: externo (ações, ati-
vidades físicas) e interno (emoções, sentimentos,
pensamentos dentre outros), ou seja, a língua é a
maneira como percebemos, experienciamos e re-
presentamos o mundo.(DIAS, 2009, p. 56)

Dessa forma, para uma melhor compreensão, apresentam-se as


metafunções no quadro a seguir, elaborado a partir dos exemplos de
Cunha e Souza (2007, p. 22):

 46 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


METAFUNÇÕES DE HALLIDAY

IDEACIONAL / REPRE- INTERPESSOAL/ INTERA- TEXTUAL/ COMPOSICIO-


SENTACIONAL TIVO NAL
“Representa/constrói os
significados de nossa
“Representa a interação e “Está ligada ao fluxo de
experiência, tanto do
os papéis assumidos pelos informação e organiza
mundo exterior (social)
participantes mediante o a textualização por meio
quanto no mundo interior
sistema de modo (indicati- do sistema temático.”
(psicológico)” (CUNHA
vo, imperativo e estruturas (CUNHA E SOUZA,
E SOUZA, 2007, p.22)
interrogativas) e modali- 2007, p.22). No caso do
através do sistema de
dade (auxiliares modais, exemplo abaixo, ilustra os
transitividade. No exemplo
elementos modalizado- mecanismos de coesão
a seguir os verbos e os
res)” (CUNHA E SOUZA, com a retomada do termo
termos associados a eles
2007, p.22) . “gatinhos”
se combinam para formar
o perfil de alguém.
Exemplo: “Tudo o que
Exemplo: “Afinal, existe
você precisa saber para
Exemplo: “Diogo é paulis- coisa mais fantástica do
deixar os gatinhos loucos
tano, tem 40 anos e mora que segurar na mão do
por seus lábios e pedindo
em Veneza (...) ” (Veja, gato, olhar nos olhos dele
bis. Por falar em gatos, a
jun. 2003) e dizer eu te amo? (Toda-
revista está cheia deles”
teen, ago. 2003)
(Todateen, mai.. 2003)

Em cada enunciado, essas três funções ocorrem simultaneamente e


é possível verificar esta realização simultânea na oração que é a unida-
de básica para análise léxico-gramatical na LSF. Isto ocorre porque as
diferentes redes sistêmicas, ligando-se às diferentes funções da lingua-
gem, codificam diferentes espécies de significados.

Atividade IV
De acordo com Cunha e Souza (2007, p.22), a FUNÇÃO INTERPESSOAL/
INTERATIVO de Halliday “Representa a interação e os papéis assumidos pelos
participantes mediante o sistema de modo (indicativo, imperativo e estruturas
interrogativas) e modalidade (auxiliares modais, elementos modalizadores)”

1.Com base nesta citação, leia o anúncio a seguir e identifique os papéis


assumidos pelos participantes desta interação (quem são os interlocutores)
e retire do texto os elementos linguísticos que justificam a metafunção
interpessoal.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  47


Fonte: Leite & Derivados. Ano XVI – N 98 maio/junho
2007. (revista)

Atividade V
1. Faça pesquisa de um artigo científico (acadêmico) em sites, anais de
dica. utilize o bloco congressos ou livros acadêmicos sobre a Linguística Sitêmico-Funcional e as
de anotações para Metafunções de Halliday. Leia o artigo e prepare slides para apresentação
responder as atividades! das principais ideias do texto. Socialize seus slides no AVA, de acordo com as
orientações do professor. (Não esqueça de informar a fonte).

 48 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Quanto à Multimodalidade ...
Neste mundo em que vivemos, de constante transformação, os es-
tudos da linguagem tornam-se cada vez mais importantes; é pela lin-
guagem que é expressa toda forma de opinião, de informação e de
ideologia.
Na cultura ocidental, a linguagem verbal tem sido considerada o
modo dominante de comunicação, com a escrita tendo o status mais
alto do que a fala e os outros modos semióticos, como ilustrações,
fotos, grafites, considerados apenas como suportes ilustrativos. Con-
tudo, com o surgimento da televisão e outras tecnologias nos meios
de comunicação e com a profusão de imagens em jornais, revistas,
propaganda, a tese da dominância da linguagem verbal ficou abalada.

A utilização da modalidade visual na prática de


escrita da sociedade da informação tem propor-
cionado mudanças nas formas e nas características
dos textos. Ao compararmos textos científicos publi-
cados em décadas atrás com os textos da mesma
esfera publicados atualmente, podemos observar a
inserção mais significativa de imagens como gráfi-
cos, pizzas e figuras, de uma maneira geral, nestes
textos. Na mídia televisiva, impressa e computacio-
nal este fenômeno ocorre mais acentuadamente,
o texto passa a ser produzido fazendo-se uso de
várias semioses visuais, auditivas e de movimentos.
A observação de que a imagem está cada vez mais
dividindo com o verbal a função composicional
dos textos, de forma que a exclusão da imagem
compromete o sentido do mesmo, evidencia o que
se denomina de textos multimodais. ( MÉLO, 2009,
p.1544)

Assim, os textos multimodais podem ser compreendidos como


aqueles que empregam duas ou mais modalidades semióticas em sua
composição (palavras e imagens, por exemplo), daí resultando a noção
de multimodalidade. Observa-se que

Existem novas regras semióticas para a construção


de textos com imagens. Os desenhos e as figuras
com valor apenas ilustrativos foram deixados para
trás. O uso da imagem segue outra direção. Agora,
os recursos multimodais tomam parte da composi-
ção do sentido do texto. A informação passa a ser
transmitida por diferentes modos semióticos. Em
outros tempos, os livros eram a fonte exclusiva de
todo o conhecimento. Hoje disputam espaço com
outros recursos tecnológicos e visuais, como os li-
vros eletrônicos e a Internet. (VIEIRA, 2007, p.10)

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  49


Entre muitos textos que circulam na sociedade, a bula de remédio
é um dos exemplos mais clássicos das multimodalidades de linguagens
que compõem um só texto, como podemos observar a seguir o uso da
linguagem verbal, da linguagem matemática nas tabelas e a linguagem
visual no modo de preparar. Ambas linguagens compõem uma unidade
de sentido que as tornam interdependentes na composição textual.

Apesar de o texto visual apresentar a mesma informação que o texto


verbal, observa-se que através das imagens de como dissolver o me-
dicamento a informação é passada e absorvida de forma mais rápida,
embora elas se complementem.

 50 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Atividade VI
1. Leia o texto a propaganda do MEC e em seguida analise as linguagens
presentes na composição deste texto, explicando como elas constroem o
sentido do mesmo.

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!
Fonte: http://elypaschoalick.blogspot.com/2011
_02_13_archive.html

Continuando
nossa conversa ...
Você deve está se perguntando como surgiu o interesse pelos textos
multimodais, não é? Pois bem, a proposta de analisar textos multimo-
dais surgiu pela observação de que as imagens estão cada vez mais
evidentes no discurso contemporâneo.
De acordo com a perspectiva multimodal, não é possível ler tex-
tos de maneira eficiente considerando somente a linguagem escrita,
pois esta consiste apenas em um elemento representativo que coexiste
com uma série de outros, como a diagramação da página (layout), o
Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  51
formato e a cor (ou cores) das letras, o uso de imagens e todo tipo de
informação advinda de quaisquer meios semióticos que estão presentes
no texto.
Nesse contexto, surge então a Gramática do Design Visual de Kress
e van Leeuwen, elaborada em 1996, como ferramenta crítico – analí-
tica que tem o intuito de sanar algumas dificuldades em analisar siste-
maticamente estruturas visuais e outros códigos semióticos.

Em suma, respaldados na linguística sistêmico-fun-


cional de Halliday, Kress e van Leeuwen propõem
uma análise visual de natureza essencialmente fun-
cionalista, ao visualizarem estruturas gramaticais
em imagens que igualmente representam o mun-
do de maneira concreta ou abstrata (metafunção
ideacional/representacional), constroem relações
sócio-interacionais (metafunção interpessoal/inte-
racional), e constituem relações de significado a
partir do papel desempenhado pelos seus elemen-
tos internos (metafunção composicional/textual).
(ALMEIDA, 2008, p. 10)

Sendo assim, a Gramática do Design Visual de Kress e van Leeuwen


objetiva a conscientização das imagens não como veículos neutros e
desprovidos de seu contexto social, político e cultural, mas enquanto
códigos dotados de significado potencial, carregados de estruturas sin-
táticas próprias. Para Kress, et al (1995, p.1-2),“[...] hoje é impossível
ler textos de maneira eficiente considerando somente a linguagem es-
crita: ela existe como um elemento de representação num texto que é
sempre multimodal, e deve ser lida em conjunto com todos os outros
modos semióticos[...]”.

Atividade VII
dica. utilize o bloco 1. Explique o sentido da charge a seguir, considerando o seu contexto social,
de anotações para político, cultural, como também a relação entre a linguagem escrita e outras
responder as atividades!
linguagens presentes no texto?

 52 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Fonte: http://www.blogdaresenhageral.com.br/v1/2011/11/10/page/2/

Continuando
nossa conversa ...
O texto da atividade anterior é um exemplo de que a língua é a
maneira como percebemos, experienciamos e representamos o mundo,
pois através deste texto podemos compreender uma denúncia política,
social, cultural e econômica que são experienciadas por nós cotidiana-
mente no mundo em que vivemos. Os personagens são representantes
(função ideacional) da maioria dos brasileiros. Desta forma, este texto
tem uma função social.

Neste contexto Dionísio (2005, p.161) defende a


noção de gêneros textuais segundo a perspectiva
de Bazerman (2005, 2006) de que gêneros textu-
ais são ações sociais, ou seja, gêneros “não são
apenas formas”, mas “frames de ações sociais” e
a mesma autora converge com a idéia de que as
ações sociais são fenômenos multimodais, sendo
assim a mesma afirma que: Se as ações sociais
são fenômenos multimodais, consequentemente,
os gêneros textuais falados e escritos são também
multimodais porque, quando falamos ou escreve-
mos um texto, estamos usando no mínimo dois mo-
dos de representação: palavras e gestos, palavras
e entonações, palavras e imagens, palavras e tipo-
gráficas, palavras e sorrisos, palavras e animações,
etc. (MÉLO, 2009, p. 1545)
Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  53
Se quando falamos ou escrevemos um texto, usamos no mínimo
dois modos de representação, então podemos chegar a conclusão de
que todo texto é multimodal. No entanto, é perceptível que a lingua-
gem visual tem ocupado traços marcantes na composição dos textos
que circulam na sociedade da informação. Isto ocorre devido à carac-
terização desta sociedade pela sua constante necessidade de agilidade
na veiculação da informação. Isto faz com que

[...] a imagem conquista maior espaço por ela


transmitir mais informações de maneira mais rápi-
da que a escrita, esta é uma condição de produ-
ção dos textos multimodais, consequentemente a
linguística também desperta o interesse pelo fenô-
meno da multimodalidade e a mesma para com-
preender os textos da sociedade contemporânea
recorre às outras teorias, pois, como Marcuschi
(2004, p.66 ) afirma, ao tratar dos gêneros emer-
gentes que surgem com a nova tecnologia, que “
[...] a linguística tal como está definida hoje não
serve a esses propósitos.

Consequentemente, a linguística recorre à sócio semiótica e à aná-


lise do discurso para respaldar-se de forma mais satisfatória para ob-
servar e interpretar este novo texto.

(...) Uma vez que a análise do discurso se concen-


tra no texto linguisticamente realizado, o enfoque
multimodal visa transpor esse nível de análise e
pretende compreender os diferentes modos de re-
presentação que entra no texto com a mesma pre-
cisão com que se faz a análise do texto linguístico.
(VIEIRA, 2007, p.10)

Dessa forma, entre outros autores, Maroun (2007) para analisar


textos multimodais lança mão de quatro autores para constituir as ca-
tegorias de análise de seu estudo: Kress e Van Leeuwen (participantes e
composição espacial do significado: o dado e o novo, a categoria das
cores), Fairclough (transitividade, intertextualidade e a interdiscursivida-
de) e Thompson (racionalização).

 54 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Atividade VIII
Segundo Maroun (2007, p. 81),

O principal objetivo do livro didático de Português


é contribuir para o ensino de língua materna, “com
uma abordagem que tem como propósito desen-
volver e expandir a competência comunicativa dos
usuários da língua, de modo a lhes garantir o em-
prego da Língua Portuguesa em diversas situações
de comunicação, produzindo e compreendendo
textos que interagem com eles, cotidianamente, em
situações diversas de interação sociocomunicativa”
(PCN, 1999). Nesse sentido, o ensino de língua
materna deve ser, antes de mais nada, o ensino de
uma forma específica de (inter) agir, e não apenas
de um conjunto de informações sobre a língua.

1. Reflita sobre a citação anterior, observe a atividade a seguir e analise por escrito
a modalidade visual presente, levando em consideração os seguintes aspectos:

• Os participantes dela;
• A composição espacial (o dado e o novo, a categoria das cores);
• A interdiscursividade presente (ou seja, que outro discurso está presente
neste discurso publicitário);
• O aspecto gramatical evidenciado;
• A intencionalidade.

Fonte: Atividade extraída da página 265 do livro Português: ensino médio – 2º ano, coordenado por
Ricardo Gonçalves Barreto – São Paulo: Edições SM, 2010.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  55


Finalizando nossa conversa...
Quando se trata de análise do discurso nesta perspectiva, refere-se á
ADC (Análise de Discurso Crítica) que corresponde a uma linha de estudo
do discurso que difere da linha francesa. Esta será estudada nas próximas
unidades sobre a ADC da linha ânglo americana que Resende e Ramalho
(2006, p. 12) apresentam um breve resumo histórico desta corrente:

Resumo de breve histórico da ADC


A ADC é, por princípio, uma abordagem transdisciplinar.
Isso significa que não somente aplica outras teorias como tam-
bém, por meio do rompimento de fronteiras epistemológicas,
operacionaliza e transforma tais teorias em favor da abordagem
sóciodiscursiva. Assim sendo, a ADC provém da operacionali-
zação de diversos estudos dentre os quais com base em Fair-
clough (2001a), destacamos os de Foucault (1997, 2003) e de
Bakhtin (1997, 2002) cujas perspectivas vincularam discurso e
poder e exerceram forte influência sobre a ADC.
O termo ‘Análise de Discurso Crítica’ foi cunhado pelo linguis-
ta britânico Norman Fairclough, da Universidade de Lancaster, em
um artigo publicado em 1985 no período Jornal of Pragmatics. Em
termos de filiação disciplinar, pode-se afirmar que a ADC confere
continuidade aos estudos convencionalmente referidos como Lin-
guística Crítica, desenvolvidos na década de 1970, na Universidade
de East Anglia, ampliando em escopo e em produtividade os estudos
a que se filia (Magalhães, 2005). É importante salientar, então, que
a Análise de Discurso Crítica e a Análise de Discurso Francesa his-
toricamente pertencem a ramos distintos do estudo da linguagem.
A ADC se consolidou como disciplina no início da década de
1990, quando se reuniram, em um simpósio realizado em janeiro
de 1991 em Amsterdã, Teun van Dijk, Norman Fairclough, Gunter
Kress, Theo van Leeuwen e Ruth Wodak (Wodak, 2003, p. 21).
A despeito de existirem diferentes abordagens de análises críticas
da linguagem, o expoente da ADC é reconhecido em Norman
Fairclough, a ponto de se ter convencionado chamar sua proposta
teórico metodológica, a Teoria Social do Discurso, de ADC – con-
venção que mantemos aqui, mas com cuidado de ressaltar que os
estudos em ADC não se limitam ao trabalho de Fairclough.
(...) as principais contribuições de Fairclough para os estudos
críticos da linguagem foram ‘a criação de um método para o estu-
do do discurso e seu esforço extraordinário para explicar por que
cientistas sociais e estudiosos da mídia precisam dos(as) linguísti-
cas’ (Magalhães, 2005, p.3). Podemos acrescentar a essa lista a
relevância que o trabalho de Fairclough assumiu na consolidação
do papel do(a) linguista crítico(a) na crítica social contemporânea.
(RESEND E RAMALHO, 2006, p.12)

 56 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Leituras recomendadas

Viviane de Melo Resende & Viviane Ramalho


- contexto – 2006.
Este livro é uma leitura introdutória so-
bre a ADC (Análise de Discurso Crítica), o
mesmo tem como principal objetivo revisar a obra de Norman Fairclou-
gh, considerado o maior expoente da ADC.

Josenia Antunes Vieira; Harrison da Rocha;


Janaina de Aquino Ferraz & Cristiane R. G. Bou
Maroun – Vozes – 2007.
Uma leitura muito interessante para
quem se atrai pelos estudos da linguagem na perspectiva da Multimo-
dalidade e da ACD. Os capítulos são organizados de forma interessan-
te, apresentando um constante diálogo entre teoria e análise de textos
multissemióticos.

Resumo
Os estudos linguísticos que seguem os pressupostos do funciona-
lismo europeu têm se acentuado, entre estes autores, cada vez mais
na corrente funcionalista do inglês Michael A. K. Halliday. Sua teoria
é denominada de Linguística Sistêmico-Funcional (LSF). Esta corrente
representa um postulado teórico para a teoria da Multimodalidade que,
entre outros focos, analisa como a utilização da modalidade visual na
prática de escrita da sociedade da informação tem proporcionado mu-
danças nas formas e nas características dos textos.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  57


Autoavaliação

Primeiro passo: após o estudo desta unidade, para saber se realmente o


conteúdo foi compreendido, vamos fazer uma simples pesquisa: escolha uma
unidade de um livro didático de Português do ensino Fundamental ou do Ensino
Médio e identifique os textos multimodais que são apresentados nas seções de
leitura.

Segundo passo: em seguida, produza um texto, descrevendo e analisando como


dica. utilize o bloco os autores do livro abordam as diversas linguagens nas atividades de leitura.
de anotações para
responder as atividades! Não esqueça de informar nome da coleção e autor do livro.

Terrceiro passo: Socialize seu texto no seu blog do AVA ou de acordo com
orientação do seu professor(a).

 58 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Referências
ALMEIDA, Danielle Barbosa Lins de (Org.) Perspectivas em análise visual:
do fotojornalismo ao blog. João Pessoa: Editora da UFPB, 2008.

BAZERMAN, Charles. Gêneros textuais, tipificação e interação. Trad. Angela


Paiva Dionísio e Judith Chambliss Hoffnagel. São Paulo: Cortez, 2005.

_________________. Gênero, agência e escrita. São Paulo: Cortez, 2006.

CARVALHO, Eneida Oliveira Dornellas de. Teorias Linguisticas 1.


Campina Grande: EDUEPB, 2011.178 p.

CUNHA, Maria Angélica Furtado da. Funcionalismo In: MARTELOTTA,


Mário Eduardo (Org.). Manual de Linguística. São Paulo: Contexto,
2008.

