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Universidade Federal de Santa Catarina

Centro de Ciências Jurídicas


Direito do Trabalho II

Relatório do acórdão:
PROCESSO nº 0001719-83.2017.5.12.0059 (ROT)

Camila Martins
Géssica Carolina Goulart Pinto
Luis Fernando Gutierrez
Luiz Felipe Domingo

Sumário:

Trata-se de recurso ordinário trabalhista em que a autora Fabíola Medeiros e


a ré “Concórdia Logistica S.A” visam a reforma da sentença parcialmente
procedente em favor desta ré. A discussão geradora da lide trata da pertinência da
indenização por horas extras não remuneradas e pelo pagamento de valores a
menor do salário devido, pretensões formuladas pelo autor.

A principal controvérsia reside na natureza do cargo ocupado pelo recorrente.


O acórdão discute também os respectivos temas suspeição de testemunha; jornada
de trabalho; adicional por tempo de serviço; indenização pela não contratação de
seguro de vida; multa do artigo 477 da CLT; multa do artigo 467 da CLT; dano
existencial; correção monetária e honorários sucumbenciais.

Remuneração e salário:

A exceção ao controle de jornada, prevista no art. 62, II, da CLT, é destinada


àqueles que agem como prolongamentos da vontade do empregador, possuindo
inequívoco poder de gestão, não bastando a mera responsabilidade técnica. No
caso em questão, a despeito dos registros que atribuiam a autora o cargo de
confiança, a aplicação do princípio da primazia da realidade nos permite
descaracterizar essa atribuição, uma vez que deve ser conferida de maneira
excepcional e não como um artifício para deixar de pagar as horas extraordinárias
devidas ou para submeter os trabalhadores a jornadas exaustivas.

Conforme ficha financeira, a autora percebia o valor mensal de R$ 2.788,74.


Considerando que sua jornada era superior a 12 horas diárias (15 horas do dia 20
ao dia 25 de cada mês), que somam, em média, 82h30min semanais, pelas quais
não recebia horas extraordinárias, em função do suposto cargo de confiança, a
autora percebia salário/hora de R$6,70. Desse modo, a autora recebia um valor,
proporcionalmente, menor do que os seus subordinados (R$8,52). Caso recebesse
pelas horas extraordinárias cumpridas, ainda receberia o valor mensal de
R$1.200,00 além do salário.
O espaço dedicado no acórdão à apreciação do dano existencial é de suma
importância, tendo em vista a relação que este possui com os dois principais temas
que guiam o litígio: excesso de horas de trabalho e falta da devida remuneração.
Respaldada no art. 7º, XIII da CF, a caracterização do dano existencial neste caso
serve de síntese das consequências práticas decorrentes da privação de tempo livre
e insuficiente remuneração a que o empregador submeteu a recorrente.
Este dano evidencia ainda uma questão fundamental no tocante à
remuneração: o abuso da exceção contida no art. 62, II da CLT. Ao esvaziar de
conteúdo o significado concreto do cargo de confiança busca-se por parte da ré
atribuir nomenclaturas que se assemelhem a cargos de supervisão e autonomia
sem que de fato exerçam qualquer atividade de gestão.

Duração do trabalho

Quanto às horas trabalhadas, a autora comprovou trabalhar cerca de 12


horas diárias, estendendo para 15 horas no período de fechamento de folha (do dia
20 ao 25 de todo mês). O órgão julgador acredita que a ré abusou no
enquadramento na exceção prevista no art. 62, II, da CLT, para excluir o controle de
jornada e o pagamento de horas extras, mantendo a autora em sua constante
disposição por excessivas horas. A ré afirma que a autora sempre exerceu cargos
de confiança/gestão, podendo ser enquadrada na exceção.

A pretensão de enquadramento foi julgada improcedente pelos


desembargadores.

Durante seu período na empresa, a autora exerceu o cargo de Coordenadora


de Gestão de Pessoas, sendo promovida ao cargo de Auditora Interno Pleno e,
após, ao cargo de Especialista em Gestão, por fim, retornando para o cargo de
Coordenadora de Gestão de Pessoas. Todos os cargos mencionados são de
eminente natureza técnica e não de gestão, no sentido estrito, segundo o julgador.

Para que o empregado fique excepcionado das regras relativas à duração


normal do trabalho, enquadrando-se na hipótese do art. 62, inciso II, da CLT, é
necessária a prova inequívoca da existência de poderes de mando e gestão, além
da percepção de elevado padrão salarial, distinguindo-o dos demais empregados.
Não basta a simples denominação de cargo de confiança, mostrando-se
imprescindível a prova do desempenho de típico encargo de gestão ou
representação, que coloque o empregado em posição de tomar decisões, e de
subordinação atenuada, o que não se mostrou no caso.

Assim, o TRT determinou que a exceção do art. 62, II não cabe no caso em
questão, devendo a jornada da autora ser caracterizada conforme descrita e
comprovada, das 06 às 19h por dia, com uma hora de almoço de segunda a sexta-
feira e aos sábados até às 14h30min, sendo acrescentadas mais 3 horas no período
de fechamento de folha.

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