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0.

Ostomias de eliminação
A qualidade de vida do indivíduo,
que possui um estoma, depende
do ajuste psicológico adequado,
da correta localização do estoma
e da existência de um
profissional de saúde disponível,
que acompanhe o doente na fase
de adaptação.

Definição:

O termo ostomia refere-se à formação cirúrgica de uma abertura para drenar conteúdo
(fezes ou urina). São vários os motivos que levam à realização de uma ostomia num
indivíduo: traumatismos, patologias neurológicas e infeciosas, entre outras.
Podem ser classificadas relativamente à duração:

• Temporárias;
• Definitivas.
Podem ser classificadas relativamente a finalidade:

• Urinárias;
• Intestinais;
• Ileostomias;
• Colostomias.

0.1. Preparação pré-operatória


A avaliação pré-operatória é essencial para o alcance dos objetivos
reabiliatórios que devem estar voltados, o mais precocemente possível, para
o autocuidado. Nesta fase de tratamento, tanto o individuo quanto a família
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estão ávidos e recetivos por informações que lhes deem subsídios para
trabalhar as ansiedades e o medo do desconhecido e ativar os mecanismos
de enfrentamento”. (Santos et al, 2005)

0.2. Marcação do estoma


A marcação do estoma tem imensas vantagens. Segundo Bastos “…é a
marcação do local do estoma para que haja uma boa adaptação dispositivo”
(2006, p. 86). Segundo Santos et al, as
vantagens são:
• Boa adaptação do dispositivo;
• Facilitar o autocuidado;
• Prevenção de complicações;
• Facilitar reintegração social precoce;
• Direito do paciente (Santos et al, 2005,
p.115).

0.3. Pós-operatório
Aspetos a considerar:
• Estado psicológico, Mental e emocional;
• Estado físico e capacidades sensoriais (Ensino do autocuidado);
• Nível sociocultural e económico.

0.4. Autocuidado à ostomia


Autocuidado higiene: troca de dispositivos;

O ensino deve começar com a primeira substituição do sistema;

Reunir todo o material;

Lavar as mãos e posicionar o doente confortavelmente;

Retirar de forma suave o sistema com fezes de cima para baixo, com as duas mãos em
que uma segura o sistema coletor e a outra apoia a pele;

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Observar as caraterísticas do efluente e sistema;

Lavar o estoma e a pele perístoma, sem esfregar, com esponja humedecida em água
morna e sabonete líquido de PH neutro. Repetir com esponja humedecida só com água;

Secar bem o estoma e a pele com movimentos suaves;

Avaliar as caraterísticas do estoma e a pele. Incentivar o doente a “olhar” o estoma e


“tocar”;

Medir o estoma com medidores próprios, recortar ao tamanho adequado;

Utilizar uma barreira cutânea, quando a pele peri-estomal se encontra macerada, com
lesões ou com pregas, que protegem a pele;

Embora sem estudos científicos que provem a sua eficácia, a aplicação da clara de ovo,
ligeiramente batida tem dado bons resultados. A sua justificação poderá estar
relacionada com a conhecida função das proteínas, na reparação dos tecidos.

0.5. Complicações das ostomias de eliminação


Podem ser imediatas ou tardias.

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0.5.1. Granulomas
São lesões nodulares que resultam da irritação cutânea por recorte
desajustado do dispositivo, pelas fugas frequentes e pela presença
prolongada de material de sutura.

A aplicação de nitrato de prata é eficaz, emboras necessite de experiência na


sua aplicação e vigilância da zona tratada.

0.5.2. Hemorragia
Resulta da hemostase inadequada durante a construção do estoma, da
presença de doença poliposa/diverticulite ou da administração de
medicamentos como ácido acetilsalicílico;

Geralmente advém dos pequenos vasos da mucosa, do mesentérico ou da


parede abdominal;

Se hemorragia pequena: compressão, observação até regredir. Se persistir


chamar médico.

Se hemorragia grande: chamar médico pois pode ser necessário suturar o


vaso lesado.

