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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

INSTITUTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS


FACULDADE DE DIREITO

TEMA: FORMAS DE PAGAMENTO INDIRETO

BELÉM – 2021
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
INSTITUTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS
FACULDADE DE DIREITO

TEMA: FORMAS DE PAGAMENTO INDIRETO

PROFESSOR:
DENIS LEITE RODRIGUES

GRADUANDOS:
ANDRE VIANA DA SILVA (202006140081)
MARCELO DOS SANTOS PEREIRA (201906140177)
MARCOS EDURADO POMPEU AMARO (202006140072)
MATEUS GARCIA DA CRUZ (201706140162)
SAMUEL MOURA DIAS ( 202006140201)

Monografia apresentada como


requisito parcial para avaliação
e obtenção de conceito da
disciplina Teoria Geral das
Obrigações (Direito Civil II) sob
orientação do Prof. Denis Leite
Rodrigues.
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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO
1. CONCEITO DE PAGAMENTO
1.1. ESPÉCIES
1.1.1. Direto
1.1.2. Indireto
1.1.3. Algumas formas de pagamento indireto
2. PAGAMENTO EM CONSIGNAÇÃO
2.1. POSICIONAMENTO JURISPRUDENCIAL NO PAGAMENTO EM
CONSIGNAÇÃO: A APLICAÇÃO NA PRÁTICA SOCIAL DESSE INSTITUTO
JURÍDICO...................................................................................................................17

3. SUB-ROGAÇÃO
3.1. CONCEPÇÃO
3.2. PREVISÃO LEGAL
3.3. EXEMPLOS DE APLICAÇÃO NA PRÁTICA SOCIAL
3.4. POSSÍVEIS JURISPRUDÊNCIAS
4. COMPENSAÇÃO
4.1. CONCEPÇÃO
4.2. PREVISÃO LEGAL
4.3. EXEMPLOS DE APLICAÇÕES NA PRÁTICA SOCIAL
4.4. POSSÍVEIS JURISPRUDÊNCIAS
5. REMISSÃO
5.1. CONCEPÇÃO
5.2. PREVISÃO LEGAL
5.3. EXEMPLOS DE APLICAÇÃO NA PRÁTICA SOCIAL
CONCLUSÃO
BIBLIOGRAFIAS
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INTRODUÇÃO

As relações jurídicas obrigacionais compreendem basicamente a existência


de uma prestação do devedor para com credor, garantindo ao último o direito de
exigir do devedor o fiel cumprimento da coisa devida, ou melhor, seu adimplemento.
E a extinção dessa obrigação que vincula devedor e credor é extinta através do seu
pagamento.

Assim, um contrato é celebrado visando que o devedor satisfaça o


cumprimento da obrigação nos termos em que fora acordado, o que significa dizer
que, conforme leciona Carlos Roberto Gonçalves (2018), o que se espera é a
extinção da obrigação através do pagamento voluntário do devedor, satisfazendo o
interesse do credor, já que esse fora o acordado.

Contudo, diversas situações supervenientes podem resultar na


impossibilidade da realização do pagamento nos exatos termos em que foi
acordado. Assim, o ordenamento jurídico brasileiro disciplina outras possibilidades
que asseguram o adimplemento da obrigação, através de uma das formas do
pagamento indireto.

Assim, ao longo deste trabalho, discorreremos sobre o tema “formas de


pagamento indireto”, enfatizando a concepção de Pagamento em consignação,
Sub-rogação, Compensação e Remissão, bem como fazendo um apanhado da
previsão legal dessas formas de pagamento indireto, visualizando exemplos de
aplicação na prática social e jurisprudências sobre a problemática.

Este trabalho monográfico pretende compreender o conceito e características


do pagamento indireto, identificando como o cumprimento de uma obrigação pode
ser realizado de forma diversa da acordada.

Assim, no primeiro capítulo desta monografia realizamos uma primeira


aproximação através de uma reflexão sobre o conceito de pagamento e suas
espécies, trazendo a definição de pagamento direto e pagamento indireto. Após,
abordamos algumas formas de pagamento indireto, dividindo-o em quatro capítulos
nesta ordem: Pagamento em consignação, Sub-rogação, Compensação e
Remissão.
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Ao tratar do pagamento em consignação, realizamos uma análise da doutrina


sobre a concepção desse instituto, fazendo ligação com a previsão legal. Utilizamos
como fundamentação teórica obra de autores como Carlos Roberto Gonçalves e
Maria Helena Diniz. Por critério didático, criamos um tópico específico do capítulo
pagamento em consignação para abordar o posicionamento jurisprudencial sobre o
tema e assim visualizar a aplicação na prática social desse instituto jurídico.

Em seguida, discorremos sobre a sub-rogação através de quatro


subcapítulos. No primeiro abordamos a concepção através de uma análise do que a
doutrina discorre cobre esse instituto. Em seguida, trazemos a previsão legal,
exemplos da aplicação na prática social e jurisprudência sobre matéria, cada uma
em um subcapítulo distinto.

Após, analisamos a forma de pagamento indireto compensação através de


uma reflexão do entendimento da doutrina, consultando obras de civilistas como
Tartuce (2019). Assim, o capítulo encontra-se dividido em quatro subcapítulos, nesta
ordem: concepção, previsão legal, exemplos da aplicação na prática social e
possíveis jurisprudências.

Em seguida, damos enfoque à remissão, dividindo o em três subcapítulos:


concepção. Previsão legal e exemplos de aplicação na prática social. Para tanto,
consultamos obras de autores como Pereira (2010).

Por fim, trazemos as conclusões da pesquisa, apresentando, dentre outros


entendimentos, que o pagamento, quando analisado por diferentes ângulos, pode
ser efetuado tanto por aquele que paga em dinheiro ou que realiza uma determinada
atividade, quanto por aquele que não realiza uma determinada tarefa. Além disso, o
devedor tem não apenas o dever de pagar, mas o direito de pagar e se ver livre da
obrigação.
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1 CONCEITO DE PAGAMENTO

É possível conceituar pagamento, em linhas gerais, como o cumprimento de


uma prestação a qual um sujeito estava comprometido a fazer; nesse sentido, “[…] o
termo pagamento, diferentemente do que a linguagem comum nos sugere, não
significa apenas a entrega de um pagamento em dinheiro […]” (FILHO, GAGLIANO,
2018, p.188). Portanto, ainda sob essa perspectiva, “extraímos que o pagamento
vincula-se a satisfação da obrigação criada, abrangendo não apenas o ato de
repassar dinheiro, mas também de quitação de relações obrigacionais.” (CRUZ,
2014). Dessa forma, “[…] paga não apenas aquele que entrega a quantia em
dinheiro (obrigação de dar), mas também o indivíduo que realiza uma atividade
(obrigação de fazer) ou, simplesmente, se abstém de um determinado
comportamento (obrigação de não fazer).” (FILHO, GAGLIANO,2018, p.188). É
nessa linha de raciocínio que Gonçalves (2020, p.388) enfatiza que “paga a
obrigação o escultor que entrega a estátua que lhe havia sido encomendada, bem
como o pintor que realiza o trabalho solicitado pelo cliente.”

É interessante observar que “O Código Civil dá o nome de pagamento à


realização voluntária da prestação debitória, tanto quando procede do devedor como
quando provém de terceiro, interessado ou não na relação obrigacional […]”
(GONÇALVES, 2020, p.388). Assim, “[…]temos que pagamento é uma maneira de
adimplemento, um modo de se extinguir um vínculo obrigacional, efetuado pelo
próprio devedor ou por terceiro interessado […]” (CRUZ,2014). Cabe pontuar,
também, que o pagamento pode ser realizado tanto de forma direta quanto de forma
indireta.

De acordo com Gonçalves (2020, p.389): “São aplicáveis ao cumprimento das


obrigações dois princípios: o da boa-fé ou diligência normal e o da pontualidade.”
Dessa forma, “segundo o autor [Gonçalves] o princípio da boa-fé vai além de uma
simples relação contratual, prevenindo assim as partes a agirem de forma correta no
trâmite da relação contratual toda.”(RODRIGUES, 2016). Ao passo que “o princípio
da pontualidade exige não só que a realização seja cumprida em tempo, no
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momento aprazado, mas de forma integral, no lugar e modo devidos.”


