Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
DUQUE
Jariane Ribeiro
Sinopse
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Epílogo
Copyright © Jariane Ribeiro, 2020
Estava entediada.
Terrivelmente entediada.
Catalogou mentalmente cada móvel do quarto e quantos
vestidos ainda faltavam para chegar de Londres e completar seu
guarda-roupa.
Fazia apenas um dia desde que acabou se distraindo e
torcendo o tornozelo, apesar da dor latejante em alguns momentos,
não conseguia evitar os suspiros que deixavam claro seu tédio.
Sally arrumou seu cabelo com mais esmero em uma tentativa
de distrair a patroa, mas Lucy deitou e logo alguns cachos
escaparam do elaborado coque.
Tentou ler o livro que Patience, a governanta com um nome
terrivelmente inoportuno, trouxe, mas era tão entediante e com uma
protagonista tão sem graça que Lucy desistiu depois de poucas
páginas.
Nicholas apareceu em algum momento após o almoço e lhe
lançou uma piscadela desejando melhoras. Uma piscadela! Isso fez
com que ela corasse e se repreendesse por corar por qualquer
gesto mínimo do marido, mas pelo menos durante uma hora se
sentiu tola e não entediada.
Agora estava mais uma vez olhando o teto, vendo os últimos
raios de sol sumirem e darem lugar à noite fria, mesmo que
estivessem na primavera.
Cansada de não fazer nada, Lucy olhou para a cadeira ao lado
da cama e viu uma bengala que Sally deixou mais cedo,
aconselhando que a chamasse para ser melhor auxiliada, caso
decidisse se levantar.
Sem vontade alguma de chamar a sorridente criada, Lucy se
levantou e pegou a bengala, se firmando e testando dar alguns
passos. Apesar de dolorido, não era impossível.
Foi então que olhou para a escrivaninha e pensou em escrever
para a família, contar como estava indo seu segundo dia de casada,
mas ainda se sentia tão magoada com o irmão e apesar de querer
muito escrever para a mãe, não achava que tinha algo de realmente
útil para contar. Annie era uma boa ideia, mas isso apenas a faria
sentir ainda mais falta da amiga.
Lembrou-se das palavras de Nicholas desejando que ela fosse
feliz e mordeu o lábio, decidindo não ficar nostálgica por algo que
sequer estava ao seu alcance e lembrando-se da biblioteca que
disseram que havia na casa.
Lucy precisava de um bom livro, com a dose perfeita de
romance e aventura que a faria esquecer o tédio, só esperava
encontrar romances porque nada a motivaria mais do que uma linda
história de amor. Lembrou-se de Grace Hunter, a famosa e
misteriosa escritora que escandalizava a sociedade com seus
romances picantes e protagonistas audaciosas que desafiavam as
convenções sociais. Era de um livro dela que necessitava.
Decidida, se firmou melhor e caminhou mancando enquanto
tentava se acostumar com a bengala. Saiu do quarto e seguiu pelo
corredor que levava à escada em que se machucou no dia anterior.
Desta vez, procurou não se distrair com os retratos e prestou
atenção no lugar em que pisava, encarou o dilema de como
desceria as escadas assim que chegou em frente a elas.
Talvez se trocasse a bengala pelo corrimão, conseguisse se
firmar até chegar à ampla sala, ou então poderia descer sentada,
mas isso seria o cúmulo da deselegância...
— Vejo que saiu do quarto.
Ela olhou para trás assim que ouviu a voz dele, surpresa por já
estar familiarizada o suficiente para reconhecer o timbre da voz de
Nicholas.
— Estou à procura da biblioteca — ela explicou, posicionando
melhor a bengala para se apoiar.
— Deveria ter me chamado. Eu disse que a ajudaria.
— Não queria importuná-lo com algo tão simples.
Nicholas sorriu e mesmo com a luz do final do dia e algumas
velas de cera de abelha sendo acesas por empregados que os
olhavam com curiosidade, ela conseguiu perceber os brilhantes
olhos verdes do duque e seus lábios carnudos e rosados. Lucy
nunca reparara na boca de um homem antes, mas a dele com
certeza era linda. Será que eram macios e...
— Lucy?
Ela sacudiu a cabeça, sentindo o rosto queimar e tentou se
concentrar nas palavras dele, mas não sabia sobre o que estavam
falando, ou melhor, sobre o que ele estava falando.
