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Poder Judiciário Federal

Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região


Vara do Trabalho de Tangará da Serra/MT

ATA DE AUDIÊNCIA

Aos 18 dias do mês de novembro de 2005, na Vara do Trabalho de Tangará


da Serra/MT, presente a Exma. Juíza do Trabalho, Eleonora Alves Lacerda
Bonaccordi, que ao final assina, foi aberta a audiência relativa ao Processo
n° 1648.2005.051.23.00-3, entre a partes: MAURINA GASPAR DE
NOVAES e REPRESENTAÇÃO COMÉRCIO E SERVIÇOS LTDA. e
UNIÃO FEDERAL (TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 23ª
REGIÃO), Reclamante e Reclamados, respectivamente.

Às 17h59min, foram, por ordem da MM. Juíza, apregoadas as partes que se


fizeram ausentes.

Analisados os autos e as provas que dele constam, foi proferida a seguinte

SENTENÇA:

I - RELATÓRIO

MAURINA GASPAR DE NOVAES na qualidade de reclamante ajuizou


Reclamação Trabalhista contra REPRESENTAÇÃO COMÉRCIO E
SERVIÇOS LTDA. e, subsidiariamente, contra UNIÃO FEDERAL
(TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 23ª REGIÃO), todos já
qualificados na petição inicial, alegando ter sido admitida em 29.07.2004 e
pedido demissão em 12.05.2005, denunciando diversas irregularidades
ocorridas na extinção do vínculo empregatício.

Pleiteia, em conseqüência, o pagamento de verbas salariais, indenizatórias e


rescisórias.

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Atribuiu à causa o valor de R$ 993,88.

A primeira reclamada não compareceu à audiência designada.

Em sede de defesa, a segunda Reclamada argúi as preliminares de


ilegitimidade passiva, impossibilidade jurídica do pedido, e, no mérito, aduz
não haver responsabilidade subsidiária da União pelos créditos decorrentes
do contrato de trabalho mantido entre a reclamante e a primeira reclamada,
impugnando os pedidos formulados e requerendo a improcedência da ação.

Juntou carta de preposição e documentos que não foram impugnados pela


Reclamante.

Sem outras provas, foi encerrada a instrução.

Razões finais orais remissivas pela Reclamante e pela segunda Reclamada.

Restaram infrutíferas as tentativas conciliatórias.

É o relatório.

II - FUNDAMENTAÇÃO

II.1 - PRELIMINARES DE CARÊNCIA DE AÇÃO

Eriça, a segunda Reclamada, as preliminares de ilegitimidade passiva e


impossibilidade jurídica do pedido, sob o fundamento de inexistência de
vínculo empregatício entre as partes e, portanto, de haver óbice legal ao
deferimento das parcelas pleiteadas, posto que se trata de pessoa jurídica de
Direito Público.

Segundo a reelaborada teoria do direito abstrato de agir, o exame das


condições da ação deve ser procedido em conformidade com a afirmativa
feita pelo autor na peça vestibular, e não de acordo com a efetiva situação de
fato, contrária ou não ao direito, que vier a ser revelada com a prova
produzida.

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Dessa forma, a análise da existência da ilegitimidade de parte, da
possibilidade jurídica do pedido e do interesse de agir deverá ser feita in
status assertionis, vez que o estudo das provas remete ao mérito a decisão,
fugindo das hipóteses de se decretar a carência da ação.

A solução a ser dada ao processo será de procedência ou improcedência da


ação. Tal procedimento evita as freqüentes situações em que o autor que teve
seu processo extinto sem julgamento de mérito por ilegitimidade passiva, p.
ex., ingresse com nova ação contra a mesma Reclamada, já declarada
ilegítima.

No caso presente, a autora afirmou na inicial ter sido admitida pela 1ª


Reclamada para prestar serviços para a segunda Reclamada, pleiteando, em
conseqüência da alegada terceirização, a responsabilidade subsidiária desta
última pelas verbas trabalhistas previstas em lei.

Não se vislumbra, pois, da análise pura e simples da inicial, qualquer


ilegitimidade de parte, ou impossibilidade jurídica do pedido ou falta de
interesse de agir.