0.5.3. Necrose
Resulta da perda de viabilidade do tecido e manifesta-se por alteração da
coloração (+/2 dias).

A principal causa é o comprometimento sanguíneo por suturas muito apertadas, tensão


excessiva ou torção do mesentérico.
Deve ser efetuada uma monitorização da necrose através da utilização de um
sistema transparente. Caso a área de necrose seja pequena, geralmente há
regeneração da mucosa; caso a área seja grande deve ser contactado o
cirurgião.

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0.5.4. Deiscência da sutura mucocutânea
Verifica-se quando existe rutura da linha de sutura entre estoma e a parede
abdominal; pode resultar de um orifício parietal demasiado grande ou fatores
que interferem no processo de cicatrização como desnutrição, tensão
excessiva ou infeção.

Se a deiscência for total é necessário recorrer a nova cirurgia; caso seja


parcial procede-se à monitorização através da utilização de bolsa
transparente.

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0.5.5. Edema
Surge como resposta fisiológica à
manipulação do cólon, por uma abertura
pequena do orifício da parede, por tração
excessiva ou pela pressão exercida da
vareta.

Devem ser aplicadas de compressas frias


com glicose hipertónica.

0.5.6. Abcessos
Resultam da contaminação do estoma e podem estar associados a limpeza
insuficiente do colon ou infeção dos pontos de sutura;

O tratamento passa pela drenagem de abcessos e instituição de


antibioterapia. Pode ainda haver necessidade de ajustar o dispositivo e de
reforçar a proteção cutânea.

0.5.7. Prolapso
Consiste na exteriorização do segmento da ansa
intestinal, por abertura excessiva da parede
abdominal ou por fixação inadequada do
intestino. Pode ainda resultar do aumento da
pressão abdominal associada a tumores ou
resultante da tosse, espirros, elevação de pesos,
etc.

Requer monitorização e, quando possível, a


redução do prolapso (doente em decúbito dorsal
e efetuar redução manual).

Aconselha-se a utilização de um sistema adequado tanto ao tamanho como


ao diâmetro do estoma, sem fricção da mucosa, a aplicação de um protetor
cutâneo e o uso de cinta ou faixa abdominal.

É também fulcral o ensino relativo a esforços.


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0.5.8. Estenose
Caracteriza-se pelo aperto do lúmen do estoma e pode resultar da técnica
cirúrgica, de processos infeciosos, da retração/aumento de peso ou do
traumatismo do estoma.

Na presença de estenose deve haver um controlo apertado do peso; pode


ainda ser efetuada dilatação com velas de Hegar ou de forma manual.

0.5.9. Retração
Consiste na “penetração” total ou parcial do estoma para dento da cavidade
abdominal; pode resultar da fixação incorreta da ansa intestinal, da tensão
excessiva da ansa (devido á mobilização insuficiente do da ansa), do aumento
de peso ou da remoção precoce da vareta. Nestes casos deve ser aplicado um
sistema convexo complementado com anéis ou pasta. Deve ser ponderada
cirurgia se separação total ou lesões frequentes da pele.

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0.5.10. Hérnia
Trata-se de uma protusão de vísceras abdominais para fora do músculo reto,
devido a fragilidade na musculatura abdominal.

Nestes casos deve-se adequar o dispositivo (flexível), ensinar o doente a


evitar esforços físicos, tosse e espirros e aconselhar uma cinta ou faixa
abdominal;

A implementação de hábitos alimentares corretos contribui para o controlo


da situação.

0.5.11. Foliculite
Inflamação do folículo piloso; pode observar-se desde um ponto avermelhado
à secreção purulenta no folículo. Pode resultar da remoção traumática do
pêlo decorrente da tricotomia inadequada. A bordagem da foliculite inclui a
remoção correta do pelo e, se neessário, a instituição de antibioterapia.

0.5.12. Lesão Irritativa


Inflamação da pele que se traduz por eritema, edema, vesiculas, exsudado,
ardor e dor. Pode resultar do uso de produtos de higiene, do próprio material
do dispositivo, do recorte do dispositivo ou da frequência de substituição do
dispositivo inadequada. Está também assocaida a situações de fugas
frequentes ou de localização incorreta do estoma.

A abrodagem inclui o tratamento da lesão cutânea, a higiene/dispositivo


adequados e a aplciação de barreiras cutâneas.