(GONÇALVES, 2020, p.389).

Quanto à natureza jurídica do pagamento, a doutrina diverge, principalmente


pelo pagamento poder se dar de diversas formas. Para a doutrina majoritária, tendo
dentre os representantes Caio Mário, o pagamento pode se dar como negócio
jurídico, podendo ser bilateral ou unilateral, ou ato jurídico stricto senso. Dessa
forma, é possível traçar cinco elementos principais para que o pagamento produza
seus efeitos: a existência do vínculo gerado pela obrigação; a intenção de solvê-la; o
cumprimento da prestação; o sujeito que efetua o pagamento (chamado solvente);
por fim, a pessoa que recebe o pagamento (acipiente).

1.1. ESPÉCIES

Há duas espécies de pagamento: a direta e a indireta. O primeiro é quando a


obrigação se extingue pelos meios normais, enquanto o segundo se extingue por
meios em que não há o pagamento (anormais), a exemplo da prescrição da
obrigação ou a compensação. Nesse sentido, “o pagamento é o principal modo de
extinção das obrigações e pode ser direto é indireto.” (GONÇALVES, 2020, p.390).

1.1.1. Direto

Segundo Cruz (2014), “o pagamento direto é aquele em que se aplica o


efetivo cumprimento da obrigação, realizando-se a satisfação do débito ao qual se
submeteu o devedor, e consequente extinção da dívida, aplicando-se a liberação do
vínculo obrigacional.” Portanto, o pagamento direto é aquele que se dá quando a
prestação exigida do sujeito licitamente vinculado à realização é fielmente cumprida
no que tange ao seu montante, sua forma e seu prazo. Em verdade, é isso que se
espera que ocorra em qualquer relação jurídica-obrigacional: ou seja, que o devedor
realize aquilo que ele se comprometeu a realizar.

Conforme o Código Civil, em seu artigo 304, qualquer interessado no fim da


dívida pode pagá-la, usando, se o credor se opuser, dos meios conducentes à
exoneração do devedor. Para efeitos legais o interessado é quem tem interesse
jurídico de extinguir a dívida, sendo o principal deles o devedor, mas além destes os
outros interessados como fiadores e sublocatários podem efetuar o pagamento,
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havendo a sub-rogação do credor para efeitos de cobrança contra o devedor e seus


fiadores.

Além disso, cabe mencionar, brevemente, o artigo 307 do código civil. Nele, o
“pagamento através de transferência da propriedade exige que o devedor seja dono
da coisa, sob pena de ineficácia.” (SCHREIBER et al., 2021, p. 590). Dessa forma,
em outras palavras, o único titular de direito das coisas que pode alienar aquilo que
tem em mãos é o proprietário, pois o único sujeito que tem o poder de usar, gozar e
de dispor de um determinado bem é o proprietário. Portanto, quanto à obrigação de
dar, somente essa obrigação será devidamente cumprida quando a pessoa que se
comprometeu a transferir o bem é proprietária e, assim, pode alienar o bem;
somente assim estará havendo o pagamento direto e válido por parte do devedor.
Em suma, “não se pode transferir um direito (de propriedade) que não se tem.”
(SCHREIBER et al., 2021, p.590).

Ainda sob essa perspectiva, é importante, de igual maneira, comentar


brevemente o artigo 304. Basicamente, a lei diz que “o devedor é o sujeito passivo
da obrigação (de quem a prestação é exigida) e sujeito ativo do pagamento, pois é
ele que o realiza.”(SCHREIBER et al., 2021, p. 586).

1.1.2. Indireto

De acordo com Cruz (2014), “pagamento indireto ou especial é um meio de


extinção de obrigação onde a satisfação do credor e liberação do devedor não se
efetivam em decorrência da realização da prestação, […]” Essa definição inicial é
importante, dado que deixa claro sua distinção em relação à forma de pagamento
direto. No entanto, “é importante ressaltar que no pagamento indireto nem sempre
há a plena satisfação de obrigação, muito embora se obtenha a liberação do
devedor, […]”(CRUZ,2014).

Em outras palavras, o pagamento indireto ocorre quando, embora não


realizada a prestação originalmente definida, a dívida contraída é satisfeita mediante
a concretização de outro ato lícito. Assim, embora não tenha se concretizado a
prestação originalmente definida, mas, por meio de outro ato qualquer(lícito) essa
mesma prestação é satisfeita, diz-se que houve pagamento indireto.
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1.1.3. Algumas formas de pagamento indireto

De acordo com Filho e Gagliano (2018, p.215), “[...] ao lado do pagamento


propriamente dito, existem formas especiais de extinção das obrigações, […]” É
nesse sentido que se pode citar, como algumas formas de pagamento indireto, a
“consignação em pagamento”, “pagamento com sub-rogação”, “imputação do
pagamento”, “dação em pagamento”, “novação”, “compensação”, “transação”,
“compromisso (arbitragem)”, “confusão” e “remissão”. Neste capítulo estudaremos
as formas de pagamento indireto denominadas Pagamento em consignação, Sub-
rogação, Compensação e Remissão, analisando seus conceitos, previsão legal,
visualizando aplicações na prática social e posicionamentos jurisprudenciais sobre a
matéria.

Essas quatro formas de pagamento indireto encontram-se divididas em quatro


subcapítulos para melhor explanar as ideias e discussões peculiares a cada um
desses institutos jurídicos.
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2. PAGAMENTO EM CONSIGNAÇÃO

O pagamento em consignação, conforme o termo sugere, consiste no


pagamento realizado pelo devedor mediante depósito judicial ou em
estabelecimento bancário da coisa devida (Art. 334, CC/02), que extingue a
obrigação. Para Maria Helena Diniz (2010, p. 147), a concepção de consignação
envolve matéria de “Direito Civil e Direito Processual Civil. a) Modo indireto de o
devedor exonerar-se de sua obrigação, depositando a coisa devida em juízo ou em
estabelecimento bancário; b) depósito judicial ou extrajudicial de valores ou coisas”.

De modo geral, a doutrina civilista firmou o entendimento de que o pagamento


em consignação se trata de uma forma de extinção da obrigação, adimplindo-a por
meio de um deposito em juízo ou em estabelecimento bancário quando houver litígio
sobre o objeto de pagamento, ou quando o credor não puder ou se recusar a
receber sem justa causa a prestação devida, ou se o credor não receber a coisa
nem pedir para que terceiro a receba nas condições acordadas ou ainda, quando o
credor for incapaz de receber, for desconhecido, declarado ausente ou resida em
lugar incerto etc., conforme ensinam GUIMARAES (2010) e GONÇALVES (2018).
Assim, essas são algumas das hipóteses – as mais comuns – nas quais o
pagamento em consignação pode ser utilizado para o adimplemento da obrigação e,
consequentemente, para a extinção do vínculo entre devedor e credor.

Somando-se às argumentações já colacionadas, o dicionário jurídico de


Deocleciano Torrieri Guimarães (2010, p. 220-221) traz a seguinte concepção sobre
a matéria em exame:

CONSIGNAR – [...] fazer depósito judicial de soma ou coisa devida a outro,


que não a quer ou não a pode receber.
CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO – pagamento que se faz mediante
depósito em juízo. Dá-se quando o credor, sem justa causa, recusa receber
o pagamento ou dar quitação dele; se ele não for nem mandar receber no
lugar, tempo e condições devidas; se o credor for desconhecido, estiver
declarado ausente (se houver declaração de ausência, o curador receberá
pelo credor); se residir em lugar incerto ou de acesso perigoso ou difícil; se
ocorrer dúvida sobre quem deva receber o objeto do pagamento; se sobre
esse pender litígio; se houver concurso de preferência aberto contra o
credor ou se este for incapaz de receber o pagamento. Se houver falência
ou insolvência, pode-se fazer a consignação no juízo da falência ou da
insolvência, sem caráter contencioso.
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Portanto, um ponto relevante que se conclui sobre o pagamento em


consignação é que se trata de um instituto jurídico à disposição do devedor, para
que, nas hipóteses em que não haja cooperação do credor em receber o pagamento
da coisa devida ou diante de outras situações determinadas, possa o devedor ser
liberado do vínculo obrigacional pela realização voluntária da prestação devida
através de um depósito.

