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A Nova Escola: como sair do papel e do conceito?

Adriana Godoy1, 10 mar. 2017

Trabalho, muito trabalho.


Após um ano do meu relato pessoal apresentado no artigo, “Autismo: Goela abaixo da
Educação”, tenho uma nova realidade com meu filho no sistema público de ensino, agora em
uma escola municipal da cidade de São Paulo, onde também participo do Conselho Escolar.
Nessa escola tenho tido a oportunidade de conversar de maneira respeitosa, franca e objetiva
com coordenadores, professores e funcionários sobre metas e desafios da inclusão escolar,
dele e de outros alunos.
Ao me dispor a falar com a escola e ouvir o que ela tinha a me dizer pude perceber que
o que mais assustava os professores era a possibilidade de serem incapazes de fazer algo que
lhes é inerente, o ensino escolar.
Diante disso, me dispus a lhes passar tudo o que eu sabia sobre autismo e sobre meu
filho até ali. Durante um mês, em 2016, duas vezes por semana, num total de 32 horas, estive
na escola dialogando com os professores e coordenadores, colocando-me como ouvinte e
como oradora, mas, primeiramente, como ouvinte.
Tenho como lema uma frase de Rosane Lowental2: “a gente não se prepara para
aquele que não está”. Por isso, meu papel ali foi criar uma oportunidade para a escola
conversar de forma franca e objetiva com quem convive com o autismo.
Simples? Jamais.
Meu filho, com autismo moderado e de pouca verbalização, tem hoje 14 anos de idade,
está no 7º ano, pela primeira vez está estudando na escola sem o apoio de seu AT (assistente
terapêutico) pessoal.
Após cinco anos com acompanhamento escolar com AT, entendemos que ele precisa
dessa oportunidade. Nós, como pais, precisamos saber se essa realidade é possível. Para mim,
isso significa estratégias e muito trabalho, pois minha presença na escola é fundamental para
ambos os lados. Para o meu filho, até agora, parece que fizemos a escolha certa, pois
diariamente chega em casa feliz. E a cada dia compreendo melhor a máxima: “ter deficiência
não me faz um incapaz”.
No presente artigo procuro dissertar sobre as medidas que o Ministério da Educação
vem orientando sobre o tema da inclusão escolar ao longo dos últimos anos, por meio de

1 Adriana Godoy é musicista, cantora profissional, mãe de um adolescente autista e coordenadora do Autismo Projeto
Integrar (http://autismoprojetointegrar.com.br/). Contato: adrianagodoycantora@gmail.com
2
Rosane Lowental é Coordenadora da Unidade de Referência em Autismo Professor Marcos Tomanik Mercadante, da
Irmandade Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, e uma das colaboradoras do Ministério da Educação para implantação
do Ensino Inclusivo no País.

1
Diretrizes, Notas e Pareceres Técnicos. A proposta do Ministério é promover a transição da
antiga escola segregacionista para a nova escola inclusiva, a Escola Para Todos.
O que proponho a fazer aqui é apontar pontos estratégicos, a partir do conteúdo dos
documentos oficiais, com intenção de facilitar o entendimento de conceitos e indicar o que
pode ser feito na prática. Procurei selecionar aspectos que esclarecem as determinações
governamentais, principalmente aqueles que ainda geram muita discussão, pois a transição
está sendo feita.
De início, é importante fazer uma distinção entre INTEGRAÇÃO e INCLUSÃO ESCOLAR.
INTEGRAÇÃO ESCOLAR é o sistema de inserção do aluno com deficiência na escola
regular com apoio do trabalho pedagógico realizado nas salas de AEE, dentre outras
estratégias. Segundo a professora Maria Teresa Égler Mantoan, da UNICAMP3:
Os movimentos em favor da integração de crianças com deficiência surgiram nos
Países Nórdicos, em 1969, quando se questionaram as práticas sociais e escolares de
segregação. [...]
O processo de integração ocorre dentro de uma estrutura educacional que oferece ao
aluno a oportunidade de transitar no sistema escolar — da classe regular ao ensino
especial — em todos os seus tipos de atendimento: escolas especiais, classes especiais
em escolas comuns, ensino itinerante, salas de recursos, classes hospitalares, ensino
domiciliar e outros. Trata-se de uma concepção de inserção parcial, porque o sistema
prevê serviços educacionais segregados.
Nesse sistema, quando o aluno atinge um determinado nível de “normalização”, pode
ser integrado em definitivo à sala de ensino regular. Mas nem sempre isso acontece. Em
alguns casos, ele nunca será inserido de fato no contexto social da sala de aula regular, se a
escola entender que ele não tem condições para isso. Em outros casos, fará parte das
atividades escolares em separado e parte das atividades na sala de aula regular. Em ambas as
situações, a demanda não se adequa ao aluno. É o aluno que deve se adequar a demanda.
De um modo geral, no sistema de INTEGRAÇÃO ESCOLAR, o aluno com deficiência
estuda com os demais alunos no mesmo espaço físico da escola, mas não necessariamente ao
lado deles, na classe de ensino regular.
Na proposta de INCLUSÃO ESCOLAR o paradigma é outro e é esse que almejamos.
A proposta desse sistema é promover na escola o convívio social integrado entre todos
os alunos, com deficiência ou não, suprimindo-se as subdivisões entre as modalidades de
ensino especial e regular. De acordo com Mantoan4:
(A inclusão) é incompatível com a integração, pois prevê a inserção escolar de forma
radical, completa e sistemática. Todos os alunos, sem exceção, devem frequentar as
salas de aula do ensino regular. [...]