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0.5.13. Lesão Traumática
Lesões dolorosas com áreas húmidas,
sangrantes de superfície e formas
irregulares. Resulta da utilização e técnica
de limpeza abrasiva, da remoção
traumática do dispositivo e acessórios, ou
da fricção ou pressão contínua dos
mesmos.

Nestes casos é necessário efetuar a


reeducação da pessoa relativamente ao
autocuidado e proceder à adaptação do dispositivo e acessórios adequados.

0.5.14. Lesão alérgica


Surge em resposta a um fator alérgico.
A inflamação da pele perístoma
traduz-se pela presença de
microvesiculas, excudado, placas
eritematosas e prurido.

O tratamento passa pela remoção do


agente causal, devendo haver atenção a
quaisquer sensibilidades conhecidas (alimentares e medicamentosas). Se
necessário, realizar testes cutâneos de sensibilidade.

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0.6. Implicações socioeconómicas
São fatores de risco socioeconómico da pessoa portadora de ostomia as
remunerações reduzidas, o tempo de recuperação prolongado e algum
material com custeio pelo próprio. A necessidade de mudar de atividade
profissional ou passar a aposentação causam também impacto negativo.

Intervenções de Enfermagem: orientar para assistente social, informar


acerca da legislação sobre direitos, benefícios fiscais e outos e encaminhar
para o acesso mais “fácil” aos dispositivos (contactos de laboratórios:
B.Braun; Hollister, Convactec, Coloplast,etc.);

0.7. Implicações psicológicas


Ao abordar a componente psicológica e cognitiva, é fundamental:
• Avaliar a capacidade de aprender, de adaptar-se a novos hábitos de vida e ao stress;
• Abordar a alteração da imagem corporal e despistar baixa de autoestima e
autoconceito;
• Explorar medos, ansiedade ou rejeição a esta nova situação;
• Identificar problemas socioculturais e de relacionamento com os outros;
• Diagnosticar problemas psicossexuais e o medo de rejeição, do que o outro possa
pensar.
• Intervenções de enfermagem:
• Relação empática;
• Esclarecer dúvidas, receios, etc.;
• Mostrar o apoio com que pode contar: consulta de estomaterapia, consulta de
psicologia ou psiquiatria;
• Estabelecer contacto com outros doentes;

0.8. Direitos dos ostomizados


• Receber orientação pós-operatória, a fim de garantir um total conhecimento dos
benefícios da operação cirúrgica que efetuou, e os factos essenciais sobre como
viver com uma ostomia;
• Ter um estoma bem feito, em local apropriado, de forma a proporcionar uma
higienização adequada e um conveniente conforto do paciente;
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• Receber apoio médico experiente e profissional, cuidados de enfermagem
especializados no período pré e pós-operatório, tanto no hospital como na
comunidade;
• Ter acesso a informação completa e isenta sobre os materiais e aparelhagem
adequados, disponíveis no seu país;
• Ter a oportunidade de escolha entre os diversos equipamentos disponíveis para
ostomia, sem preconceitos ou constrangimentos;
• Ter acesso a informação sobre a atividade das associações de apoio existentes,
assim como dos serviços que podem ser oferecidos;
• Receber apoio e informação, para benefício da família, dos cuidados pessoais e dos
amigos, a fim de aumentar o entendimento sobre as condições e adaptações
necessárias para alcançar um padrão de vida satisfatório.

0.9. Auto irrigação


“A irrigação é um método mecânico para controlo do hábito intestinal.
Consiste num enema realizado a cada 24, 48, ou 72horas, cujo fluido enviado
ao intestino grosso através do estoma, estimula
sua peristalse em massa e assim o esvaziamento
do controlo fecal.” (Santos et al, 2005, P. 247).