Esse conceito também é acompanhado por Pablo Stolze GAGLIANO e


Rodolfo PAMPLONA FILHO (2010, p. 171) que se manifestam da seguinte forma:

Trata-se a consignação em pagamento, portanto, do instituto jurídico


colocado à disposição do devedor para que, ante o obstáculo ao
recebimento criado pelo credor ou quaisquer outras circunstâncias
impeditivas do pagamento, exerça, por depósito da coisa devida, o direito de
adimplir a prestação, liberando-se do liame obrigacional.

Nesse sentido, o pagamento em consignação é um instrumento que permite


assegurar ao devedor efetuar o adimplemento da obrigação assumida, para que
este não se sujeite aos efeitos de potenciais prejuízos ou penalidades atreladas ao
descumprimento do contrato, pois “não se realizando o pagamento pela falta de
cooperação e anuência do credor, o devedor não se exonera da obrigação (...)”
(GONÇALVES, 2018, p. 291).

Portanto, o simples fato de o credor se recusar a receber a prestação, não


exime o devedor dos efeitos do contrato, como por exemplo entrar em mora, estar
sujeito incidência de juros sobre o valor devido ou ter o nome inscrito em cadastros
de devedores. Isso porque o devedor está submetido ao credor por uma prestação,
um vínculo jurídico obrigacional, cuja extinção requer a satisfação do pactuado.

Dessa maneira, resta mais do que evidente a necessidade e importância da


existência de um instituto jurídico que assegure ao devedor a realização voluntária
da prestação devida. Além disso, tal como o devedor tem o direito de receber a
prestação, o pagamento também é um direito para o devedor (GONÇALVES, 2018).

Corroborando com essa reflexão, merece realce o ensinamento de Adroaldo


Furtado Fabrício que sinaliza que:

Também o devedor é titular de direitos. E não somente o direito de apenas


pagar nos limites do devido e não antes do vencimento. O devedor é
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juridicamente interessado na própria exoneração, porque a permanência do


débito é uma situação constrangedora e potencialmente danosa. Não se
trata só da extimatio pessoal e social, nem apenas do renome de bom
pagador com vistas à contração de débitos futuros; nem apenas da
insegurança da incômoda incerteza quanto ao momento em que será
exigido o pagamento: há obrigações que se tornam mais onerosas com o só
passar do tempo, outras envolvem determinados riscos e encargos para o
devedor desde o vencimento até o adimplemento. O Direito não poderia
deixar de proteger esse interesse do devedor na própria liberação, de modo
que não há impropriedade em falar-se de um direito subjetivo à liberação.
Daí os remédios postos à sua disposição para emprego nos casos em que o
modo normal de exonerar-se o devedor é impossibilitado ou dificultado além
dos limites do razoável por variados motivos: o pagamento é substituído por
sucedâneos a ele equiparáveis em eficácia jurídica (FABRICIO, 1988, p. 34-
35).

Portanto, o devedor enquanto “(...) sujeito passivo da obrigação tem não


apenas o dever de pagar, mas também o direito de pagar” (GONÇALVES, 2018, p.
291), para que possa se liberar do vínculo a que se encontra submetido, se
prevenindo de situações potencialmente danosas.

Feitas essas considerações, é necessário assinalar onde encontramos a


previsão legal desse instituto na legislação brasileira. Pois bem, o pagamento em
consignação está previsto nos artigos 334 a 345 do Código Civil e em outras leis,
como o Código Tributário Nacional. Já a regulação da ação de pagamento em
consignação, encontra-se disciplinada nos artigos 539 a 549 do Código de Processo
Civil, pois “nos casos previstos em lei, poderá o devedor ou terceiro requerer, com
efeito de pagamento, a consignação da quantia ou da coisa devida” (art. 539, caput,
CPC/2015).

Primeiramente, é importante destacar que, em sintonia com argumentações já


colacionadas sobre a existência da consignação em pagamento ensinadas pela
doutrina, o Código Civil enumera as hipóteses nas quais é possível se recorrer a
esse instituto para o adimplemento da obrigação. Vejamos o que diz o Código:

Art. 335. A consignação tem lugar:


I - se o credor não puder, ou, sem justa causa, recusar receber o
pagamento, ou dar quitação na devida forma;
II - se o credor não for, nem mandar receber a coisa no lugar, tempo e
condição devidos;
III - se o credor for incapaz de receber, for desconhecido, declarado
ausente, ou residir em lugar incerto ou de acesso perigoso ou difícil;
IV - se ocorrer dúvida sobre quem deva legitimamente receber o objeto do
pagamento;
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V - se pender litígio sobre o objeto do pagamento.

Não obstante, confirme já sinalizado neste trabalho, não é apenas no Código


Civil que há previsão do pagamento em consignação. Outras legislações também
definem hipóteses nas quais o devedor pode consignar sua prestação, a exemplo do
que prevê o artigo 164 do Código Tributário Nacional (CTN), Lei Nº 5.172/96:

Art. 164. A importância de crédito tributário pode ser consignada


judicialmente pelo sujeito passivo, nos casos:
I - de recusa de recebimento, ou subordinação deste ao pagamento de outro
tributo ou de penalidade, ou ao cumprimento de obrigação acessória;
II - de subordinação do recebimento ao cumprimento de exigências
administrativas sem fundamento legal;
III - de exigência, por mais de uma pessoa jurídica de direito público, de
tributo idêntico sobre um mesmo fato gerador.
§ 1º A consignação só pode versar sobre o crédito que o consignante se
propõe pagar.
§ 2º Julgada procedente a consignação, o pagamento se reputa efetuado e
a importância consignada é convertida em renda; julgada improcedente a
consignação no todo ou em parte, cobra-se o crédito acrescido de juros de
mora, sem prejuízo das penalidades cabíveis.

Portanto, além de elencar as hipóteses nas quais o devedor pode ajuizar ação
de pagamento em consignação em matéria tributária, o parágrafo segundo do artigo
164 do CTN traz os efeitos do julgamento pela procedência ou não da consignação.
Assim, a legislação tributarista prevê que no caso de improcedência total ou parcial,
será cobrado do devedor o valor devido acrescido de juros de mora, sem prejuízo
das penalidades cabíveis.

Outra previsão do cabimento do pagamento em consignação está na Lei que


regula o penhor rural e a cédula pignoratícia, Lei Nº 492/37:

Art. 19. É a cédula rural pignoratícia a resgatável a qualquer tempo, desde


que se efetue o pagamento de sua importância, mais os juros devidos até
ao dia da liquidação; e em caso de recusa por parte do endossatário
constante do registro, pode o devedor fazer a consignação judicial da
importância total da dívida capital e juros até ao dia do depósito, citado
aquele e notificado o oficial do registo imobiliário competente para o
cancelamento da transcrição e anotação no verso da folha do talão
arquivando a respectiva contra fé, de que constará o teor do termo de
depósito.
Parágrafo único. A consignação judicial libera os bens ou animais
empenhados, subrogando-se o vínculo real pignoratício quantia depositada.
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Desse modo, o que constamos em comum na previsão desses dispositivos


legais é a possibilidade jurídica de pagamento em consignação, basicamente, diante
da falta de cooperação do credor ou existência de dúvida sobre quem deva receber
o pagamento: no caso de recusa por parte do “endossatário constante do registro”
(Lei Nº 942/37); de recusa de “recebimento, ou subordinação deste ao pagamento
de outro tributo ou de penalidade, ou ao cumprimento de obrigação acessória”
(CTN); se o credor “não puder, ou, sem justa causa, recusar receber o pagamento,
ou dar quitação” (CC/02); de “exigência, por mais de uma pessoa jurídica de direito
público, de tributo idêntico sobre um mesmo fato gerador” (CTN) ou; se ocorrer
“dúvida sobre quem deva legitimamente receber o objeto do pagamento” (CC/02).

Portanto, a essência da consignação em pagamento está em garantir ao


devedor a satisfação voluntária da prestação diante de obstáculos alheios a sua
vontade. Não obstante, é importante destacar que não é em face de qualquer
obstáculo que o devedor poderá requerer a consignação em pagamento, mas nos
casos previstos em lei, conforme disciplina o caput do artigo 539 do CPC/2015.