Rejeito, como preliminar, destinando ao mérito a apreciação da matéria.

II.3 - DA RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA

Alega, a reclamante, ter sido contratada pela 1° reclamada (empresa


prestadora de serviços) para laborar para a 2ª reclamada (tomadora dos
serviços da primeira reclamada).

Pleiteia, em conseqüência, a responsabilidade subsidiária desta última.

Quanto à responsabilidade solidária, somente seria aplicável no caso de


subordinação direta à tomadora dos serviços, fato sequer alegado nestes
autos. Aliás, embora tenha sido contestada, a responsabilidade solidária não
foi requerida na inicial.

Entretanto, subsiste, sem dúvida, a responsabilidade subsidiária, tendo em


vista que a própria segunda reclamada confessou, em sua defesa, que
contratou a primeira reclamada para executar trabalhos de limpeza e
conservação.

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Trata-se, pois, de típica relação trilateral denominada terceirização que
envolve o prestador de serviços, tomador de serviços e empregados, na sua
modalidade lícita e válida.

De acordo com o Enunciado de número 331 do c. TST:

I- A contratação por empresa interposta é ilegal,


formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos
serviços, salvo no caso de trabalho temporário (L.
6019, de 31.1.1974).
II- A contratação irregular de trabalhador, através de
empresa interposta, não gera vínculo de emprego com
os órgãos da Administração Pública direta, indireta
ou fundacional (art. 37, II, da CRF).
III- Não forma vínculo de emprego com o tomador a
contratação de serviços de vigilância (L. 7.102, de
20.6.83), de conservação e limpeza, bem como a de
prestação de serviços especializados ligados à
atividade-meio do tomador, desde que inexistente a
pessoalidade e a subordinação direta.
IV- O inadimplemento das obrigações trabalhistas por
parte do empregador, implica a responsabilidade
subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas
obrigações, inclusive quanto aos órgãos da
administração pública direta, das autarquias,
fundações públicas, das empresas públicas e das
sociedades de economia mista, desde que hajam
participado da relação processual e constem também
do título executivo judicial. (art. 71 da L. 8.666/93)
(red. Res. TST 96/00, DJ, 18.9.00 (1993).

Observa-se, portanto, do inciso IV que o inadimplemento das obrigações


trabalhistas, por parte do empregador implica na responsabilidade
subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que
tenha participado da relação processual e conste também do título executivo
judicial.

Vale salientar que o inciso acima citado é específico dos casos de


terceirização onde todos os requisitos de validade foram observados, já que a
terceirização fraudulenta implica em responsabilidade solidária entre ambas
as empresas e não apenas subsidiária como ora é deferida nestes autos.
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Impende, em tempo, ressaltar que nada impede seja terceirizado o setor de
limpeza e conservação, já que não se trata de atividade-fim da segunda
reclamada.

A fim de esclarecer o que estamos a afirmar, mister tecer previamente alguns


comentários a respeito do instituto denominado terceirização.

Segundo Valentim Carrion, denomina-se “terceirização”:

“o ato pelo qual a empresa produtora, mediante contrato,


entrega a outra empresa certa tarefa (atividades ou serviços
não incluídos nos seus fins sociais) para que esta a realize
habitualmente com empregados desta” (in “Comentários à
Consolidação Das Leis Do Trabalho” ed. Saraiva, 22ª ed.
Pág. 294)

O objeto do contrato de prestação de serviços é a limpeza e conservação dos


estabelecimentos da segunda reclamada. Não se trata, pois, de atividade que
pode ser considerada essencial do tomador de serviços.

Os obstáculos e tendências da economia moderna desafiam as empresas a


buscar o aprimoramento do seu sistema de produção, a fim de poderem
concorrer com menor dificuldade no mercado, sendo que, das formas
existentes atualmente, é a horizontalização o modelo mais indicado para a
finalidade almejada, já que a verticalização (centralização numa única
empresa ou em grupo econômico de todas as atividades ligadas a um
empreendimento), acaba por desperdiçar o tempo, a tecnologia, os recursos
humanos e o investimento que poderiam ser destinados apenas à atividade-
fim da empresa.

