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I.

DA MANIFESTAÇÃO DA RECLAMADA

A reclamada, por meio da petição de id. XYZ oportuniza manifestação ao Tema


725 do STF, aduzindo, em síntese, a inexistência de vínculo por força da legitimidade
da terceirização. Sem razão, como se passa a demonstrar, de início, pelo
conhecimento do Tema 725 e suas formas de distinguishing.

O leading case trata do julgamento da constitucionalidade do processo de


terceirização ocorrido na CENIBRA – Celulose Nipo Brasileira. Naqueles autos, a
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Industria se manifestou, pelo OF. CNTI
Nº 155:

“A CNTI - CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES NA INDÚST'RIA (...)


tendo tomado conhecimento do julgamento do Recurso Extraordinário referente
ao Processo nO ARE 713211, no qual será analisada pela 1" Turma desta egrégia
corte a constitucionalidade do processo de terceirização empreendido pela
CENIBRA Celulose Nipo Brasileira SA, manifestar nossa preocupação com a
preservação do direitos dos trabalhadores brasileiros protegidos
constitucionalmente, de modo a evitar a legitimação das graves violações de
direitos fundamentais vivenciadas pelos trabalhadores contratados através de
empresas interpostas na referida empresa e a possível repercussão em casos
similares, o que poderia prejudicar milhões de trabalhadores de nosso pais.

A Ação Civil Pública nO 0126100-45.2006.5.03.0013 (CSJT-01261-2006-013-03-00-0)


movida pelo Ministério Público do Trabalho, em conjunto com o Sindicato de
Guanhães, atualmente SINDEX-MG - Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias
de Extração Vegetal Carvoejamento, Reflorestamento e Similares do Estado de
Minas Gerais, tem grande. importância para a categoria dos trabalhadores na
indústria extrativa e para a Clase trabalhadora como um todo no avanço da luta
contra a terceirização sem limites, associada á precarização das condições de
trabalho no Brasil.

Deve-se destacar a relevância da decisão judicial ora debatida para o avanço


das relações de trabalho em nosso pais e a reafirmação dos princípios
constitucionais que visam éJa garantia dos direitos humanos e ao trabalho,
consagrados em nossa lei Maior. B As entidades ora signatárias, juntamente com
o Ministério do Trabalho e o Ministério Público do Trabalho, vêm constatando a
ocorrência de reiterada violação de direitos fundamentais dos trabalhadores,
garantidos constitucionalmente, levada a efeito por "grandes empresas
multinacionais, a exemplo da CENIBRA, por meio da intensificação da exploração
da força de trabalho e da adoção do processo de terceirização sem limites,
impondo severa precarização das condições de trabalho e salário, com o claro
propósito, por parte da empresa tomadora de serviços, de se desobrigar do
cumprimento de normas primárias de proteção ao trabalho.”

O que se vê, quase dez anos após o início desta discussão na Corte Constitucional,
é que a reclamada tenta igualar a terceirização realizada mediante empresas de
pequeno, médio e grande porte à precarização perpetrada diante de 1 (um)
trabalhador, que começou como estagiário e foi “efetivado” como trabalhador
informal.
II. TEMA 725 DO STF DISTINGUISHING

O tema 725 do STF reconheceu a possibilidade de trabalhadores prestarem serviços


como pessoa jurídica, desde que não haja fraude à legislação trabalhista e não haja o
preenchimento dos requisitos elencados no art. 3º da CLT. O que não ocorria com os serviços
prestados pelo reclamante.

1. Subordinação: O reclamante estava sujeito a instruções e era supervisionado


pela coordenadora de mediadores Elisabete Alves, em nome da Lycée
Molière.
2. Pessoalidade: O reclamante não poderia enviar um substituto para
desempenhar as suas atividades, haja vista que foi contratado para auxiliar o
aluno, configurando, assim, a pessoalidade do seu serviço.
3. Não eventualidade: O serviço do reclamante era prestado de forma contínua
e regular, durante diversos dias ao longo da semana, demonstrando a
existência de uma relação de emprego. Diferentemente de uma prestação
ocasional e esporádica como é no caso de um serviço autônomo.
4. Remuneração: O pagamento por hora indica um vínculo empregatício. O
reclamante recebia sua remuneração conforme a hora/aula trabalhada.