3
MANTOAN, Maria Teresa Eglér. Inclusão escolar: O que é? Por quê? Como fazer? São Paulo: Moderna, 2003,
p.15. Grifo nosso.
4
Idem, p. 16.

2
O objetivo da integração escolar é inserir o aluno, ou grupo de alunos, que foi
anteriormente excluído. O mote da inclusão, ao contrário, é o de não deixar ninguém
no exterior do ensino regular, desde o começo da vida escolar. As escolas inclusivas
propõem um modo de organização do sistema educacional que considera as
necessidades de todos os alunos, estruturado em função dessas necessidades.
No Brasil, as práticas escolares realmente inclusivas são ainda incipientes. Contudo, é
importante ter a consciência de que direitos educacionais iguais para todos, sem distinção, é
um princípio assegurado pela Constituição Federal desde 19885:
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida
e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola [...]
Posto isso, precisamos considerar a realidade: há resistência por parte de muitas
famílias, gestores escolares e especialistas em autismo na área da saúde, para que a INCLUSÃO
ESCOLAR se efetive. Essa discussão deve ser considerada pelo poder público, pois muitas
famílias lutam pelo atendimento exclusivamente especializado, considerando a ineficiência na
aplicação do sistema inclusivo por partes da Gestão das Escolas Regulares e a ineficiência das
Secretarias Estaduais e Municipais de Educação na orientação e na oferta do serviço de AEE
(Atendimento Educacional Especializado).
Por outro lado, a boa notícia é que, atualmente, já existem escolas particulares que
possuem a sala de AEE e oferecem o que determina a Lei Federal: atendimento educacional
especializado no contraturno e orientação constante de profissionais especializados aos
professores regulares, com as devidas estratégias de ensino, estimulando sua participação na
escola. Até há pouco tempo, esse tipo de sala existia apenas em escolas públicas.
Mas há muito o que avançar.
Ao escolhermos a escola em que matricularemos nosso filho, geralmente seguimos
alguns preceitos que nos agradam, como filosofia e método de ensino-aprendizagem,
envolvimento com as artes, distância entre casa e escola, praticidade, envolvimento com
assuntos da comunidade, entre outros... Escolhemos a escola que queremos ou acreditamos
ser a melhor para nosso filho. Contudo, na perspectiva legalista e constitucional, os motivos
da escolha não importam: toda escola deve ter um Sistema Escolar Inclusivo. E a famosa
pergunta, “Você conhece alguma escola inclusiva?”, não deve mais ser feita, pois todas as
escolas, públicas ou particulares, têm a obrigação de ser inclusivas.
Como pais, precisamos trabalhar com a sociedade e com as instituições educacionais
para que todas as escolas sejam inclusivas, pois de outra forma estaremos sendo permissivos
com a exclusão. Precisamos assumir uma postura de parceria com a escola, definir estratégias