A evacuação programada tem como finalidades:


• Estabelecer um habito intestinal regular em
colostomizados;
• Reduzir gases e odores;
• Diminuir a frequência do uso do dispositivo;
• O aparecimento de lesões periestoma;
• Diminuir custos financeiros;
• Contribuir para a melhoria da qualidade de vida.
Pretende-se que esta intervenção seja efetuada:
• Antes da alta hospitalar, ou seja, de forma precoce;
• Em doentes com colostomia do cólon descendente para evitar o funcionamento
da ostomia durante 48 horas.
Vantagens:

• Redução das despesas;

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• Redução da poluição (ambientais);
• Aumento da qualidade de vida de alguns doentes;
• Utilizar um obturador (evitando sacos);
• Sem necessidade de mudar o estilo de vestuário;
• Sem se preocupar que o dispositivo descole;
• Sem dificuldade na atividade sexual;
• Evitar a disfunção do casal (divórcio).
Desvantagens:

• Só ser efetuado ao cólon descendente e sem anastomoses internas;


• Complicações: cólicas; bradicardia; hipotensão.
Critérios para inclusão (indicação) de clientes na técnica de irrigação:

• Indicação médica;
• Condições locais do estoma;
• Condições de aprendizagem;
• Condições físico-motoras;
• Ausência de deficiências sensoriais (visão e audição);
• Conhecimento sobre a técnica;
• Decisão do cliente e não ser ditada por norma do serviço;
• Motivação para a realização da técnica;
• Dor controlada/sem dor;
• Adaptar o seu estilo de vida de forma a ter disponibilidade de tempo (1hora),
inicialmente diariamente, e a posteriori de 48h em 48horas ou 72horas conforme
o regulamento do seu intestino.
Critérios de exclusão para a técnica de irrigação:

• Prolapso;
• Hérnia;
• Retração;
• Estenose;
• Radioterapia;
• Quimioterapia;
• Doenças cardíacas, renais, doença de Chron, divertículos, etc.

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0.9.1. Procedimento: Treino da técnica de irrigação
O processo de treino aqui descrito é baseado em Santos e Kozumi, citados
por Santos e Cesaretti (2005,p.250):

• Visualização de um vídeo sobre a técnica de irrigação, a entrega de um panfleto


informativo, a apresentação do kit de irrigação (normalmente ao 5º dia de pós-
operatório);
• Execução de 2 a 3 sessões de treino da técnica de irrigação, que se inicia ao sexto
dia do pós-operatório e termina ao nono dia, habitualmente dia da alta;
• Descrição das 3 sessões:
o 1ª fase, 1ª sessão de treino, a técnica é executada e orientada, passo a passo
pela enfermeira;
o 2ª fase, 2ª sessão, após constatação dos resultados obtidos com a 1ª irrigação,
o cliente relembra os passos da técnica executando-a a seguir, com a ajuda da
enfermeira, que reforça os pontos principais;
o 3ª fase, 3ª sessão, o cliente descreve a técnica antes de executa-la sob a
supervisão da enfermeira e nesta sessão o cliente é avaliado quanto à sua
competência em irrigar-se sem auxilio da enfermeira.

0.9.2. Avaliação dos procedimentos e resultados do ensino


Na avaliação dos clientes para a auto irrigação procurando avaliar se estão
aptos são considerados os seguintes critérios:

• Descreve corretamente os passos do procedimento da técnica;


• Identifica a altura adequada da base do irrigador em relação ao ombro;
• Refere o volume e a temperatura adequada da água;
• Retira o ar do sistema de conexão antes de introduzir o cone (lubrificado) no
estoma;
• Introduz e mantem o cone na colostomia de forma adequada, sem comprimi-la e
sem deixar vazar água;
• Infunde a agua a velocidade constante, no tempo preconizado (cinco a dez
minutos);
• Impede a entrada de ar no intestino;
• Reconhece os principais problemas que podem ocorrer durante e após a irrigação.

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0.9.3. Material para a auto irrigação
• Kit de irrigação completo;
• Lubrificante;
• Suporte para o irrigador;
• Água morna;
• Material de higiene habitual;
• Dispositivo coletor;
• Saco ou obturador;
• Relógio.

0.9.4. Considerações Finais


Com esta técnica, há a perceção de que se contribui para minorar o
sofrimento dos clientes, diminuem-se custos e nisto está-se de acordo com
Santos (1992) para quem “A irrigação, como método de controlo da função
intestinal, mostrou ter uma forte importância na melhoria da qualidade de
vida dos indivíduos portadores de colostomia”.