CUNHA, Maria Angélica Furtado da.& SOUZA, Maria Medianeira de.


Transitividade e seus contextos de uso. Rio de Janeiro: Lucerna, 2007.

DIAS, Sandra Maria Araújo. A representação da experiência e identidade


docente em um diário reflexivo: uma abordagem sistêmico-funcional.
Dissertação de Mestrado em Linguística, UFPB, João Pessoa-PB, 2009.

DIONÍSIO, Angela Paiva. Gêneros multimodais e multiletramento.


In: Gêneros textuais: reflexes e ensino. União da Vitória, PR: Kaygangue,
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______. Discurso e mudança social. Brasília: Editora Universidade de


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HALLIDAY, M.A.K.. An Introduction to Functional Grammar. London: Edward


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KRESS, G. et al. (m. s) Discourse semiotics, 1995.

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MARCUSCHI, L. A. Produção textual, análise de gêneros e compreensão.


São Paulo: Parábola Editorial, 2008.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  59


MAROUN, Cristiane Ribeiro Gomes Bou. O texto multimodal no livro
didático de português. In:VIEIRA, J. A.; ROCHA, H. da; BOU MAROUN,
C. R. G.; FERRAZ, J. de A. Reflexões sobre a Língua Portuguesa: uma
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Contexto, 2008.

MÉLO, Francisca Maria de. E RAMOS, Marta Anaísa Bezerra. Sintaxe e


Ensino: velhos dilemas, novos olhares. In: ARANHA, S. D. G.; PEREIRA,
T. M. A.; ALMEIDA, M. L. L. (Orgs.). Gêneros e Linguagens: diálogos
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NEVES, Maria Helena de Moura. A gramática funcional. São Paulo:


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RESENDE, Viviane de Melo & RAMALHO, Viviane. Análise de Discurso


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THOMPSON, Geoff. Introducing Functional Grammar. London: Arnold,


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VIEIRA, Josenia Antunes et all. Reflexões sobre a língua portuguesa: uma


abordagem multimodal. Rio de Janeiro: Vozes, 2007.

 60 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


IV UNIDADE

A fundação da análise do
discurso: o projeto audacioso

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  61


Apresentação
Nas quatro unidades seguintes, você conhecerá mais
uma disciplina teórica que se coloca como um avanço em
relação aos estudos estruturais sobre a língua(gem): a Aná-
lise do Discurso.
Neste primeiro momento, você estudará o contexto his-
tórico da França da segunda metade da década de 60, mo-
mento de sua fundação, e os campos teóricos que serviram
como base para a construção da Análise do Discurso: a
Linguística, a Psicanálise e o Materialismo Histórico. Interes-
sa ainda destacar os três princípios basilares da teoria da
Análise do discurso, quais sejam: língua, sujeito e ideologia,
para compreender outra concepção de igual importância, o
discurso.
Você começará a refletir como essa mudança de pers-
pectiva de análise da língua influenciou significativamente a
composição de novas abordagens e a revisão de teorias até
então referências no estudo da linguagem.
Esse estudo promoverá novas possibilidades para a pro-
dução de trabalhos acadêmicos e de pesquisas científicas.
Portanto, mergulhe no projeto audacioso de Michel Pêcheux,
o criador da Análise do Discurso.
Para facilitar a sua aprendizagem, siga as orientações já
apresentadas na primeira unidade:

• Planeje a cada dia um tempo para suas leituras.


• Leia os textos e destaque os novos conceitos e infor-
mações importantes.
• Releia sempre os textos e faça anotações.
• Responda as questões propostas com atenção e utilize
o AVA para promover discussão a respeito da teoria e
das atividades.
• Apresente as suas dúvidas para o professor e para o
tutor, buscando esclarecê-las.
 62 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
Objetivos

Ao final desta aula, esperamos que você:

• Conheça o contexto histórico no qual se deu a fundação da


Análise do Discurso.
• Entenda a Análise do Discurso como uma disciplina de entre-
meio.
• Adquira o conhecimento dos conceitos básicos da Análise do
Discurso, quando do momento de sua fundação.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  63


A fundação da análise
do discurso: um projeto
audacioso
Para começo de conversa...

Um pequeno retorno aos


estudos anteriores!
Relembrando Saussure...

“Como sabemos, Saussure considera que o que interessa


é o valor do signo [...] Tudo no signo é relativo ao conjunto
de signos de que faz parte. Não porque os signos se definam
por antecedência e depois entrem em relação, mas porque
são signos pelo que são as relações do sistema que é a lín-
gua. [...] A questão da significação fica posta também como
uma questão das relações internas ao sistema. O significado
de um signo é o que os outros significados não são. Ou seja,
a significação não é uma relação de representação de um
signo relativamente ao mundo, aos objetos. A significação
não é, de forma nenhuma, a relação com objetos fora da lín-
gua. [...] O corte saussureano é a ‘culminância’ [...] de uma
história de exclusão do mundo, do sujeito, por tratar a lin-
guagem como um percurso só interno. [...] Saussure afirma o
caráter social, coletivo da língua, como o que está em todos,
não incluindo no objeto, portanto, seu caráter histórico. [...]
Saussure suprime qualquer relação da língua com algo que
lhe seja exterior. O exterior (o mundo, o sujeito, as relações
entre sujeitos) fica como aquilo a que se nega o caráter de
objeto da linguística. O que há de significação no seu Curso
é o que há de decodificação como significado”.
( Guimarães, 1995, 11-12)

Nas últimas décadas, o que se tem observado é que as abordagens


sobre a linguagem agregaram em suas análises um olhar mais acurado
sobre aspectos discursivos, já que os estudos pautados apenas na estru-
tura da língua, de caráter imanentista, não conseguem explicar aquilo
que escapa de sua regularidade, aquilo que se materializa a partir da
relação com a exterioridade da língua, com o SOCIAL.
 64 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
Embora muitas áreas da Linguística destaquem os aspectos discursi-
vos, interessa-nos aqui mostrar como se constituem os estudos discursi-
vos na Análise do Discurso de linha francesa e quais as suas contribui-
ções para a revisão de abordagens estruturalistas da linguagem.
Para começar, leia atentamente, no box ao lado, o breve resumo
sobre a concepção de língua e significação para Saussure, apresenta-
dos por Eduardo Guimarães, no seu livro Os Limites do Sentido.
Após relembrar um pouco de Saussure, observe o enunciado a seguir:
“Um grande carro não precisa necessa-
riamente ser um carro grande”
(Publicidade do carro Clio, Revista Veja, 1999)

Se analisarmos o enunciado, levando em consideração apenas a


estrutura linguística, repetiremos a tradição gramatical que restringe o
estudo da negação, em português, à observação da relação gramatical
entre o “advérbio de negação” e o verbo, ou seja, o advérbio é definido
como a “palavra que se junta a verbos, para exprimir uma mudança
nas circunstâncias em que se desenvolve o processo verbal” (Cunha,
1986: 499). Consequentemente, ignoraremos relação língua e exterio-
ridade, quando na produção efetiva de enunciados significativos.
Enunciados como “Um grande carro não precisa necessariamente ser
um carro grande”5 escapam à explicação anterior, visto que o sintagma 5
Veja, nº 26, 1999.
“não” nega parcialmente a pertinência da especificação do tamanho
– idéia explicitada pela segunda expressão ‘carro grande’ -, ao mesmo
tempo em que, na instância da enunciação, é ativado um conjunto de
combinatórios de elemento agregados a primeira expressão ‘grande
carro’, o que possibilita aos sujeitos envolvidos no processo enunciativo
recuperar na exterioridade da língua os efeitos de sentido presentes no
fato linguístico, quais sejam: 1. a dimensão que ressalta a caracterís-
tica física, expressa em “carro grande”; 2. a dimensão que ressalta o
caráter não físico, mas discursivamente construído em “grande carro”.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  65


Construindo o seu conhecimento...

Atividade I
Leia o texto abaixo

Fonte:
agência: AlmapBBDO
redação: Marco Aurélio Giannelli (Pernil)
direção de arte: Ary Nogueira
direção de criação: Dulcidio Caldeira, Luiz Sanches
Acesso: http://www.propagandopropaganda.com/2009/06/aspirina.html

dica. utilize o bloco


de anotações para 1. O enunciado traz memórias de determinadas práticas e representações
responder as atividades! sociais. Mesmo de forma intuitiva, destaque os possíveis efeitos de sentido que
se materializam no enunciado.

Acredito que você percebeu que a sua leitura articulou memórias


sociais a respeito dos sujeitos “filha adolescente” e “filha adolescente
namorando” e que tais memórias são fundamentais para a construção
da significação do enunciado e circulam numa exterioridade à língua.
Isso também nos dá indícios de que a língua não se fecha como um
sistema. A Análise do Discurso lhe dará um aparato teórico para você
entender melhor o dinamismo da língua.
Você pode estar se perguntando como utilizar a teoria da Análise do
 66 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
Discurso em seus estudos sobre linguagem, em suas análises de fatos
linguísticos. Para começar estudar a Análise do Discurso é necessário
conhecer a sua fundação e entendê-la como uma disciplina de entre-
meio.
A Análise do Discurso (AD) é uma disciplina que teve sua origem
no contexto histórico da França de 1969. Michel Pêcheux e Jean Du-
bois lançam nesse momento os manifestos inaugurais da Análise do
Discurso: esse assina o artigo Discourse Analyses na revista Language,
número 13, em março de 1969; e aquele publica Análise Automáti-
ca do Discurso (AAD-69) - iniciava-se aqui um marco nas mudanças
ocorridas nos estudos sobre a linguagem. Vale ressaltar que Dubois
e Pêcheux posteriormente seguem caminhos teóricos diferentes e fica
para Pêcheux o atributo de fundador da Análise do Discurso, disciplina
que passou por várias revisões e reorganização téorica até a década de
80, quando da morte de Pêcheux.
Como bem coloca Nascimento (2010, p. 27), o teoria de Pêcheux
surgiu das dicussões “produzidas em um grupo constituído por pensa-
dores de diferentes formações, como filósofos, linguistas, matemáticos,
psicológos, dentre outros, chamado por Maldidier de ‘uma aventura a
várias vozes’”.
No período de fundação da Análise do Discurso, grandes movimen-
tos e manifestações ocorriam na França. E esse contexto social é muito
significativo para entendermos o porquê das revisões nos estudos da
época. Em que se baseavam as ciências nesse período para construir
suas abordagens? Qual o contexto político da Europa e os principais
movimentos dos partidos existentes? E a juventude? O que faziam os
estudantes na França dos anos 60? Ao mostrar como se concebeu os
estudos da Análise do Discurso, você terá um panorama desses acon-
tecimentos e entenderá as inquietações de Michel Pêcheux, que na re-
alidade representam também as inquietações de muitos estudiosos da
época numa busca urgente por mudanças.

Construindo o seu conhecimento...

Atividade II
1. Para compreender os contextos social e histórico que marcaram o período
anterior e durante a criação da Análise do Discurso, pesquise em sites da dica. utilize o bloco
internet sobre os movimentos sociais e as manifestações ocorridas na França de anotações para
da década de 60. Apresente um resumo com os principais fatos da época. responder as atividades!

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  67


Na década de 60, na França, as áreas da ciência viviam o estru-
turalismo triunfante, ou seja, o estruturalismo vivia o seu auge e servia
para os intelectuais franceses como parâmetro para os estudos cientí-
ficos e para organizar as ideias a respeito do mundo e das coisas na-
quele período. Nesse contexto, o estruturalismo linguístico servia como
ciência-piloto das ciências humanas, já que dispunha de ferramentas
essenciais da análise da língua e de rigor formal do método – elemen-
tos tão valorizados na época, ainda sob inspiração Positivista.
A esse respeito, veja no box em destaque o que comenta Ferreira,
no seu livro Michel Pêcheux & Análise do Discurso: uma relação de
nunca acabar.

“No centro desse novo paradigma, situa-se o es-


truturalismo linguístico a servir como norte e ins-
piração. Afinal, a Linguística em seu papel de ci-
ência-piloto das ciências humanas tinha condições
de fornecer aos aficcionados da nova corrente as
ferramentas essenciais para análise da língua, en-
quanto estrutura formal, submetida ao rigor do mé-
todo e aos ditames da ciência”. (FERREIRA, 2007,
p. 130)

Entendendo a Análise
do Discurso como uma
Disciplina de Entremeio...
A Análise do Discurso (AD) nasce numa perspectiva de mudança
dentro da própria Linguística, buscando operar um deslocamento nos
conceitos de LÍNGUA, HISTORICIDADE e SUJEITO, excluídos dos estudos
da linguagem e de outras correntes à época. A AD nasce de releituras e
críticas a três áreas. Para isso, Pêcheux revisita a Línguística, a Psicaná-
lise e o Materialismo Histórico para rever tais conceitos e reconstrui-los
no campo metodológico da nova disciplina: a Análise do Discurso.
De cada área, Pêcheux toma, problematiza e rever um conceito que
será fundante do campo teórico da Análise do Discurso: da Linguística
vem a noção de língua apresentado por Saussure; da Psicanálise, a no-
ção de sujeito discutida por Freud; do Materialismo Histórico, a noção
de Ideologia de Marx.

Vale lembrar mais uma vez que a Análise do Discurso se constroi


 68 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
não na repetição e na consonância dos conceitos dessas disciplinas,
mas na contradição. Repetem-se os termos, mas os conceitos já não
são os mesmos - Na Análise do Discurso, os termos LÍNGUA, HISTÓRIA/
HISTORICIDADE, SUJEITO se revestem de nova concepção. Daí, ser cha-
mada de disciplina de entremeio e não como disciplina interdisciplinar.
E sobre cada revisão conceitual empreendida por Pêcheux é o que você
vai estudar a seguir.

“Orlandi (1996), a esse respeito, imputa à AD a


condição de disciplina de entremeio, uma vez que
sua constituição se dá às margens das chamadas
ciências humanas, entre as quais ela opera um
profundo deslocamento de terreno. Nesse sentido,
é importante reiterar que os conceitos que a AD
traz de outras áreas de saber, como a psicanálise, o
marxismo, a linguística e o materialismo histórico,
ao se integrarem ao corpo teórico do discurso dei-
xam de ser aquelas noções com os sentidos estritos
originais e se ajustam à especificidade e à ordem
própria da rede discursiva”.
(FERREIRA, 2007, p. 15-6)

O conceito de Língua
para a Análise do Discurso
Saussure foi a pedra basilar na fundação da linguística como ciên-
cia, mas em consequência do Positivismo excluiu a fala de sua abor-
dagem de Língua. A esse fato denominamos de corte saussureano.
Naquele momento, a ciência ao apresentar uma premissa precisava
descrever e comprovar sua ‘verdade.. Daí, Saussure trazer a língua
como estrutura. (MALDIDIER, 2003). Pêcheux retoma essa noção e dis-
corda totalmente com a exclusão da fala, já que para ele essa exclusão
prejudica a explicação semântica da língua. Para Pêcheux a língua é
estrutura e acontecimento (histórico e social), ou seja, a língua se repete
e se renova a cada situação enunciativa (MALDIDIER, 2003) através da
memória discursiva, que por sua vez é histórica.
A AD insere o aspecto sócio-histórico no estudo da língua, de for-
ma que “ao mesmo tempo que a linguagem é entidade formal, cons-
tituindo um sistema, é também atravessada por entradas subjetivas e
sociais” (CARDOSO, 2005, p. 21). A AD é constitutivamente social.
Ela, no seu primeiro momento, se ocupava em analisar enunciados
políticos, o discurso institucionalizado. Atualmente, os discursos do co-
tidiano, não institucionalizados, também são alvos de análise. E nesses
Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  69
quarenta anos a AD ganhou espaço nos currículos das instituições de
ensino superior a partir do seu desenvolvimento, enquanto é também
compreendida como um método de análise recorrido por pesquisa-
dores de diferentes áreas como historiadores, psicólogos, sociólogos,
pedagogos entre outros. Esta recorrência se dá porque a AD visa inter-
pretar os aspectos históricos, sociais e ideológicos que se materializam
na língua através do enunciado.
Pêcheux introduz no estudo da língua um viés político e histórico, os
quais põem em relevo aspectos como a fala, o sujeito, a ideologia e a
história, que possibilitam correlacionar a materialidade linguística e os
aspectos extralinguísticos para a construção de sentido numa situação
real de uso da língua.
Para entender melhor a concepção de Língua da AD, tome nota do
que diz Ferreira (2007, p. 17):

A Análise do Discurso não trabalha com a língua


da Linguística, a língua da transparência, da au-
tonomia, da imanência. A língua do analista de
discurso é outra. É a língua da ordem material, da
opacidade, da possibilidade do equívoco como
fato estruturante, da marca da historicidade inscrita
na língua. É a língua da indefinição do direito e
avesso, do dentro e fora, da presença e da ausên-
cia.

A Língua é constitutivamente histórica e por essa razão ela se repete


e se atualiza em cada evento enunciativo. Para ilustrar a concepção de
língua, vejamos a capa da revista Veja, de 10 de agosto de 2005:

Uma pergunta fundamental para empreender uma análise de enun-


 70 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
ciados, tomando por base os princípios teóricos da Análise do Discurso,
é: Por que foi dito desta forma e não de outra?
Assim, no enunciado acima, a primeira coisa que nos chama aten-
ção é a materialidade linguística “LuIIa” grafado com dois eles, um
verde e outro amarelo. Para atribuir efeitos de sentido a esse enunciado
são acionados na memória enunciativa elementos extralinguísticos, que
dizem respeito a acontecimentos sociais da história política do Brasil.
O que aparentemente parece contraditório, incompatível, se atualiza e
(re)significa numa nova história, num novo momento, num novo acon-
tecimento. Nesse enunciado o sujeito social, o político Lula, é compa-
rado e colocado no mesmo grau de similaridade a outro sujeito so-
cial, o político Collor, mesmo inscritos em partidos políticos diferentes
e considerados adversários. Para a AD não interessa apenas observar
a estrutura linguística, é necessário também analisar o acontecimento.
É nessa materialidade que perpassam discursos e emergem as marcas
ideológicas que convergem para a construção dos possíveis efeitos de
sentidos.

Construindo o seu conhecimento...

Atividade III
Levando em consideração que a língua é constitutivamente histórica e por
essa razão ela se repete e se atualiza em cada evento enunciativo, discuta os
possíveis efeitos de sentido que se materializam dos enunciados abaixo.