5
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Site da Presidência da República. Disponível
em: https://goo.gl/HwJ1Q

3
conjuntas, levar a informação quando preciso, e também exigir que ela cumpra seu papel. Não
devemos recuar diante disso.
A seguir, estudaremos pontos fundamentais a respeito de problemas e barreiras
atitudinais para a inclusão escolar, que enfrentamos constantemente, a partir da leitura dos
seguintes documentos:
 ORIENTAÇÕES para implementação da política de educação especial na perspectiva da
educação inclusiva. Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial, 20156.
 Diretrizes da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva (2008). Idem, p. 39.
 NOTA TÉCNICA 11/2010. Assunto: Orientações para a Institucionalização na Escola, da
Oferta do Atendimento Educacional Especializado – AEE em Salas de Recursos
Multifuncionais. Idem, p. 129.
 NOTA TÉCNICA 15/2010. Assunto: Orientações sobre Atendimento Educacional
Especializado na Rede Privada. Idem, p. 140.
 NOTA TÉCNICA 04/2014. Assunto: Orientação quanto a documentos comprobatórios de
alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades /
superdotação no Censo Escolar. Idem, p. 53.
 NOTA TÉCNICA 19/2010. Assunto: Profissionais de apoio para alunos com deficiência e
transtornos globais do desenvolvimento matriculados nas escolas comuns da rede
pública de ensino. Idem, p. 143.
 PARECER TÉCNICO 71/2013. Assunto: Transtorno do Espectro Autista. Idem, p. 167.

TRECHOS DESTACADOS E COMENTÁRIOS


(Meus comentários estão indicados na cor azul. Os grifos são nossos.)

ORIENTAÇÕES para implementação da política de educação especial na perspectiva da


educação inclusiva. Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial, 2015.
Este documento, com cerca de 200 páginas, também conhecido como “Documento
Subsidiário à Política de Inclusão”, é fundamental para se compreender o desenvolvimento do
processo inclusivo educacional e sua implantação. Traz conceitos históricos e o texto integral
da legislação pertinente, como Notas e Pareceres Técnicos, regulamentações etc.

6
Disponível em: https://goo.gl/hfGNe0

4
É essencial para nós, pais, entender o que é a Educação Especial e como ela deve funcionar.
Por isso, o Documento Subsidiário deve ser lido e relido por aqueles que querem compreender
o sistema inclusivo de ensino a ser adotado em todas as escolas do país.
Para que o processo inclusivo seja efetivo, é importante observar que parte das atividades da
Educação Especial devem acontecer no contraturno escolar, em consonância com as
atividades da classe regular em que o aluno está matriculado.
De acordo com o texto de apresentação do site do Ministério da Educação 7, o “Documento
Subsidiário à Política de Inclusão”:
[...] apresenta a evolução do conceito de deficiência e das práticas escolares sobre o
novo paradigma da educação inclusiva. É necessário que as escolas brasileiras se
transformem em espaços inclusivos e de qualidade, que valorizem as diferenças sociais,
culturais, físicas e emocionais e atendam às necessidades educacionais de cada aluno,
orienta também para a importância de se estabelecer redes de apoio à inclusão
educacional.

Diretrizes da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva


(2008)
Sobre a definição de Educação Especial:
 A Educação Especial é uma modalidade de ensino que perpassa todos os níveis, etapas e
modalidades, realiza o atendimento educacional especializado, disponibiliza os recursos e
serviços e orienta quanto a sua utilização no processo de ensino e aprendizagem nas
turmas comuns do ensino regular.
Sobre a forma de atendimento:
 O atendimento educacional especializado tem como função identificar, elaborar e
organizar recursos pedagógicos e de acessibilidade que eliminem as barreiras para a plena
participação dos estudantes, considerando suas necessidades específicas.
 As atividades desenvolvidas no atendimento educacional especializado diferenciam-se
daquelas realizadas na sala de aula comum, não sendo substitutivas à escolarização.
 O Atendimento Educacional Especializado complementa e/ou suplementa a formação dos
estudantes com vistas à autonomia e independência na escola e fora dela.
 Dentre as atividades de atendimento educacional especializado são disponibilizados
programas de enriquecimento curricular, o ensino de linguagens e códigos específicos de
comunicação e sinalização e tecnologia assistiva.
 Ao longo de todo o processo de escolarização esse atendimento deve estar articulado com
a proposta pedagógica do ensino comum.

