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O AFETO COMO CAMINHO PARA A INCLUSÃO DE ESTUDANTES COM

DEFICIÊNCIA COGNITIVA NA ESCOLA


AFFECT AS A WAY TO INCLUDE STUDENTS WITH COGNITIVE DISABILITIES IN
SCHOOL
Tereza Gorete Fortaleza de Sousa

RESUMO

Este artigo de afetividade para efeito de inclusão escolar é o mesmo que tocar em
feridas não fechadas, é um grande desafio a ser enfrentado por professores, alunos
e sociedade em geral. As emoções precisam fluir para que vínculos sejam
construídos e com isso facilitem o desejo de frequentar a escola, por crianças que
tenham dificuldade de aprender e que tenha alguma deficiência cognitiva. O
aprender se torna mais estimulante quando é propiciado um ambiente acolhedor,
afetivo e apaixonante, fazendo com que as crianças com esse tipo de déficit se
sintam protegida, acolhida, amada nas suas diferenças e se abrem a um processo
de querer e desejar mais explícito e confiante. Afeto – do latin affectus, designa o
conjunto de atos ou de atitudes como a bondade, a benevolência, a inclinação, a
devoção, a proteção, o apego, a gratidão, a ternura levando as relações por um
caminho benéfico de apego afetivo e de confiança propiciando um novo modo de
aprender e ressignificar o saber. Quando se usa a afetividade, a amorosidade e o
respeito, aqui especificamente, por crianças com deficiência cognitiva, o aprender
floresce e o caminho torna-se mais leve e menos árduo, fazendo com que haja
inclusão e permanência na escola.

Palavras-chave: afetividade; inclusão; amorosidade; deficiência cognitiva.

ABSTRACT

This affectivity article for the purpose of school inclusion is the same as touching
unclosed wounds, it is a great challenge to be faced by teachers, students and
society in general. Emotions need to flow so that bonds are built and thus facilitate
the desire to attend school, by children who have difficulty learning and who have
some cognitive impairment. Learning becomes more stimulating when a welcoming,
affectionate and passionate environment is provided, making children with this type
of deficit feel protected, welcomed, loved in their differences and open to a process
of wanting and desiring more explicit and trusting. Affection – from the Latin affectus,
designates the set of acts or attitudes such as kindness, benevolence, inclination,
devotion, protection, attachment, gratitude, tenderness, leading relationships along a
beneficial path of affective attachment and trust providing a new way of learning and
giving new meaning to knowledge. When affection, love and respect are used,
specifically for children with cognitive disabilities, learning flourishes and the path
becomes lighter and less arduous, ensuring inclusion and permanence in school.

Keywords: affection; inclusion; lovingness; cognitive disability.

1 INTRODUÇÃO

O ser humano, por si só, é movido por emoções, sejam elas, positivas ou
negativas. Mas o que é afetividade? Por que a afetividade possibilita incluir
pessoas? O que ocorre, quando escolas limitam, mesmo sem se dar conta, a
interação de crianças com deficiência cognitiva com outras crianças, ditas
“normais”? Para tanto é necessário ter a compreensão do termo tão utilizado e
pouco respeitado que é a inclusão. Inclusão é o ato de incluir, acrescentar, não só
no ambiente escolar, mas, em diversos lugares e formas. Este artigo se limitará à
importância da inserção de crianças com deficiência cognitiva, na vida escolar, a
partir da prática da afetividade.
Entende-se por inclusão escolar o processo em que se amplia a participação
de todos os alunos no ensino regular atendendo à diversidade dos mesmos. Soler
(2005) explicita que é uma abordagem, a qual percebe o sujeito e suas
singularidades, tendo como objetivos o crescimento, desenvolvimento e a inserção
social de todos.
Identificar as fragilidades vivenciadas, dar importância à presença da criança
no ambiente escolar, criar vínculo com afeto, fazer algo inovador para que
permaneçam na escola. Incluir requer considerar peculiaridades, considerar o
cruzamento de culturas, requer olhar a singularidade de cada um dentro da
diversidade, olhar a parte no todo e o todo na parte. Implica, ainda, considerar as
crenças, mitos e valores de cada um, bem como considerar as emoções envolvidas
nas relações estabelecidas no cotidiano.
Mas e a afetividade, como ela se torna essência da inclusão? Procurar
entender sobre a afetividade, como qualidade de ser afetivo; aquele que tem afeto
por algo ou alguém. Afeto – do latin affectus, designa o conjunto de atos ou de
atitudes como a bondade, a benevolência, a inclinação, a devoção, a proteção, o
apego, a gratidão, a ternura etc., que no seu todo podem ser caracterizados como a
situação em que a pessoa “preocupa-se com” ou “cuida de” outra pessoa em que
esta responde, positivamente, aos cuidados ou à preocupação de que foi objeto,
(ABBAGNANO, 2000, p. 21). Que perfeição este conceito, abrange o intangível, o
abstrato, mas também impacta na condição de fazer o outro importante, de se sentir
visto, cuidado, presente, e porque não dizer, amado?
O afeto determina caminhos fundamentados na amorosidade, fazendo com
que a criança, que tenha deficiência cognitiva, se sinta capaz de absorver saberes,
mesmo com suas limitações.