1. “Hoje é dia de rock, bebê”: Christiane Torloni comenta o bordão


Quem pensa que Christiane Torloni não está muito satisfeita ao ver dica. utilize o bloco
sua frase “Hoje é dia de rock, bebê” virar bordão em todo o país, está de anotações para
muito enganado. Em entrevista para o jornal “Agora”, a atriz comentou responder as atividades!
que está adorando o sucesso da frase [...].
(http://entretenimento.br.msn.com/famosos/hoje)

2. A troca de carinhos entre o vocalista da banda Restart, Pe Lanza,


e a apresentadora Ellen Jabour roubou todos os flashes do último dia
do festival de música SWU, nesta terça-feira (15). O casal, fotogra-
fado dando verdadeiros amassos nos bastidores do evento, virou um
Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  71
dos tópicos mais comentados do Twitter. [...] “A noite do rock foi tudo, né,
bebê?!!”, escreveu ela no microblog na manhã seguinte [...].
(http://gente.ig.com.br/groupies-modernas-as-maiores-fas-do-
-rocknroll)

3. [...] Questionada sobre como anda a gestação, a atriz (Luana


Piovani) soltou: “hoje é dia de rock, bebê!. Mas ele está bem. Capaz que
dê o primeiro chute durante o show dos Strokes. Gosto tanto da banda
e de rock que meu filho pode nascer com cara de LP”, brincou a atriz,
que adorou o fato de o festival ser no Playcenter, que ela considera a
Disney brasileira [...].
(http://musica.terra.com.br/planetaterra/2011/noticias)

4. Cristiane Torloni agride maquiadora da Globo nos bastidores de novela.


FamosiDrops: Confira os bastidores do mundo das celebridades

RIO DE JANEIRO - O tempo fechou nos bastidores de “Fina Estam-


pa”. Baixou a Tereza Cristina em Christiane Torloni e a atriz agrediu
uma maquiadora da TV Globo, chamada Carol, no set de gravação da
novela escrita por Aguinaldo Silva. [...] Vale lembrar que essa não é a
dica. utilize o bloco primeira vez que a morena se envolve em uma confusão desse tipo nos
de anotações para
responder as atividades!
bastidores do canal. Em 2009, durante uma gravação de “Caminho
das Índias”, Christiane se desentendeu com uma camareira dentro de
um ônibus utilizado como camarim na gravação de uma externa. Não
pode agredir o coleguinha, bebê!

Publicado em 18/11/2011 http://entretenimento.br.msn.com/


famosos/famosidrops-confira-os-bastidores-do-mundo-das-celebrida-
des-291

Na Psicanálise, Freud toma o sujeito como individual, psicologi-


zante, empírico,consciente e que se pensa livre e dono de si. Já para
Pêcheux, o sujeito é social. Ele enuncia sempre de um Lugar, ocupando
posições sociais que o significam. De acordo com Ferreira (2001, p.
21), uma “posição-sujeito não é uma realidade física, mas um objeto
imaginário, representando no processo discursivo os lugares ocupados
pelos sujeitos na estrutura de uma formação social”. Deste modo, não
há sujeito único mas diversas posições-sujeito, as quais estão relacio-
nadas com determinadas formações discursivas e ideológicas.
A AD trabalha a noção de língua agregada ao conceito de sujeito.
O sujeito na AD é apresentado como descentrado e afetado, interpela-
do pela ideologia. Assim, poderemos ter uma mesma estrutura linguís-
tica com diferentes efeitos de sentido, já que são produzidos a partir de
posições-sujeito diferentes. Vejamos alguns exemplos:
 72 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
Exemplo 1

Os Sete Pecados Capitais


Os sete pecados capitais denomi-
nam-se dessa forma por originarem ou-
tros pecados. E ao contrário daquilo que
certas denominações que se dizem cristãs
afirmam, os pecados capitais possuem
base bíblica e fazem parte do ensino mo-
ral cristão. São regras de libertação e não de aprisionamento do ser Imagem Disponível em: http://4.bp.blogspot.
humano. Afinal, qual homem pode-se dizer livre quando na verdade é com/_7T0flBwSsE0/S9EbHKnITJI/
AAAAAAAAAu4/9caPt0g2gFQ/s1600/
prisioneiro de suas próprias inclinações? E foi justamente para sermos a9_bb_livros_aberto_um_em_cima_do_
homens e mulheres livres que Jesus foi sacrificado. Portanto, os peca- outro_.jpg
dos capitais são mais que hodiernos.
Origem
No século IV, São Gregório Magno e São João Cassiano definiram-
-nos como sete: orgulho, avareza, inveja, ira, luxúria, gula e preguiça.
Até hoje na Igreja existe um consenso doutrinal sobre essa classifica-
ção.

http://www.universocatolico.com.br/index.php?/os-sete-pecados-capitais.html

Exemplo 2

Revista Veja, ano 33, nº 14, 64-65, 2000

Nesses exemplos, pode-se observar que esses enunciados não se


constituem como uma simples relação de textos. Mais do que isso, esta
intertextualidade é mobilizada pela relação de discursos e os efeitos de
Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  73
sentido construídos a partir de posições-sujeito bem definidas na mate-
rialidade linguística e imagética.
Esta relação é aquela que nos dá o lugar da historicidade específica
da enunciação. A enunciação do texto do exemplo 2 se relaciona com
a enunciação do texto do exemplo 1 e de outros textos efetivamente re-
alizados - os textos bíblicos -, alterando-os, repetindo-os, omitindo-os,
interpretando-os, projetando formações simbólicas dispersas.
Nesse processo de produção de sentido, palavras como “inveja,
orgulho, gula, avareza, cólera, preguiça, luxúria” não são distinguíveis
a partir da sua dimensão material, elas ganham identidade e são regu-
ladas pelo discurso que arregimenta as forças de representação simbó-
lica (de natureza histórica) - uma mesma palavra, numa determinada
língua, varia de significação, dependendo da posição do sujeito [...] (cf.
DIAS, 2004, p. 236-7).
Essas palavras ganham pertinência no campo da memória, espe-
cificamente nesses enunciados, quando são acionados vozes de sujeitos
sociais que enunciam e explicitamente enunciados pré-construídos do
discurso religioso sobre pecado – ou seja, aquilo é considerado a fal-
ta, a maldade, o erro, o vício, que transgride o preceito religioso que
postula o amor ao próximo, a igualdade e o desapego aos bens mate-
riais – para, em seguida, destituí-los de sua memória primeira (sentido
bíblico) e colocá-los a funcionar com um outro sentido, o do tempo da
enunciação – “pecado é não ter um carro como o Fiat”.
Esse deslocamento trabalha a interpretação enquanto exposição do
sujeito à historicidade na sua relação com o simbólico – o que pode
ser observado no exemplo 2, quando na relação com o simbólico um
oitavo pecado agrega-se aos sete pecados capitais já discursivamente
marcados. No movimento da interpretação, aparece-nos como conte-
údo já-lá, como evidência, o sentido bíblico de pecado. Ao se dizer, se
interpreta – e a interpretação tem sua materialidade – mas nega-se a
interpretação e suas condições no momento mesmo em que ela se dá e
se tem a impressão do novo sentido que se “reconhece”, já-lá.
Para melhor entender o sujeito da AD, lembremos que “a lingua-
gem pela ótica discursiva ganha um traço fundacional na constituição
do sujeito e do sentido e vai distinguir-se também da condição que lhe
confere a psicanálise” (FERREIRA, 2007, p. 15), como um sujeito dono
e origem do seu dizer.
Portanto, a Análise de Discurso Francesa tem em seu princípio um
olhar sobre a movência da fala, sobre o sujeito social visto do lugar
onde fala, pois são os lugares de fala que dão credibilidade ao dizer,
e este sujeito ao ser analisado do lugar de onde fala, sempre será con-
siderado a partir de suas representações sociais. Daí o sujeito não ser
origem, dono do seu discurso (MALDIDIER, 2003).

 74 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Construindo o seu conhecimento...

Atividade IV
1. Analise a charge e a postagem de um blog, apresentados a seguir,
destacando as construções de efeitos de sentido a partir das posições-sujeito
no enunciado.

Texto 1

Folha de S.Paulo, jan./2005.

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  75


Texto 2

Ele é brasileiro. “Não desiste nunca”

Piloto fecha patrocínio para corrida no Brasil

Rubens Barrichello acaba de fechar um patrocínio ex-


clusivo para o GP do Brasil. A Locaweb, empresa de hos-
pedagem de sites no país, vai estampar a sua marca no
capacete, boné e camiseta do piloto durante a corrida.
No ano passado, Barrichello fechara contrato seme-
lhante com a Bit Company, rede de escolas de ensino pro-
fissionalizante, e a Olla, marca de preservativos.
Ô home teimoso..
Fonte: http://ronaldcoqueiro.blogspot.com/2011/11/
ele-e-brasileiro-nao-desiste-nunca.html

O conceito de Ideologia
para a Análise do Discurso
A análise do Discurso se diferencia dos estudos estruturais da lin-
guagem pelo olhar bem particular de trabalhar a linguagem indisso-
ciada com a ideologia – esse será sempre um ponto de revisão de sua
construção teórica até a 3ª época.
Ao tomar os estudos do Materialismo Histórico, Pêcheux critica a
postura de Max, que acredita que a ideologia é algo abstrato, que afeta

 76 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


o sujeito pelas práticas das Instituições sociais que sustentam o poder
ideológico do Estado, tornando esse sujeito cada vez mais assujeitado
à ideologia.
Para Pêcheux, essa ideologia tem um caráter concreto, visto que os
enunciados materializam os discursos e desses discursos sempre emer-
gem as marcas ideológicas (MALDIDIER, 2003). No primeiro momento
da AD, Pêcheux coloca o “assujeitar-se” como condição indispensável
para ser sujeito. Posteriormente, essa noção é observada como “assu-
jeitamento” não pacífico, onde o sujeito pode mostrar resistência ao ser
afetado por ideologias.
A noção de Ideologia está complemente imbricada com a noção de
sujeito e são constitutivos da linguagem, produzindo efeitos de sentidos
sempre discursivos e, por esta razão, históricos. Vejamos exemplos des-
sas marcas ideológicas em enunciados efetivos da língua.

Exemplo 1

Fonte: http://www.google.com.
br/imgres

Exemplo 2

Fonte: http://www.artigonal.
com/ensino-superior-artigos/a-
evolucao-do-homem-frente-as-
novas-tecnologias-909757.html

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  77


Exemplo 3

Fonte: http://stripsoftoothpicks.blogspot.
com/2011/03/parodias-com-evolucao-
humana.html

Facilmente observamos nos enunciados marcas ideológicas de dis-


cursos que circulam socialmente: o discurso científico sobre a origem e
evolução do homem; o discurso científico das áreas tecnológicas sobre a
evolução da comunicação e do trabalho humanos; o discurso do humor,
revestido de outros discursos de beleza, moda e saúde, sobre a evolução
da estética humana. Os traços ideológicos se materializam nesses enun-
ciados e contribuem para a construção dos efeitos de sentidos.

Construindo o seu conhecimento...

Atividade V
1. Utilizando o recurso AVA, discuta sobre os traços ideológicos que perpassam
os enunciados a seguir e como contribuem para a construção dos efeitos de
sentido numa dada situação enunciativa. Após as discussões, organize num
texto a análise do enunciado.

IMPORTANTE: Utilize o AVA para interagir com as colegas de cursos,


apresentando as suas impressões e comentários sobre os enunciados
que serão apresentados a seguir. Aproveite a oportunidade para tirar
dúvidas sobre a teoria, e para explicá-la quando necessário, sempre
dica. utilize o bloco relacionando-a aos textos que estão em pauta de análise. A pro-
de anotações para
responder as atividades! fessora e a tutora seguirão as discussões e esclarecerão os pontos
nodais para o entendimento do construto teórico da AD.

 78 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Enunciado 1

Disponível em: http://stripsoftoothpicks.


blogspot.com/2011/03/parodias-com-
evolucao-humana.html

2. Compare os três enunciados e continue discutindo sobre os traços ideológicos


que perpassam os enunciados e como contribuem para a construção dos
efeitos de sentido numa dada situação enunciativa. Apresente um texto com a
análise desses enunciados.

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  79


Fonte: http://mundofabuloso.blogspot.
com/2008/01/o-boticario-e-suas-
princesas.html
“A história sempre se repete. todo Chapeuzi-
nho Vermelho que se preze, um belo dia, co-
loca o lobo mau na coleira”

Campanha Publicitária de O Boticário – 2005

Fonte: http://mundofabuloso.blogspot.
com/2007/08/contos-cabulosos.html

Campanha Publicitária da Melissa, 2007

Fonte: http://mundofabuloso.blogspot.
com/2008/03/calendrio-campari-2008

Calendário da Campari, 2008

 80 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Para fechar esse primeiro momento de discussão, destacamos que
Pêcheux inaugura com a Análise do Discurso um marco teórico nos
estudos modernos sobre a linguagem. Como bem aponta Fernandes
(2008, p. 53), não se deve perder de vista algumas referências funda-
doras da AD, que se mostram como constitutivas da teoria, quais sejam:

a) o atravessamento da Linguística pelo Marxismo,


próprio à explicitação do objeto da Analise do Dis-
curso – o discurso –, que resulta da articulação en-
tre o linguístico e o histórico;

b) uma constante problematização das bases epis-


temológicas da AD, até mesmo pela pluralidade e
especificidades dos objetos;

c) o discurso como objeto de estudo apresenta-se


também como um lugar de enfrentamento teórico
(Cada objeto tomado para análise apresenta, por
exemplo, elementos da história que lhes são pecu-
liares, o que implica uma volta à teoria);

d) a Análise do Discurso implica apreender a lín-


gua, o sujeito e a história, em funcionamento, uma
vez que a própria teoria do discurso revela uma de-
terminação histórica dos processos semânticos, e,
com isso, uma dispersão dos sentidos. (FERNAN-
DES, 2005, p. 66-67).

Na busca de querer encontrar um método de análise que pudes-


se explicar coerentemente o aparato metodológico da AD francesa,
Pêcheux elabora e reelabora o seu objeto, articulando o discurso com
fatores que possibilitam o aprofundamento teórico-metodológico da
AD, caracterizando o seu estudo em três épocas – assunto que veremos
nas unidades seguintes -, como afirma Gregolin (2004, p. 60):

O solo epistemológico precisou ser revolvido e


mudanças delineiam os debates teóricos e políticos
que surgiram das crises que atingiram a reflexão
sobre como se dá a articulação entre o discurso, a
língua, o sujeito e a História.

A AD, portanto, se constitui um novo parâmetro científico para o estudo


da língua, buscando nos usos certas regularidades associadas à exteriori-
dade: os sujeitos, suas inscrições na história e as condições de produção
da linguagem para a construção de sentido dos seus dizeres. Nasce, dessa
forma, a AD francesa, que vai se aprimorando no decorrer dos tempos,
revendo conceitos básicos para a compreensão do discurso, tais como:
sujeito, ideologia, produção de sentido, enunciado, formação discursiva,
pré-construído, interdiscurso, consciência, heterogeneidade entre outros.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  81


Construindo o seu conhecimento...

Atividade VI

Um pouco da biografia do Fundador da Análise do Discurso

1. Pesquise em sites da internet dados sobre Michel Pêcheux, destacando


informações de sua vida pessoal, profissional e política, sua relação com
o partido Comunista Francês, suas publicações acadêmicas e sua morte,
se considerar necessário. Em seguida, escreva um texto biográfico com as
informações que considere mais importantes.

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!
Concluindo nossa conversa...

Resumo
A fundação da Análise do Discurso (AD) ocorreu na França, em
1969, por Michel Pêcheux, que propõe uma nova teoria a partir do
entrecruzamento de três campos teóricos: a Linguística, a Psicanálise e
o Materialismo Histórico. Pêcheux, tomando conceitos já existentes nas
referidas disciplinas, empreende uma revisão em três dos conceitos
basilares da Análise do Discurso: LÍNGUA, SUJEITO, IDEOLOGIA. Essa
mudança de perspectiva de análise da língua influenciou significativa-
mente a composição de novas abordagens e a revisão de teorias até
então referências no estudo da linguagem.

 82 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Leituras Recomendadas

FERNANDES, Cleudemar Alves. Análise do Dis-


curso: reflexões introdutórias. 2 ed. São Carlos,
Claraluz, 2008.
Este livro traz de forma sucin¬ta a contextualização histórica, a
apresentação dos conceitos fundamentais e um capítulo com a apli-
cação do dispositivo analítico da Análise do Discurso - é uma leitura
fundamental para quem está iniciando os estudos dos princípios teóri-
cos da AD.

FERREIRA, Maria Cristina Leandro. “O quadro


atual da análise de discurso no Brasil – um bre-
ve preâmbulo”. In: INDURSKY, Freda; FERREIRA,
Maria Cristina Leandro (org.). Michel Pêcheux
& Análise do Discurso: uma relação de nunca
acabar. 2 ed. São Carlos-SP: Claraluz, 2007.
Neste texto, Ferreira discute os conceitos de língua, sujeito, discurso
e ideologia e traça um quadro atual da Análise do Discurso no Brasil,
destacando como os estudos da AD tomaram força e uma caracterís-
tica própria no nosso país.

ORLANDI, Eni. Interpretação: autoria, leitura e


efeitos do trabalho simbólico. 2 ed. Petrópolis-
-RJ: Vozes, 1996.
Nesse livro, Orlandi promove uma excelente discussão sobre efeitos
de sentido a partir dos gestos de interpretação, relacionando-os à his-
toricidade da língua. Trata ainda das noções de sujeito e de posições-
-sujeito e da ideologia como intrinsecamente ligada às construções de
sentido e aos funcionamentos discursivos.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  83


Autoavaliação
É importante que você acompanhe a evolução de seus conhecimentos nessa
unidade, que traz significativas reflexões sobre os estudos da língua(gem) e
para o profissional das letras. Por esta razão, reflita e escreva um comentário
sobre a constatação de Ferreira (2007): “A Análise do Discurso é uma disciplina
de entremeio”

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

 84 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Referências
CARDOSO, S. H. B. “Linguagem, língua, fala e discurso”. In: Discurso
e Ensino. 2ª ed., São Paulo: Autêntica/FALE-UFMG, 2005.

CUNHA, Celso Ferreira da. (1986). Gramática da Língua Portuguesa. 11


ed. Rio de Janeiro: FAE.

DIAS, Luiz Francisco. (1996). Os Sentidos do idioma Nacional: as bases


enunciativas do nacionalismo linguístico no Brasil. Campinas: Pontes,
1996.

_____. “Fundamentos do sujeito gramatical: uma perspectiva da


enunciação”. In: ZANDWAIS, Ana (org.). Relações entre pragmática e
enunciação. Porto Alegre: UFGS/Sagra Luzzatto, 2002, p. 47-63.

_____. “Enunciação, gramática e política de língua na atualidade”.


In: PINHEIRO, Hélder (org.). Território da Linguagem. Campina Grande:
Bagagem, 2004. p. 235-44.

FERNANDES, Cleudemar Alves. Análise do Discurso: reflexões


introdutórias. 2 ed. São Carlos, Claraluz, 2008.

FERREIRA, Maria Cristina Leandro. “O quadro atuall da análise de


discurso no Brasil – um breve preâmbulo”. In: INDURSKY, Freda;
FERREIRA, Maria Cristina Leandro (org.). Michel Pêcheux & Análise do
Discurso: uma relação de nunca acabar. 2 ed. São Carlos-SP: Claraluz,
2007.