Transcreve-se, por oportuna, a lição de João de Lima Teixeira Filho, in


“Instituições de Direito do Trabalho”, 15ª ed. Vol. I, pág. 276, ao definir o
modelo citado:

“Com a horizontalização se passa movimento oposto: dá-se


a desconcentração industrial, isto é, o desmonte ou descarte
de atividades acessórias ou intermediárias para que a
empresa enfoque seu negócio principal. Deste modo, abrem-
se espaços, de um lado, para o aparecimento de empresas,
especializadas, de aprimorada técnica produtiva e alta
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qualidade, enquanto que, de outro lado, a empresa
reorganizada tende a experimentar melhores condições de
dirigibilidade do negócio, incremento de produtividade e de
salários, redução de custos operacionais etc. É neste último
modelo que brota e viceja a terceirização. Implementar este
modelo, por si só, nada revela de fraudulento contra o
trabalhador.”

Concluo, assim, que a terceirização evidenciada nos autos foi plenamente


válida, ensejando tão somente a responsabilidade principal da primeira
reclamada e subsidiária da última reclamada quanto aos débitos que
porventura sejam reconhecidos.

Quanto ao argumento de impossibilidade de a Administração Pública


suportar os encargos trabalhistas decorrentes do contrato de prestação de
serviços, o qual estabelece que é do contratado a responsabilidade pelos
encargos originados do contrato (art. 71 Parágrafo 1° da Lei n° 8. 666/93),
não merece prosperar.

Ocorre que a Lei n° 8.666/93 que trata de Licitações e Contratos com


Administração Pública, também em seu art. 71 parágrafo 2° estabelece que
Administração Pública, responderá solidariamente com o contratado pelos
encargos previdenciários resultantes da execução do contrato, nos termos do
art. 31 da Lei n° 8.212, de 24 julho de 1991. (red. Lei n° 9.032/95).

Ora, se a responsabilidade pelos encargos previdenciários é solidária, qual a


razão para não se reconhecer a responsabilidade subsidiária dos créditos
trabalhistas, os quais, como se sabe, têm natureza privilegiada?

A Administração Pública, ao contratar o particular mediante terceirização,


despe-se de seu jus imperium, e assume os riscos pelo eventual
inadimplemento do contratado, não havendo, portanto, que se falar em
inconstitucionalidade do Enunciado transcrito.

Vale lembrar que a Administração Pública, por ter atuado com culpa in
eligendo (culpa na escolha) e culpa in vigilando (culpa na fiscalização), por
si só, já se tornaria responsável subsidiária, por ter escolhido mal, bem como
por não ter fiscalizado o cumprimento das obrigações da contratada, o que
ensejaria responsabilização objetiva da Administração Pública.

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Nesse diapasão, declaro a responsabilidade solidária da 2ª reclamada quanto
aos débitos previdenciários decorrentes desta sentença, nos termos do art. 31
da Lei n° 8212/90.

Quanto aos créditos trabalhistas, deverá, eventual execução, ser procedida


inicialmente contra a primeira reclamada e, somente em se constatando a
insolvabilidade desta deverá ser voltada contra a segunda reclamada.

II.4 - DAS VERBAS RESILITÓRIAS

Incontroverso restou nos autos o fato de ter sido, a reclamante, contratada


para trabalhar na função de faxineira, recebendo como remuneração mensal
a quantia de R$ 305,00 que deverá ser observada nos cálculos, tendo sido
admitida em 29.07.2004 e pedido demissão em 12.05.2005.

A primeira reclamada não compareceu à audiência inicial, incidindo, assim,


em revelia, aplicando-se-lhe os efeitos decorrentes, em especial no que
concerne à confissão ficta quanto à matéria de fato alegada na inicial.

Em face da ausência de prova da devida quitação, defiro à Reclamante os


pedidos de saldo de salário de 12 dias do mês de maio de 2005, 13º salário
proporcional/2005 (04/12), férias proporcionais 2004/2005 (09/12)
acrescidas de 1/3, multa do artigo 477 § 8º da CLT, diferença do FGTS de
todo o vínculo (R$ 132,00) que deverá ser recolhido em sua conta vinculada,
em face da resilição contratual ter se dado por iniciativa obreira.