7
Ver link na nota anterior.

5
Sobre o acesso educacional nos diversos níveis:
 O acesso à educação tem início na educação infantil, na qual se desenvolvem as bases
necessárias para a construção do conhecimento e desenvolvimento global do aluno. Nessa
etapa, o lúdico, o acesso às formas diferenciadas de comunicação, a riqueza de estímulos
nos aspectos físicos, emocionais, cognitivos, psicomotores e sociais e a convivência com
as diferenças favorecem as relações interpessoais, o respeito e a valorização da criança.
 Do nascimento aos três anos, o atendimento educacional especializado se expressa por
meio de serviços de estimulação precoce, que objetivam otimizar o processo de
desenvolvimento e aprendizagem em interface com os serviços de saúde e assistência
social. Em todas as etapas e modalidades da educação básica, o atendimento educacional
especializado é organizado para apoiar o desenvolvimento dos estudantes, constituindo
oferta obrigatória dos sistemas de ensino.
 O Atendimento Educacional Especializado deve ser realizado no turno inverso ao da classe
comum, na própria escola ou centro especializado que realize esse serviço educacional.
Desse modo, na modalidade de educação de jovens e adultos e educação profissional, as
ações da educação especial possibilitam a ampliação de oportunidades de escolarização,
formação para ingresso no mundo do trabalho e efetiva participação social.
 Na educação superior, a educação especial se efetiva por meio de ações que promovam o
acesso, a permanência e a participação dos estudantes. Estas ações envolvem o
planejamento e a organização de recursos e serviços para a promoção da acessibilidade
arquitetônica, nas comunicações, nos sistemas de informação, nos materiais didáticos e
pedagógicos, que devem ser disponibilizados nos processos seletivos e no
desenvolvimento de todas as atividades que envolvam o ensino, a pesquisa e a extensão.
Sobre a avaliação pedagógica:
 A avaliação pedagógica como processo dinâmico considera tanto o conhecimento prévio
e o nível atual de desenvolvimento do aluno quanto às possibilidades de aprendizagem
futura, configurando uma ação pedagógica processual e formativa que analisa o
desempenho do aluno em relação ao seu progresso individual, prevalecendo na avaliação
os aspectos qualitativos que indiquem as intervenções pedagógicas do professor.
 No processo de avaliação, o professor deve criar estratégias considerando que alguns
estudantes podem demandar ampliação do tempo para a realização dos trabalhos e o uso
da língua de sinais, de textos em Braille, de informática ou de tecnologia assistiva como
uma prática cotidiana.
Sobre os profissionais de apoio:
 Cabe aos sistemas de ensino, ao organizar a educação especial na perspectiva da educação
inclusiva, disponibilizar as funções de instrutor, tradutor/intérprete de Libras e guia-
intérprete, bem como de monitor ou cuidador dos estudantes com necessidade de apoio
nas atividades de higiene, alimentação, locomoção, entre outras, que exijam auxílio
constante no cotidiano escolar.

6
Sobre a acessibilidade física:
 Os sistemas de ensino devem organizar as condições de acesso aos espaços, aos recursos
pedagógicos e à comunicação que favoreçam a promoção da aprendizagem e a valorização
das diferenças, de forma a atender as necessidades educacionais de todos os estudantes.
A acessibilidade deve ser assegurada mediante a eliminação de barreiras arquitetônicas,
urbanísticas, na edificação – incluindo instalações, equipamentos e mobiliários – e nos
transportes escolares, bem como as barreiras nas comunicações e informações.