FERREIRA, Maria Cristina Leandro (coord.); Glossário de termos do


discurso; a posição do leitor – autor. Porto Alegre; UFRGS, 2011.

GUIMARÃES, Eduardo. Os limites do sentido: um estudo histórico e


enunciativo da linguagem. Campinas-SP: Pontes, 1995.

INDURSKY, Freda; FERREIRA, Maria Cristina Leandro (org.). Michel


Pêcheux & Análise do Discurso: uma relação de nunca acabar. 2 ed. São
Carlos-SP: Claraluz, 2007.

MALDIDIER, Denise. A inquietação do discurso: (re)ler Michel Pêcheux


hoje. Campinas: Pontes, 2003.

NASCIMENTO, Maria Eliza Freitas do. Sentido, Memória e Identidade do


Discurso Poético de Patativa do Assaré. Recife: Bagaço, 2010.

ORLANDI, Eni. Interpretação: autoria, leitura e efeitos do trabalho


simbólico. 2 ed. Petrópolis-RJ: Vozes, 1996.
Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  85
 86 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
V UNIDADE

Os Conceitos da Construção
da Maquinaria do Discurso

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  87


Apresentação
Na unidade IV, estudamos como se deu as principais re-
visões empreendidas por Michel Pêcheux em três dos con-
ceitos basilares da Análise do Discurso: LÍNGUA, SUJEITO,
IDEOLOGIA. E como essa mudança de perspectiva de aná-
lise da língua influenciou significativamente a composição
de novas abordagens e a revisão de teorias até então refe-
rências no estudo da linguagem.
Nesta unidade, você continuará conhecendo as princi-
pais mudanças nos estudos da língua empreendidas pela
Análise do Discurso e os princípios teóricos que nortearam
a Primeira Época da AD, período denominado de “o tempo
das grandes construções”.
Complementado as discussões anteriores sobre língua,
sujeito e ideologia, esta unidade destacará a noção de Dis-
curso e outras concepções do arcabouço teórico da Análise
do Discurso nesse momento: formação social, forma-sujeito,
inconsciente, ideologia e pré-construído.
Nunca é demais repetir aquelas orientações que você já
conhece, mas que são fundamentais para uma aprendiza-
gem planejada e segura:

• Planeje a cada dia um tempo para suas leituras.


• Leia os textos e destaque os novos conceitos e infor-
mações importantes.
• Releia sempre os textos e faça anotações.
• Responda as questões propostas com atenção e utilize
o AVA para promover discussão a respeito da teoria e
das atividades.
• Apresente as suas dúvidas para o professor e para o
tutor, buscando esclarecê-las.
 88 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
Essa aula lhe dará subsídios para compreender a cons-
tante inquietação de Pêcheux quanto ao seu construto teóri-
co e às reflexões sobre língua(gem).

Objetivos
Com o estudo desta aula, esperamos que você:

• Conheça os conceitos básicos da primeira época Análise do


Discurso.
• Entenda como a Análise do Discurso agrega o aspecto social a
sua abordagem sobre língua(gem).

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  89


A primeira época
da Análise do Discurso
Denomina-se de primeira época da Análise do Discurso o período
de 1969 a 1975. Denise Maldidier, em seu livro A Inquietação do Dis-
curso: (reler Michel Pêcheux hoje, se refere a essa fase como “o tempo
das grandes construções” - é o momento inaugural que teve como
ponto de partida o livro Análise Automática do Discurso (AAD). Vale
lembrar que tudo aquilo que discutimos sobre língua, sujeito e ideolo-
gia na unidade anterior acontece nessa primeira época da AD.

“Não posso imaginar uma obra sobre Michel


Pêcheux que não permitisse revisitar o estranho
livro que aparece na Dunod em 1969 com o títu-
lo provocador de Análise Automática do Discurso
[...] Esta primeira “máquina discursiva”, como dirá
Michel Pêcheux bem mais tarde, desempenhará
ao mesmo tempo para ele o papel do momento
quase mítico da fundação e o do protótipo remo-
delado sem cessar, criticado, corrigido, finalmente
abandonado, mas sempre presente. A expressão
AAD 69 designará posteriormente este polo ori-
ginal. Que nós mesmos, depois, só possamos ler
este livro como um esboço, como o laboratório de
uma teoria do discurso ainda por vir, que sejamos
surpreendidos por algumas de suas ingenuidades
ou ambiguidades, não muda nada ao essencial:
Análise Automática do Discurso é um livro origi-
nal que chocou lançando, a sua maneira, questões
fundamentais sobre os textos, a leitura, o sentido.”
(Maldidier, 2003, p. 19)

Nele estão os fios constitutivos do objeto de que se ocupa a disci-


plina: O DISCURSO. Aqui, repito uma frase de Fernandes (2008) para
começar a nossa reflexão, qual seja: O que se entende por discurso?
Para compreender esse objeto de análise, é necessário rigor teórico,
visto que a noção de Discurso frequentemente é usada no cotidiano
sem a especificidade desse campo científico. Não podemos entender
discurso como referência a pronunciamentos políticos, a falas marca-
das por eloquências ou ainda por textos construídos a partir de recursos
estilísticos mais rebuscados.
A respeito da concepção de Discurso para AD Francesa, Fernades
(2008, p. 13) pontua:
(Discurso) não é língua, nem texto, nem a fala, mas
necessita de elementos linguísticos para ter uma
existência material. [...] Discurso implica uma exte-
rioridade à língua, encontra-se no social e envolve

 90 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


questões de natureza não estritamente linguísticas.
Referimo-nos a aspectos sociais e ideológicos im-
pregnados nas palavras quando elas são pronuncia-
das. [...] o discurso não é a lingua(gem) em si, mas
precisa dela para ter existência material e/ou real.

Vejamos ainda outras acepções teóricas relacionadas a esse mé-


todo de análise. Segundo Orlandi (1999, p. 15), o discurso é como
ação social, a “palavra discurso, etimologicamente, tem em si a ideia
de curso, de percurso, de correr por, de movimento. O discurso é assim
palavra em movimento, prática de linguagem: com o estudo do discur-
so observa-se o homem falando.”
Para Cardoso (2005, p.21), o discurso é, pois, um lugar de investi-
mentos sociais, históricos, ideológicos, psiquícos, por meio de sujeitos
interagindo em situações concretas.”
Nas três citações apresentadas, pode-se observar que é preciso
entender que os discursos não são fixos, estão sempre se movendo e
sofrem transformações, acompanham as transformações sociais e po-
líticas de toda natureza que integram a vida humana (cf. FERNANDES,
p. 14)
Portando, o discurso é um processo de produção de sentido, em
que se articula o linguístico ao tecido sócio-histórico que o constitui, ou
seja, há uma intersecção entre o sujeito, a ideologia e a história: o dis-
curso - Maldidier (2003) destaca que esse conceito oriundo na primeira
época da AD vai acompanhar Pêcheux em todas as etapas posteriores.
No primeiro momento da AD, interessava a análise dos discursos inti-
tucionalizados, os discursos políticos. Hoje, no Brasil, a AD também se
interessa pelos discursos do cotidiano, inclusive das mídias sociais.
De acordo com esta perspectiva, o texto é compreendido como a
materialização do discurso,

“O texto é a manifestação verbal do discurso, o


que equivale a dizer que os discursos são lidos e
ouvidos sob a forma de textos. Um discurso é nor-
malmente constituído de uma pluralidade de textos
(basta que se observe a pluralidade de textos que
constitui o discurso feminista, ou a pluralidade de
textos que constitui o discurso das esquerdas no
Brasil). Ao mesmo tempo, um só texto é atraves-
sado por vários discursos (basta que se observe,
por exemplo, que o texto da Bíblia é atravessado
pelo discurso machista, pelo histórico).” (Cardoso,
2005, p. 36)

Esta concepção de texto não é aceita por alguns linguistas textuais,


pois este posicionamento causa algumas divergências teóricas entre
pesquisadores destas áreas de conhecimento da linguística: linguísti-
ca textual e a análise do discurso. Desta forma, cabe aqui neste texto

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  91


compreender o que é texto na perspectiva da Análise do Discurso. E
para elucidar melhor esta ideia, cabe consultar o que o autor líder da
fundação da AD diz sobre o assunto, pois para Pêcheux (1969, p.79),
não se pode analisar um discurso como um texto, ou seja, “como uma
sequência linguística fechada sobre si mesma, mas é necessário referi-
-lo ao conjunto de discursos possíveis a partir de um estado definido de
condições de produção (...)”.
O que leva ao equívoco de achar que a AD analisa textos deve-se
ao fato de comumente o corpus de análise de trabalhos de pesquisa
da AD serem tipicamente textos e isto pode levar a conclusão que a AD
analisa nada mais que isso. Ao analisar o discurso, buscamos compre-
ender como os sentidos se constroem e se materializam nos textos. Daí,
se afirmar que a Análise do Discurso trabalha com enunciados efetiva-
mente realizados. Vejamos um exemplo:

Texto 1

Fonte: http://www.turmadamonica.
com.br/index.htm

Texto 2

Fonte: http://www.turmadamonica.
com.br/index.htm

Nos textos 1 e 2, temos duas situações enunciativas perpassadas


por discursos sobre o sujeito social mulher e o sujeito social obeso,
cujas representações sociais são construções discursivas sustentadas
 92 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
historicamente nas práticas sociais. Na primeira tira, o “e desde quan-
do ela manja de mecânica” retoma e atualiza dizeres não apenas sobre
a mãe do Cebolinha, mas da performance de mulheres ao volante,
silenciando outros dizeres já tão comuns e esteriotipados sobre o com-
portamento das mulheres no trânsito, dentre eles: “mulher no volante,
perigo constante”, “mulher não entende de carro, nem de trânsito”,
“mulher sabe pilotar fogão”. Na segunda tira, o “estou fazendo exercí-
cio para perder peso” e a imagem do afundamento do piso são bastan-
te significativas e materializam discursos recorrentes tanto nas áreas de
medicina e educação sobre saúde quanto da área da moda, por exem-
plo, podendo ser institucionalizados ou do cotidiano. Particularmente,
o buraco no chão é uma visão generalizadora e esteriotipada sobre o
obeso, que em dada situação ridiculariza esse sujeito social. Percebam
que os discursos materializam marcas ideológicas dos sujeitos sociais e
não de indivíduos.

Construindo o seu conhecimento...

Atividade I
Leia os textos A e B e identifique os discursos que perpassam cada enunciado.
Em seguida, explique como esses discursos constroem os possíveis efeitos de
sentido na materialidade linguística e da imagem. (DEIXAR UMAS 10 LINHAS)

Texto A

dica. utilize o bloco


Fonte: http://obaudainternet.paulosezio.com/search/label/Humor de anotações para
responder as atividades!

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  93


Texto B

Forum, Cidadania e Dignidade, de 2006


Agência: AlmapBBDO / Título: Forum Jeans / Diretor de Criação e Arte: Marcello
Serpa /
Fotógrafo: Laurent Seroussi/Flair

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades! 2. A partir da leitura do início desta unidade, faça uma síntese do que você
entendeu sobre a diferença entre texto e discurso.

Outros conceitos
da primeira época...
Você já percebeu, desde a primeira unidade, que todos os conceitos
da Análise do Discurso se relecionam com a construção dos efeitos de
sentido na língua, pelas marcas históricas e ideológicas, pelo sujeito
social que enuncia e silencia.
Na primeira época da AD, entendia-se que os efeitos de sentido se
materializam nos discursos por uma dada inscrição Ideológica, o que
envolve também a noção de sujeito. E o que isso signica?
A ideologia, portanto, se “materializa no discurso que, por sua vez,
é materilizado pela linguagem em forma de texto; e/ou pela linguagem
não-verbal, em forma de imagens” (FERNANDES, p. 15) – como você
pode verificar nos exercícios anteriores.

A ideologia é definida, de acordo com Maldidier (2003), “enquanto


mecanismo estruturante do processo de significação”. Ela surge como
efeito da relação do sujeito com a língua e com a história.
 94 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
Nessa primeira época, Pêcheux acreditava que a Ideologia esta-
va estritamente ligada a uma Formação Social e consequentemente o
sujeito tomava uma forma-sujeito nas relações sociais de interação. É
claro que essa noção logo será modificada na 2ª época, mas procure
entender essa forma-sujeito.
O sujeito discursivo, na primeira época, é determinado tanto pelo
seu funcionamento psíquico, pelo inconsciente, como pelo seu funcio-
namento social, pela ideologia. Pêcheux afirmava que todo sujeito era
clivado, afetado, cindido pelo inconsciente e pela ideologia.
Assim, de acordo com Pêcheux, o sujeito é afetado pelo inconscien-
te, trazendo dois esquecimentos necessários:

1. O de que não é fonte, origem do seu dizer. O sujeito acredita que pode
dizer o que quer, quando quer e como quer. Para Pêcheux, isso era uma
ilusão necessária, já que os sujeitos não “utilizam” seus discursos, são
na verdade “servos assujeitados”. Todo enunciado, assim como todo
sujeito, traz uma história. E cada história traz uma memória. O que é
dito agora já foi dito em algum lugar, em algum momento, por algum
sujeito. A língua é histórica, e tem um caráter atemporal. “Com a AD
– e isto que estamos chamando historicidade – a relação passa a ser
entendida como constitutiva. [...] Não se parte da história para o texto,
[...] parte do texto enquanto materialidade histórica” (ORLANDI, 1998,
p. 55).

2. O de que os sentidos não apresentam uma completude e transparência.


O sujeito tem a ilusão de que ao enunciar os sentidos são apreendi-
dos na sua totalidade. Os sentidos, melhor que sempre chamemos de
efeitos de sentido, são infinitos, sempre poderão ser outros, sempre
são inapreensíveis, sempre apresentam um ponto de deriva, são sem-
pre opacos. Os sentidos também trazem uma história, uma memória
discursiva. Ora, a língua é estrutura e acontecimento, ela se repete
e se atualiza, lembra? Ao tratar da opacidade dos sentidos e da não
origem do dizer na primeira época, Pêcheux traz um prenúncio do que
tratará na segunda época com mais ênfase: os conceitos de memória e
interdiscurso. Nesse momento ele traz a noção de pré-construído, que
discutiremos mais adiante.

“[...] toda descrição – quer se trate da descrição


de objetos ou de acontecimentos ou de um arranjo
discursivo-textual não muda nada, a partir do mo-
mento em que nos prendemos firmemente ao fato
de que “não há metalinguagem” – está intriseca-
mente exposta ao equivoco da língua: todo enun-
ciado é intrinsicamente sucetível de tornar-se outro,
diferente de si mesmo, se deslocar discursivamente
de seu sentido para derivar para outro (a não ser
que a proibição da interpretação própria ao logi-
camente estável se exerça sobre ele explicitamente).
Todo enunciado, toda sequência de enunciados é,
Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  95
pois, linguisticamente descritível como uma séria
(léxico-sintaticamente determinada) de pontos de
deriva possíveis, oferecendo lugar a interpretação.
É nesse espaço que pretende trabalhar a análise
de discurso”.
(Michel Pêcheux, 2008, p. 53)

O sujeito é cindido pela Ideologia, ele é assujeitado a essa ideo-


logia, a uma Formação Social, é desse lugar que significa. Ao tentar
“negar” uma dada ideologia, necessariamente, já se increve noutra,
tornando-se mais uma vez assujeitado – a noção de ideologia será
sempre revisada por Pêcheux e modificada até a terceira época, quan-
do se registra a sua morte.

Construindo o seu conhecimento...

Atividade II
1. Analise os enunciados abaixo e, em seguida, elabore um texto discutindo os
possíveis efeitos de sentido que se materializam a partir dos diferentes lugares
que ocupam os sujeitos.

Texto A

Relaxa e goza, diz ministra sobre crise aérea

A ministra do Turismo, Marta Suplicy, desdenhou dos problemas


nos aeroportos brasileiros, que desestimula o crescimento do turismo
no País. Ela falou sobre o assunto na manhã de hoje durante o lan-
çamento do Plano Nacional do Turismo. Ao ser questionada sobre
que incentivo tem o brasileiro para viajar com o caos nos aeroportos,
ela disse: “relaxa e goza, porque depois você vai esquecer todos os
transtornos”, aconselhou Marta.

Fonte: http://noticias.terra.com.br/brasil/noticias/0,,OI1685467-EI7896,00-Relaxa+e+goza+diz+ministr
a+sobre+crise+aerea.html
dica. utilize o bloco
de anotações para
responder as atividades!

 96 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Texto B

Fonte:http://ueba.com.br/forum/
lofiversion/index.php/t85698.html

Texto C

Fonte: http://ueba.com.br/forum/
lofiversion/index.php/t85698.html

Texto D

Fonte: http://ueba.com.br/forum/
lofiversion/index.php/t85698.html

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  97


Texto E

Fonte: http://ueba.com.br/forum/
lofiversion/index.php/t85698.html

2. Ainda utilizando os textos apresentados acima, destaque os discursos que


perpassam cada enunciado.

dica. utilize o bloco 3. Que traços históricos são retomados nos enunciados C e E para a construção
de anotações para
responder as atividades! dos efeitos de sentido?

Outro conceito importante da primeira época da AD foi o de pré-


-construído. Não raro, quando falamos, ouvimos ou escrevemos algo
numa dada situação enunciativa sentimos que um ou outro efeito de
sentido já nos é conhecido e já foi dito em algum lugar, sem necessa-
riamente identificarmos como, quando e nem de onde surgiu. Isso é o
que entendemos como pré-construído - conceito de Michel Pêcheux e
Paul Henry, que postulavam que todo discurso necessariamente apre-
senta traços de uma enunciação anterior – é a relação do discurso ao
“já-ouvido”, ao “já-lá”. De acordo com Brandão (1991), o pré-cons-
truído deve ser entendido como o “elemento produzido em outro(s)
discurso(s), anterior ao discurso em estudo, independentemente dele”.
A esse respeito, Baracuhy (no prelo) também destaca:

A elaboração do conceito de pré-construído foi fru-


to de um trabalho conjunto entre Pêcheux e Paul
Henry. Para ambos, todo discurso necessariamente
apresenta traços [...] de combinações de elementos
da língua já utilizadas em discursos passados e que
fornecem as evidências sobre as quais um discur-
so se constroi. A articulação dos enunciados une o
que está alhures”.

 98 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


É importante lembrar que o já-dito, o já-lá, pode ser materilaizado
explicitamente ou silenciado nas construções linguísticas ou de ima-
gens.

Construindo o seu conhecimento...

Atividade III

Leia os textos abaixo e destaque os possíveis já-ditos que são retomados


em cada enunciação e como se atualizam na materialidade linguística e na
imagem para a construção dos efeitos de sentido.

