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Apostila 01
24 de setembro de 2022
DIREITO AMBIENTAL I
Sumário:
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A rigor, Ecologia é a ciência que estuda as relações dos seres vivos entre
si e com o seu meio físico. Este, por sua vez, deve ser entendido, no contexto da
definição, como o cenário natural em que esses seres se desenvolvem. Por meio físico
entendem-se notadamente seus elementos abióticos, como solo, relevo, recursos
hídricos, are clima.
O termo ecologia foi cunhado em 1866 pelo biólogo e médico alemão
Ernst Heinrich Haeckel (1834-1917), em sua obra Morfologia geral dos seres vivos, como
proposta de uma nova disciplina científica, a partir dos radicais gregos oikos (casa) e logia
(estudo).
Ecologia é, assim, o "estudo da casa", compreendida em sentido lato
como o local de existência, o entorno, o meio. É, na verdade, um ramo da moderna
Biologia, com foros de ciência, e dado como sinônimo de Mesologia. Na linguagem
corrente, porém, além de equivalente de natureza, paisagismo, moda com temática de
plantas e animais, e sabe-se lá mais o quê, a palavra passou a denotar o movimento
ativista voltado para a proteção ambiental, inclusive com conotações intelectuais e
artísticas, sociais e políticas.
Cabe notar que, dada a interação com as demais ciências, a Ecologia foi
escapando dos limites estritos das Biociências para ganhar novos parâmetros científicos,
em intercâmbio com outros saberes teóricos e práticos, de modo que hoje ela comporta
especializações interdisciplinares.
A nosso ver, tal definição está mais para a Ecologia Social do que para a
Ecologia como ramo das Biociências. Mas a superação de limites, que nela se entrevê, é
altamente elucidativa e provocante.
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um século e meio atrás, para pensar numa Ecologia holística em que as relações são
fortemente perturbadas pela espécie humana em detrimento do equilíbrio de toda a Terra.
Fugindo às formulações mais ortodoxas, tal definição apela para a
contribuição de outras ciências, e isso explica sua densidade de conteúdo. Segundo o
autor, a "ciência Ecologia" deve versar sobre as relações entre a sociedade moderna e a
natureza; explicitar com precisão as conseqüências das várias ações dos agentes sóciais
sobre a base natural do meio ambiente; e, por fim, analisando as relações causa-efeito,
colaborar na busca de soluções corretivas.
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ambiente nada mais é do que a expressão do patrimônio natural e as relações com e
entre os seres vivos. Tal noção, é evidente, despreza tudo aquilo que não diga respeito
aos recursos naturais.
Numa concepção ampla, que vai além dos limites estreitos fixados pela
Ecologia tradicional, o meio ambiente abrange toda a natureza original (natural) e artificial,
assim como os bens culturais correlatos. Temos aqui, então, um detalhamento do tema:
de um lado, com o meio ambiente natural, ou físico, constituído pelo solo, pela água, pelo
ar, pela energia, pela fauna e pela flora; e, do outro, com o meio ambiente artificial (ou
humano), formado pelas edificações, equipamentos e alterações produzidos pelo homem,
enfim, os assentamentos de natureza urbanística e demais construções. Em outras
palavras, quer-se dizer que nem todos os ecossistemas são naturais, havendo mesmo
quem se refira a "ecos sistemas sociais" e "ecossistemas naturais". Esta distinção está
sendo, cada vez mais, pacificamente aceita, quer na teoria, quer na prática.
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Isto é o ponto de partida para as diferentes ramificações técnico-
científicas da Ecologia, que servem de base para a gestão ambiental.
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artificial), numa visão inegavelmente antropocêntrica. Não sendo assim entendido, não
seria mais vago do que o referido enunciado!".
Este é, com efeito, o caso da legislação brasileira que tem sido objeto
destas considerações. Tanto a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente como as
disposições constitucionais anteriormente lembradas foram elaboradas, evidentemente,
numa época em que a preocupação com a qualidade e a quantidade dos recursos
naturais era predominante, ao passo que o aprofundamento científico, filosófico e social
do conceito de meio ambiente não havia alcançado, ainda, o nível do final dos anos 90,
ou seja, no término do século XX.
O Direito não atribui nem poderia atribuir autonomia aos seres irracionais,
porém ocupa-se deles, protege-os e dispõe sobre suas boas condições e o seu correto
uso e, desta forma, direta ou indiretamente ocupa-se da preservação do planeta Terra. É
o nosso Direito que se aplica aos "direitos" dos demais seres, especialmente os vivos, a
fim de garantir a harmonia na convivência planetária.
Sem embargo, o saber jurídico pode e deve ser iluminado pela luz de
outros saberes que contribuem para a consolidação do respeito ao mundo natural e para
a limitação das atitudes antropocêntricas, sabidamente danosas ao equilíbrio ecológico.
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Não é qualquer fim que está sendo levado em conta, mas apenas os fins
almejados naquela lei e que serão, posteriormente, explicados no próprio diploma legal.