NOTA TÉCNICA 11/2010. Assunto: Orientações para a Institucionalização na Escola, da Oferta


do Atendimento Educacional Especializado – AEE em Salas de Recursos Multifuncionais.
Observe nos tópicos destacados, a importância do papel da família no processo inclusivo: é
um direito e um dever. Observe também que, de acordo com a lei, as escolas privadas e
públicas têm a obrigação de oferecer o AEE (Atendimento Educacional Especializado).
 A Política Nacional da Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008, p.15)
define o atendimento educacional especializado - AEE com função complementar e/ou
suplementar à formação dos alunos, especificando que “o atendimento educacional
especializado tem como função identificar, elaborar e organizar recursos pedagógicos e
de acessibilidade que eliminem as barreiras para a plena participação dos alunos,
considerando suas necessidades específicas”.
 Esse atendimento constitui oferta obrigatória pelos sistemas de ensino para apoiar o
desenvolvimento dos alunos público alvo da educação especial, em todas as etapas, níveis
e modalidades, ao longo de todo o processo de escolarização. O acesso ao AEE constitui
direito do aluno público alvo do AEE, cabendo à escola orientar a família e o aluno quanto
à importância da participação nesse atendimento.
 O Decreto nº 6.571/2008 dispõe sobre o atendimento educacional especializado, definido
no §2º do art.1º, determina que o AEE integra a proposta pedagógica da escola,
envolvendo a participação da família e a articulação com as demais políticas públicas.
 Para a implementação do Decreto nº 6.571/2008, a Resolução CNE/CEB nº4/2009, no art.
1º, estabelece que os sistemas de ensino devem matricular os alunos público alvo da
educação especial nas classes comuns do ensino regular e no atendimento educacional
especializado, ofertado em salas de recursos multifuncionais ou centros de atendimento
educacional especializado da rede pública ou de instituições comunitárias, confessionais
ou filantrópicas sem fins lucrativos.
 O AEE é realizado prioritariamente na sala de recursos multifuncionais da própria escola
ou de outra escola, no turno inverso da escolarização, não sendo substitutivo às classes
comuns. A elaboração e execução do Plano de AEE são de competência dos professores
que atuam nas salas de recursos multifuncionais em articulação com os demais

7
professores do ensino comum, com a participação da família e em interface com os demais
serviços setoriais.
 Na institucionalização da Sala de Recursos Multifuncionais, compete aos sistemas de
ensino prover e orientar a oferta do AEE.

NOTA TÉCNICA 15/2010. Assunto: Orientações sobre Atendimento Educacional Especializado


na Rede Privada.
Nas escolas, é bastante comum a barreira atitudinal em relação à inclusão, com o queixume
de que “não sabemos como fazer”. Para a Legislação, contudo, esse discurso não procede.
Observe que a escola regular deve prover essas informações e os materiais necessários para
a inclusão do aluno com deficiência dentro dos parâmetros da Educação Especializada.
 As escolas regulares devem garantir o acesso dos alunos público alvo da educação
especial às classes comuns, promover a articulação entre o ensino regular e a educação
especial, contemplar a organização curricular flexível, valorizar o ritmo de cada aluno,
avaliar suas habilidades e necessidades e ofertar o atendimento educacional
especializado, além de promover a participação da família no processo educacional e a
interface com as demais áreas intersetoriais.
 Assim como os demais custos da manutenção e desenvolvimento do ensino, o
financiamento de serviços e recursos da educação especial, contemplando professores e
recursos didáticos e pedagógicos para o atendimento educacional especializado, bem
como tradutores/intérpretes de Libras, guia-intérprete e outros profissionais de apoio às
atividades de higiene, alimentação e locomoção, devem contar na planilha de custos da
instituição de ensino.
Observe que a regulamentação não menciona a figura do acompanhante individual que atua
como assistente terapêutico, o intitulado AT, tão conhecido por aqueles que convivem com o
autismo e a deficiência intelectual.
Esses profissionais atuam no sistema “um por um”, ou seja, diretamente e exclusivamente
com um determinado aluno.
Muitas famílias querem ter seus próprios profissionais, pagos de forma particular. Os
procedimentos de trabalho também são ajustados de forma particular, de acordo com o
interesse e necessidade de cada família. Ainda não existe uma regulamentação oficial para
isso. Em geral, quando a escola oferece esse serviço individual dentro da sala regular, e não
na sala de AEE, esse serviço é feito por estagiários de pedagogia e raramente por profissionais
especializados.