Texto A

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  99


Texto B

Fonte: http://br.havaianas.com/pt-BR

Texto C

Fonte: http://www.josapar.com.br/
campanhas-de-comunicacao

 100 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Construindo o seu conhecimento...

Atividade IV
Analise o enunciado “a traição e as regiões do Brasil”. Em seguida, elabore
um texto explicativo, destacando os discursos pré-construídos, a historicidade
e como cada sujeito social é representado e significado na materialidade
linguística.

A TRAIÇÃO E AS REGIÕES DO BRASIL

O CARIOCA - Encontra a mulher com outro na cama e se junta a eles!


O MINEIRO - Encontra a mulher com outro na cama, mata o homem
e continua casado com a mulher, exatamente como manda a TFM -
Tradicional Família Mineira.
O GAÚCHO - Encontra a mulher com outro na cama e, ao contrário do
mineiro, mata a mulher e fica com o marmanjo só pra ele.
O PARAIBANO - Encontra a mulher com outro na cama e, sendo o
CABRA da peste que é, mata os dois e arruma outra.
O GOIANO - Encontra a mulher com outro na cama, entra em depres-
são, pega a viola e vai para a rua a procura de outro corno para
montar mais uma dupla sertaneja.
O BRASILIENSE - Sempre que pega a mulher com outro na cama, de
raiva, vai para o Congresso e nos rouba mais um pouco.
O CURITIBANO - Quando pega a mulher com outro na cama, não faz
nada, pois curitibano não fala com estranhos
O BAIANO - Não faz nada porque esse negócio de separar, arrumar
outra, etc, dá um trabaaaaaaaalho, dá uma canseeeeeira,dá um
soooooooono…
Fonte: Autoria desconhecida. Postado por: Carlos Zamith Junior em Humor http://www.diariodeumjuiz.
com/?p=1695) dica. utilize o bloco
de anotações para
responder as atividades!

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  101


Concluindo nossa conversa...

Resumo
Para finalizar a primeira época da AD, lembremos que esse período
foi bastante profícuo para os estudos da linguagem. Nesse momento
da AD Francesa, Pêcheux pensando na sua maquinaria discursiva cons-
troi novos conceitos sobre língua, sujeito, ideologia, pré-construído e
efeitos de sentido – mesmo que isso signifique que era só um começo
e muitas mudanças ainda estavam sendo pensadas. Pêcheux durante
todo o seu construto teórico, que a partir daqui só cessará com a sua
morte na década de 80, mostrou muita inquietação e humildade inte-
lectual, para está em constante revisão de sua obra.

 102 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Leituras Recomendadas

MALDIDIER, Denise. A inquietação do discurso: (re)ler Michel Pêcheux hoje.


Campinas: Pontes, 2003. PP. 9-54.

Livro muito interessante e referencial – tan-


to para os iniciantes quanto para os vetera-
nos em pesquisas em AD - sobre todo o
período da construção da Análise do Dis-
curso e sobre as três épocas em que
Pêcheux empreende as revisões no constru-
to teórico de sua teoria. Nesse momento,
recomendamos a leitura do capítulo que
diz respeito à primeira época da AD.

PÊCHEUX, Michel. O discurso: estrutura ou acontecimento. Tradução Eni


Puccinelli Orlandi. 5 ed. Campinas – SP: Pontes, 2008.

Este livro traz uma das discussões mais inte-


ressantes de Pêcheux sobre Discurso - uma
das mais importantes concepções da Análise
do Discurso. O leitor acompanha as explica-
ções sobre Discurso ao mesmo tempo em
que lhe é apresentado as noções de efeitos
de sentido e de historicidade da língua.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  103


Autoavaliação
Continue atenta à construção de sua aprendizagem e aos novos conhecimentos
que são fundamentais para a sua formação como estudioso e contínuo
pesquisador sobre língua(gem). Pensando nisso, escreva um comentário sobre
uma das afirmações de Pêcheux: “A Língua é estrutura e acontecimento”.

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

 104 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Referências
CARDOSO, S. H. B. Discurso e Ensino. 2ª ed., São Paulo: Autêntica/
FALE-UFMG, 2005.

FERREIRA, Maria Cristina Leandro. Análise do Discurso no Brasil:


notas à sua história. In: FERNANDES, Claudemar Alves e SANTOS,
João Bôsco Cabral (Orgs). Percursos da análise do discurso no Brasil.
São Carlos: claraluz, 2007.

FERNANDES, Cleudemar Alves. Análise do Discurso: reflexões


introdutórias. 2 ed. São Carlos, Claraluz, 2008.

GREGOLIN, Maria do Rosário. Foucault e Pêcheux na construção da


Análise de Discurso: diálogos e duelos. São Carlos: ClaraLuz, 2004.

___. Formação discursiva, redes de memória e trajetos sociais de


sentido: Mídia e produção de identidades. In: Análise de Discurso:
apontamentos para uma história da noção-conceito de formação
discursiva. São Carlos: Pedro & João Editores, 2007.

LEITE, Maria Regina Baracuhy. Análise do Discurso e Mídia: nas


trilhas da identidade nordestina. VEREDAS ON LINE – ANÁLISE DO
DISCURSO – 2/2010, p. 167-177 – PPG LINGUÍSTICA/UFJF – JUIZ DE
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_____. Entrevendo oásis e silêncios no discurso da propaganda


turística oficial sobre o Nordeste. In: GREGOLIN, Maria do Rosário
Valencise. et al. (org.). Análise do discurso: entornos do sentido.
Araraquara: UNESP, FCL, Laboratório Editorial; São Paulo: Cultura
Acadêmica, 2001.

____. As três épocas da análise do discurso (AD) francesa (mimeo).

MALDIDIER, Denise. A inquietação do discurso: (re)ler Michel Pêcheux


hoje. Campinas: Pontes, 2003.

MUSSALIM, Fernanda. 2001. Análise do Discurso. In: MUSSALIM, F.;


BENTES, A. C. (orgs.). Introdução à Linguística: domínios e fronteiras, v.
2. São Paulo: Cortez.
ORLANDI, Eni. Análise de discurso: princípios e procedimentos. 6. ed.
Campinas: Pontes, 2005.

_____. Interpretação: autoria, leitura e efeitos do trabalho simbólico. 2 ed.


Petrópolis: Vozes, 1998.

PÊCHEUX, Michel. O discurso: estrutura ou acontecimento. Tradução Eni


Puccinelli Orlandi. 5 ed. Campinas – SP: Pontes, 2008.
Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  105
PÊCHEUX, Michel. Análise Automática do Discurso (AAD 69).
In: GADET, Francoise & HAK, Tony. Por uma Análise Automática do
Discurso: uma introdução à obra de Michel Pêcheux. Campinas – SP:
EDUNICAMP, p. 61-162.

PÊCHEUX, Michel et al. Apresentação da Análise Automática


do Discurso. In: GADET, Francoise & HAK, Tony. Por uma Análise
Automática do Discurso: uma introdução à obra de Michel Pêcheux.
Campinas – SP: EDUNICAMP, p. 253-282.

PÊCHEUX, Michel. A Análise de Discurso: três épocas. In: GADET, F.;


HAK, T. (orgs.). Por uma análise automática do discurso: uma introdução
à obra de Michel Pêcheux. Trad. Bethânia S. Mariani et al. Campinas:
Editora da UNICAMP, 1993. pp. 311-318.

 106 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


VI UNIDADE

As mudanças conceituais
da Análise do Discurso

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  107


Apresentação

Na unidade V, você estudou como Michel Pêcheux con-


cebeu os primeiros conceitos do seu construto teórico. Na
primeira época da AD, Pêcheux pensando na sua maquina-
ria discursiva lança os conceitos sobre língua, sujeito, ideo-
logia, pré-construído e efeitos de sentido. Vale lembrar que
alguns conceitos serão revisados por Pêcheux.
Nesta unidade, nosso objetivo é apresentar as mudanças
em alguns conceitos da Análise do Discurso Francesa (ADF)
no período conhecido como 2ª época da AD.
Continue motivado na construção dos seus conhecimen-
tos e busque seguir as orientações que são bastante úteis e
já conhecidas:

• Planeje a cada dia um tempo para suas leituras.


• Leia os textos e destaque os novos conceitos e infor-
mações importantes.
• Releia sempre os textos e faça anotações.
• Responda as questões propostas com atenção e utilize
o AVA para promover discussão a respeito da teoria e
das atividades.
• Apresente as suas dúvidas para o professor e para o
tutor, buscando esclarecê-las.
Continuemos nossa fascinante viagem teórica!
 108 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
Objetivos

Ao estudar a unidade VI, esperamos que você:


• Conheça as mudanças teóricas que ocorreram na segunda
época da Análise do Discurso.

• Entenda como as mudanças teóricas da segunda época da Aná-


lise do Discurso estão relacionadas ao novo modo de Pêcheux
conceber Ideologia nesse período.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  109


A Segunda Época
da Análise do Discurso
A segunda época da Análise do Discurso compreende o período
de 1976 a 1979 e é denominado por Denise Maldidier, no livro A In-
quietação do Discurso: (re)ler Michel Pêcheux hoje, como “Tentativas”.
Para Maldidier (2003, p. 55), “o ano de 1975 marca o início da grande
fratura, da reviravolta da conjuntura teórica que desemboca no esta-
belecimento de paradigma novo. Um período de tateamentos se abre
então para Michel Pêcheux”. E na segunda época da AD, a ideia da
máquina discursiva estrutural também é repensada.
Os trabalhos de Pêcheux nessa fase partem da questão como se
relacionam a ordem da língua com a ordem da história, ou seja, como
os elementos do interior da língua se relacionam com a exterioridade
constitutiva nos processos discursivos. E a partir desse ponto, dois con-
ceitos vão ser estruturados: Formação Discursiva e Interdiscurso.

Construindo seu
Conhecimento
Leia o texto a seguir:

Fonte: www.nadaver.com

Ao analisar o enunciado, é possível verificar que os efeitos de senti-


do se constroem a partir das diferentes posições que os sujeitos sociais
representados assumem e estes papéis sociais - ecologista e latifundi-
ário - que cada figura representa são condições de produção do dis-
curso. Nesta situação, o diálogo envolve sujeitos sociais que divergem
suas opiniões sobre um mesmo assunto. As escolhas lexicais “floresta”,
 110 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
“dinheiro”, “senhor”, “ganancioso”, “latifundiário”, “destruindo” e das
imagens da moto-serra - e não de um machado – e da cartola reve-
lam a presença de posições-sujeito que se opõem, revelando diferentes
discursos.
Percebam que na segunda época da AD Pêcheux abandona o con-
ceito de FORMA-SUJEITO – que traz uma ideia de algo fixo e de que o su-
jeito se reveste de uma dada ideologia (no singular) - e trata os efeitos
de sentido relacionando-os a outra noção, a de POSIÇÃO-SUJEITO – que
indica que o sujeito da enunciação ocupa posições-sujeito (no plural)
conforme a enunciação enunciativa . Lembremos que os efeitos de sen-
tido é “dependende da inscrição ideológica da enunciação, do lugar
histórico-social de onde se enuncia [...] De acordo com as posições dos
sujeitos envolvidos, a enunciação tem um sentido e não outro(s)” (FER-
NANDES, 2008, p. 19). O sujeito social passa a significar a partir da
posição-sujeito que ocupa na enunciação, mas para “Pêcheux a noção
de sujeito discursivo permanece como efeito de assujeitamento à for-
mação discursiva com a qual ele se identifica” (FERNANDES, op. cit.).
Essa mudança implica também um novo modo de pensar Ideologia,
que nesse momento está ligada ao conceito de FORMAÇÃO DISCUR-
SIVA – termo tomado por empréstimo a Foucault e resignificado por
Pêcheux.
A noção de formação discursiva (FD) começa a
fazer explodir a noção de maquinaria estrutural
fechada uma vez que o dispositivo da formação
discursiva está em relação paradoxal com seu ex-
terior: uma FD não é um espaço estruturalmente
fechado, pois é constitutivamente “invadido” por
elementos que vêm de outro lugar (isto é, de outras
FD) que se repetem nela, fornecendo-lhes suas evi-
dências discursivas fundamentais (PÊCHEUX apud
FERNANDES, 2008, p. 41).

A Formação Discursiva (FD) determina “o que pode e deve ser dito”


a partir de dada posição, o que reforça aquele noção de que o sujeito
não é origem do seu dizer. A Formação Discursiva (FD) diz respeito ao
que se “pode dizer somente em determinada época e espaço social, ao
que tem lugar e realização a partir de condições de produção específi-
cas, historicamente definidas” (FERNANDES, 2008, p. 48).

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  111


Atividade I

Agora é sua vez. Leia a tirinha e, em seguida, escreva um comentário sobre as


posições-sujeito e as formações discursivas em que se inscrevem os sujeitos
da enunciação, destacando como as marcas ideológicas materializadas no
enunciado contribeum para a construção dos efeitos de sentido.

Texto 1

Fonte: http://guiaecologico.wordpress.
com/tag/biratan/page/3/

Atividade II
1. Explique os possíveis efeitos de sentido que se materializam no enunciado a
partir de diferentes posições-sujeito, indicadas abaixo:

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

 112 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Texto 1

POSIÇÃO-SUJEITO HOMEM:

POSIÇÃO-SUJEITO MULHER:

2. Imagine-se como jornalista da Revista Play Boy, e elabore um texto com o


seguinte título:

SAIBA O QUE VOCÊ NUNCA DEVE DIZER A UMA MULHER

3. Se você estivesse em plena idade média, orientando as moças da corte como


se comportar após o casamento, o que seria dito no item abaixo?
SAIBA O QUE VOCÊ NUNCA DEVE DIZER A UM HOMEM

4. Analise como a historicidade e as marcas ideológicas das práticas sociais


se materializam em cada enunciado apresentados anteriormente nesse bloco
de exercício.

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  113


Você já sabe que todo sujeito social ocupa um lugar na sociedade
e esta condição faz parte da constituição de significação.

[...] observamos, em diferentes situações de nos-


so cotidiano, sujeitos em debate e/ou divergência,
sujeitos em oposição acerca de uma mesmo tema.
As posições em contraste revelam lugares socioi-
deológicos assumidos pelos sujeitos envolvidos e a
linguagem é a forma material de expressão desses
lugares. Vemos, portanto, que o discurso não é a
lingua(gem) em si, mas precisa dela para ter exis-
tência material e/ou real”.
FERNANDES, 2008, p. 13

O Interdiscurso outro
conceito da 2ª época da AD
O discurso não depende do texto para existir e um mesmo discurso
pode se materializar em vários enunciados. Esse ponto nodal da AD
ficou bem explicado desde a primeira época. Porém, é na segunda
época que Pêcheux destaca que diferentes dicursos podem se cruzar
numa mesma Fundação Discursiva. Esse entrecruzamento de discursos
num enunciado foi denominado por Pêcheux como Interdiscurso.

Interdiscuso: presença de diferentes discursos,


oriundos de diferentes momentos na história e de
diferentes lugares sociais, entrelaçados no interior
de uma formação discursiva. Diferentes discursos
entrecruzados constitutivos de uma formação dis-
cursiva dada [...] (FERNANDES, p. 49)

Vejamos o enunciado a seguir:

 114 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Nesta tirinha, com os personagens curumins, percebe-se a presen-
ça do discurso eco-ambiental, representado pelo sujeito social indí-
gena, que discursivamente é marcado por uma imagem de amigo da
natureza, e pela alusão ao homem branco, discursivamente marcado
por uma imagem de destrtuidor da natureza, através de uma referen-
ciação verbal pela palavra PROGRESSO e de uma referenciação à
ação de desmatamento materializada na imagem de troncos de árvores
que foram derrubadas.
No plano discursivo, o lugar do índio continua sendo o de defensor
da natureza e o do homem branco é aquele que desmata a floresta em
nome do progresso. No enunciado, é possível constatar outras vozes
acionadas pela palavra “progresso”: os efeitos de sentido constituídos
no símbolo nacional brasileiro, o “Ordem e Progresso” da nossa ban-
deira; no texto histórico lema do governo de JK, que se voltava para o
progresso (avanço para o interior) do país.
Na tirinha, os efeitos de sentido atribuídos a materialidade linguísti-
ca PROGRESSO dizem respeito aqueles discursos que apontam a atitude
do homem branco como causadora do desmatamento e da destruição
– diferentemente de outros discursos que tomam a palavra PROGRESSO
como desenvolvimento. Esta escolha lexical se apresenta como a chave
da construção da significação do enunciado.

Construindo o seu conhecimento

Atividade III
1. Analise o texto a seguir e escreva um comentário, destacando os discursos
explicitados e silenciados na materialidade do enunciado.

Fonte: http://www.turmadamonica.com.br/
index.htm

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  115


2. Quais as interdiscursividades mostradas no enunciado e como contribuem
para os possíveis efeitos de sentido?

Fonte: Revista Veja, edição 1901, ano 38, nº 16, 20 de abril de 2005, p. 40.

3. Como se instaura a crítica a uma dada situação religiosa no texto assinado


por Millôr Fernandes?

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

 116 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Concluindo nossa conversa

Resumo
Para finalizar essa unidade, retomemos os três pontos fundamentais
dessa segunda época, quais sejam: a mudança da noção de FORMA-
-SUJEITO para POSIÇÃO-SUJEITO; a construção dos conceitos de
Formação Discursiva e Interdiscurso – todos ligados à revisão da con-
cepção de Ideologia, feita por Pêcheux..
Vale lembrar ainda que para entender os conceitos de Interdiscur-
so e de Formação Discursiva é necessário observar a historicidade na
materialidade do enunciado, que provoca a repetição e/ou atualiza-
ção da língua(gem) e consequentemente constroi os possíveis efeitos
de sentido.

Leituras Recomendadas
MALDIDIER, Denise. A inquietação do discurso: (re)ler Michel Pêcheux hoje.
Campinas: Pontes, 2003. PP. 9-54.
Livro muito interessante e referencial – tan-
to para os iniciantes quanto para os vetera-
nos em pesquisas em AD - sobre todo o
período da construção da Análise do Dis-
curso e sobre as três épocas em que
Pêcheux empreende as revisões no constru-
to teórico de sua teoria. Nesse momento,
recomendamos a leitura do capítulo que
diz respeito à segunda época da AD.
ORLANDI, Eni P. “A Análise de Discurso em suas diferentes tradições
intelectuais: o Brasil”. In: INDURSKY, Freda; FERREIRA, Maria Cristina Leandro
(org.). Michel Pêcheux & Análise do Discurso: uma relação de nunca acabar. 2
ed. São Carlos-SP: Claraluz, 2007. P. 75 a 88.

Neste texto, Orlandi apresenta as contribui-


ções de Pêcheux e as atuais tendências da
Análise do Discurso no Brasil, destacando
os diferentes objetos de análise e pesquisa
e, consequentemente, as particularidades
do campo teórico em nossas universidades.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  117


Autoavaliação

Para que você possa refletir sobre sua aprendizagem e para fechar essa
unidade, selecione um texto, de qualquer gênero textual, e destaque as
posições-sujeito, os interdiscursos e os possíveis efeitos de sentido.