0.10. Referências bibliográficas


BASTOS, A.M.R. (2006). Saberes e Competências da Pessoa com Ostomia: Preparação para o Regresso a
Casa. Dissertação de Mestrado, Porto, Portugal.

COLOPLAST, (2002) – Manual sobre derivaciones urinarias, Produtos Médicos, S.A, Madrid.

SANTOS VLCG, KOIZUMI MS. Sentimentos e sugestões manifestados por colostomizados que se irrigam.
Rev Esc Enf USP. 1992; 26(2): 161-72.

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SANTOS VLCG; CESARETTI IUR. Assistência em estomaterapia cuidado do ostomizado. São Paulo (SP):
Atheneu; 2005

SANTOS, C. (1999) – Saúde e Qualidade de Vida da Pessoa Portadora de Ostomia de Eliminação. Porto
(Dissertação de Mestrado em Psicologia, Faculdade de Psicologia e Ciências de Educação da Universidade
do Porto).

SANTOS, Isabel M.; et al. (2013) – Estomaterapia: o saber e o cuidar. Lisboa, Editora Lidel.

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Viabilidade Tecidular e Tratamento de Feridas

0. Ostomias de ventilação
A presença de uma traqueostomia tem um profundo impacto no bem-estar
físico, funcional e emocional. A pesquisa efetuada demostra a existência de
vários estudos sobre os efeitos da doença na qualidade de vida da pessoa
com traqueostomia, nomeadamente os efeitos na vida familiar, social e
laboral, na autoestima, na imagem corporal e na capacidade funcional
(Vilaseca, Chen e Backscheider, 2006; Woodord, Oplatek, Petruzzelli,2007;
Semple et al., 2008; Kazi et al., 2008; Paula e Gama, 2009; Gomes e
Rodrigues, 2010; Hashmi et al,2010; Gul e Karadag,2010).

Traqueostomia refere-se à incisão na parede anterior da traqueia com o


objetivo de criar um orifício para o exterior ou estoma (Leny et al., 2007;
Ministry of Health Singapure, 2010; Santos, 2011).

Traqueotomia: consiste numa intervenção cirúrgica na qual é feita uma


abertura temporária das vias áreas a nível da traqueia, na face anterior do
pescoço ao nível do 3º ou 4º anel traqueal, abaixo da cartilagem cricoide, na
qual se insere uma cânula (interna e externa) de diâmetro e comprimento
adequado com ou sem cuff (balão) de forma a manter as vias aéreas
permeáveis (DGS Norma nº011/2016 de 28/10/2016).

Traqueostomia: consiste num procedimento de maior complexidade, no qual


é feita uma abertura cirúrgica da traqueia seguida de sutura do orifício
cutâneo subjacente à pele, ou seja, o ato de realizar um traqueostoma para
preservar a função respiratória. É sempre definitivo e realiza-se nas
laringectomias totais e na presença de graves problemas de deglutição
(glossectomia). A respiração faz-se exclusivamente pelo orifício do
traqueostoma. (DGS; norma nº11/2016 de 28/10/2016).

As traqueostomias podem ser temporárias ou definitivas.

É definitiva no caso de tumores da laringe (Laringectomia). Estas pessoas


necessitam sempre de traqueostomia para evitar a aspiração de alimentos e
de líquidos para dentro do trato respiratório inferior, porque é a laringe que
fornece o esfíncter protetor que não esta presente.
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Viabilidade Tecidular e Tratamento de Feridas

É temporária no caso de laringectomia parcial, no caso de pessoas que


precisam de apoio ventilatório, sendo removido a cânula logo que deixe de
precisar.

As traqueostomais podem ser cirúrgicas ou percutâneas. As traqueostomias


cirúrgicas são realizadas em bloco e com a utilização de fios de sutura; as
percutâneas são realizadas em unidades de cuidados, é realizada uma
pequena incisão na pele e inserção de uma agulha na traqueia através do
qual passa um fio guia e posterior dilatação do orifício o que permite a
introdução da cânula.