8
A Lei Federal nº 12.764/2102, conhecida como “Lei Berenice Piana”8, menciona direito ao
acompanhamento de um profissional especializado, quando determinado por laudo médico,
porém não determina quem deverá remunerá-lo. Em contrapartida a oferta do AEE, não deve
estar associada ao laudo médico, exatamente como diz a Nota Técnica 04/2014, que
estudaremos a frente.
 A legislação garante a inclusão escolar aos alunos público alvo da educação especial, nas
instituições comuns da rede pública ou privada de ensino, as quais devem promover o
atendimento as suas necessidades educacionais específicas. O Decreto nº 5.296/2004, o
Decreto nº 5.626/2005, o Decreto nº 6.571/2008, o Decreto nº 6.949/2009 e a Resolução
CNE/CEB nº 4/2009 asseguram aos alunos público alvo da educação especial o acesso ao
ensino regular e a oferta de atendimento educacional especializado.
 Sempre que o AEE for requerido pelos alunos com deficiência, com transtornos globais do
desenvolvimento ou com altas habilidades/superdotação, as escolas deverão
disponibilizá-lo, não cabendo o repasse dos custos decorrentes desse atendimento às
famílias dos alunos.
 As instituições de ensino privadas, submetidas às normas gerais da educação nacional,
deverão efetivar a matrícula no ensino regular de todos os estudantes,
independentemente da condição de deficiência física, sensorial ou intelectual, bem como
ofertar o atendimento educacional especializado, promovendo a sua inclusão escolar.
 Configura-se descaso deliberado aos direitos dos alunos o não atendimento as suas
necessidades educacionais específicas e, neste caso, o não cumprimento da legislação
deve ser encaminhado ao Ministério Público, bem como ao Conselho de Educação.
Observe que para que isso se efetive as famílias dos alunos de inclusão deverão estar unidas
e trabalhar juntamente com a escola, garantindo que o AEE aconteça realmente e de forma
especializada, não permitindo que a Escola Regular faça o espaço físico do AEE, mas tenha um
estagiário de pedagogia trabalhando com esses alunos nesse espaço.
No espaço de AEE o profissional que acompanha esses alunos, por obrigação legal deve ser
um profissional especializado em Educação Especial e esse mesmo profissional é quem
orientará os estagiários de pedagogia e professores regulares desse aluno. A sua não
efetivação configura descaso deliberado aos direitos do aluno de inclusão.
Alerte-se ao fato de que o que temos atualmente em muitas escolas particulares é a ausência
do AEE e cada aluno com seu AT pessoal. E não raro esse AT é o único responsável pela inclusão
do aluno.

8
BRASIL. Lei 12.764/2102, que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do
Espectro Autista; e altera o § 3o do art. 98 da Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990. Site da Presidência da
República, 2012. Disponível em: https://goo.gl/rRECeW

9
NOTA TÉCNICA 04/2014. Assunto: Orientação quanto a documentos comprobatórios de
alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades /
superdotação no Censo Escolar.
Observe que a ausência do laudo médico não descaracteriza o direito ao AEE: ele é um
documento complementar e não obrigatório.
 O atendimento educacional especializado - AEE visa promover acessibilidade, atendendo
as necessidades educacionais específicas dos estudantes público alvo da educação
especial, devendo a sua oferta constar no projeto Político Pedagógico da Escola, em todas
as etapas e modalidades da educação básica, afim de que possa se efetivar o direito destes
estudantes à educação. Para realizar o AEE, cabe ao professor que atua nesta área,
elaborar o Plano de Atendimento Educacional Especializado – Plano de AEE, documento
comprobatório de que a escola, institucionalmente, reconhece a matricula do estudante
público alvo da educação especial e assegura o atendimento de suas especificidades
educacionais. Neste liame não se pode considerar imprescindível a apresentação de
laudo médico (diagnóstico clínico) por parte do aluno com deficiência, transtornos
globais do desenvolvimento ou altas habilidades/superdotação, uma vez que o AEE
caracteriza-se por atendimento pedagógico e não clínico.
 Durante o estudo de caso, primeira etapa da elaboração do Plano de AEE, se for
necessário, o professor do AEE, poderá articular-se com profissionais da área da saúde,
tornando-se o laudo médico, neste caso, um documento anexo ao Plano de AEE. Por
isso, não se trata de documento obrigatório, mas, complementar, quando a escola julgar
necessário. O importante é que o direito das pessoas com deficiência à educação não
poderá ser cerceado pela exigência de laudo médico.