É cristalino o caso de distinguishing, conforme ensinamentos do Ministro Alberto


Bastos Balazeiro, relator do acórdão de agravo abaixo ementado em 15/08/2023:

AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. LEIS 13.015/2014 E


13.467/2017. LEIS 13.465/15 E 13.467/17 TERCEIRIZAÇÃO DE SERVIÇOS. EMPRESAS
PRIVADAS. ATIVIDADE-FIM. POSSIBILIDADE. TEMA DE REPERCUSSÃO GERAL 725.
SUBORDINAÇÃO DIRETA COM A EMPRESA TOMADORA DE SERVIÇOS.
CORRESPONDENTE BANCÁRIO. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PREVISTOS NOS
ARTS. 2º E 3º DA CLT. FRAUDE NA CONTRATAÇÃO. "PEJOTIZAÇÃO". DISTINGUISHING
CONFIGURADO. MATÉRIA FÁTICA. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA 1. O
STF reconheceu a legalidade irrestrita da terceirização de serviços, podendo a
contratação de trabalhadores ocorrer de forma direta ou por empresa interposta
e para exercer indiscriminadamente atividades ligadas à atividade fim ou meio
das empresas, não se configurando em tais circunstâncias relação de emprego
entre a contratante e o empregado da contratada (ADPF-324 e RE-958252 - Tema
725). 2. Ocorre, no entanto, que a jurisprudência desta Corte vem assentando o
entendimento de que, reconhecida a fraude na contratação , ante a existência
de subordinação direta do empregado à empresa tomadora dos serviços, não há
que se falar em licitude da terceirização. 3. Assinale-se ainda que esta Corte,
diante da decisão do STF quanto à licitude da terceirização nas hipóteses de
"pejotização", em que restou afastada a irregularidade na contratação de pessoa
jurídica formada por profissionais liberais para prestar serviços terceirizados na
atividade-fim da contratante ( AgRg-Rcl 39.351), vem entendendo que,
caracterizado os requisitos clássicos da relação de trabalho, em que se
reconhece a fraude na terceirização, configura-se o distinguishing da tese
expressa pelo STF no Tema 725. Precedentes. 4. Assim, havendo elementos fáticos
no acórdão regional que permitem concluir configurada fraude na contratação,
ante a existência de subordinação direta do empregado à empresa tomadora
dos serviços, resta configurado o distinguishing da tese expressa pelo STF no Tema
725. Agravo a que se nega provimento. (TST - Ag-AIRR: 00106716520205030069,
Relator: Alberto Bastos Balazeiro, Data de Julgamento: 15/08/2023, 3ª Turma, Data
de Publicação: 18/08/2023)

Demais disso, a narrativa da reclamada não se sustenta no que diz respeito a


existência de MEI, uma vez que é incontroversa a sua contratação como estagiário, sendo
certo que eventual constituição de MEI após o início da atividade não possui o condão de
afastar a relação eminentemente de emprego moldada pelos artigos 2º e 3º da CLT:

RECURSO ORDINÁRIO. CORRESPONDENTE BANCÁRIO. PEJOTIZAÇÃO. FRAUDE.


VÍNCULO DE EMPREGO. RECONHECIDO. 1) A análise dos elementos fático-
jurídicos da relação de emprego na situação vivenciada pelo empregado
terceirizado em face da tomadora dos serviços e, quando presentes os
requisitos desta relação, afasta a estrita aderência necessária ao decidido
pelo STF na ADPF nº 324 e no RE 958.252 (Tema 725). 2) Recursos ordinários aos
quais se concede parcial provimento.

(TRT-1 - ROT: 01005997220215010481, Relator: CLAUDIO JOSE MONTESSO, Data


de Julgamento: 01/03/2023, Décima Turma, Data de Publicação: DEJT 2023-
03-17)

Como se vê, a argumentação da ré em nada modifica o caso em aspecto, já que


desde o início foi assumida a prestação de serviços, inclusive com a juntada dos
comprovantes de pagamento de toda a contratualidade. Logo, é da reclamada o ônus da
prova