Nesse diapasão, ressaltamos ainda que além das previsões legais citadas,
também encontramos a previsão do cabimento do pagamento em consignação no
artigo 160 do Código Civil, artigo 17 do Decreto-Lei nº 58/37, artigo 33 da Lei nº
6.766/79 e artigo 67 da Lei nº 8.245/91.

Outrossim, é registramos que não constitui nosso objetivo central elencar


minuciosamente todos os dispositivos legais que definem hipóteses nas quais o
devedor pode utilizar o pagamento em consignação ou examinar detalhadamente os
efeitos processuais do seu acolhimento. Nosso foco busca dar destaque à essência
desse instituto, seu conceito e características, de modo a direcionar o leitor à
compreensão das razões práticas da existência do pagamento em consignação.

2.1. POSICIONAMENTO JURISPRUDENCIAL NO PAGAMENTO EM


CONSIGNAÇÃO: A APLICAÇÃO NA PRÁTICA SOCIAL DESSE INSTITUTO
JURÍDICO.

Após analisarmos a concepção doutrinária e a previsão legal do pagamento


em consignação, torna-se imprescindível, para melhor compreender a aplicação
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desse instituto, verificar sua aplicação na prática social através da visualização do


entendimento da jurisprudência.

Inicialmente, destacamos que a jurisprudência é pacífica no sentido de que a


ação de consignação em pagamento possui natureza declaratória, com o fito de
declarar que o depósito em consignação oferecido libera o devedor da obrigação. O
Superior Tribunal de Justiça (STJ) assim se manifestou:

CIVIL. TRIBUTÁRIO. AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO.


NATUREZA E FINALIDADE. UTILIZAÇÃO PARA OBTER PROVIMENTO
DE CARÁTER CONSTITUTIVO, MODIFICATIVO DO PRAZO DA
OBRIGAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.
1. A falta PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.
PROCESSO de prequestionamento da questão federal impede o
conhecimento do recurso especial.
2. O depósito em consignação é modo de extinção da obrigação, com força
de pagamento, e a correspondente ação consignatória tem por finalidade
ver atendido o direito – material – do devedor de liberar-se da obrigação e
de obter quitação. Trata-se de ação eminentemente declaratória: declara-se
que o depósito oferecido liberou o autor da respectiva obrigação.
3. Sendo a intenção do devedor, no caso concreto, não a de pagar o tributo,
no montante que entende devido, mas sim a de obter moratória, por meio de
parcelamento em 240 meses, é inviável a utilização da via consignatória,
que não se presta à obtenção de provimento constitutivo, modificador de um
dos elementos conformadores da obrigação (prazo).
4. Agravo regimental a que se nega provimento." (AgRg no Ag 811.147/RS,
Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJ 29.3.2007)

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM


PAGAMENTO. PARCELAMENTO DO DÉBITO TRIBUTÁRIO.
IMPOSSIBILIDADE. VIA INADEQUADA. SÚMULA 83/STJ. LITIGÂNCIA DE
MÁ-FÉ. SÚMULA 7/STJ. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. INOVAÇÃO
RECURSAL. ARGUMENTO RECURSAL DISSOCIADO DA DECISÃO
AGRAVADA. SÚMULA 284/STF.
1. A ação consignatória, que é de natureza meramente declaratória, tem por
objetivo apenas liberar o devedor de sua obrigação com a quitação de seu
débito, por meio de depósito judicial, quando o credor injustificadamente se
recusa a fazê-lo.
2. Recolher parceladamente o valor do débito fiscal na seara da ação
consignatória é desviar-se da finalidade por ela pretendida.
3. De acordo com o Min. Luiz Fux, a referida ação não pode ser servil à
obtenção de parcelamento do débito tributário, sob pena de fazer da
legislação, que prevê o referido benefício, letra morta. Súmula 83/STJ. (...)
Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 1.397.419/SC, Rel. Min.
Humberto Martins, DJe 10.2.2014)

Em sintonia com esse raciocínio, Carlos Roberto Gonçalves (2018, p. 303)


esclarece que “(...) se o credor, sem justa causa, recusa-se a receber o pagamento
17

em dinheiro, poderá o devedor optar pelo depósito extrajudicial ou pelo ajuizamento


da ação de consignação em pagamento” e que, considerando que pode ser admitida
não apenas quando se tratar de valor líquido e certo, é uma “(...) ação de natureza
declaratória, podendo ser ajuizada também quando houver dúvida sobre o exato
valor da obrigação”.

Como exemplo da aplicação na prática social, citamos o destacado pelo


ilustre civilista. De acordo com Carlos Roberto Gonçalves (2018), uma situação de
ajuizamento de ação para consignação em pagamento na hipótese da existência de
dúvida sobre o valor da obrigação, é o que ocorre com os contratos do Sistema
Nacional de Habitação: os mutuários realizam a propositura da ação para
pagamento em consignação do valor que consideram devido, objetivando, portanto,
a declaração do valor das prestações devidas.

Mas o que poderá o credor fazer diante de uma ação que objetiva depositar
em juízo o valor da coisa devida? No CPC/2015, diante da citação em ação de
consignação em pagamento, poderá o credor na contestação:

Art. 544. (...) alegar que:


I - não houve recusa ou mora em receber a quantia ou a coisa devida;
II - foi justa a recusa;
III - o depósito não se efetuou no prazo ou no lugar do pagamento;
IV - o depósito não é integral.
Parágrafo único. No caso do inciso IV, a alegação somente será admissível
se o réu indicar o montante que entende devido.

De outra banda, o Supremo Tribunal Federal assentou o entendimento que a


consignação constitui causa extintiva da obrigação e tem, na ação consignatória, o
instrumento processual destinado a viabilizar o deposito judicial da coisa devida. A
respeito da manifestação da Suprema Corte brasileira, temos o acórdão abaixo que
se encontra assim ementado:

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - ISENÇÃO DE CORREÇÃO


MONETÁRIA (ADCT, ART. 47) - PAGAMENTO DO DÉBITO - RECUSA DO
CREDOR - AÇÃO CONSIGNATORIA AJUIZADA NO ÚLTIMO DIA DO
PRAZO, ACOMPANHADA DO VALOR DO DÉBITO REPRESENTADO
POR CHEQUE - EFICACIA LIBERATORIA DA CONSIGNAÇÃO JUDICIAL
EM PAGAMENTO - EXERCÍCIO TEMPESTIVO DO DIREITO
ASSEGURADO PELO PRECEITO CONSTITUCIONAL TRANSITORIO -
AGRAVO IMPROVIDO.
18

A designação judicial de data para a efetivação do deposito, ainda que


recaindo em momento posterior ao limite temporal fixado pela norma inscrita
no art. 47, par. 3., I, do ADCT/88, precisamente por constituir fato imputavel
ao aparelho judiciario do Estado, não pode afetar o reconhecimento do
direito outorgado ao devedor, desde que este, agindo tempestivamente,
tenha ajuizado a ação de consignação em pagamento dentro do prazo
estipulado pelo preceito constitucional transitorio referido. Precedentes. (AI-
AgR 151944 SP, Primeira Turma; Relator: Min. CELSO DE MELLO,
Publicação: 10/02/1995).

Não obstante, recordamos que ao iniciar as exposições sobre a concepção de


pagamento em consignação, enfatizamos, detalhadamente, que se trata de um
instituto jurídico à disposição do devedor, para que, nas hipóteses em que não haja
cooperação do credor em receber o pagamento ou diante de outras situações
determinadas, possa adimplir a obrigação, extinguindo assim o vínculo entre ele e o
credor.