2 O Afeto como indutor de inclusão e de aprendizagem

Para compreender melhor a importância da afetividade, a literatura, tendo


como autor, Henri Wallon, retrata alguns conceitos centrais no que se refere ao
desenvolvimento humano, onde a afetividade está diretamente ligada a três
dimensões inseparáveis: o cognitivo, o afetivo e o psicomotor. Percebe-se, a partir
daí, o caráter fundamental de todas essas dimensões para o desenvolvimento da
criança. Para Wallon (1968), existe uma reciprocidade entre o afeto e o aprender.
O ato de afetar a criança no ensino e na aprendizagem, faz com que ela se
perceba em um processo dinâmico de existir, de contribuir e de dar qualidade à
relação existente entre quem ensina e quem se propõe a aprender. O ambiente
escolar deve ter caráter familiar e proporcionar alternativas para que o estudante se
descubra diante do mundo. O estudante, como ser dotado de emoções, possui a
necessidade de manter vínculos de amor e carinho em todos os espaços por onde
circula.
Por parte do educador, essa prerrogativa também é imprescindível, pois
como aponta Paulo Freire ao afirmar em sua obra Educação e Mudança, que não
existe educação sem existir amor. Aponta assim que o amor é uma condição
inerente do ser humano, e condição altruística para o educador, pois aquele que
“não é capaz de amar os seres inacabados não pode educar”. Traz ainda que esta
forma de amor é uma real luta contra o egoísmo: “Não há educação imposta, como
não há amor imposto. Quem não ama não compreende o próximo, não o respeita”.
(FREIRE, 2013, p. 15).
Para que ocorra a inclusão, é necessária uma reflexão a respeito da prática
pedagógica de forma a promover mudanças significativas na estrutura e
funcionamento das escolas, bem como na formação dos professores e na relação
família-escola.
De acordo com Mantoan (2002), existe o dever de oferecer escola comum a
todos os alunos, pois a escola especial os inferioriza, discrimina, limita, exclui, sendo
impossível separar afetos, emoções, sentimentos e cognição. Ao mesmo tempo, é
fundamental garantir-lhes um atendimento educacional especializado e de
qualidade, paralelamente, preferencialmente na escola comum, para que não sejam
desconsideradas suas especificidades.
A emoção se destaca como a forma mais expressiva da afetividade, pois é
onde acontece o desenvolvimento de sentimentos que possibilitam e antevê a
aprendizagem. Não se pode separar emoção da afetividade, mesmo que no
desabrochar das emoções estas podem se dar de diversas maneiras, porém,
quando está acrescida de afeto, ela dá um tom de esperança e assim o desejo de
aprender é mais eloquente.
A construção das relações e dos laços de afetividade se dá por meio dos
estímulos que os envolvidos recebem do ambiente em que estão inseridos. Luck e
Carneiro (1983, p. 25) afirmam que “as relações afetivas assumem um papel
especial e singular no quadro educativo”. Portanto, isto vem consolidar e confirma
que a afetividade deve ser cultivada em todas as relações, principalmente na relação
professor e aluno, pois os comportamentos afetivos interferem diretamente na
aprendizagem.
Piaget (1994), discorre que o plano cognitivo está ligado ao plano afetivo
“existe um estreito paralelismo entre o desenvolvimento da afetividade e os das
funções intelectuais, á que estes são dois aspectos indissociáveis de cada ação”
(PIAGET, 1994, p. 37). Contudo, pode-se afirmar que a afetividade está presente em
todas as etapas do desenvolvimento do sujeito, sendo importante destacar que as
funções afetivas e cognitivas, possibilitam que o estudante, possa através do meio
social, refletir sobre suas percepções e sentimentos, concluindo, assim, que o
desenvolvimento afetivo está interligado ao desenvolvimento cognitivo.