Por não terem, nem a 1ª nem a 2ª reclamadas, quitado as verbas de natureza


resilitória incontroversas em primeira audiência, deverão ser pagas com
acréscimo de 50% as seguintes parcelas: saldo de salário, 13º salário
proporcional e férias proporcionais acrescidas de 1/3.

Deverá, a primeira reclamada, devolver à reclamante sua CTPS devidamente


anotada no prazo de cinco dias, sob pena de busca e apreensão, além de
multa por descumprimento de obrigação de fazer.

Declaro extinto sem julgamento do mérito o pedido de comprovação do


recolhimento previdenciário de todo o vínculo, diante da incompetência
material da Justiça do Trabalho para seu processamento e análise.

II.5 - JUSTIÇA GRATUITA

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Defiro à Reclamante o benefício da Justiça gratuita por presentes os
requisitos legais.

II.6 - NATUREZA JURÍDICA DAS PARCELAS

Estatui o texto expresso no § 3º do artigo 832 da CLT, inserido pela Lei nº


10.035 de 25.10.2000, que “As decisões cognitivas ou homologatórias
deverão sempre indicar a natureza jurídica das parcelas constantes da
condenação ou do acordo homologado, inclusive o limite de
responsabilidade de cada parte pelo recolhimento da contribuição
previdenciária.”

Desta feita, em observância a este comando legal, declaro que são de


natureza indenizatória as seguintes verbas acolhidas neste processado:

• FGTS
• férias proporcionais indenizadas acrescidas de 1/3
• Multa do artigo 477 § 8º da CLT
• Multa do artigo 467 da CLT
• Multas eventuais pelo descumprimento de obrigação de fazer
• Juros sobre estas parcelas

São de natureza salarial as demais parcelas que foram acolhidas neste


processo.

III - DISPOSITIVO

Em razão do exposto, DECIDO, extinguir sem julgamento do mérito o


pedido de comprovação do recolhimento previdenciário de todo o vínculo,
rejeitar as preliminares de impossibilidade jurídica do pedido e ilegitimidade
passiva e, no mérito, julgar PROCEDENTES EM PARTE os pedidos
formulados por MAURINA GASPAR DE NOVAES, em desfavor de
REPRESENTAÇÃO COMÉRCIO E SERVIÇOS LTDA. e UNIÃO
FEDERAL (TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 23ª REGIÃO),
para condenar a primeira a pagar à reclamante, no prazo legal e conforme se
apurar em liquidação por simples cálculos, observadas as especificidades do

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contrato de emprego (item II.2), saldo de salário de 12 dias do mês de
maio de 2005, 13º salário proporcional/2005 (04/12), férias
proporcionais 2004/2005 (09/12) acrescidas de 1/3, multa do artigo 477 §
8º da CLT, diferença do FGTS de todo o vínculo (R$ 132,00) que deverá
ser recolhido em sua conta vinculada e multa do artigo 467 da CLT,
tudo conforme a fundamentação supra que a este dispositivo integra para
todos os fins legais.

A segunda reclamada é responsável solidária pelos créditos previdenciários e


subsidiária pelos créditos trabalhistas reconhecidos nesta sentença em
desfavor da primeira reclamada.

Incidem juros e correção monetária (En. 200/TST).

Deverá, a primeira reclamada, devolver à reclamante sua CTPS devidamente


anotada no prazo de cinco dias, sob pena de busca e apreensão, além de
multa por descumprimento de obrigação de fazer.

Observem-se os Provimentos pertinentes da Corregedoria Geral da Justiça


do Trabalho.

Custas, pela reclamada, importam em R$-60,00, sobre R$-3.000,00 valor


arbitrado provisoriamente à condenação.

Cientes a reclamante e a segunda reclamada. Intime-se a primeira


reclamada, por mandado.

Encerrou-se às 18h.

ELEONORA ALVES LACERDA BONACCORDI


Juíza do Trabalho

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