Isso significa que, para haver procedência do pedido da ação de pagamento


em consignação, é necessário que o devedor, o qual ajuíza ação para garantir seu
direito de pagar, efetue o pagamento integral da quantia devida. O STJ firmou
entendimento que a finalidade precípua da ação de pagamento em consignação é
substituir o pagamento, evitando o inadimplemento do devedor e liberando-o da
dívida mediante depósitos em valores suficientes para adimplir a dívida (AgInt no
AREsp 1251155/RJ, Rel. Ministro MARCO BUZZI, Quarta Turma, DJe 28/06/2019).
No REsp 1108058/DF, o STJ apreciou matéria em exame, emitindo o acórdão que
encontra-se assim ementado:

CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE


CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. CONTRATO BANCÁRIO.
IMPROCEDÊNCIA. FINALIDADE DE EXTINÇÃO DA OBRIGAÇÃO.
NECESSIDADE DE DEPÓSITO INTEGRAL DA DÍVIDA E ENCARGOS
RESPECTIVOS. MORA OU RECUSA INJUSTIFICADA DO CREDOR.
DEMONSTRAÇÃO. OBRIGATORIEDADE. EFEITO LIBERATÓRIO
PARCIAL. NÃO CABIMENTO. CÓDIGO CIVIL, ARTS. 334 A 339. CPC DE
1973, ARTS. 890 A 893, 896, 897 E 899. RECURSO REPRESENTATIVO
DE CONTROVÉRSIA. CPC DE 2015.
1. "A consignação em pagamento visa exonerar o devedor de sua
obrigação, mediante o depósito da quantia ou da coisa devida, e só poderá
ter força de pagamento se concorrerem 'em relação às pessoas, ao objeto,
modo e tempo, todos os requisitos sem os quais não é válido o pagamento'
(artigo 336 do NCC)". (Quarta Turma, REsp 1.194.264/PR, Rel. Ministro
Luís Felipe Salomão, unânime, DJe de 4.3.2011).
2. O depósito de quantia insuficiente para a liquidação integral da dívida não
conduz à liberação do devedor, que permanece em mora, ensejando a
improcedência da consignatória.
19

3. Tese para os efeitos dos arts. 927 e 1.036 a 1.041 do CPC: - "Em ação
consignatória, a insuficiência do depósito realizado pelo devedor conduz ao
julgamento de improcedência do pedido, pois o pagamento parcial da dívida
não extingue o vínculo obrigacional".
4. Recurso especial a que se nega provimento, no caso concreto. (REsp
1108058/DF, Rel. Ministro LÁZARO GUIMARÃES (DESEMBARGADOR
CONVOCADO DO TRF 5ª REGIÃO), Rel. p/ Acórdão Ministra MARIA
ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 10/10/2018, DJe
23/10/2018).

Portanto, não basta o simples ajuizamento da ação de pagamento em


consignação, mas é necessário o fiel pagamento da dívida para que haja a extinção
do vínculo obrigacional. Assim, imaginemos uma aplicação na prática social na qual
um indivíduo ajuíza ação de pagamento em consignação, depositado apenas 90%
do valor devido e não atendidas as previsões excepcionais do artigo 545 “caput” e
parágrafo primeiro do CPC. Nesta situação, será julgado improcedente o pedido,
permanecendo o vínculo obrigacional e sujeitando-se o devedor aos juros da dívida
e riscos (art. 337, CC/02).

Em relação à utilização do pagamento em consignação nas situações em que


haja dúvida sobre quem deva receber o pagamento, o STF assentou entendimento,
no Agravo Regimental na Ação Cível Originária 960/PA, que deve ser realizado
deposito judicial até que seja definido o credor. O referido Agravo encontra-se
ementado da seguinte forma:

DEPÓSITOS - AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO.


Pendente o deslinde sobre o titular de valores a serem recolhidos, tem-se
como adequado o depósito à disposição do órgão no qual tramita a ação de
consignação em pagamento (ACO-AgR 960/PA, Tribunal Pleno, Relator:
Min. MARCO AURÉLIO, DJe: 29/08/2008).

Tal entendimento é recepcionado pelo Código de Processo Civil de 2015, nos


artigos 547 e 548:

Art. 547. Se ocorrer dúvida sobre quem deva legitimamente receber o


pagamento, o autor requererá o depósito e a citação dos possíveis titulares
do crédito para provarem o seu direito.
Art. 548. No caso do art. 547 :
I - não comparecendo pretendente algum, converter-se-á o depósito em
arrecadação de coisas vagas;
II - comparecendo apenas um, o juiz decidirá de plano;
III - comparecendo mais de um, o juiz declarará efetuado o depósito e
extinta a obrigação, continuando o processo a correr unicamente entre os
presuntivos credores, observado o procedimento comum.
20

Portanto, essa disposição legal é fundamental para que, em face da


existência de dúvida sobre quem deva receber o pagamento, não fique o devedor
inerte, sujeitando-se a determinados riscos e encargos desde o vencimento até o
adimplemento da obrigação.

Outrossim, quando a coisa devida for imóvel ou corpo certo que deva ser
entregue no mesmo lugar onde está ou, se a escolha da coisa indeterminada
competir ao credor, poderá ser requerida ação de pagamento em consignação? A
resposta a essa indicação está regulada nos artigos 341 e 342 do Código Civil,
respectivamente:

Art. 341. Se a coisa devida for imóvel ou corpo certo que deva ser entregue
no mesmo lugar onde está, poderá o devedor citar o credor para vir ou
mandar recebê-la, sob pena de ser depositada.
Art. 342. Se a escolha da coisa indeterminada competir ao credor, será ele
citado para esse fim, sob cominação de perder o direito e de ser depositada
a coisa que o devedor escolher; feita a escolha pelo devedor, proceder-se-á
como no artigo antecedente.

Portanto, o legislador se preocupou com as hipóteses em que haja ausência


de cooperação do credor em receber o pagamento quando a coisa devida se tratar
de imóvel ou corpo certo a ser entregue no mesmo lugar onde está ou coisa
indeterminada cuja escolha competir ao credor. Assim, o procedimento regulado na
legislação civilista prevê que o devedor poderá citar o credor para que haja a
satisfação da obrigação nas condições acordadas sob pena de perder credor o
direito que lhe assiste. Nesse caso, o não comparecimento do credor permite ser
depositada a coisa.

Logo, não restam dúvidas quanto à necessidade e relevância do pagamento


em consignação enquanto instituto jurídico que assegura ao devedor o direito de
pagar a coisa devida, pois a ausência de cooperação do credor em receber o
pagamento sujeita o devedor aos efeitos da mora e incidência de juros sobre o valor
devido, podendo, inclusive, ter seu nome negativado nos órgãos de proteção de
crédito. Portanto, o pagamento em consignação é uma forma de pagamento indireto
na qual o devedor realiza o adimplemento da obrigação por meio de um depósito
judicial ou em estabelecimento bancário, extinguindo assim o vínculo entre ele e o
credor
21

3. SUB-ROGAÇÃO

3.1 CONCEPÇÃO

Na visão de Filho e Gagliano (2018, p.248), “[…] sub-rogação traduz a ideia


de ‘substituição’ de sujeitos e de objeto, em uma determinada relação jurídica.” É
nessa mesma linha de raciocínio que Gonçalves (2020, p.466) diz que “na
linguagem jurídica fala-se de sub-rogação, em geral, para designar determinadas
situações em que coisa se substitui a outra coisa ou uma pessoa a outra pessoa. Há
um objeto ou um sujeito jurídico que toma o lugar de outro diverso.” Como exemplo,
pode-se citar o caso de sub-rogação do vínculo da inalienabilidade, em que a coisa
gravada pelo testador ou doador é substituída por outra, ficando esta sujeita àquela
restrição, tal como expresso no artigo 1911 do Código Civil de 2002. Mas é
importante destacar que “embora a prestação devida seja normalmente realizada
pelo devedor, pode ocorrer, todavia, o seu cumprimento por terceiro, que tenha
interesse na extinção da obrigação, como sucede, por exemplo, com o fiador.”
(GONÇALVES, 2020, p. 466).

Portanto, “sub-rogação é […] a substituição de uma pessoa, ou de uma coisa,


por outra pessoa, ou outra coisa, em uma relação jurídica. No primeiro caso, a sub-
rogação é pessoal; no segundo, real.” (GONÇALVES, 2020, p. 467). Dessa forma,
“[…] quando o terceiro tem interesse jurídico, este se sub-roga aos direitos do credor
primitivo, devendo exigir do devedor o reembolso posterior, quando adquiri todas as
vantagens e garantias do credor.” (DIAS; SILVA, 2012?).