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

 118 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Referências
CARDOSO, S. H. B. Discurso e Ensino. 2ª ed., São Paulo: Autêntica/
FALE-UFMG, 2005.

FERREIRA, Maria Cristina Leandro. Análise do Discurso no Brasil:


notas à sua história. In: FERNANDES, Claudemar Alves e SANTOS,
João Bôsco Cabral (Orgs). Percursos da análise do discurso no Brasil.
São Carlos: claraluz, 2007.

FERREIRA, Maria Cristina Leandro. “O quadro atuall da análise de


discurso no Brasil – um breve preâmbulo”. In: INDURSKY, Freda;
FERREIRA, Maria Cristina Leandro (org.). Michel Pêcheux & Análise do
Discurso: uma relação de nunca acabar. 2 ed. São Carlos-SP: Claraluz,
2007.

FERREIRA, Maria Cristina Leandro (coord.); Glossário de termos do


discurso; a posição do leitor – autor. Porto Alegre; UFRGS, 2011.

FERNANDES, Cleudemar Alves. Análise do Discurso: reflexões


introdutórias. 2 ed. São Carlos, Claraluz, 2008.

GREGOLIN, Maria do Rosário. Foucault e Pêcheux na construção da


Análise de Discurso: diálogos e duelos. São Carlos: ClaraLuz, 2004.

INDURSKY, Freda; FERREIRA, Maria Cristina Leandro (org.). Michel


Pêcheux & Análise do Discurso: uma relação de nunca acabar. 2 ed. São
Carlos-SP: Claraluz, 2007.

LEITE, Maria Regina Baracuhy. Análise do Discurso e Mídia: nas


trilhas da identidade nordestina. VEREDAS ON LINE – ANÁLISE DO
DISCURSO – 2/2010, p. 167-177 – PPG LINGUÍSTICA/UFJF – JUIZ
DE FORA.

_____. Entrevendo oásis e silêncios no discurso da propaganda


turística oficial sobre o Nordeste. In: GREGOLIN, Maria do Rosário
Valencise. et al. (org.). Análise do discurso: entornos do sentido.
Araraquara: UNESP, FCL, Laboratório Editorial; São Paulo: Cultura
Acadêmica, 2001.

____. As três épocas da análise do discurso (AD) francesa (mimeo).

___. Formação discursiva, redes de memória e trajetos sociais de


sentido: Mídia e produção de identidades. In: Análise de Discurso:
apontamentos para uma história da noção-conceito de formação
discursiva. São Carlos: Pedro & João Editores, 2007.

MALDIDIER, Denise. A inquietação do discurso: (re)ler Michel Pêcheux


hoje. Campinas: Pontes, 2003.
Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  119
MUSSALIM, Fernanda. 2001. Análise do Discurso. In: MUSSALIM, F.;
BENTES, A. C. (orgs.). Introdução à Linguística: domínios e fronteiras, v. 2.
São Paulo: Cortez.

NASCIMENTO, Maria Eliza Freitas do. Sentido, Memória e Identidade do


Discurso Poético de Patativa do Assaré. Recife: Bagaço, 2010.

ORLANDI, Eni. Análise de discurso: princípios e procedimentos. 6. ed.


Campinas: Pontes, 2005.

_____. Interpretação: autoria, leitura e efeitos do trabalho simbólico. 2 ed.


Petrópolis: Vozes, 1998.

PÊCHEUX, Michel. O discurso: estrutura ou acontecimento. Tradução Eni


Puccinelli Orlandi. 5 ed. Campinas – SP: Pontes, 2008.

PÊCHEUX, Michel. Análise Automática do Discurso (AAD 69). In:


GADET, Francoise & HAK, Tony. Por uma Análise Automática do Discurso:
uma introdução à obra de Michel Pêcheux. Campinas – SP: EDUNICAMP,
p. 61-162.

PÊCHEUX, Michel et al. Apresentação da Análise Automática


do Discurso. In: GADET, Francoise & HAK, Tony. Por uma Análise
Automática do Discurso: uma introdução à obra de Michel Pêcheux.
Campinas – SP: EDUNICAMP, p. 253-282.

PÊCHEUX, Michel. A Análise de Discurso: três épocas. In: GADET, F.;


HAK, T. (orgs.). Por uma análise automática do discurso: uma introdução
à obra de Michel Pêcheux. Trad. Bethânia S. Mariani et al. Campinas:
Editora da UNICAMP, 1993. pp. 311-318.

 120 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


VII UNIDADE

Os novos horizontes
conceituais da
Análise do Discurso

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  121


Apresentação
Na unidade VI, estudamos a 2ª época da Análise do Dis-
curso e as primeiras mudanças conceituais empreendidas
por Michel Pêcheux nesse período, que dizem respeito ao
abandono do termo FORMA-SUJEITO para a noção de PO-
SIÇÃO-SUJEITO e à construção dos conceitos de Formação
Discursiva, que envolvia um novo modo de entender Ideolo-
gia, e de Interdiscurso.
Nesta unidade, apresentaremos outras mudanças concei-
tuais que ocorreram na terceira época da Análise do Discur-
so Francesa (ADF), nos últimos anos vida de Michel Pêcheux.
Nesse último momento de estudo sobre Análise do Dis-
curso, é muito importante você refletir sobre seu processo
de aprendizagem e não se distanciar de suas metas. Para
isso, um dos caminhos é seguir as orientações repetidamen-
te apresentamos:

• Planeje a cada dia um tempo para suas leituras.


• Leia os textos e destaque os novos conceitos e infor-
mações importantes.
• Releia sempre os textos e faça anotações.
• Responda as questões propostas com atenção e utilize
o AVA para promover discussão a respeito da teoria e
das atividades.
• Apresente as suas dúvidas para o professor e para o
tutor, buscando esclarecê-las.

Continuemos nossa fascinante viagem teórica!

 122 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Objetivos

Finalizando nessa aula o estudo sobre Análise do Discurso, espera-


mos que você:

• Conheça as mudanças teóricas que ocorreram na terceira épo-


ca da Análise do Discurso.

• Entenda como as mudanças teóricas da terceira época da Aná-


lise do Discurso continuam relacionadas à revisão que Pêcheux
faz mais uma vez sobre a noção de Ideologia.

• Entenda o quadro de construção e de mudanças da Análise do


Discurso nas três épocas apresentadas nessa e nas três unida-
des anteriores..

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  123


A Terceira Época da
Análise do Discurso
“A desconstrução domesticada” - é com essa expressão que Denise
Maldidier, no livro A Inquietação do Discurso: (re)ler Michel Pêcheux
hoje, se refere a terceira época da Análise do Discurso, período com-
preendido de 1980 a 1983. Esse momento é de significativa abertura
do campo teórico da AD para novos debates, reflexões e diálogos com
outros pensadores, culminando com a reforma de algumas concep-
ções, entre elas a de assujeitamento do sujeito.
“A terceira época da AD é marcada pela abertura
dos horizontes teóricos. Ampliam-se as fronteiras
e aprofundam-se os diálogos. Esta última fase ca-
racterizou-se pela confluência das idéias de Michel
Pêcheux com outros pensadores. Ele relê Bakhtin (a
quem havia criticado pelo “subjetivismo humanis-
ta”), como também vai se aproximar, de fato, das
idéias de Michel Foucault, através de Jean-Jacques
Courtine, além de sofrer a influência decisiva dos
teóricos da Nova História como Pierre Nora, Jac-
ques Le Goff, Michel de Certeau”.
(BARACUHY, Maria Regina. In: As três épocas da
análise do discurso (AD) francesa (no prelo).

Na terceira época, há a desconstrução e abandono da noção de


maquinaria discursiva estrutural, visto que não se concebia mais pensar
as condições de produção como um “espaço” fechado e homogêneo –
já havia o prenúncio desse fato já na segunda época. Lembra?
O ponto crucial que ainda causava inquietação na abordagem de
Pêcheux era a noção de assujeitamento do sujeito: na primeira época,
como forma-sujeito assujeitado a uma ideologia; na segunda época,
assujeitado à formação discursiva. A mudança se dá a partir da forma
de conceber o discurso como constitutivamente heterogêneo. “A no-
ção de formação discursiva vai ser retificada e ampliada. Nessa nova
concepção, desaparecem os termos ‘aparelhos ideológicos’ e ‘luta de
classes’” (BARACUHY, no prelo). E Pêcheux aos poucos se afasta da
sombra marxista.
A respeito dessas mudanças na terceira época, Nascimento (2010,
p. 35) destaca:
Teoria e prática discursivas são interrogadas-nega-
das-desconstruídas por Pêcheux, que propõe uma
abordagem discursiva da História, investindo con-
tra a evidência do sujeito e do sentido que procura
descrever. Assim, o sujeito e o sentido passam a
ser constituídos historicamente. A ideologia é vista
como dividida, não idêntica a si mesma, tendo a
presença da heterogeneidade no próprio interior

 124 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


da ideologia e da formação discursiva. O resul-
tado disso é uma minimização do assujeitamento
do sujeito, visto que, segundo Grangeiro (2005),
no interior de uma mesma formação discursiva,
há espaço para o confronto, a divergência, a con-
traidentificação do sujeito, o que confirma a sua
heterogeneidade constitutiva. O sujeito é clivado,
atravessado pelo outro.

Nessa etapa, Pêcheux acata as críticas de Courtine sobre a concep-


ção de Formação Discursiva, bem como a sua proposta de vê-la como
fronteiras que se deslocam. Concomitantemente, a noção de memória
discursiva proposta por Coutine, será adotada por Pêcheux, tornando-
-se fundamental para a análise dos enunciados e a para o entendimen-
to da heterogeneidade como constitutiva da língua(gem).

É pela memória discursiva – “que constitui um corpo-sócio-histórico-


-cultura” – que observamos a repetição, a atualização, materialização
e silenciamentos de vozes enunciadas anteriormente numa determinada
enunciação e nos fatos linguísticos daí decorrentes. Os discursos, então,
trazem uma memória coletiva na qual os sujeitos sociais estão inseridos. A concepção de
E como percebemos essa memória discursiva nos enunciados? Ve- memória discursiva,
jamos: trazida para a Aná-
lise do Discurso por
Jean-Jacques Cour-
tine, parte do con-
ceito de domínio de
memória, apresen-
tado por Foucault.

Fonte: Revista Veja, edição 1604, ano 32,


nº 26, 30 de junho de 1999, p. 29.

No enunciado, é possível observar um já-dito do senso comum a respei-


to do comportamento dos brasileiros no trânsito e da qualidade dos carros
populares em uso no Brasil para abalizar outro enunciado preconstruído:
o status de um carro europeu. Na materialidade linguística “Não pare na
faixa de pedestre, não fure o sinal fechado, não feche o cruzamento. Você
está num carro europeu. Seat Córdoba, o europeu sangue quente”, tem-se
a utilização de propagandas institucionais (governo) que trazem à tona uma
memória discursiva sobre o comportamento dos brasileiros no trânsito: “o
brasileiro para na faixa de pedestre, fura o sinal fechado, fecha o cruza-
mento”. Simultaneamente, agrega-se outra memória discursiva, a de que
Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  125
não é permitido infringir a lei, acionada pelo enunciado “você está num
carro europeu”. Deve-se observar que não é o sintagma “não” que articula
a informação nova, mas a afirmativa posterior – “você está num carro eu-
ropeu” - que se apresenta perpassada por interdiscursos. É a partir dessa
memória do dizer que são mobilizados discursos outros sobre “ser europeu”,
que põem em relevo a “verdade” do senso comum sobre a superioridade
cultural, educacional, racional e - por que não? – tecnológica desse conti-
nente. Nesta direção argumentativa, atualiza a significação do seu dizer, que
pode ser entendido como “cumpra a lei, seja educado, seja racional, você
tem um nome europeu a zelar” e nega a respeitabilidade do outro, deixando
implícito que “você pode ter uma atitude qualquer, típica de brasileiro no
volante, num carro qualquer, a exemplo dos nacionais”. Aqui, os processos
discursivos vão provendo o brasileiro de uma definição que, por sua vez, é
parte do funcionamento imaginário da sociedade brasileira. Não é o discur-
so do Brasil que define o brasileiro, mas o discurso sobre o Brasil.

Construindo seu Conhecimento

Atividade I
O texto a seguir circula nas rodas de conversas e brincadeiras de adolescentes
e nas redes sociais das quais participam. Ele nos foi enviado por uma criança
de 10 anos através de email.

Texto 1

Querem que nós adolescentes tenhamos juízo? Como é possível?


Desde pequenos vimos:
O Tarzan andando nu!
A Cinderela chegava meia noite!
O Pinóquio mentia muuuuito!
O Aladim era ladrão!
O Batman dirigia a 320 km/h!
A Branca de Neve morava com 7 homens!
E o Popeye fumava folha verde!

Esses foram os exemplos que tivemos desde


pequenos. Concorda?

 126 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


1. Quais os possíveis efeitos de sentido que se materializam no enunciado
sobre a representação do sujeito social adolescente?

2. Quais os possíveis discursos que perpassam o enunciado sobre a prática


social “dar exemplos”?

3. Quais as memórias discursivas que emergem do enunciado e como elas


atualizam os efeitos de sentido do enunciado. dica. utilize o bloco
de anotações para
responder as atividades!

A heterogeneidade do discurso, como já foi dito, faz explodir a ideia


de maquinaria discursiva estrutural e põe em relevo seu caráter consti-
tutivo: o discurso é perpassado por discursos “outros” que faz emergir,
materializar várias vozes em uma só voz.

A noção de heterogeneidade discursiva é fruto do


contato de Michel Pêcheux com a linguista Jacque-
line Authier-Revuz, que, a partir do pensamento de
Mikhail Bakhtin, traz significativas contribuições
para a construção desse conceito.

A heterogeneidade discursiva, como bem coloca Fernandes (2008,


p. 35), são as “formas de presença no discurso das diferentes vozes
constitutivas do sujeito”. E acrescenta um ponto importante dos estudos
de Authier-Revuz sobre heterogeneidade, as duas possibilidades de rea-
lização: “Heterogeneidade não-mostrada (presença implícita de outras
vozes constitutivas da voz do sujeito) e heterogeneidade mostrada (pre-
sença explícita de outras vozes, marcadas, na voz do sujeito)”. Ao ana-
lista do discurso, fica o trabalho de buscar os indícios na materialidade
linguística e da imagem da heterogeneidade mostrada, sabendo que as
vozes apontadas na análise sempre poderão significar algo diferente,
já que os sentidos são sempre opacos, restando-lhe apenas apontar os
possíveis efeitos de sentido numa dada situação enunciativa.

A heterogeneidade constitutiva] diz respeito ao “ex-


terior” constitutivo, ao “já-dito”, a partir do qual
todo discurso se constrói. Assim todo discurso em
si carrega rastros de outros, a alteridade é consti-
tutiva do dizer. É pela memória discursiva de uma
dada formação social que se apreende a hetero-
geneidade constitutiva, logo ela é não-localizável
e não-representável na materialidade discursiva,
porque da ordem do interdiscurso e do inconscien-
te” (BARACUHY, no prelo)

As duas heterogeneidades se articulam entre si, mas estão em dife-


rentes ordens: a heterogeneidade não-mostrada é inerente a constitui-
ção do discurso e a heterogeneidade mostrada traz a representação do
Outro no processo discursivo.
Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  127
Vejamos a heterogeneidade em situações efetivas de uso da
língua(gem):
As fotos e as legendas a seguir são enunciados integrantes das pe-
ças publicitárias da campanha eleitoral de Dilma Rousseff, veiculadas
no site oficial da, então, candidata e no guia eleitoral da campanha
presidencial de 2010. Elas estão aqui organizadas em três blocos, se-
6
Trabalho A construção da imagem femini- guindo a ordem cronológica como aparecem no guia6.
na na campanha eleitoral de Dilma Rous-
seff: uma análise discursiva, de Genival
Antônio Silva Filho, aluno do Propaganda e
Publicidade da CESREI, sob a orientação de
Adriana Rodrigues Pereira de Souza, coor-
denadora do Grupo de Estudo e Pesquisa de
Identidade, Discurso e Mídia.

Fonte: www.dilma13.com.br (site oficial da campanha eleitoral de


Dilma Rousseff – eleições 2010)

A partir da análise dos enunciados apresentados, a princípio, ob-


servamos uma Identidade feminina que se constroi numa memória dis-
cursiva a partir de três posições sujeitos: Dilma, mulher vanguardista;
Dilma, a política competente; Dilma, a mãe (do PAC - Programa de
Aceleração do Crescimento), cujos efeitos de sentido materializam dis-
cursos sociais sobre representação de mulher moderna, a frente do seu
tempo.
 128 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
No primeiro bloco, ela assume uma identidade de uma nova mulher e
se torna uma espécie de vanguardista que quebra “verdades”, representa-
ções sociais até então inquestionáveis. Os enunciados trazem uma memória
coletiva e retomam a luta de outras mulheres no cenário nacional, reforçada
no guia eleitoral por vídeos que trazem imagens de grandes mulheres da
História oficial do Brasil, como Princesa Isabel, Anita Garibaldi, Chiquinha
Gonzaga. A mulher submissa, que não opina, deixa de existir, assume agora
um sujeito que dar suas opiniões, que faz suas escolhas – a mulher vanguar-
dista. No segundo bloco, além de vanguardista, agrega-se outra imagem
– a da mulher competente. Mais uma vez o sujeito social em destaque na
construção de imagens é o da mulher pública, a consolidação dessa mulher
pública. No último bloco, Dilma agora assume os sujeitos sociais “Mãe do
PAC” (sujeito público) – O PAC (Programa de Aceleração do Crescimento)
um dos maiores planos de desenvolvimento da história do país-, “Mãe de
milhões de brasileiros” - memória coletiva de um sujeito social doméstico.
Para a análise desses enunciados foram articulados os conceitos de
sujeito social, memória discursiva, heterogeneidade discursiva, histori-
cidade e efeitos de sentido. Agora é a sua vez!