Nicholas deu de ombros e se aproximou dela, a erguendo nos
braços e fazendo com que derrubasse a bengala, dando um gritinho
tipicamente feminino que o fez rir.
— Os criados! — Lucy sibilou, tentando ajeitar a barra do
vestido, não querendo mostrar os tornozelos.
Nicholas apenas sorriu, aquele mesmo sorriso libertino que
havia feito Mary Hopkins desmaiar de modo nada delicado no baile
dos Smiths.
— Não se importe com a opinião dos outros, milady — Nicholas
disse em um tom divertido. — Você é a dona desta casa agora.
Lucy acabou rindo, apertando os braços ao redor do pescoço
dele, sentindo o cheiro do sabão que estava em sua pele quente.
Constatar isso fez com que uma onda de calor passasse por seu
corpo e de repente não era mais uma noite fria, e sim quente, muito
quente.
Nicholas chutou a porta da biblioteca, que bateu na parede com
um estrondo e fez com que Lucy arregalasse os olhos, mas tudo o
que seu marido fez foi rir e continuar a conduzi-la até uma
confortável poltrona, onde a depositou com cuidado.
— Apresento-lhe a biblioteca — o duque disse e, com um floreio
exagerado, abriu os braços e mostrou as inúmeras prateleiras
carregadas de livros, até mesmo uma escada que levava ao
segundo andar com mais livros.
Lucy sorriu, o tipo de sorriso verdadeiro que deu aos seus olhos
azuis um encantador tom de violeta que fez com que Nicholas
ficasse sem fôlego, admirando os cabelos dourados da esposa
caindo de forma displicente ao redor do rosto e o modo como ela
ficava linda sorrindo.
Ele sacudiu a cabeça com a constatação, ainda incapaz de
desviar os olhos dela.
— Tem livros de romance? — A voz dela soou baixa, até mesmo
tímida.
Nicholas coçou a nuca, não sabendo exatamente se tinha
romances ali, pois ele não era de ler livros daquele gênero, apenas
os de agricultura para afastar a insônia.
— Irei procurá-los — ele respondeu e então olhou para a mesa,
se lembrando de algo que havia encomendado um dia antes de
partirem de Londres. — Mas primeiro isto.
Lucy olhou para ele com curiosidade e Nicholas sorriu ao ir até
a mesa e pegar o embrulho simples e pardo amarrado com um
barbante grosso. Ele o entregou à esposa, sentando-se no
banquinho, que mal comportava seu peso, na frente dela e
esperando para ver que reação teria.
Lucy olhou para ele e então, com delicadeza, soltou o barbante,
fazendo o embrulho pardo cair em seu colo e revelar um livro com
capa de couro e o nome dela gravado em dourado, como se fosse
um dos inúmeros exemplares que preenchiam a biblioteca.
Curiosa, ela o abriu e percebeu as páginas amareladas
formadas por papel de excelente qualidade, mas sem nada escrito.
Olhou para Nicholas e ele sorriu, fazendo com que o coração dela
errasse uma batida.
— É um presente — ele disse de uma forma gentil, até mesmo
tímida. — Para que você escreva sua própria história. Lembro-me
de quando me contou que queria viver tranquila para escrever seu
livro.
Lucy abriu a boca, tocando o presente com as pontas dos
dedos, mas não encontrou as palavras corretas para agradecê-lo,
completamente surpresa por Nicholas se lembrar do que ela lhe
disse há tantas semanas.
— Eu... — ela balbuciou e então pigarreou. — Muito obrigada,
Nick. É a coisa mais gentil que já fizeram por mim.
— Espero que seja o incentivo certo para que comece a
escrever.
— Não acha que seria escandaloso uma duquesa escrever uma
história de amor?
Ele olhou para ela e lentamente sorriu.
— Só seria escandaloso se eu não pudesse ler antes.
Isso fez com que ela sorrisse, um sorriso sincero e do fundo do
coração. Há quanto tempo ela não sorria assim?
— Não se preocupe com convenções sociais — Nicholas falou,
tocando em seu joelho. — Apenas escreva o que seu coração
mandar.
— Eu ainda não sei sobre o que escrever.
— Um dia saberá e, por agora, saiba que eu a apoio
completamente.
E, com um tapinha gentil em seu joelho, ele levantou e começou
a procurar pelos tais livros de romance, passando a empilhá-los em
seus braços e resmungar algo sobre histórias sentimentais que
provocou uma crise de risos em Lucy.