O termo sub-rogação advém do latim subrogatio, designando a substituição


de uma coisa por outra, com os mesmos ônus e atributos. Para Filho e Gagliano
(2018, p.249), “ao lado da sub-rogação objetiva ou real, temos, ainda, a sub-rogação
subjetiva ou pessoal.” Nestes últimos casos, como o próprio nome indica, a
substituição que se opera é de sujeitos, e não de objeto, na relação jurídica: “tal
ocorre, por exemplo, quando o fiador paga a dívida do afiançado, passando, a partir
daí, a ocupar a posição do credor, substituindo-o.”(FILHO; GAGLIANO, 2018, p.
249). Em suma, se o fiador paga a dívida do devedor principal, junto ao credor, o
fiador poderá, então, exigir o reembolso do que pagou, sub-rogando-se nos direitos
do credor. (FILHO; GAGLIANO,2018).
22

Além disso, é importante discutir um pouco sobre os efeitos jurídicos da sub-


rogação. Assim, pode-se dizer que “o principal efeito da sub-rogação é, exatamente,
transferir ao novo credor ‘todos os direitos, ações, privilégios e garantias do
primitivo, em relação à dívida, contra o devedor principal e seus fiadores. ’” (FILHO;
GAGLIANO, 2018, p.256). Nesse sentido, pode-se dizer que “se o credor principal
dispunha de garantia real (uma hipoteca ou um penhor, por exemplo) ou pessoal
(fiança), ou ambas, o terceiro sub-rogado passará a detê-las, podendo, pois, tomar
todas as medidas judiciais para a proteção de seu crédito, como se fosse o credor
primitivo.” (FILHO; GAGLIANO,2018, p. 256). Mas, “se a sub-rogação for
convencional, as partes poderão convencionar a diminuição de privilégios ou
garantias concedidas ao credor originário.” (FILHO; GAGLIANO,2018, p.256).

É importante lembrar que na “sub-rogação legal, ‘o sub-rogado não poderá


exercer os direitos e as ações do credor, senão até que a soma que tiver
desembolsado para desobrigar o devedor. ’” (FILHO; GAGLIANO,2018, p.256). Por
fim, “cumpre-nos anotar que, se houver concorrência de direitos entre o credor
originário e o credor sub-rogado, ao primeiro assistirá preferência na satisfação do
crédito.” (FILHO; GAGLIANO,2018, p.256).

Portanto, existem quatro espécies de sub-rogação. A “sub-rogação pessoal”


consiste na substituição do credor como titular do crédito, pelo terceiro que cumpre a
prestação no lugar do devedor ou que, em alguns casos, financia o pagamento para
o devedor. A “sub-rogação real” diz que a coisa que toma o lugar da outra fica com o
mesmo ônus e atributos da primeira. A “sub-rogação legal” é a que decorre da lei,
independentemente de declaração do credor ou do devedor. Por fim, a “sub-rogação
convencional” é a que deriva da vontade(expressa) das partes.

3.2. PREVISÃO LEGAL

O pagamento com sub-rogação está previsto nos artigos 346 a 351 do Código
Civil, traduz o cumprimento da obrigação por terceiro, com a consequente
substituição de credores. Isto é, uma dívida é paga por um terceiro que adquire o
crédito e satisfaz o credor. Como dito antes, há uma substituição de pessoas,
porém, não há extinção da dívida e nem liberação do devedor, que passa a dever a
esse terceiro. O pagamento com sub-rogação nunca será gratuito, sempre haverá
23

um pagamento antes da substituição. São espécies de pagamento com sub-rogação


1) pagamento com sub-rogação legal, onde quem determina a substituição é a lei,
independente da vontade das partes. Nesse sentido, o artigo 346 do código civil diz,
basicamente, que “a sub-rogação legal decorre de um fato jurídico previsto em lei e
independe da concordância ou ciência das partes. Basta a ocorrência de
determinado fato jurídico para ela ocorrer. É automática.” (SCHREIBER et al., 2021,
p. 654).

O artigo 347 do código civil trata da sub-rogação convencional. Dessa forma,


“a sub-rogação convencional é negócio jurídico bilateral, pois nasce do acordo de
vontades. Por lei, sub-rogação não ocorreria.” (SCHREIBER et al., 2021, p.654).

O artigo 348 diz que “a sub-rogação convencional por acordo entre o credor e
o terceiro que paga a dívida do devedor se rege pelas regras da cessão de
crédito(arts. 286 a 298 do CC).” (SCHREIBER et al., 2021, p. 655). No entanto, a
sub-rogação não se confunde com a cessão de crédito. Na cessão de crédito ocorre
transferência do crédito existente. O cedente pode receber pelo crédito(cessão
onerosa), mas não recebe o valor devido pelo devedor. Já na sub-rogação o credor
recebe o valor devido, ocorrendo, para ele, a extinção da obrigação. É por isso que a
cessão se encontra no capítulo da transmissão das obrigações(uma única obrigação
tem o polo ativo alterado) e a sub-rogação no capítulo da extinção da obrigação,
pois o credor tem a obrigação extinta.

Mas é somente no artigo 349 que os efeitos da sub-rogação vêm descritos.


(SCHREIBER et al., 2021). Dessa forma, “como o sub-rogado fica na idêntica
posição que ocupava o credor antes de receber o pagamento, os direitos que o sub-
rogado tem são os mesmos que aquele tinha.” (SCHREIBER et al., 2021, p. 656). É
por isso que, se o credor for em um banco que pode cobrar os juros além dos limites
da lei da usura, o sub-rogado, mesmo não sendo o banco, pode cobrar do devedor
os juros convencionados.

Além disso, o artigo 350 trata de “[…] uma regra baseada na vedação ao
enriquecimento sem causa. Ocorrendo sub-rogação legal, há um limite no exercício
dos direitos dela decorrente: o valor que o sub-rogado pagou para exonerar o
devedor.” (SCHREIBER et al., 2021, p. 656). Por fim, o artigo 351 diz,
24

essencialmente, que “se o pagamento ao credor originário for parcial, ele e o sub-
rogado ocupam simultaneamente a posição de credores. Há, portanto, uma
transferência parcial, e não integral dos direitos.” (SCHREIBER et al, 2021, p.658).

3.3. EXEMPLOS DE APLICAÇÃO NA PRÁTICA SOCIAL

Pode-se mencionar como exemplo de sub-rogação o caso do “devedor


solidário”. Nesse sentido, o devedor que paga a dívida de todos os codevedores
cumpre o que lhe cabia em nome desses demais codevedores, portanto sua
obrigação está extinta, mas agora esse devedor solidário passará a ser um novo
credor.

Outro exemplo de sub-rogação é o caso da pessoa casada pelo regime da


comunhão parcial de bens que vende bem particular e com a quantia recebida
compra outro na constância do casamento. O novo bem é sub-rogado, ou seja,
prossegue sendo particular apesar de onerosamente adquirido na constância do
casamento — trata-se, em verdade, aqui, de uma situação de sub-rogação real, que
é quando ocorre uma substituição de uma coisa por outra.

3.4. POSSÍVEIS JURISPRUDÊNCIAS

Pode-se citar, como exemplo de jurisprudência, o seguinte caso sobre a sub-


rogação e a integralidade do ressarcimento:

Ação regressiva de ressarcimento de danos(seguro de transporte


internacional) — transporte aéreo internacional de carga —
Responsabilidade objetiva da ré — Deve entregar a coisa incólume ao seu
destinatário — Inteligência dos arts. 749 e 750 do CC — Avarias das
mercadorias seguradoras durante o transporte aéreo — transporte
cumulativo — Requerida atuou como agente de cargas para operacionalizar
a cadeia de transporte destinado ao traslado da carga assegurada pela
autora — Inteligência do art. 756 do CC — Responsabilidade dos envolvidos
na cadeia de transporte pelos danos causados — Dever de ressarcir
evidenciado — Recurso adesivo da ré negado. Sentença limitou o valor a
ser ressarcido pela ré- Descabimento — os documentos exibidos pela
seguradora autora comprovam a totalidade da carga transportada pela ré,
inexistindo razões para limitação da indenização securitária, por se
evidenciar ter sido indenizado apenas as mercadorias avariadas —
Necessidade de ressarcir a integralidade do valor pago pela autora
seguradora à sua segurada — Recurso da autora provido. Inaplicabilidade
da Convenção de Montreal, anotando que o Recurso Extraordinário nº
636.331/RJ, julgado em 25.5.2017, refere-se a extravio de bagagem em voo
internacional, hipótese diversa da versada nos autos, regulada pelo código
civil — Recurso adesivo da ré negado. Recurso autora provido em parte,
negado da ré. (TJSP; Apelação Cível 1050875-42.2019.8.26.0114; Relator
25

(a): Francisco Giaquinto; Órgão Julgador: 13ª Câmara de Direito Privado;


Foro de Campinas — 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 25/11/2020; data
de Registro: 25/11/2020).