2.1 A afetividade na produção de movimentos de inclusão escolar

As demonstrações de afeto são de suma importância para demonstrar qual


importante é o aluno, que é uma pessoa, que possui sentidos, medos, insegurança,
vontades... quando tudo isto é percebido no seio escolar, faz-se uma ponte de
vínculo que liga o que estava fora, no caso o aluno que se sentia despercebido, com
os sonhos que agora se tornam reais devido aos vínculos gerados pela afetividade e
pelo impulso da confiança em delegar para outrem a possibilidade de se sentir útil e
produtivo.
Vários movimentos podem ser realizados, como é o caso da aproximação na
hora da leitura, no momento do lanche, nas tarefas do cotidiano, trazer elementos de
afetações para incorrer em desdobramentos de confiança e autoestima. Uma
definição poética trazida por Rios é que (2006, p.131), "despojada do sentido
romântico de que é revestida, às vezes, a afetividade traz cor e calor à prática
educativa".
Para Gotti (1998), a inclusão escolar não tem, somente, a finalidade de
incluir os educandos com problemas físicos, mentais ou com características de
superdotação, mas precisa incluir, também, o aluno “normal”, que é privado de estar
em um ambiente escolar, que não tem acesso às escolas por uma cadeia de
questões sociais, econômicas e culturais. A inclusão precisa ser sentida e
vivenciada, de forma natural e leve, não por normas, por piedade, muito menos por
cumprimento de legislações frias e fechadas em si mesmo, mas por vontade de
produzir sementes de amor, vínculos com afeto e solidariedade. É a concretização
da empatia.
De acordo com Maturana (1999, p.15) “vivemos uma cultura que desvaloriza
as emoções, e não vemos o entrelaçamento cotidiano entre razão emoção, que
constitui o viver humano, e não nos damos conta de que todo sistema racional tem
um fundamento emocional”. As emoções positivas regam o caminhar ao encontro de
novos significados, principalmente quando é percebido o déficit de cognição e logo
se coloca em prática a afetividade e a pedagogia do amor, fazendo com paixão os
traços de inclusão, necessários para promover a aprendizagem, mesmo com
lacunas, mas cheia de motivos e bons sentimentos.

Os sentimentos, as emoções e os valores devem ser encarados como


objetos de conhecimento, posto que tomar consciência, expressar e
controlar os próprios sentimentos talvez seja um dos aspectos mais difíceis
na resolução de conflitos. Por outro lado, a educação da afetividade pode
levar as pessoas a se conhecer e a compreender melhor suas próprias
emoções e as das pessoas com quem interagem no dia-a-dia. (ARANTES,
2002, p. 172).