Construindo seu Conhecimento

Atividade II
1. Leia o quadrinho da personagem Radical Chic, de Paiva, e analise os
discursos que perpassam o enunciado e como as movências dos efeitos de
sentido se materializam a partir das posições-sujeito por cada personagem.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  129


2. Que memórias discursivas são acionadas no enunciado de cada sujeito
social?

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

Os novos caminhos da AD
No momento inaugural da Análise do Discurso, o interesse era pela
análise de discursos políticos, com seu caráter institucionalizado. Essa
realidade no Brasil mudou muito. Hoje, há uma rica e fértil variedade
de materiais que são tomados como objeto de trabalho para a AD. Para
se ter uma ideia desses novos caminhos, Ferreira (2007, p. 21) destaca:

Do campo verbal ao não-verbal, passando pelos


temas sociais (imigração, movimento sem terra,
greves) e por diferentes tipos de discurso (religio-
so, jurídico, científico, cotidiano), ou por questões
estritamente teóricas (hiperlíngua, autoria, sujeito
do discurso, equivocidade da língua), a Análise do
Discurso no Brasil ou Escola Brasileira de Análise
de Discurso, amadureceu, se consolidou e garan-
tiu seu lugar no âmbito dos estudos da linguagem
realizados pelas ciências humanas

Seja qual for o seu objeto escolhido para estudo não se deve perder
de vista o conselho dado por Ferreira (op. cit.): “o que dá vigor e consis-
tência às análises feitas pelo viés discursivo é precisamente a indissocia-
bilidade entre a teoria e a prática” (grifo nosso). Sempre lembrar de que
a Análise do Discurso não dispõe de modelos prontos de análise, mas
tem princípios teóricos, métodos e rigor científico. E por não apresentar
modelos fixos e prontos para a análise dos arquivos escolhidos como
corpus não significa que na Análise do Discurso “tudo pode”. Ferreira
(op. cit.), ao mostrar que a “Análise do Discurso no Brasil se deslocou
da Linguística e ganhou maior entrada nas áreas-fronteiras das ciências
humanas”, apresenta um risco que devemos evitar: “O ‘perigo’ dessa
maior circulação é ver alguns de seus conceitos banalizados e seu apa-
rato teórico reduzido a “método de análise do discurso”.
 130 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
Construindo seu conhecimento

Atividade III
Os enunciados abaixo foram publicados pela Revista Veja como campanha
publicitária institucional-educativa no período da campanha eleitoral de 2010.

Texto 1 - A Texto 1 – B

Revista Veja, edição 2181, ano 43, nº 36, 08 de setembro de 2010,


p. 118 e 119

Revista Veja, edição 2181, ano 43, nº 36, 08 de


setembro de 2010, p 1 (Capa)

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  131


Texto 2 - A Texto 2 – B

Revista Veja, edição 2182, ano 43, nº 37, 15 de setembro de 2010,


p. 14 e 15.

Revista Veja, edição 2182, ano 43, nº 37, 15 de


setembro de 2010, p. 1 (Capa).

Texto 3 - A Texto 3 – B

Revista Veja, edição 2186, ano 43, nº 41, 13 de outubro de 2010,


p. 132 e 133.

Revista Veja, edição 2186, ano 43, nº 41, 13 de


outubro de 2010, p. 1 (Capa).

1. Levando em consideração os princípios teóricos da AD Francesa, analise


apenas os enunciados 1-A, 2-A, 3-A. Em seguida, escreva um comentário,
destacando os possíveis efeitos de sentido.

 132 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


2. Agora a sua análise deve correlacionar os enunciados 1-A, 2-A, 3-A aos
enunciados das capas da Veja, 1-B, 2-B, 3-B, respectivamente. Quais os
possíveis efeitos de sentido a partir da posição-sujeito e das memórias
discursivas.

dica. utilize o bloco


3. Os enunciados em análise são constitutivamente heterogêneos, quais os de anotações para
discursos que perpassam a materialidade linguística e da imagem? responder as atividades!

Concluindo nossa conversa

Resumo
Nessa unidade, você conheceu as mudanças que ocorreram na ter-
ceira época da Análise do Discurso e a introdução da concepção de
Heterogeneidade Discursiva
Nessas unidades, você conheceu um pouco da história da AD Fran-
cesa, seus conceitos fundadores, principais mudanças conceituais que
ocorrem pelo seu próprio fundador, Michel Pêcheux, e os novos percur-
sos da AD no Brasil.
Mas, ainda há muito que conhecer. Esperamos que os estudos so-
bre Análise do Discurso sejam incentivo para buscar sempre um (O)
outro e que você seja tomado pela inquietação do analista do discurso
e sempre se pergunte “por que foi dito desta forma e não de outra?”.
Que os caminhos e as bifurcações discursivas sejam o incentivo
para essa viagem não terminar nesse ponto.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  133


Leituras Recomendadas
GREGOLIN, Maria do Rosário (org.). Discurso e mídia: a cultura do espetáculo.
São Carlos-SP: Claraluz, 2003. (coleção olhares oblíquos).

Os artigos que compõem o livro trazem


uma discussão muito interessante sobre a
espetacularização da/na mídia na socie-
dade contemporânea a partir da teoria da
Análise do Discurso. Eles refletem as atuais
tendências do campo de estudo e dos ar-
quivos, objetos de pesquisa.

MALDIDIER, Denise. A inquietação do discurso: (re)ler Michel Pêcheux hoje.


Campinas: Pontes, 2003. PP. 9-54.

Livro muito interessante e referencial – tanto


para os iniciantes quanto para os veteranos
em pesquisas em AD - sobre todo o perío-
do da construção da Análise do Discurso e
sobre as três épocas em que Pêcheux em-
preende as revisões no construto teórico de
sua teoria. Nesse momento, recomenda-
mos a leitura do capítulo que diz respeito à terceira época da AD.

GREGOLIN, Maria do Rosário (org.). Foucault e Pêcheux na Análise do Discurso:


diálogos e duelos. São Carlos-SP: Claraluz, 2004.

A autora, nessa obra, apresenta um quadro


histórico da Análise do Discurso, tomando
como base os diálogos e duelos entre Mi-
chel Pêcheux e Michel Foucault, destacando
dentre outras as concepções de sujeito, sen-
tido e história.

 134 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Autoavaliação

Tendo apresentado nas quatro últimas unidades a fundação e as três épocas da


Análise do Discurso, é momento de você observar como está o seu processo de
aprendizagem. Levando isso em consideração, com a orientação de seu tutor e/
ou professor, selecione três textos, de qualquer gênero textual, que circularam
(ou estão estejam em circulação) em qualquer veículo midiático. Analise do
arquivo escolhido a partir dos princípios teóricos da AD da terceira época. Em
seguida, escreva um texto, apresentando os resultados da sua análise.

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  135


Referências
CARDOSO, S. H. B. Discurso e Ensino. 2ª ed., São Paulo: Autêntica/
FALE-UFMG, 2005.

FERREIRA, Maria Cristina Leandro. Análise do Discurso no Brasil:


notas à sua história. In: FERNANDES, Claudemar Alves e SANTOS,
João Bôsco Cabral (Orgs). Percursos da análise do discurso no Brasil.
São Carlos: claraluz, 2007.

FERREIRA, Maria Cristina Leandro. “O quadro atual da análise de


discurso no Brasil – um breve preâmbulo”. In: INDURSKY, Freda;
FERREIRA, Maria Cristina Leandro (org.). Michel Pêcheux & Análise do
Discurso: uma relação de nunca acabar. 2 ed. São Carlos-SP: Claraluz,
2007.

FERREIRA, Maria Cristina Leandro (coord.); Glossário de termos do


discurso; a posição do leitor – autor. Porto Alegre; UFRGS, 2011.

FERNANDES, Cleudemar Alves. Análise do Discurso: reflexões


introdutórias. 2 ed. São Carlos, Claraluz, 2008.

GREGOLIN, Maria do Rosário. Foucault e Pêcheux na construção da


Análise de Discurso: diálogos e duelos. São Carlos: ClaraLuz, 2004.

___. Formação discursiva, redes de memória e trajetos sociais de


sentido: Mídia e produção de identidades. In: Análise de Discurso:
apontamentos para uma história da noção-conceito de formação discursiva.
São Carlos: Pedro & João Editores, 2007.

INDURSKY, Freda; FERREIRA, Maria Cristina Leandro (org.). Michel


Pêcheux & Análise do Discurso: uma relação de nunca acabar. 2 ed. São
Carlos-SP: Claraluz, 2007.

LEITE, Maria Regina Baracuhy. Análise do Discurso e Mídia: nas


trilhas da identidade nordestina. VEREDAS ON LINE – ANÁLISE DO
DISCURSO – 2/2010, p. 167-177 – PPG LINGUÍSTICA/UFJF – JUIZ DE
FORA.

_____. Entrevendo oásis e silêncios no discurso da propaganda


turística oficial sobre o Nordeste. In: GREGOLIN, Maria do Rosário
Valencise. et al. (org.). Análise do discurso: entornos do sentido.
Araraquara: UNESP, FCL, Laboratório Editorial; São Paulo: Cultura
Acadêmica, 2001.

____. As três épocas da análise do discurso (AD) francesa (mimeo).

 136 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


MALDIDIER, Denise. A inquietação do discurso: (re)ler Michel Pêcheux
hoje. Campinas: Pontes, 2003.

MUSSALIM, Fernanda. 2001. Análise do Discurso. In: MUSSALIM, F.;


BENTES, A. C. (orgs.). Introdução à Linguística: domínios e fronteiras, v. 2.
São Paulo: Cortez.

NASCIMENTO, Maria Eliza Freitas do. Sentido, Memória e Identidade do


Discurso Poético de Patativa do Assaré. Recife: Bagaço, 2010.

ORLANDI, Eni. Análise de discurso: princípios e procedimentos. 6. ed.


Campinas: Pontes, 2005.

_____. Interpretação: autoria, leitura e efeitos do trabalho simbólico. 2 ed.


Petrópolis: Vozes, 1998.

PÊCHEUX, Michel. O discurso: estrutura ou acontecimento. Tradução Eni


Puccinelli Orlandi. 5 ed. Campinas – SP: Pontes, 2008.

PÊCHEUX, Michel. Análise Automática do Discurso (AAD 69). In:


GADET, Francoise & HAK, Tony. Por uma Análise Automática do Discurso:
uma introdução à obra de Michel Pêcheux. Campinas – SP: EDUNICAMP,
p. 61-162.

PÊCHEUX, Michel et al. Apresentação da Análise Automática


do Discurso. In: GADET, Francoise & HAK, Tony. Por uma Análise
Automática do Discurso: uma introdução à obra de Michel Pêcheux.
Campinas – SP: EDUNICAMP, p. 253-282.

PÊCHEUX, Michel. A Análise de Discurso: três épocas. In: GADET, F.;


HAK, T. (orgs.). Por uma análise automática do discurso: uma introdução
à obra de Michel Pêcheux. Trad. Bethânia S. Mariani et al. Campinas:
Editora da UNICAMP, 1993. pp. 311-318.

SOUZA, Adriana Rodrigues Pereira de; SILVA FILHO, Genival Antonio


da. A construção da imagem feminina na campanha eleitoral de Dilma
Rousseff: uma análise discursiva. (no prelo)

SOUZA, Adriana Rodrigues Pereira de. A Negação em Textos


Publicitários: uma abordagem discursiva. UFAL, 2001. Dissertação de
Mestrado.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  137


 138 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
VIII UNIDADE

Chegando à praia da
Linguística Aplicada

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  139


Apresentação

Nesta aula nos aprofundaremos mais verticalmente na


Linguística Aplicada, mostrando, entre outras coisas, o per-
curso pelo qual passou até conseguir não ser mais entendi-
da apenas como uma extensão da Linguística.
A partir das leituras realizadas, conseguiremos entender
que, enquanto área possível de investigação independente,
há possibilidades de pesquisa em Linguística Aplicada, bem
como é possível utilizá-la em sala de aula.
Convido você a viajar junto comigo pelas ondas da Lin-
guística Aplicada, a qual nãos se limita aos estudos da lin-
guagem, mas ultrapassa as zonas fronteiriças de diferentes
disciplinas. Boa viagem!

 140 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Objetivos

Ao final desta aula, esperamos que você seja capaz de:

• Entender que a Linguística Aplicada não é apenas uma exten-


são da Linguística;
• Empregar os postulados da Linguística Aplicada em diferentes
situações de pesquisa ;
• Identificar possibilidades de utilização da Linguística Aplicada
em sala de aula.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  141


Ambientando-se na
Linguística Aplicada
Uma área que começa nos anos 1940, com o objetivo de desen-
volver materiais para o ensino de línguas durante a Segunda Guerra
Mundial, vai ter uma Associação Internacional (a AILA) constituída em
1964, quando ocorre o primeiro evento internacional de Linguística
Aplicada (LA). Essa área se inicia, então, como resultado dos avanços
da Linguística como ciência no século XX.
Como você pode inferir, até bem recentemente, a LA era entendida
como um apêndice da linguística e isso foi certamente prejudicial ao
desenvolvimento dela como uma área independente de investigação.
Esse equívoco ajudou a gerar um preconceito contra a LA, já que es-
camoteava a sua natureza de pesquisa e a sua contribuição para o
entendimento do uso da linguagem. Parece, portanto, que uma das
tarefas mais importantes dela no Brasil é divulgar a sua natureza como
área de investigação.
Essa visão só vai começar a mudar com o trabalho de Widdowson,
no final dos anos 70, em que aparece a distinção entre LA e a aplica-
ção de Linguística. Segundo ele,

É uma suposição comum entre professores de lín-


guas [como resultado das percepções de linguis-
tas, preferiria acrescentar] que sua área deva ser
de algum modo definida por referência a modelos
de descrição linguística criados por linguistas. [...]
Essa mesma suposição domina a linguística apli-
cada. O próprio nome é uma proclamação de de-
pendência. Bem, não tenho nada contra linguistas.
Alguns dos meus melhores amigos são linguistas
etc. Mas acho que devemos ter cuidado com sua
influência. [...] E quero sugerir que a própria lin-
guística aplicada como ramo teórico da pedago-
gia do ensino de línguas deva procurar um modelo
que sirva seu propósito. (1979, p. 235 apud MOI-
TA LOPES, 2009, p.

Aqui você percebe duas características das propostas de Widdow-


son: uma restrição da LA a contextos educacionais e a necessidade de
uma teoria linguística para a LA que não a mantenha dependente.
Inicialmente entendida como restrita a operar somente durante in-
vestigação em contexto de ensino-aprendizagem de línguas estrangei-
ras, mais adiante os estudos de LA começam a privilegiar e pesquisar
contextos de ensino e aprendizagem de língua materna, no campo dos
letramentos, de outras disciplinas do currículo e em outros contextos

 142 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


institucionais. Sendo assim, ao começar se espraiar para outros con-
textos, aumenta consideravelmente seus tópicos de investigação, assim
como o apelo de natureza interdisciplinar para teorizá-los.
Contudo, no final do século XX e no início do século XXI, as mudan-
ças tecnológicas, culturais, econômicas e históricas vivenciadas inicia-
ram um processo de ebulição nas Ciências Sociais e nas Humanida-
des, mudanças essas que começaram a chegar à LA. Diante disso, as
Ciências Sociais colocavam à modernidade indagações sobre o sujeito
social, e as implicações da redescrição do sujeito social foram cruciais
para que emergisse a teoria sobre Linguística Aplicada Indisciplinar.
De acordo com Moita Lopes (2009. p. 19), a Linguística Aplicada
Indisciplinar, antidisciplinar, trangressiva, ou da desaprendizagem

É uma LA que deseja, sobremodo, falar ao mundo


em que vivemos, no qual muitas das questões que
nos interessavam mudaram de natureza ou se com-
plexaram ou deixaram de existir. Como Ciência So-
cial, conforme muitos formularam a LA agora, em
um mundo em que a linguagem passou a ser um
elemento crucial, tendo em vista a hiperssemioti-
zação que experimentamos, é essencial pensar em
outras formas de conhecimento e outras questões
de pesquisa que sejam responsivas às práticas so-
ciais em que vivemos.

A ler esta definição, você consegue entender que ela é indisciplinar


porque reconhece a necessidade de não se constituir como disciplina,
bem como por ousar pensar de forma diferente, para além dos para-
digmas consagrados; ou seja, tem como objeto de pesquisa o estudo
das práticas específicas de uso da linguagem em contextos também
específicos, levando em consideração as condições de produção, a
intencionalidade discursiva e a interação entre os participantes.

Atividade I
A Linguística Aplicada é entendida como uma área de investigação aplicada,
mediadora, interdisciplinar, centrada na resolução de problemas de uso da
linguagem, que tem foco na linguagem de natureza processual, que colabora
com o avanço do conhecimento teórico e que utiliza métodos de investigação
de base positivista e interpretativista.
dica. utilize o bloco
Com base nessa afirmação, observe a notícia que segue e as atividades a ele de anotações para
correspondente: responder as atividades!

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  143


O mito dos queimadores de gordura

Este é um as-
pecto onde os
suplementos ain-
da não conse-
Fonte: http://3. guiram os tão
bp.blogspot.com/-lH1- perseguidos
qX9zjno/TwszCD2Cl9I/
AAAAAAAAAoY/
efeitos “queima-
MXa7EYwQ8Gw/s1600/ -gorduras”. No
pilates+1.jpg
mercado pode-
-se encontrar
desde os clássicos e inofensivos L-Carnitina e Fat Burners, até ver-
dadeiras bombas queima-gorduras à base de excitantes que têm
o inconveniente de afetar o sistema nervoso.
Há que deixar claro que nenhum destes suplementos constitui
por si só um queima-gorduras, são apenas intermediários meta-
bólicos que intervêm no processo da oxidação dos ácidos gordos
sobretudo quando fazemos exercício.
A L-Carnitina tem a função de introduzir os ácidos gordos no
interior da mitocôndria celular para a sua oxidação, mas se não
fazemos exercício o ácido gordo não se transportará pelo sangue.
Os excitantes como a cafeína, efedrina, teína, etc. têm a pro-
priedade de aumentar a secreção de adrenalina (ainda que tenha
o efeito não desejado de alterar o sistema nervoso) que por sua
vez degrada os adipócitos, os ácidos gordos entram na corrente
sanguínea, mas chegados a este ponto se não necessitamos de
energia voltam a armazenar-se em forma de gordura. Ou seja, se
não nos exercitarmos não é necessária a degradação do ácido
gordo na célula e perde-se o efeito queima-gorduras.
No entanto, funcionam muito bem a queimar gordura quando
acompanhados da prática de exercício, pois realmente o melhor
“queima-gorduras” é o próprio exercício físico.

Fonte: http://www.sportlife.com.pt/index.php/slmulher/item/349-o-mito-dos-queimadores-de-gordura,
acesso em 27 de junho de 2011.

I–
a) Relacione o texto lido ao suporte do qual foi extraído.

b) O texto interessa a você. Que argumentos que justificam essa afirmação?

c) Agora, imagine-se um leitor que não se agradou do texto. Levante


argumentos que justifiquem seu desagrado.

d) Você recomendaria o texto para alguém? Por quê?

 144 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


II –
a) Uma notícia que trata desse tipo de informação atrai que tipo de leitores?

b) Qual a função que um texto desse assume fora da escola?

c) Escreva um e-mail exigindo um pronunciamento dos responsáveis pela


divulgação do produto.

III –
a) Qual a função das informações dos parênteses?

b) Que sentido assume a expressão “queima-gorduras” em função do uso


das aspas?