Dessa forma, percebe-se as diferentes dimensões que a sub-rogação pode


ter em diferentes esferas sociais. No caso citado, a sub-rogação relaciona-se com
um caso concreto, haja vista suas especificidades na situação específica em
questão. Nessa mesma perspectiva, também pode-se citar a seguinte
jurisprudência:

Não se fundando em contrato de seguro, mas na sub-rogação de direitos, a


ação regressiva proposta pela seguradora contra o responsável pelos danos
se sujeita à prescrição vintenária, não se aplicando o art.178, § 6º, inc., II,
do Código Civil. Recurso especial não conhecido (REsp n. 83.839/MG, Rel.
Ministro Barros Monteiro, Quarta Turma, DJ de 10.6.1996.)
26

4. COMPENSAÇÃO

4.1. CONCEPÇÃO

A compensação é configurada como um meio indireto de se extinguir uma


obrigação quando ocorre a incidência de obrigações recíprocas em situações em
que as partes são em simultâneo, credoras e devedoras entre si, levando-se em
consideração para a aplicação deste instituto, uma questão de simplicidade e
lógica, visando com isso diminuir a possibilidade de duplo pagamento e a sua base
histórica é calcada no direito romano, o qual admitia a possibilidade de
compensação, pressupondo a utilização do princípio da equidade, em casos em
que houvesse a reciprocidade de obrigações entre as partes, buscando-se, com
isso a satisfação do crédito.

Segundo Tartuce (2019), ocorre a compensação quando duas ou mais


pessoas forem ao mesmo tempo credoras e devedoras umas das outras,
extinguindo-se as obrigações até o ponto em que se encontrarem, onde se
equivalerem (art. 368 do Código Civil/2002) e a compensação é efetuada entre
dívidas líquidas, vencidas e de coisas fungíveis, ou seja, as dívidas devem ser
certas quanto à existência e determinadas quanto ao valor (líquidas), vencidas ou
atuais podendo ser cobradas, constituídas por coisas substituíveis (ou
consumíveis, ou fungíveis), como o dinheiro.

Tem-se que, quando as obrigações se equivalerem, ocorre a neutralidade


das mesmas e há a extinção da totalidade do débito, outrossim, quando houver
divergências entre as obrigações, aplica-se uma redução proporcional ao crédito
maior. É o que proposto a seguir de acordo com Mendonça (1956):

A compensação, portanto, será total, se de valores iguais às duas


obrigações; e parcial, se os valores forem desiguais. No último caso há
uma espécie de desconto: abatem-se até a concorrente quantia. O efeito
extintivo estende-se aos juros, ao penhor, às garantias fidejussórias e
reais, à cláusula penal e aos efeitos da mora, pois, cessando a dívida
principal, cessam seus acessórios e garantias. (MENDONÇA, 1956, p.615)
27

4.2. PREVISÃO LEGAL

Como já citado, o direito brasileiro admite a compensação como meio de


indireto de extinção de uma obrigação e trata da matéria nos artigos 368 a 380 do
CC/2002, os quais versam sobre as eventualidades em que podem ser aplicadas,
sobre as condições, sobre as espécies, vedações e efeitos dela, consistindo na
concomitância na condição de credor e devedor, conforme está consignado no
artigo 368 do código civil:

"Art. 368. Se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma
da outra, as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem."

De acordo com Diniz (2007), o efeito maior dessa forma de pagamento


indireto é o de operar a extinção de obrigações recíprocas, liberando os devedores
e retroagindo à data em que a situação fática se configurou. Dessa forma, apesar
de ter sido alegada posteriormente, operará desde o instante em que o réu,
cobrado de uma prestação, se tornar credor do autor. Tal efeito retroativo alcança
ambas as dívidas, com todos os seus acessórios, de modo que os juros e as
garantias do crédito deixam de existir a partir do momento em que se tiver a
coexistência de dívidas.

A compensação é tratada em três tipos ou espécies quanto à origem, a


legal, a convencional e a judicial (ou processual), as quais podem ser definidas e
caracterizadas da seguinte maneira:

— Compensação Legal: é a espécie de compensação que decorre de lei e


independe de convenção entre sujeitos da relação obrigacional, operando-se
mesmo que uma delas não queira a extinção das dívidas, pois envolve a ordem
pública. Para ocorrer essa modalidade de compensação, são necessários os
seguintes requisitos: reciprocidade de débitos; liquidez das dívidas, que devem ser
certas quanto à existência determinadas quanto ao objeto e valor; exigibilidade
atual das prestações, estando estas vencidas; e fungibilidade dos débitos, havendo
identidade entre a natureza das obrigações.
28

— Compensação Convencional ou Voluntária: ocorre quando há um acordo


de vontade entre os sujeitos da relação obrigacional. Nessa modalidade de
compensação não há necessidade de pressupostos como na compensação legal.
Perfeitamente possível a cláusula de exclusão dessa forma de compensação, nos
moldes do art. 375 do CC, desde que o contrato seja civil e paritário.

— Compensação Judicial (ou processual): é aquela que ocorre por meio de


decisão do juiz que reconhece no processo o fenômeno de extinção obrigacional.
Em casos tais, é necessário que cada uma das partes alegue o seu direito contra a
outra. Segundo uma regra mais formal do Direito Processual Civil, em regra e para
tanto, o réu necessita ingressar com a reconvenção, que é a ação do réu contra o
autor, no mesmo feito em que está sendo demandado, inclusive com o fim de
extinguir ou diminuir o valor da obrigação (art. 343 do CPC/2015, que corresponde
parcialmente ao art. 315 do CPC/1973). Não haveria a necessidade de
reconvenção nas ações de natureza dúplice, caso, por exemplo, das ações
possessórias. De toda a sorte, recentemente o Superior Tribunal de Justiça,
distante do formalismo processual, que a compensação é possível juridicamente,
independentemente de reconvenção ou pedido contraposto.

Deve-se atentar para diferenciação entre a compensação judicial e as


compensações convencionais e legais, as quais também podem ser declaradas por
um magistrado, enquanto na processual há a constituição dela, mesmo sem haver
a satisfação dos créditos aviltados.

As origens das dívidas não impedem as compensações, exceto em


situações, como está consignado no artigo 373 do Código Civil Brasileiro e
Legislação correlata:

“Art. 373. A diferença de causa nas dívidas não impede a compensação,


exceto:
I — Se provier de esbulho, furto ou roubo;
II — Se uma se originar de comodato, depósito ou alimentos;
III — Se uma for de coisa não suscetível de penhora.
29

4.3. EXEMPLOS DE APLICAÇÕES NA PRÁTICA SOCIAL

A compensação é um instituto que pode ser aplicada em muitas situações


do nosso dia a dia como forma de extinção de uma obrigação e uma de suas
aplicações práticas é percebida através do Código Tributário Nacional, que acolheu
esse instituto, com algumas particularidades, dispondo-se no seguinte sentido: a lei
pode, nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipulação em cada
caso atribuir à autoridade administrativa, autorizar a compensação de créditos
tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo
contra a Fazenda Pública (art. 170).

A compensação, para o Direito Tributário, é uma das modalidades de


extinção de crédito tributário, não só porque o Código Tributário Nacional assim
expressa (art. 156, II), mas, porque na sua essência tem essa função. A
compensação é como que um encontro de contas, se o obrigado ao pagamento do
tributo é credor da fazenda pública, poderá ocorrer a compensação pela qual seja
extinta sua obrigação, isto é, o crédito tributário.