0.1. Indicação
Obstrução das Vias Aéreas Superiores:
• Tumores
• Traumatismo facial
• Edema cervical inflamatório
• Traqueomalácia
• Aspiração de corpo estranho
• Anomalias congénitas do sistema respiratório e digestivo
• Apneia do sono
Alterações na ventilação: Pré ou intra-operatório de cirurgias da cabeça e
pescoço

Ineficácia na eliminação das secreções: Reflexo de tosse diminuído ou com


fraqueza muscular extrema mesmo na ausência de ventilação mecânica

Suporte ventilatório prolongado: para providenciar conforto e mobilidade e


para prevenir lesões orais e laríngeas provocadas pelas EOT muito
prolongadas

0.2. Complicações:
• Hemorragia
• Obstrução da cânula
• Enfisema subcutâneo (regride em 48h)

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Viabilidade Tecidular e Tratamento de Feridas
• Infeção da ferida
• Deiscência da sutura operatória
• Hipoxia
• Edema traqueal
• Estenose traqueal e sub-glótica (na área de abertura da traqueia ou na zona de
pressão do cuff e disfagia) Ocorre uma semana a 2 anos após traqueostomia.
Resulta da cicatrização da zona lesada devido à permanência do cuff.
• Fistula (traqueoesofágica), (devido ao cuff) A fistula permite a fuga de ar para o
estômago e também a aspiração de conteúdo gástrico para a traqueia. Pode
suspeitar-se desta situação quando há uma necessidade crescente de introdução
de ar no cuff.

0.3. Tipos de cânula de traqueostomia:


Portex:

Shiley:

Jackson:

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Viabilidade Tecidular e Tratamento de Feridas

As cânulas variam ao nível do diâmetro interno, do ângulo de curvatura, dos mecanismos de


encerramento, do número de cuffs e das fenestrações. As cânulas contêm um mandril que é um
pouco mais longo que a cânula e de ponta romba, que serve como condutor no momento da
introdução na traqueia.

0.4. Composição das cânulas:


1 – cânula externa

2 – cânula interna

3 – placa fixação da cânula

4 – terminação exterior com 15mm de diâmetro

5 – cuff

6 – válvula entrada de ar

7 – linha de entrada de ar

8 – sensor de pressão

9 – fenestra

10 – botão ou tampa de traqueostomia

0.5. Cânula com cuff


Esta indicada no pós-operatório imediato e em doentes com ventilação mecânica.
O cuff não evita mas diminui o risco de aspiração;

De forma a diminuir os riscos, a pressão do cuff deve ser monitorizada uma vez
por turno e deve manter-se entre os 20 e os 30cmH2O. Em doentes não
ventilados, a pressão deve ser diminuída gradualmente, após 24h, de forma a que
as 72h seja possível a mudança para a cânula sem cuff.

O cuff só deve estar insuflado no caso de ser necessário ventilação mecânica ou ser necessário o
uso de ambu.

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Viabilidade Tecidular e Tratamento de Feridas

Se doente neurológico e /ou outros sem reflexo de proteção da via aérea – pode ser necessário
manter sempre cânula com cuff para impedir aspiração de saliva/alimentos para a via aérea;

Ser necessário exercer pressão nos locais de hemorragia ou para prevenção de aspiração de
sangue após intervenção cirúrgica na garganta/ pescoço.

0.5.1. Complicações
Traqueomalacia, estenose traqueal, fístula traqueo-esofágica, erosão de vaso sanguíneo
importante. Para prevenir as complicações deve-se ter em conta:

Insuflar o balão com a quantidade de ar necessária apenas para impedir a passagem de ar ao redor
da cânula;

Estudos demonstram que pressões superiores a 30 cm H2O (23 mm Hg) alteram a perfusão da
mucosa traqueal gerando lesões isquémicas:

• Insuflar o cuff a pressão inferior à pressão arterial média;


• Prevenção através do uso de manómetro de pressão, avaliação realizada
em todos os turnos

0.6. Cânulas sem cuff


Esta indicada em traqueostomias permanentes (normalmente é
colocada na primeira mudança de cânula) e em doentes que vão ser
descanulados a curto prazo; as cânulas sem cuff fenestradas estão
indicadas para os doentes que possam falar (inicio do treino da fala).