Por fim, quando já tinha cerca de dez livros embaixo do braço,
Nicholas voltou até ela, mostrando os títulos que encontrou. Tomou
um susto quando a esposa deu um gritinho feliz e bateu palmas.
— O primeiro livro de Grace Hunter — ela explicou a ele, as
bochechas coradas de animação. — Sempre quis lê-lo, mas não o
encontrei em nenhuma livraria.
Grace Hunter? Ele já ouviu aquele nome... ah, claro. A escritora
misteriosa e que escrevia histórias terrivelmente impróprias e
adoradas pelas damas da sociedade, em segredo, é claro, porque
nenhuma dama bem-nascida admitiria que lia as cenas picantes e
inadequadas da senhorita Hunter.
— Quer dizer que gosta desse tipo de história? — ele
questionou quando ela pegou o livro de suas mãos como se fosse
um tesouro. — Terrivelmente impróprias e com cenas picantes?
Nicholas percebeu o instante em que ela registrou suas
palavras, as bochechas adquirindo um tom rubro que ia além do que
ele já a tinha feito corar.
— São... são boas histórias.
— Acho que terei de lê-las para descobrir o que anda passando
pela cabecinha da minha esposa.
Lucy registrou o tom brincalhão dele e sorriu, balançando a
cabeça em sinal afirmativo.
— Irei adorar ter com quem conversar sobre isso. — Então ela
abaixou o tom de voz, se aproximando dele. — Mamãe achava
terrivelmente impróprio que eu lesse esse tipo de livro. Acho que
pensa que o escândalo do nosso casamento é culpa deles.
— Por Deus, então terei mesmo que os ler — Nicholas disse de
forma conspiratória.
Lucy gargalhou e quando ele percebeu, estava sentado ao lado
dela, na segunda poltrona mais confortável da biblioteca, e lendo um
dos livros da senhorita Hunter, coisa que jamais imaginou que faria.
Para enorme surpresa de ambos, devoraram as palavras de
Grace Hunter, no mundo sensual que ela levava ao leitor, mas
também confortáveis um com o outro, conversando ocasionalmente
sobre o que estavam lendo e rindo quando algo era muito fora da
realidade dos salões londrinos que abrigavam a alta sociedade.
Foi em meio aos sorrisos que ele percebeu que gostava da
esposa e que ela não era sequer parecida com a moça sem graça
que descreviam e terrivelmente quieta e enfadonha como o irmão
havia ressaltado. Lucy-Anne desabrochava ao se sentir confortável
com alguém e Nicholas concluiu, surpreso, que ela sentia isso ao
lado dele.
Capítulo 14
Querida Lucy-Anne,
Estive aqui para esclarecer um pequeno mal-entendido, mas a
encontrei dormindo e não quis, de forma alguma, atrapalhar seu
descanso.
Sei que poderia dizer-lhe tais palavras, mas creio que ficará
mais confortável se as ler.
Não menti em nossa conversa no jardim mais cedo. Realmente
a acho linda, mas acredito que ressaltar sua beleza não irá apagar
os anos em que a insultaram e não perceberam a linda mulher que
é.
Eu mesmo nunca notei e espero que perdoe este tolo com
quem se casou e saiba que não há um único dia em que não
percebo a enorme sorte que tive ao conseguir o seu sim.
Nunca desejei o casamento, apenas sabia que teria de
encontrar uma esposa, mas estas semanas com você me fizeram
entender que estar casado com uma mulher inteligente, bem-
humorada e linda era o que eu precisava e não sabia.
Se ainda não a procurei para consumarmos o casamento era
porque estava esperando que se sentisse confortável. Nunca quis
impor minha presença a você, pois sei que já sofreu demais e por
agora merece a felicidade de uma vida tranquila e sem a
preocupação de se ver obrigada a estar com alguém que ainda não
conhece.
Estou descobrindo coisas sobre você que me encantam e me
fazem enxergar que você é como uma flor que floresce diante da
gentileza. Serei gentil e paciente com você, querida Lucy.
Poderá falar sobre qualquer coisa comigo e eu a ouvirei e se
não tiver coragem, receberei todas as cartas que me escrever e
escreverei outras centenas, caso seja necessário.
Espero-a para o jantar.
Com adoração,
Seu Nicholas.
Fim