RECURSO ORDINÁRIO. "PEJOTIZAÇÃO". VÍNCULO EMPREGATÍCIO. ASSUNÇÃO


DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. ÔNUS DA PROVA. Quando o trabalhador com
pessoalidade, subordinação e não eventualidade, ainda que por intermédio
de "pessoa jurídica" - "pejotização" -, condição imposta para obtenção do
emprego, resta transparente a fraude (art. 9º, CLT), impondo-se, de pronto, o
reconhecimento do vínculo de emprego entre as partes. Outrossim, se
reconhecida a prestação do serviço pela Ré, a ela incumbe comprovar a
natureza autônoma do ajuste, ônus do qual não se desincumbiu. Recurso a
que se nega provimento. I - (TRT-1 - ROT: 01009242820205010046 RJ, Relator:
MARIO SERGIO MEDEIROS PINHEIRO, Data de Julgamento: 16/03/2022, Primeira
Turma, Data de Publicação: 24/03/2022)

Se constatada a presença dos requisitos do vínculo empregatício, será considerada


fraudulenta a forma de contratação e deve ser reconhecido o vínculo em eventual
reclamação trabalhista. Nas palavras de Rogério Renzetti: (Manual de Direito do Trabalho -
2021)
“A possibilidade de terceirizar a atividade-fim ou a atividade-meio não
significa que, apenas por isso, está tudo correto. Não pode haver também
pessoalidade e subordinação direta entre o trabalhador terceirizado e o
tomador de serviços.
Se houver essa pessoalidade e subordinação direta, então o verdadeiro
empregador será aquele que era o suposto tomador de serviços, havendo
fraude. E se houver essa fraude, a Justiça poderia reconhecer vínculo de
emprego entre o trabalhador e a empresa tomadora de serviços.

Nesse caso, os tribunais trabalhistas podem verificar que a hipótese


examinada possui elementos que diferenciam das premissas do que foi
decidido pelo STF. Essa diferenciação autoriza julgamento diverso. É a técnica
do distinguishing.”

Fato é que a reclamada basicamente confessa a existência de uma cadeia de


serviços, assume-se tomadora e alega não possui qualquer responsabilidade sobre os direitos
do reclamante, que prestou trabalho de forma pessoal, habitual, onerosa e subordinada
durante mais de 4 anos.

Eventual terceirização, acaso reconhecida, certamente seria ilícita e acarretaria o


reconhecimento de vínculo de emprego diretamente com a tomadora de serviços:

RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO APÓS A LEI Nº 13.467/2017. TERCEIRIZAÇÃO


ILÍCITA - SUBORDINAÇÃO DIRETA AO TOMADOR DE SERVIÇOS - ISONOMIA -
DISTINGUISHING EM RELAÇÃO AOS TEMAS NºS 383 E 725 DE REPERCUSSÃO GERAL
DO STF. A partir do julgamento do RE nº 958.252 e da ADPF nº 324 pelo Supremo
Tribunal Federal (em 30/08/2018), a matéria relativa à ilicitude da terceirização de
atividade-fim encontra resposta no Tema 725 da repercussão geral, com tese
jurídica segundo a qual "é lícita a terceirização ou qualquer outra forma de
divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do
objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da
empresa contratante". No entanto, da premissa fática delineada no acórdão
regional, extrai-se que o TRT, na realidade, reconheceu a ilicitude da terceirização
com fundamento na subordinação direta com a tomadora, motivo pelo qual
declarou o vínculo de emprego diretamente com empresa contratante e,
amparado no princípio da isonomia, deferiu ao reclamante os direitos da
categoria dos trabalhadores bancários. Desse modo, comprovada a
subordinação jurídica direta ao tomador de serviços, resta configurado o
distinguishing capaz de afastar as teses consagradas pelo STF nos Temas nºs 383
e 725 de Repercussão Geral. Recurso de revista não conhecido.

(TST - RR: 00109536020145010040, Relator: Liana Chaib, Data de Julgamento:


10/05/2023, 2ª Turma, Data de Publicação: 12/05/2023)

Segundo Carlos Henrique Bezerra Leite (Curso de Direito do Trabalho - 2023):


“(...) a terceirização em atividade-fim, além de precarizar as relações
trabalhistas em geral, viola diversos princípios constitucionais, bem como
tratados internacionais de direitos humanos, os quais estabelecem o primado
do trabalho digno, o valor social do trabalho e da livre-iniciativa, a função
socioambiental da empresa, a busca do pleno emprego etc.“