0.7. Cânulas fenestradas


Para facilitar/ melhorar a fala, a fenestra permite o aumento do volume de ar forçado que passa
pela laringe na expiração.

Para facilitar a função deglutição, a fenestra permite retomar os mecanismos de proteção da


deglutição.

Se necessário aspirar, trocar cânula interna por cânula não fenestrada.

0.8. Descanulação
Só é possível em doentes com secreções escassas, fluidas e mucosas; o doente deve estar
clinicamente estável e ter reflexos de tosse e de deglutição;

Em doentes com traqueostomias prolongadas deve começar por clampar-se a cânula por vários
períodos ao longo do dia. Pode opta-se por ir reduzindo o tamanho do lúmen na cânula clampada
e sem oxigénio suplementar.

Só remover a cânula após o doente tolerar 24h com a cânula clampada e de preferência sem
oxigénio suplementar. Deve efetuar-se penso compressivo que impeça a passagem de ar. Em

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Viabilidade Tecidular e Tratamento de Feridas

doentes com traqueostomias prolongadas, por vezes, estas só encerram com recurso à cirurgia
com enxerto de cartilagem (raro).

Um permutador de calor e humidade funciona como um nariz artificial que ajuda a hidratar e
aquecer o ar inspirado. Conserva 60% da humidade nas vias aéreas. Os adesivos cobrem o
traqueostoma e proporcionam um isolamento para a pele à volta do estoma.

0.9. Dispositivos médicos para ostomias respiratórias


• Cânulas rígidas longas (cânula interna e externa em liga de prata, plástico biocompatível ou PVC))
fenestradas e não fenestradas;
• Cânulas Rígidas Longas com cuff (balão);
• Cânulas aramadas;
• Cânulas internas de substituição quando não integram o Kit;
• Escovilhão para higienização das cânulas;
• Penso protetor;
• Fitas de fixação (indicada “fita” de nastro);
• Filtros permutadores de calor e humidade;
• Obturador.
• Dispositivos médicos da traqueostomia:
• Os mesmos dispositivos da traqueotomia, e:
• Cânulas rígidas curtas;
• Cânulas e botões de silicone;
• Placas adesivas;
• Kit mãos livres
• Filtros permutadores de calor e humidade
• Fitas de fixação ( banda para fixação de cânula de traqueostomia (velcro), Fitas de nastro).
• Adesivo para fixação de cânula
• Proteção da ostomia para duche/banho
• Escovilhão de prótese fonatória (caso exista)

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Viabilidade Tecidular e Tratamento de Feridas

• Compressas tecido não tecido (TNT) 10 x10 (5 compressas)


• Escovilhão limpeza/higienização da cânula
• Aspirador de secreções no domicílio
• Sondas de aspiração de secreções
• Prótese fonatória (DGS;norma nº 11/2016)

0.10. Aspiração traqueal


Trata-se de um procedimento invasivo a ser realizado quando constatada a presença de secreções
e a incapacidade da pessoa em elimina-las por meio da tosse. Toda a pessoa internada, deve ter a
seu lado, pronto para uso mediato, material e equipamento de aspiração;

Ordem de aspiração: traqueostomia, nariz, boca, após termino eliminar cânula de aspiração; a técnica inclui
movimentos giratórios feitos com os dedos.

Tempo máximo de tolerância de aspiração continua do vácuo é de 15 segundos (Boggs,1993, Odel et al, 1993).

O lúmen da sonda de aspiração deve ser aproximadamente metade do lúmen da cânula (cânula 7/sonda 12 Fr;
cânula 8/sonda 14 Fr; cânula 9/sonda 16 Fr).

Aplicar sucção apenas na retirada da sonda de aspiração e intermitentemente;

A água esterilizada utilizada para a lavagem da sonda de aspiração deve ser rejeitada após cada Procedimento.

A pressão de aspiração no adulto não deve ser > aos 120-150mmHg e na criança 70 a 100mmHg; deve-se
monitorizar a tolerância do/a pessoa observando expressão e coloração facial, ao 1º sinal de angustia
respiratória interromper.