Por outro lado, existem algumas situações em que há vedação para


aplicação da compensação, como, por exemplo, quando expressamente relatada
em contrato, protegendo-se neste caso o direito da vontade entre as partes e da
autonomia, e em casos em que há vinculações obrigacionais de caráter alimentar e
tributário. Essas situações de vedação são resguardas pelo CC/2002 nos artigos
373 (já citado) e consignadas no artigo 375:

“Art. 375. Não haverá compensação quando as partes, por mútuo acordo,


a excluírem, ou no caso de renúncia prévia de uma delas.”

4.4. POSSÍVEIS JURISPRUDÊNCIAS

O Superior Tribunal de Justiça, em diversos julgados, determinou o


pagamento por compensação, inclusive sob o rito do artigo 543-C do CPC, é firme
no sentido de que, quando se trata de tributo sujeito a lançamento por
homologação, o termo a qual do prazo decadencial para constituição do crédito,
conta-se do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento
30

poderia ter sido efetuado, nos casos em que a lei não prevê
o pagamento antecipado da exação ou quando, a despeito da previsão legal, o
mesmo não ocorre, sem a constatação de dolo, fraude ou simulação do
contribuinte, inexistindo declaração prévia de débito (como precedentes: STJ —
REsp 766.050/PR, Rel. Ministro Luiz Fux, julgado em 28.11.2007, DJ 25.02.2008;
STJ — AgRg nos EREsp 216.758/SP, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, julgado
em 22.03.2006, DJ 10.04.2006; STJ — EREsp 276.142/SP, Rel. Ministro Luiz Fux,
julgado em 13.12.2004, DJ 28.02.2005), o pedido de repetição de indébito
independe de prévia impugnação administrativa pelo contribuinte, sendo o bastante
para se pleitear a restituição ou declaração do direito à compensação que ele
tenha efetuado o pagamento considerado indevido, afigurando-se, pois,
dispensável tanto o processo administrativo quanto o requerimento expresso de
desconstituição da relação jurídica tributária consubstanciada nas notificações
fiscais de lançamentos de débito em comento.
31

5. REMISSÃO

5.1. CONCEPÇÃO

Considerando a etimologia da palavra remissão vem do latim remissio, -onis,


restituição, entrega, afrouxamento, brandura, indulgência. Significando a ação de
remitir, de perdoar. Aliás, em oportuna aproximação, temos aqui a figura do "sócio
remido", ou seja, "desobrigado do compromisso de arcar com as mensalidades".

Entretanto, no âmbito jurídico, sob a epígrafe da remissão das dívidas,


disciplina o Código Civil de 2002 (arts. 385 a 388) a liberação graciosa do devedor,
emanada do credor. Trata-se de dispensa do devedor quanto ao pagamento da
dívida (PEREIRA, 2010, p. 262). Liberação direta, como o pagamento, e não através
de consequência, como a novação ou a compensação. Portanto, a remissão possui
o significado de perdão da dívida. É considerada uma forma de extinção da
obrigação.

A aceitação do devedor, expressa ou tácita, é pressuposto indispensável a


que a remissão possa extinguir a obrigação. Mesmo porque, opondo-se à remissão,
nada poderá impedi-lo de realizar o pagamento.

5.2. PREVISÃO LEGAL

A previsão legal da Remissão encontra-se disciplinada nos artigos 385 a 388


do Código Civil. Assim disciplina a lei:

CAPÍTULO IX
Da Remissão das Dívidas
Art. 385. A remissão da dívida, aceita pelo devedor, extingue a obrigação,
mas sem prejuízo de terceiro.
Art. 386. A devolução voluntária do título da obrigação, quando por escrito
particular, prova desoneração do devedor e seus co-obrigados, se o credor
for capaz de alienar, e o devedor capaz de adquirir.
Art. 387. A restituição voluntária do objeto empenhado prova a renúncia do
credor à garantia real, não a extinção da dívida.
Art. 388. A remissão concedida a um dos co-devedores extingue a dívida na
parte a ele correspondente; de modo que, ainda reservando o credor a
solidariedade contra os outros, já lhes não pode cobrar o débito sem
dedução da parte remitida.
32

5.3. EXEMPLOS DE APLICAÇÃO NA PRÁTICA SOCIAL

Remissão total: ocorre quando se é perdoada completamente a dívida. Como,


por “A” deve 4 milhões de reais de “B”, e “B” realiza a remissão total da dívida,
perdoando “A” do pagamento da dívida.

Remissão parcial:  ocorre quando apenas por uma parte da dívida.


Como por exemplo “A” deve 4 milhões de reais a “B”, e “B” realiza a remissão de 2
milhões de reais, ficando “A” devedor de 2 milhões de reais.

Remissão expressa: ocorre quando o credor remitente perdoa a dívida de


forma escrita, verbal. Como, por exemplo “A” realiza uma declaração, por meio de
um documento particular, perdoando a dívida de “B”.

Remissão tácita: quando o credor desenvolve uma conduta que faz inferir que
ele perdoou a dívida. Como, por exemplo, “A” é credor de 2 milhões, “B” paga 400
mil reais a “A” e “A” lhe dá um recibo no valor de 2 milhões. Assim, tacitamente o “A”
está remindo 1 milhão e 400 reais. Pois, recebeu só 400 mil e deu um recibo
dizendo que recebeu os 2 milhões. Remissão presumida: é aquela determinada na
lei.
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CONCLUSÃO
As diversas formas de adimplemento, portanto, tanto de forma direta quanto
de forma indireta, configuram-se como matérias de especial relevância no âmbito do
Direito Civil, haja vista que se fazem presentes nas mais diversas situações sociais e
de diferentes maneiras, sendo, além disso, cada forma de pagamento singular e, por
isso mesmo, deve ser observada de modo cuidadoso. Nesse sentido, definiu-se aqui
que uma obrigação extingue-se com o pagamento, e que essa palavra não
necessariamente está apenas relacionada com dinheiro, mas que pode haver
pagamento de diferentes maneiras. Além disso, destacou-se também que o
pagamento, quando analisado por diferentes ângulos, pode ser efetuado tanto por
aquele que paga em dinheiro ou que realiza uma determinada atividade, quanto por
aquele que não realiza uma determinada tarefa.

Por outro lado, refletiu-se também sobre o pagamento indireto e suas


diferentes formas de concretização. Assim, analisou-se o pagamento em
consignação, a sub-rogação, a compensação e a remissão, sendo todos formas de
pagamento indireto. Por meio do tratamento cuidadoso de cada um desses
pagamentos, pôde-se perceber suas diferentes aplicações no âmbito social e
cotidiano, fornecendo, dessa forma, um rico quadro analítico onde se avaliou, de
maneira conjunta, uma perspectiva abstrata, pois tratou-se tanto da jurisprudência
quanto da previsão legal no Código Civil de 2002, e uma perspectiva concreta, por
assim dizer, visto que, dessa maneira, analisou-se de que forma tudo isso acontece
de fato nas relações sociais.

Nesse sentido, definiu-se que o pagamento em consignação é aquele que


acontece quando o pagamento é realizado mediante um depósito judicial ou em
estabelecimento bancário da coisa devida. Essa forma de pagamento indireto é
relevante na medida em que garante ao devedor o direito de pagar aquilo que deve,
extinguindo, portanto, qualquer relação jurídica entre o credor e o devedor. O
pagamento por sub-rogação, por outro lado, enfatiza a ideia, como o próprio nome
sugere, de substituição, seja de um bem por outro ou de uma pessoa por outra,
sendo esse instituto previsto nos antigos 346 ao 351 do Código Civil.

Seguindo na análise das diferentes formas de pagamento indireto, abordou-


se o pagamento em compensação, que se traduz quando duas ou mais pessoas são
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credoras e devedoras umas das outras. O pagamento em compensação se encontra


previsto nos artigos 368 a 380 do CC/2002. Por fim, analisou-se o pagamento por
remissão, que trata do perdão de uma dívida do devedor pelo credor. Espera-se,
com o esclarecimento dessas formas de pagamento, salientar a importância do
conhecimento das diferentes formas de adimplemento que fazem parte do Direito
Civil.
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