Não obstante, os deveres e os direitos fundamentais de indivíduos e da coletividade da
espécie humana ficam explicitados e definidos no que se refere ao meio ambiente,
segundo a letra e o propósito da lei. Bem se vê que nosso legislador adotou um conceito
amplo e relacional de meio ambiente, o que, em conseqüência, dá ao Direito Ambiental
brasileiro um campo de aplicação mais extenso que aquele de outros países. "A definição
é ampla, pois vai atingir tudo aquilo que permite a vida, que a abriga e rege".
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2. A CRISE AMBIENTAL E O MOVIMENTO ECOLÓGICO
Num prazo muito curto - e que se toma sempre mais curto - são
dilapidados os patrimônios formados lentamente no decorrer dos tempos geológicos e
biológicos, cujos processos não voltarão mais. Os recursos consumidos e esgotados não
se recriarão. O desequilíbrio ecológico acentua-se a cada dia que passa.
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E assim chegamos ao estado atual, em que nossas ações chocam-se
contra nossos deveres e direitos, comprometendo nosso próprio destino. O renomado
historiador H. G. Wells registrou: "A história humana é cada vez mais uma corrida entre a
educação e o desastre". Este é o paradoxo existente nas relações do homem com a
Terra. As raízes da Questão Ambiental ficam expostas e interpelam a responsabilidade
dos seres humanos, inequívoca e intransferível. Todo o saber científico, contido nas
Geociências, nas Biociências e nas Ciências Humanas, fala da fragilidade do mundo
natural e da agressividade dominante. O Direito também conhece dessa responsabilidade
e dessa complexa realidade, em que se joga com o porvir incerto da oikos e de todos os
seus moradores, ou seja, da Terra e de tudo quanto nela se encontra.
Não há dúvida, pois, de que a questão ambiental, por esse prisma, é uma
questão de vida ou morte, de morte ou vida, estas, não apenas de animais e plantas, mas
do próprio homem e do Planeta que o abriga.
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percepção das nações ricas e industrializadas da degradação ambiental causada pelo seu
modelo de crescimento econômico e progressiva escassez de recursos naturais.
Esse quadro, observado aqui e alhures, como não poderia deixar de ser,
contribui poderosamente para a perda de identidade do homem com a natureza,
fomentando uma ruptura artificial entre ambos e repercutindo profundamente naquilo que
se convencionou chamar de qualidade de vida.
Sem dúvida, estamos abusando dos recursos da Terra. "Estamos nos
alimentando de porções que pertencem às gerações ainda não nascidas. Os filhos de
nossos filhos correm o risco de entrar neste mundo já carregando o peso da dívida criada
por seus antepassados."
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A oportunidade trazida pela conscientização de que essa desordem
ecológica talvez não produza vencedores pode representar o início de uma nova era de
cooperação entre as nações, visando à adoção de padrões adequados de utilização dos
recursos naturais.
Sachs contou com o apoio de Maurice Strong para a sua proposta, como
um "estilo do desenvolvimento possível". Para ele, cada ecorregião deve procurar
soluções específicas para os seus problemas particulares, de forma que, além dos dados
ecológicos, também os culturais possam ser levados em conta na satisfação das
necessidades imediatas da população interessada. Contudo, observa Mello e Souza, " ...
parece inexeqüível como programa geral (...) não é projeto de desenvolvimento, mas de
soluções econômicas locais".
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constituirá parte integrante do processo de desenvolvimento e não pode ser considerada
isoladamente deste".
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recursos dependem naturalmente de outros recursos. Sem essa sustentabilidade haveria
o comprometimento da própria biodiversidade, com a aceleração da sua perda,
culminando em riscos ao ecossistema planetário. Como se pode ver, a sustentabilidade
vai mais além dos destinos da espécie humana: ela alcança a perpetuação da vida e o
valor intrínseco da criação ou do mundo natural.
Por outro lado, "é importante considerar que a pobreza, o subconsumo
forçado, é algo intolerável que deve ser eliminado como uma das tarefas mais urgentes
da humanidade. A pobreza, a exclusão social e o desemprego devem ser tratados como
problemas planetários, tanto quanto a chuva ácida, o efeito estufa, a depleção da camada
de ozônio e o entulho espacial que se acumula ano a ano. Questões como essas estão no
cerne das novas concepções de sustentabilidade".
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políticos que têm acelerado a contra-sustentabilidade. No seu entender, apenas em torno
da década de 60 do século XX "surge a compreensão do problema em sua inteireza
complexa, exibindo a vinculação estrutural entre quatro variáveis relacionadas entre si,
funcionando, como máquina diabólica, para gerar a velocidade auto-sustentada dos
avanços destrutivos".
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1) Respeitar e cuidar da comunidade dos seres vivos: trata-se de um
renovado princípio ético, que reflete o dever de nos preocuparmos com as outras pessoas
e outras formas de vida. Embora nossa sobrevivência dependa do uso de outras
espécies, não precisamos e não devemos usá-Ias cruel ou perdulariamente. O modelo
são os próprios ecos sistemas naturais que se auto-regulam de maneira admirável.