Verifica-se, portanto, a correlação da competência da justiça do trabalho, conforme


artigo 114 da Constituição com a preservação do trabalho digno, do valor social do trabalho
e da livre iniciativa, consoante artigo 1º, III e IV da CF. artigo 3º da CF e preservação da ordem
econômica (artigo 170 da CF), que devem contribuir para a ordem trabalhista e não para o
caos de terceirização irrestrita.
Nesse sentido, o posicionamento do Tribunal Pleno do STF e das Turmas do TST acerca
da competência da justiça do trabalho a partir da teoria da asserção:

COMPETÊNCIA - CONFLITO. Envolvendo o conflito de competência o Tribunal


Superior do Trabalho e Tribunal de Justiça, incumbe ao Supremo apreciá-lo.
CONFLITO DE COMPETÊNCIA - JUSTIÇA COMUM VERSUS JUSTIÇA DO TRABALHO.
A definição da competência decorre da ação ajuizada. Tendo como causa
de pedir relação jurídica regida pela Consolidação das Leis do Trabalho e
pleito de reconhecimento do direito a verbas nela previstas, cabe à Justiça do
Trabalho julgá-la. ( CC 7950, Relator (a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno,
julgado em 14/09/2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-168 DIVULG 31-07-2017
PUBLIC 01-08-2017)

(STF - CC: 7950 RN - RIO GRANDE DO NORTE 0043042-54.2016.1.00.0000, Relator:


Min. MARCO AURÉLIO, Data de Julgamento: 14/09/2016, Tribunal Pleno)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROVIMENTO. COMPETÊNCIA. "PEJOTIZAÇÃO".


RECONHECIMENTO DO VÍNCULO DE EMPREGO. CAUSA DE PEDIR E PEDIDO
ORIUNDOS DE ALEGADA RELAÇÃO DE EMPREGO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA
DO TRABALHO. Ante a potencial violação do art. 114, I, da CLT, o agravo de
instrumento deve ser provido para o processamento do recurso de revista.
Agravo de instrumento conhecido e provido. RECURSO DE REVISTA. VIGÊNCIA
DA LEI N.º 13.467/17. COMPETÊNCIA. "PEJOTIZAÇÃO". VÍNCULO DE EMPREGO.
CAUSA DE PEDIR E PEDIDO ORIUNDOS DE ALEGADA RELAÇÃO DE EMPREGO.
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. TRANSCENDÊNCIA RECONHECIDA.
1. O STF tem entendimento sólido de que "a competência é definida ante as
causas de pedir e o pedido da ação proposta" (STF, HC 110038, Relator (a):
MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, DJe-219, PUBLIC 07-11-2014). Dessa maneira,
"tendo como causa de pedir relação jurídica regida pela Consolidação das
Leis do Trabalho e pleito de reconhecimento do direito a verbas nela previstas,
cabe à Justiça do Trabalho julgá-la" (STF, CC 7950, Relator (a): MARCO
AURÉLIO, Tribunal Pleno, DJe-168 PUBLIC 01-08-2017). 2. O entendimento
coaduna-se com a "teoria da asserção", muito bem sintetizada por
DINAMARCO: "Define-se a competência do órgão jurisdicional de acordo com
a situação (hipotética) proposta pelo autor. Não importa, por isso, se o
demandante postulou adequadamente ou não, se indicou para figurar como
réu a pessoa adequada ou não (parte legítima ou ilegítima), se poderia ou
deveria ter pedido coisa diferente da que pediu, etc. Questões como esta não
influenciam na determinação da competência e, se algum erro dessa ordem
houver sido cometido, a consequência jurídica será outra e não a
incompetência. Esta afere-se invariavelmente pela natureza do processo
concretamente instaurado e pelos elementos da demanda proposta, ' in
status assertionis'" (Instituições de Direito Processual Civil. São Paulo: Malheiros,
2001, v. I, p. 417-8). 3. Não é demais, também, lembrar a antiga, mas sempre
atual, lição de que a competência é definida a partir da especialização, uma
vez que a Justiça Comum possui competência residual. 4. É difícil conceber a
existência de uma Justiça Especializada quase que exclusivamente em um
tipo de contrato, mas que não tem competência nem sequer para dizer
quando é que se está na presença de tal contrato. Recurso de revista
conhecido e provido.

(TST - RR: 10016828220175020361, Relator: Amaury Rodrigues Pinto Junior, Data


de Julgamento: 23/11/2022, 1ª Turma, Data de Publicação: 28/11/2022)

III. CONCLUSÃO

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