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Tema: Inventário Extrajudicial: Conceito. Natureza jurídica. Facultatividade. Requisitos.

Recolhimento do ITCMD. Fiscalização sobre outros tributos.

O vocábulo “inventário” remete, em sentido estrito, à declaração dos bens do falecido, que se
transmite aos sucessores. Em sentido mais amplo, designa todo o procedimento de declaração de
todos os bens do de cujus para a liquidação do acervo, com eventual quitação de dívida e partilha do
saldo em favor de seus herdeiros. Inventário administrativo, ou extrajudicial, é aquele feito perante
o tabelião de notas de livre escolha das partes interessadas, por meio do qual se apura o ativo e o
passivo da herança deixado pelo falecido, com o fito de partilhar o patrimônio líquido em favor dos
herdeiros. Trata-se de uma criação da Lei nº 11.441/2007, mantida pelo atual Código de Processo
Civil, como instrumento de desafogamento do Judiciário, e como uma alternativa mais célere, e
muitas vezes menos onerosa, para partilhar o patrimônio do autor da herança.

O notário não tem a faculdade e o livre arbítrio para redigir escrituras de inventário e de partilha em
situações não previstas pelo ordenamento jurídico, caso contrário, adotar-se-á o caráter
jurisdicional. Daí se afirmar que a atividade do notário, nessa situação, é a administração pública dos
direitos privados. O inventário e a partilha, neste caso, dada a ausência de litigiosidade, ocorrem em
caráter meramente administrativo, observando-se rigorosamente os requisitos legais de
admissibilidade. A rigor, a pretensão de inventariar e partilhar, imposta obrigatoriamente aos
herdeiros e ao cônjuge, é a de declarar um direito previamente existente, já que a herança se origina
e é transmitida, pelo princípio da saisine, desde a data do óbito (art. 1.784 do Código Civil).

A escritura de inventário e partilha se mostra facultativa, ante a possibilidade de se submeter ao


judiciário, ainda que presentes todos os requisitos legais para o ato notarial. A utilização do termo
“poderá” empregada no antigo art. 982, caput, do Código de Processo Civil de 1972, mantido com o
vocábulo no plural (“poderão”) no § 1o, do art. 610, do Código de Processo Civil de 2015, denota o
objetivo do legislador de criar uma alternativa aos interessados, sem obrigá-los e sem prejudicar o
direito de ação das partes. Aliás, é de se destacar a própria dicção do art. 2° da Resolução nº
35/2007. Mas, para fins de segurança jurídica, torna-se inadmissível que os dois procedimentos,
judicial e extrajudicial, sejam processados simultaneamente.

A possibilidade de processamento do inventário administrativo reporta-se restritivamente às


situações de inexistência de testamento válido e eficaz deixado pelo falecido (salvo determinadas
exceções, como o testamento previamente registrado judicialmente ou diante da expressa
autorização do juízo competente)168, sendo necessário que todos os herdeiros sejam capazes e
concordes. O regime jurídico aplicado está restrito ao atual Código de Processo Civil, mormente os
§§ 1º e 2º do art. 610, bem como a Resolução nº 35, de 24 de abril de 2007, do Conselho Nacional
de Justiça, sem desconsiderar as normas, editadas pelas Corregedorias da Justiça dos Estados,
atinentes à atividade notarial. A escritura, assim concebida, constitui título hábil para o registro
imobiliário e demais órgãos e repartições públicas e privadas para a transferência de bens e direitos,
bem como para promoção de todos os atos necessários à materialização das transferências de bens
e levantamento de valores, independentemente de homologação judicial.
A transmissão de patrimônio decorrente da abertura da sucessão é o fato gerador do imposto de
transmissão causa mortis, tributo de competência constitucionalmente conferida aos Estados (art.
155, I, da CF/1988). A competência tributária é exercida em conformidade com o § 1º do art. 155 da
Carta Maior, segundo o qual incidem os seguintes critérios: (i). relativamente aos bens imóveis e
respectivos direitos, o imposto pertence ao Estado da situação do bem ou ao Distrito Federal, se
neste o bem estiver situado; (ii). relativamente aos bens móveis, títulos e créditos, o imposto
pertence ao ente público (Estado ou Distrito Federal) onde se processar o inventário ou
arrolamento, ou tiver domicílio o doador. No inventário judicial, em conformidade com o art. 48 do
atual CPC, é competente o foro de domicílio do autor da herança, no Brasil, e também para o
inventário, a partilha, a arrecadação, o cumprimento de disposições de última vontade, a
impugnação ou anulação de partilha extrajudicial e para todas as ações em que o espólio for réu,
ainda que o óbito tenha ocorrido no estrangeiro.

Dessa forma, se o inventário for judicial, a competência para o recolhimento do ITCMD referente aos
bens móveis será determinada pelo local de domicílio do falecido, mas em relação aos imóveis será
sempre o Estado onde se situarem. A alíquota do imposto deve ser aquela vigente no momento da
abertura da sucessão (Súmula 112 do STF), uma vez que a partilha constitui ato meramente
declaratório de propriedade, havendo a transmissão dos bens no momento da abertura da sucessão
(princípio da saisine). O fato gerador independe da quantidade de bens deixados pelo de cujus, mas
varia conforme a quantidade de herdeiros ou legatários: se forem três os herdeiros, as transmissões
efetuadas para cada um deles constituem fatos geradores diferentes, de modo que cada um obriga-
se a recolher o ITCMD calculado sobre o valor de seu quinhão hereditário. Se na mesma escritura de
inventário e partilha houver a cessão e transferência de direitos hereditários, seguida da partilha,
haverá incidência do imposto de transmissão inter vivos quanto à cessão de direitos, além do
imposto sobre a transmissão mortis causa, por conta da abertura da sucessão. Este é de
competência estadual, mas, em relação à cessão, se for onerosa (ITBI), a competência será
municipal. Ao revés, será recolhido imposto sobre a doação, de competência estadual, se a cessão
for gratuita, já que o ato se equipara à doação.

Além do ITCMD, outros tributos também devem ser fiscalizados pelo notário. A Resolução n°
35/2007, do Conselho Nacional da Justiça, ao arrolar os documentos necessários para fins da
escritura e partilha, estabelece a imprescindibilidade da certidão negativa de tributos e o certificado
de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR) se houver imóvel rural a ser partilhado (art. 22, “g” e “h”).
Convém lembrar que a exigência de apresentação do CCIR expedido pelo INCRA, não é novidade
legislativa, já que tinha previsão também no art. 22 da Lei nº 4.947/1966, que, de forma expressa,
exige a sua exibição por ocasião da sucessão causa mortis, bem como no art. 1º do Decreto nº
4.449/2002.

A ausência de pendências tributárias, tais como o IPTU e o IR, deve ser demonstrada para se efetuar
o inventário administrativo. Mister ressaltar a incidência do disposto no art. 192 do CTN,
determinando que nenhuma sentença referente a partilha ou adjudicação será proferida sem a
prova da quitação de todos os tributos relativos aos bens do falecido, ou às suas rendas. A seriedade
do requisito legal é estendida à via extrajudicial, tal qual foi considerado pelo Conselho Nacional de
Justiça ao estabelecer a indispensabilidade da certidão negativa de tributos no cerne do art. 22,
alínea “g”, da Resolução 35/2007.

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