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sociedade deve promover valores que apóiem esta ética, desencorajando aqueles que
são incompatíveis com um modo de vida sustentável. Deve-se disseminar informação por
meio da educação formal e informal, de modo que as atitudes necessárias sejam
amplamente compreendidas e conscientemente adotadas.
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Estes princípios, que estão longe de ser novos, são inter-relacionados e
se apóiam mutuamente. Refletem, em última análise, declarações a respeito de uma
eqüidade mundial de desenvolvimento sustentável e de conservação da natureza, como
um direito dela própria e como fator essencial para a sustentação da vida humana.
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"padrões" ou modelos de produção. É importante ressaltar, desde logo, que há um nexo,
uma espécie de "causação circular cumulativa", entre produção e consumo, que se
estimulam reciprocamente.
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A satisfação das necessidades humanas, de várias ordens, é um
imperativo natural, decorrência de mandamento inicial insculpido no Gênesis - "Crescei,
multiplicai-vos e dominai a Terra". Tal mandamento, que assumiu feições muito
características na civilização ocidental, herdeira das tradições judaico-cristãs, foi mal
entendido e é de extrema complexidade. Todavia, satisfazer as legítimas necessidades da
espécie humana, por força do contexto em que se insere o mandamento bíblico, não pode
ser dissociado do atendimento concomitante às necessidades do Planeta, necessidades
essas que, além de se explicarem sob o ponto de vista econômico e se reforçarem sob o
ponto de vista técnico-científico, hoje em dia podem ser, também elas, consideradas
legítimas, uma vez que reforçadas pela Ética e asseguradas pelo Direito Positivo em
explicitação do Direito Natural.
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O caminho a percorrer é longo e árduo, visto que estão emjogo os estilos
de vida e os modelos de civilização. Deixando de lado as muitas controvérsias a respeito,
poderíamos resumir a questão na economia e no uso racional de energia e matéria-prima,
assim como na conservação dos recursos naturais dentro das características essenciais
dos ecossistemas, de modo que a demanda sobre eles se contenha dentro dos limites da
capacidade dos mesmos ecos sistemas para se regenerarem e auto-regularem. O
processo produtivo não tem outra fonte de insumos, de tal sorte que, valendo-nos de uma
expressão popular, o meio ambiente é como a "galinha dos ovos de ouro".
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A poluição do ar, especialmente a urbana por monóxido de carbono, por
exemplo, é, em grande parte, causada por emissões decorrentes da utilização de 500
milhões de automóveis que foram licenciados no mundo entre 1950 e 2000; ou seja, os
consumidores são diretamente responsáveis. Segundo estudos recentes do GEMS/AIR
da ONU, aproximadamente 900 milhões de pessoas estão expostos a níveis prejudiciais
de óxidos sulfúricos, e mais de um bilhão é atingido por níveis desaconselháveis de
partículas, pondo em risco suas vidas. No Brasil, onde a utilização de fertilizantes e
pesticidas é das mais altas do mundo - refletida na casa dos US$ 2,5 bilhões anuais -, a
taxa de internação de trabalhadores é igualmente muito alta, uma vez que 57% dos
rurícolas intoxicados não recebem orientação técnica antes da aplicação daqueles
produtos.
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Segundo a Organização Mundial para a Alimentação e Agricultura (FAO),
a produção de pescado no mundo, que estava em 19 milhões de toneladas anuais em
1970, chega hoje a mais de 80 milhões de toneladas/ano nos oceanos, às quais devem
ser acrescidas quase 50 milhões de toneladas advindas das aqüiculturas. Com o aumento
da captura, 50% dos estoques marinhos já se esgotaram e 25% estão sobreexplorados.
A erosão, por seu turno, não só afeta as necessidades crescentes dos
consumidores de alimentos, como, da mesma forma, é afetada por essas mesmas
necessidades.
A devastação florestal, por igual, está diretamente relacionada com um
certo modelo de consumo que prioriza a utilização de madeira. Basta lembrarmos que 1,7
bilhão de metros cúbicos de madeira foram coletados em 1989, para outros fins que não a
combustão.
Finalmente - e fiquemos com esses poucos mas significativos exemplos -
a produção de lixo, tóxico ou não, cresce na proporção do consumo de bens ou produtos
e serviços, fatores estes que tendem a aumentar.
Por isso mesmo, parece-nos que uma pesquisa mais atenta da Carta
Magna e de certos textos legislativos indica que o consumo sustentável, mesmo sem este
batismo, está, ainda que de forma assistemática e dispersa, tratado pelo legislador.
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O legislador, inicialmente, dá, como pressuposto de legitimidade da
proteção do meio ambiente e do consumidor, o mesmo fundamento: a qualidade de
vida33 e a dignidade humana.
Muitas vezes se faz menção ao uso dos recursos ambientais, o que, num
vocabulário mais próximo da nossa preocupação, quer dizer consumo.
BIBLIOGRAFIA:
MILARÉ, Édis, Direito do Ambiente: Doutrina, Jurisprudência, Glossário; 3ª Ed. SP: Ed. Revista dos
Tribunais, 2004
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