NOTA TÉCNICA 19/2010. Assunto: Profissionais de apoio para alunos com deficiência e
transtornos globais do desenvolvimento matriculados nas escolas comuns da rede PÚBLICA
de ensino.
 Dentre os serviços da educação especial que os sistemas de ensino devem prover estão os
profissionais de apoio, tais como aqueles necessários para promoção da acessibilidade e
para atendimento a necessidades específicas dos estudantes no âmbito da acessibilidade
às comunicações e da atenção aos cuidados pessoais de alimentação, higiene e
locomoção.
Na organização e oferta desses serviços devem ser considerados os seguintes aspectos:
 A demanda de um profissional de apoio se justifica quando a necessidade específica do
estudante público alvo da educação especial não for atendida no contexto geral dos
cuidados disponibilizados aos demais estudantes.
 Em caso de educando que requer um profissional “acompanhante” em razão de histórico
segregado, cabe à escola favorecer o desenvolvimento dos processos pessoais e sociais

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para a autonomia, avaliando juntamente com a família a possibilidade gradativa de retirar
esse profissional.
 Não é atribuição do profissional de apoio desenvolver atividades educacionais
diferenciadas, ao aluno público alvo da educação especial, e nem responsabilizar-se pelo
ensino deste aluno.
 O profissional de apoio deve atuar de forma articulada com os professores do aluno
público alvo da educação especial, da sala de aula comum, da sala de recursos
multifuncionais, entre outros profissionais no contexto da escola.
 Os demais profissionais de apoio que atuam no âmbito geral da escola, como auxiliar na
educação infantil, nas atividades de pátio, na segurança, na alimentação, entre outras
atividades, devem ser orientados quanto à observação para colaborar com relação no
atendimento às necessidades educacionais específicas dos estudantes.
A pessoa com autismo possui o direito legal (LEI 12.764/12) a um acompanhante, na
modalidade “um por um”, para as atividades escolares, se necessário. Na escola pública esse
serviço pode ser feito por um AVE (Auxiliar de Vida Escolar) ou por estagiários de pedagogia.
O acompanhamento deve ser solicitado por escrito pelos pais à direção da escola e poderá
conter o laudo médico, embora este não seja obrigatório para garantia do direito. A aprovação
do pedido é de responsabilidade do corpo diretivo da escola e dos órgãos responsáveis pela
implementação do Atendimento Educacional Especializado (AEE) na escola, sendo o professor
de AEE responsável pela orientação do acompanhante.
Saiba mais como funciona o sistema colaborativo da AVE na cidade de São Paulo:
 SÃO PAULO. Portaria nº 2963/13. Assunto: Organiza o quadro de Auxiliares de Vida
Escolar – AVEs e de Estagiários de Pedagogia, em apoio a Educação Inclusiva,
especifica suas funções e dá outras providências. Secretaria Municipal de Educação,
2013. Disponível em: https://goo.gl/HQXcco
 SÃO PAULO. Portaria nº 8.824, de 30 de dezembro de 2016. Assunto: institui no
âmbito da secretaria municipal de educação o “projeto rede”, integrando os
serviços de apoio para educandos e educandas, público alvo da educação especial,
nos termos do decreto nº 57.379, de 13/10/16, e dá outras providências. Disponível
em: https://goo.gl/H5kJbI

PARECER TÉCNICO 71/2013. Assunto: Transtorno do Espectro Autista.


 A Casa Civil solicitou ao MEC parecer sobre a manifestação do Sr. Ulisses da Costa Batista
e Rosangela da Costa, que trata dos vetos referentes à Lei n° 12.764/2012, expressando
sua opinião sobre a política pública para a inclusão escolar de pessoas com autismo, no
Brasil.