Hiper-oxigenação do doente (antes e após procedimento).

Posicionar o doente em folley completo (melhor expansão torácica, facilita a ventilação, promove a drenagem,
minimiza o edema e evita a tensão sobre as linhas de sutura).

0.10.1. Assistência de Enfermagem


• Manter as vias aéreas permeáveis (na presença de cânulas no traqueostoma, substituir cânula interna
diária e sempre que obstruída, confirmar permeabilidade de 6/6h);
• Aspirar vias aéreas sempre que necessário;
• Realizar nebulizações conforme necessário, para fluidificar secreções;
• Realizar mudanças de decúbito;
• Observar o aspeto das secreções (se necessário colher para microbiologia);
• Avaliar presença de secreções nas vias aéreas inferiores e providenciar sua eliminação quando necessário
(tosse, drenagem postural, fisioterapia respiratória).
• Limpar traqueostomia de dentro para fora, com compressas humedecidas;
• Utilizar uma proteção entre a cânula e a pele em redor (verificar sinais inflamatório)
• Promoção do conforto cabeceira da cama elevada a 30º.

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Viabilidade Tecidular e Tratamento de Feridas

0.11. Orientação para a alta


A avaliação das características do estoma e a sua
permeabilidade possibilitam ao enfermeiro
planear as intervenções segundo necessidades
apresentadas por cada pessoa. São exemplos de
intervenção dirigidas à alta clínica:

• Recomendar a preparação de todo o material para o


autocuidado e realizar todos os procedimentos em
frente a um espelho;
• Lavagem das mãos antes e após;
• Informar sobre onde obter material necessário (cânulas,
etc);
• Esclarecer sobre a frequência de substituição das cânulas, dos filtros;
• Ensinar a tossir inclinando-se para a frente;
• Explicar técnica de higiene corporal e da cabeça, uso de proteções para o banho ou posicionando o corpo
ligeiramente para a frente, colocando a mão a proteger o traqueostoma:
• Incentivar a higiene oral 3/4x dia;
• Estimular a pessoa a comunicar por gestos ou escrita:
• Mobilizar esforços com a terapeuta da fala e outras pessoas que vivenciaram o mesmo;
• Orientar para mastigar devagar e bem os alimentos.

0.12. Mudança da cânula externa


A primeira mudança é efetuada 5 a 15 dias após procedimento pelo médico executante da
intervenção ou por especialista de otorrino;

A segunda troca é efetuada por médico com diferenciação apropriada, com tipo e calibre de
cânula adequada ao doente. Geralmente é utilizada cânula nº 8 com cuff. É necessário ter pinça de
3 ramos e cânula nº 6 caso o estoma estenose durante o procedimento.

Posteriormente a troca é efetuada de 2/2 semanas por médico, ou enfermeiro com diferenciação
apropriada. O tipo e nº de cânula devem ser adequados ao doente (fenestrada/não
fenestrada/diâmetro externo < anterior Standard – cânula nº 8 e com cuff sempre que doente
ventilado ou com risco).

Material Necessário:

• Cânula de traqueostomia suplente


• Fita de nastro
• Pinça de três ramos
• Compressa de traqueostomia
• Material de aspiração
• Kit de penso
• Luvas esterilizadas

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• Saco para lixo contaminado (saco branco)


• Soro Fisiológico
• Lidocaína (gel ou spray)

Procedimento
• Não alimentar
• Administrar terapêutica prescrita (10 min antes de procedimento)
• Hiperoxigenação do doente
• Aspirar secreções.
• Posicionar o doente em folley completo
• Fricção das mãos com solução antissética de base alcoólica (SABA)
• Calçar luvas
• Colocar fio de nastro na cânula e testar cuff
• Desinsuflar cuff
• Lubrificar cânula
• Retirar cânula interna de traqueostomia
• Retirar cânula externa (usar pinça de três ramos)
• Introduzir cânula externa de traqueostomia e fixá-la
• Introduzir cânula interna de traqueostomia
• Proteger estoma com compressa de traqueostomia
• Rever posicionamento e fixação da cânula
• Enviar cânula para o serviço de esterilização

0.13. Referências bibliográficas


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