IV –
a) Qual a ideia central do texto?

b) Os argumentos presentes no texto ajudam você a não procurar o remédio


caso necessite? Justifique.

V-
a) Retire todas as palavras do texto relacionadas à fat burners.

b) As palavras “nenhum” e “que” são termos anafóricos que fazem


referência a que?

Atividade II
Ainda sobre o texto apresentado na Atividade I, relacione os itens destacados
nela (I, II, III, IV e V) aos grupos citados. Em seguida, justifique a associação
feita.

ITEM _______: Abordagem de questões inferenciais e prática que envolve


estratégias de compreensão com base em pressupostos não só linguísticos
como pragmáticos. Promove a formação de leitores críticos e autônomos em
relação a práticas letradas.

ITEM ______: Explicação de objetivos de leitura com base em estratégias


cognitivas e metacognitivas. Utilização como uma prática motivadora para
a formação de leitores proficientes e críticos. Estratégias que direcionam a
leitura como uma atividade dinâmica, recursiva e não-linear.

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  145


ITEM _____ : Abordagem que visa à explicitação de mecanismos internos do
texto como contribuição para compreender o funcionamento discursivo da
língua. Atividades cujos procedimentos priorizam o sistema linguístico na
informação de base textual.

ITEM _____ : Reflexão sobre gênero textual, que dá forma e função comunicativa
à materialização dos textos. A existência de atividades dessa natureza justifica
a leitura e produção (de textos orais e escritos) aplicadas ao ensino.

ITEM _____ : Análise de aspectos discursivos do texto. As marcas linguísticas


estão presentes como uma possibilidade diversa de leitura que extrapola o
próprio texto, incluindo-se uma investigação das condições de produção bem
como a intencionalidade discursiva do autor do texto.

Desbravando a LA
Segundo Moita Lopes (1996, p. 29 - 20), a melhor maneira de
identificar a LA, no sentido de estabelecê-la como área de investigação,
é através do desenvolvimento de pesquisa. Desta forma, há cinco pos-
7
É preciso frisar que nem todos aqueles que
se dedicam à pesquisa em LA, com base sibilidades de pesquisa em LA7. Veja quais são:
nesse paradigma, necessariamente percor-
rem este caminho no seu todo.

I – Pesquisa de natureza aplicada em Ciências Sociais

Este tipo de pesquisa centra-se primordialmente na resolução de


problemas de uso da linguagem tanto no contexto da escola quanto
fora dele. Veja o que diz Moita Lopes (1996, p. 20) sobre esse assunto:

A LA é uma ciência social, já que seu foco é em


problemas de uso da linguagem enfrentados pelos
participantes do discurso no contexto social, isto é,
usuários da linguagem (leitores, escritores, falan-
tes, ouvinte) dentro do meio ensino-aprendizagem
e fora dele (por exemplo, em empresas, consultório
médico etc. )

II – Pesquisa que focaliza a linguagem do ponto de vista processual

Coloca-se o foco na linguagem da perspectiva do uso/usuário no


processo da interação linguística escrita e oral.

III – Pesquisa de natureza interdisciplinar e mediadora

 146 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Visa à mediação entre o conhecimento teórico advindo de várias
disciplinas (por exemplo psicologia, educação, liguística etc.)8 e o
problema de uso da linguagem que pretende investigar. Mais uma vez,
entenda como Moita Lopes (1996, p. 21) explica-nos este tipo de pes-
quisa: 8
Cabe aqui ressaltar os postulados de Moi-
ta Lopes (2009) quando afirma que a ques-
tão da interdisciplinaridade, que se tornou
O corpo de conhecimento teórico utilizado pelo quase um dos truísmos epistemológicos
contemporâneos, já era apontada na LA nos
linguista aplicado vai depender das condições de anos 80.
relevância determinadas pelo problema a ser es-
tudado; portanto, isso implica o fato de que seja
possível que os subsídios teóricos para a explici-
tação de uma determinada questão possam vir de
disciplinas outras que a linguística, mesmo quando
esta é entendida em um sentido macro.

IV – Pesquisa que envolve formulação teórica

Além de operar com conhecimento teórico advindo de várias disci-


plinas, a LA também formula seus próprios modelos teóricos, podendo
colaborar com o avanço do conhecimento não somente dentro do seu
campo de ação como também em outras áreas de pesquisa.

V – Pesquisa que utiliza métodos de investigação de base positivista


e interpretativista

Você já deve está tirando suas próprias conclusões sobre em que


consiste essa base positivista e interpretativista. Veja: o foco da pesqui-
sa positivista está na análise do produto final do usuário, ou seja, na
análise da produção escrita e oral e no desempenho em compreensão
escrita e oral; essa tendência caracteriza a maior parte da pesquisa
produzida em LA.
Todavia, nota-se um interesse cada vez maior nos estudos de base
interpretativista, o qual possui duas tendências de pesquisa, a etnográ-
fica e a introspectiva.

Em resumo, a LA é entendida aqui como uma área


de investigação aplicada, mediadora, interdiscipli-
nar, centrada na resolução de problemas de uso
da linguagem, que tem foco na linguagem de na-
tureza processual, que colabora com o avanço do
conhecimento teórico, e que utiliza métodos de in-
vestigação de natureza positivista e interpretativista.
(MOITA LOPES, 1996, p. 22, 23)

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  147


Atividade III
Observe a proposta de produção9:

9
Esta proposta e a redação apresentada
posteriormente encontram-se em Evangelis-
ta (1998, p. 126).

Agora veja uma redação, produzida por um aluno do 6º ano (antiga 5ª série),
sobre esse tema:

Redação escolar
Eu passei muitas dificuldades para chegar na 5ª série eu vivia chorando porque não dava conta das tarefas.
Eu adorei o que o estado para nós e as tificuldades que eu tive eu fui resolvendo como muita atenção as profes-
soras poderiam ter tirado as contas os problemas.

 148 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Atividade IV
Analise a produção textual desse aluno com base na perspectiva positivista e,
em seguida, seguindo os postulados de natureza interpretativista.

Consta na Matriz de Competência do ENEM 2011 (Exame Nacional do Ensino Médio)


que um aluno do ensino médio precisa construir e aplicar conceitos das várias áreas
do conhecimento para a compreensão de fenômenos naturais, de processos histórico-
geográficos, da produção tecnológica e das manifestações artísticas.

Tomando como base essa competência exigida pelo ENEM, bem como a
característica da interdisciplinaridade presente na LA, analise as duas
questões desse concurso de vestibular e discorra sobre:

•Onde é possível encontrar a conversa entre as áreas do conhecimento;

•Em que sentido essa interdisciplinaridade favorece na formação de um


indivíduo crítico;

•Quais são os conhecimentos linguísticos necessários para a interpretação


das questões?

QUESTÃO 01: (ENEM 2001)


“... Um operário desenrola o arame, o outro o endireita, um terceiro cor-
ta, um quarto o afia nas pontas para a colocação da cabeça do alfinete; para
fazer a cabeça do alfinete requerem-se3 ou 4 operações diferentes; ...”

Fonte: SMITH, Adam. A Riqueza das Nações. Investigação sobre a sua Natureza e suas
Causas. Vol. I. São Paulo: Nova Cultural, 1985. Jornal do Brasil, 19 de fevereiro de1997.

A respeito do texto e do quadrinho são feitas as seguintes afirmações:

I. Ambos retratam a intensa divisão do trabalho, à qual são submetidos


os operários.
II. O texto refere-se à produção informatizada e o quadrinho, à produ-
ção artesanal.
Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  149
III. Ambos contêm a ideia de que o produto da atividade industrial não
depende do conhecimento de todo o processo por parte do operário.

Dentre essas afirmações, apenas


a) I está correta.
b) II está correta.
c) III está correta.
d) I e II estão corretas.
e) I e III estão corretas.

QUESTÃO 02: (ENEM 2010)

Disponível em: http://www.pinturasemtela.com.br/wp-content/uploads/2011/04/o-


viajante-sobre-o-mar-de-nevoa-1818.jpg. Acessado em 28/01/2012.

As diferentes esferas sociais de uso da língua obrigam o falante a adap-


tá-la às variadas situações de comunicação. Uma das marcas linguísti-
cas que configuram a linguagem oral informal usada entre avó e neto
neste texto é
a) a opção pelo emprego da forma verbal “era” em lugar de “foi”.
b) a ausência de artigo antes da palavra “árvore”.
c) o emprego da redução “tá” em lugar da forma verbal “está”.
d) o uso da contração “desse” em lugar da expressão “de esse”.
e) a utilização do pronome “que” em início de frase exclamativa.
 150 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
A LA em terras conhecidas
Entendido sobre o que versa a LA, chegou o momento de se per-
guntar onde, especificamente, centram-se os seus estudos. Enquanto
em alguns países há muita pesquisa em LA, especialmente no âmbito
das teorias de ensino-aquisição de línguas, nos 33 países da América
Latina há relativamente poucos programas, localizados em praticamen-
te quatro países como centros consolidados ou em consolidação de
pesquisa em LA, que são México, Colômbia, Chile e Brasil.
Hoje, são muitos os programas de pós-graduação no país nos
quais ocorrem esforços de pesquisa aplicada no âmbito das ciências
da linguagem. Outra frente de fazer LA brasileira está localizada nas
iniciativas de inclusão da disciplina Linguística Aplicada nos programas
de graduação em Letras, dentro da qual se introduzem conceitos, re-
sultados da investigação de natureza aplicada e iniciação nesse tipo de
pesquisa.
Uma pesquisa apresentada por Menezes, Silva e Gomes (2009, p.
41) aponta que, entre os 691 artigos pesquisados em versões on line
de periódicos (com exceção da revista Trabalhos em Linguística Apli-
cada que só existe no formato impresso), os brasileiros atêm-se mais
aos temas Análise do Discurso, Metodologia de Ensino de Línguas Es-
trangeiras e Formação de Professores e Aquisição de Segunda Língua;
acompanhe a tabela abaixo:

Temas RBLA Especialist L&E TLA Delta Total


1. Aprendizagem
de Línguas por 0
Adultos
2. Linguagem in-
1 1
fantil
3. Comunicação
2 2
nas Profissões
4. Análise Con-
trastiva e Análise 2 2 1 5
de Erro
5. Análise de Dis-
17 37 26 41 26 121
curso
6. Tecnologia Edu-
cacional e Apren- 10 8 5 7 30
dizagem de Língua
7. Metodologia de
Ensino de Línguas
Estrangeiras e For- 21 36 20 23 100
mação de Profes-
sores
8. Linguística Fo-
1 1
rense

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  151


Temas RBLA Especialist L&E TLA Delta Total

9. Educação em
0
Imersão
10. Tradução e In-
16 4 1 12 12 45
terpretação
11. Linguagem e
0
Ecologia
12. Linguagem
e Educação em
1 1 1 3
Contextos de Mul-
tilingualismo
13. Linguagem e
1 8 1 13 3 26
Gênero
14. Linguagem e
0
Mídia
15. Línguas em
Contacto e Mu- 0
dança Linguística
16. Linguagem
para Fins Especí- 2 2
ficos
17. Planejamento
2 2
Linguístico
18. Autonomia do
Aprendiz e Apren- 2 4 1 7
dizagem da Língua
19. Lexicografia 2 1 2 1 1 7
20. Letramento 3 1 8 10 6 28
21. Educação em
1 7 6 3 17
Língua Materna
22. Psicolinguística 1 1 2
23. Retórica e Esti-
1 1
lística
24. Aquisição de
20 19 10 26 10 75
Segunda Língua
25. Língua dos Si-
1 1 2
nais
Não Classificados 13 8 16 10 121 168
Total de Artigos 110 127 105 154 195 691

 152 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Atividade V
Escolha uma das piadas e elabore uma atividade (três questões, no máximo)
baseada nos pressupostos da LA:

1 - De início, Eva não queria comer a maçã.

- Coma! – ordenou a serpente -. Você. será como os anjos.


- Não! Respondeu Eva.
- Saberá tudo sobre a ciência do bem e do mal – insistiu a serpente.
- Não!
_ Você será como Deus em todos os aspectos.
- Não.

A serpente estava desesperada e não sabia o que fazer para que Eva comesse
a maçã. Finalmente teve uma ideia. Ofereceu-lhe a fruta mais uma vez e disse:
- Coma! Juro que não engorda!
E o resto todos já conhecem.
(Teresa G. Velázquez, México)

2 – Um homem vai á delegacia e diz ao delegado:

- Vim fazer uma queixa: minha sogra sumiu.


- Há quanto tempo? – pergunta o delegado.
-Duas semanas – responde o genro.
- E só agora você noticia à policia? Os desaparecimentos devem ser comunicados
em 48 horas.
- É que que custei a acreditar que eu tivesse tanta sorte!
(Silvana D. Neves, Rio de Janeiro)

Atividade VI
dica. utilize o bloco
Disserte sobre a elaboração das questões para a atividade anterior. Quais de anotações para
foram os aspectos da LA que você privilegiou? Por quê? responder as atividades!

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  153


Fim da viagem
Ufa! Esperamos que você tenha gostado de fazer esse passeio
conosco. Depois de tantas leituras e atividades, é possível entender
que a LA tem buscado cada vez mais a referência de uma língua real,
ou seja, de uma língua falada por falantes reais em suas práticas reais
e específicas, numa tentativa justamente de seguir essas redes, de não
arrancar o objeto da tessitura de suas raízes.
Portanto, como área de investigação, A LA tem se configurado tam-
bém, e cada vez mais, como uma espécie de interface que avança por
zonas fronteiriças de diferentes disciplinas, não somente na área dos
estudos da linguagem, como também na da Psicologia, da Sociologia,
da Antropologia, da Pedagogia, da Psicanálise, entre outras.

 154 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Leituras recomendadas
PEREIRA, Regina Celi, ROCA, Pilar (Orgs.). Linguística Aplicada: um caminho
com diferentes acessos. São Paulo: Contexto, 2009.

Este livro cumpre dois principais objetivos:


ajudar a formar profissionais desde os pri-
meiros estágios acadêmicos, e levar aos
alunos a compreensão de que a Linguística
deve se afastar do dogmatismo teórico e ser estudada, sobretudo, com
base em trabalhos de investigação. Obra indicada para alunos dos
cursos de Letras e Linguística e também para professores e estudiosos
das ciências humanas.

KOCH, Ingedore Grunfeld Villaça. Linguística Aplicada ao Português: sintaxe.


São Paulo: Cortez, 2004.

Dando sequência à série de obras de cunho


didático, inicia-se com Linguística Aplicada
ao Português. Neste livro, a descrição das
estruturas sintáticas de português, proce-
dendo à operacionalização para o ensino
dos conceitos da teoria linguística, espe-
cialmente da gramática transformacional.
KOCH, Ingedore Grunfeld Villaça. Linguística Aplicada ao Português:
morfologia. São Paulo: Cortez, 2003.

O objetivo básico deste trabalho é o de


proceder à operacionalização para o en-
sino das descrições teóricas sobre morfo-
logia, especialmente aquelas propostas na
obra clássica de Mattoso Câmara Jr.

KLEIMAN, Angela B., CAVALCANTI, Marilda C. Linguística aplicada: suas faces


e interfaces. Campinas: Mercado das Letras, 2007.

O livro traz uma amostra representativa


dos múltiplos e diversificados interesses de
pesquisa na Linguística Aplicada; nele são
mostrados os trabalhos com os quais os pro-
fessores do departamento têm enriquecido o
diálogo científico nacional e internacional,
em uma área com relações multidisciplinares e que abriga a diversidade

Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  155


Resumo

Inicialmente entendida como um apêndice da Linguística, a LA nas-


ceu como uma disciplina voltada para os estudos sobre o ensino de
língua estrangeira e hoje se configura como uma área imensamente
produtiva, responsável pela emergência de uma série de novos campos
de investigação transdisciplinar, de novas formas de pesquisa e de no-
vos olhares sobre o que é ciência. Diante do reconhecimento da impor-
tância da LA, hoje há no país muitos programas de pós-graduação que
focalizam seus estudos nessa área, além do grande interesse em incluir
a disciplina LA nos cursos de graduação.

Autoavaliação
Com base na leitura e discussões realizadas, organize um texto explicativo
sobre a disciplina Linguística Aplicada. Não esqueça de contemplar o objeto,
áreas de investigação, percurso metodológico.

dica. utilize o bloco


de anotações para
responder as atividades!

 156 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III


Referências
CELANI, M.A.A. Afinal, o que é Linguística Aplicada?’. In: PASCHOAL,
M. S. Z. de e M.A.A.CELANI (Orgs.) Linguística Aplicada: da aplicação
da linguística à linguística transdisciplinar. São Paulo: Educ, 1992.

EVANGELISTA, Aracy Alves Martins, CARVALHO, Gilcinei Teodoro


et all. Professor-leitor aluno-autor: reflexões sobre avaliação do texto
escolar. Minas Gerais: Intermédio, 1998.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra,


1970.

KLEIMAN, Angela B., CAVALCANTI, Marilda C. Linguística aplicada:


suas faces e interfaces. Campinas: Mercado das Letras, 2007.

KOCH, Ingedore Grunfeld Villaça. Linguística Aplicada ao Português:


sintaxe. São Paulo: Cortez, 2004.

________. Linguística Aplicada ao Português: morfologia. São Paulo:


Cortez, 2003.

MENEZES, Vera, SILVA, Marina Morena, GOMES, Iran Felipe.


Sessenta anos de linguística aplicada. In. PEREIRA, Regina Celi,
ROCA, Pilar (Orgs.). Linguística Aplicada: um caminho com diferentes
acessos. São Paulo: Contexto, 2009, pp. 25 – 50.

MOITA LOPES, Luiz Paulo. Da aplicação de linguística à linguística


aplicada indisciplinar. In. PEREIRA, Regina Celi, ROCA, Pilar (Orgs.).
Linguística Aplicada: um caminho com diferentes acessos. São Paulo:
Contexto, 2009, pp. 11 – 24.

_________________. Oficina de linguística aplicada: a natureza social


... ensino/ aprendizagem de línguas. Campinas, Mercado das Letras,
1996.

_________________. Por uma linguística aplicada indisciplinar. São


Paulo: Parábola, 2006.

RAJAGOPALAN, Kanavillil. Por uma linguística crítica: linguagem,


identidade e a questão ética. São Paulo: Parábola Editorial, 2003.

__________________. Repensar o Papel da Linguística Aplicada.


In: MOITA LOPES, Luiz Paulo (org.). Por uma Linguística Aplicada
Indisciplinar. São Paulo: Parábola, 2006.

SIGNORINI, Inês, CAVALCANTI, Marilda C. (Orgs.). Linguística


aplicada e transdisciplinaridade: questões e perspectivas. Campinas,
Mercado das Letras, 1998.
Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  157
 158 SEAD/UEPB I Teorias Linguisticas III
Teorias LinguisticasIII I SEAD/UEPB  159

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