11
 Segundo os autores a Lei n° 12.764/2012 gera grande reflexão sobre as condições para a
oferta do atendimento educacional, considerando a necessidade de valorização
profissional e salarial dos professores, de um ambiente escolar digno, que atenda aos
desafios dos tempos modernos, que estimule ao máximo as suas capacidades e faça de
nossos jovens verdadeiros cidadãos, ou estaremos expondo-os a frustração e ao
sofrimento por não serem capazes de alcançar seus sonhos e projetos.
 Os subscreventes posicionam-se contrariamente ao direito à inclusão escolar e
defendem a institucionalização das pessoas com autismo, designadas como autistas
severos, reproduzindo o modelo estereotipado e homogeneizador da pessoa com
deficiência. Assim, lamentam os vetos ao inciso IV do artigo 2º da Lei 12.764, que
condicionava o acesso das pessoas com transtorno do espectro autista às classes comuns
de ensino regular, limitando o direito subjetivo e indisponível à educação em razão da
deficiência.
 Para a realização do direito das pessoas com deficiência à educação, o art. 24 da CDPD
(ONU/2006) estabelece que estas não devem ser excluídas do sistema regular de ensino
sob alegação de deficiência, mas terem acesso a uma educação inclusiva, em igualdade de
condições com as demais pessoas, na comunidade em que vivem e terem garantidas as
adaptações razoáveis de acordo com suas necessidades individuais, no contexto do ensino
regular, efetivando-se, assim, medidas de apoio em ambientes que maximizem seu
desenvolvimento acadêmico e social, de acordo com a meta de inclusão plena.
Aqui temos uma séria discussão, onde as partes devem ser consideradas: Parte da
comunidade especialista acredita na institucionalização da pessoa com autismo severo e
moderado em instituições escolares especializadas e sua inserção na escola regular, caso seja
possível a esse educando.
Outra parte acredita que a inserção na escola regular é possível, desde a infância, respeitando
especificidades, assegurando igualdade de oportunidades e viabilizando estratégias,
adaptações e materiais. Esse é o ponto de defendemos. No entanto, para que isso dê certo, a
inclusão deve ser real e não de “faz de conta”. Por isso o trabalho é árduo para quem faz a
Inclusão, pois o que a escola regular oferece hoje como parceria, é o discurso de que “não
sabem fazer”.
Abaixo, destaco trechos do mesmo documento que orientam como a inclusão da pessoa com
autismo deve acontecer.
Em meu entendimento, são pontos fundamentais. Tendo essas orientações como foco,
podemos pensar em estratégias sociais, comunicativas, interacionais e pedagógicas. O
trabalho deve ser feito em conjunto com a família. A escola deve orientar a família na
construção dessas habilidades e deve estar preparada para ouvir suas colocações e
questionamentos.
Na perspectiva inclusiva, o projeto político pedagógico pressupõe:
 Superação do foco de trabalho nas estereotipias e reações negativas do estudante no
contexto escolar, possibilitando significação da experiência educacional;

12
 Mediação pedagógica nos processos de aquisição de competências, por meio da
antecipação da organização das atividades inerentes ao cotidiano escolar;
 Organização de todas as atividades escolares de forma compartilhada com os demais
estudantes;
 Reconhecimento da escola como espaço de aprendizagem, conquista de autonomia,
desenvolvimento das relações sociais e de competências, mediante as situações
desafiadoras;
 Adoção de parâmetros individualizados e flexíveis de avaliação pedagógica, valorizando o
progresso de cada estudante em relação a si mesmo e ao grupo escolar;
 Interlocução com a família para o enfrentamento dos desafios do processo de
escolarização;
 Planejamento e organização do atendimento educacional especializado considerando as
características de cada estudante, com a elaboração do plano de atendimento objetivando
a eliminação de barreiras que dificultam ou impedem sua interação social e a
comunicação.
É fundamental reconhecer o significado da inclusão para que as pessoas com transtorno do
espectro autista tenham assegurado seu direito à participação nos ambientes comuns de
aprendizagem, construindo as possibilidades de inserção no mundo do trabalho, conforme
disposto no art. nº 27 da CDPD (ONU/2006) que preconiza o direito da pessoa com deficiência
ao exercício do trabalho de sua livre escolha, em ambiente inclusivo e acessível.

Espero que, com esse material, possamos ajudar você a entender o tamanho da luta. E lembre-
se sempre de que a participação na escola é um direito nosso.
Não será fácil, mas um longo caminho já foi percorrido por centenas de famílias para que hoje
pudéssemos falar de Sistema Educacional Inclusivo.
Saibamos ouvir, para podermos falar.

Adriana Godoy, março de 2017.

Observação importante: este conteúdo é de propriedade intelectual de Adriana Godoy. Ao


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