A inclusão não se dá apenas em inserir uma criança no meio social ou


escolar, se dá a partir de mecanismos de afeto, pois conforme Pestalozzi, que
desenvolveu o método conhecido como Pedagogia do Amor, uma criança feliz, que
se sinta importante, que tenha seus sentimentos positivos despertados, mesmo com
deficiência cognitiva, aprende com muito mais facilidade, e o aprender é também
incluir, a partir de várias observações feitas, Pestalozzi concluiu que o cérebro
precisa se emocionar de forma positiva para aprender. Daí a importância de
desenvolver ações educativas capazes de provocar afetações emocionais.
E o gatilho para esses sentimentos, essas emoções e valores sejam
encarados como objeto de conhecimento, é a curiosidade. ‘Sem a curiosidade que
nos torna seres em permanente disponibilidade à indagação, seres da pergunta –
bem feia ou mal fundada, não importa – não haveria a atividade gnosiológica,
expressão concreta de nossa possibilidade de conhecer’. (FREIRE, 2001, p.76).
A amorosidade não é apenas um sentimento pelo outro, mas um
compromisso com o outro. É desenvolver a empatia e a vontade de liberar amor,
afeto, com paixão na busca da inserção, com qualidade, de crianças com déficit
cognitivo, na escola, o lugar onde as relações precisam ser efetivadas com
humanidade e respeito. Este é o segredo e a resolubilidade no tocante a acolher e
espalhar sentimentos bons para que as crianças com déficit cognitivo se sintam
pertencentes a um ambiente em que sejam capazes de aprender, mesmo com suas
limitações, pois o amor e o afeto fortalecem e impulsionam o cérebro a desenvolver
formas e novos significados para a vida e para praticar o ato educativo.

3 CONCLUSÃO
A inclusão de crianças com deficiência cognitiva é possível, desde que seja
desenvolvida a afetividade, o respeito às diferenças e à amorosidade. Pode-se fazer
movimentos de inclusão pelo afeto para que cada vez mais as relações sejam
estreitadas e a partir disso, venha de fato, favorecer a inclusão tão almejada e
desejada por tantos.
Essa importância da relação com o outro no desenvolvimento cognitivo é
fundamental para que o sujeito não se sinta em isolamento, afastado ou distante de
determinado grupo de sua convivência, pois naturalmente sente a devida
necessidade em ser aceito.
Os abismos sociais devem deixar de existir, principalmente no que toca à
questão da inserção de crianças no ambiente escolar que possuam algum tipo de
deficiência. Mas quando se tratar, de dificuldade de aprender, por possuir deficiência
cognitiva, é necessário desenvolver uma rede de afeto, de ética e respeito, construir
pontes em vez de muros, incluir no coração, na memória, na sala de aula, no
cinema, na igreja, em casa. Criar relações de afeto e afetar o outro com o melhor
que se pode ofertar, pois a semeadura é o que vai determinar a colheita. Vale apena
incluir, fazer o outro importante e feliz. A inclusão, quer seja de que forma, é um
sonho possível.
REFERÊNCIAS

ABBAGNANO, Nicola. História da filosofia. Trad. Nuno Valadas e Antônio Ramos


Rosa. 4. ed. Lisboa: Editorial Presença, 2000. v. 5.

ARANTES, Valéria Amorim. A afetividade no cenário da educação. In: OLIVEIRA,


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2002. p. 159-174.

FREIRE, Paulo. À sombra desta mangueira. São Paulo: Olho d'água. 2001.

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LUCK, Heloisa; CARNEIRO, Dorothy Gomes. Desenvolvimento afetivo na escola:


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MANTOAN, Maria Teresa Egler. Caminhos pedagógicos da inclusão: como
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MATURANA, Humberto R. Emoções e linguagem na educação e na política. Belo


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PIAGET, Jean. Seis estudos de Psicologia. Trad.: Maria Alice Magalhães


D’Amorim e Paulo Sérgio Lima Silva. Rio de Janeiro: Editora Forense Universitária,
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RIOS, Terezinha Azerêdo. Compreender e ensinar: por uma docência da melhor


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SOLER, Reinaldo. Educação física inclusiva: em busca de uma escola plural. Rio
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WALLON, Henri. A evolução psicológica da criança. Lisboa: Edições 70, 1968.

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