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Susanna Pozzolo**
Recebido para publicação em agosto de 2005
Resumo: Apresentarei uma breve introdução sobre a noção de neoconstitucionalismo. A isso seguirá a análise
de alguns pontos especialmente interessantes e problemáticos sobre os quais se confrontam os opostos susten-
tadores do jurispositivismo e neoconstitucionalismo. No ponto 1.1 desenvolverei algumas considerações sobre
o modelo preceptivo e sobre sua relação entre direito e moral. No ponto 1.2 apresentarei algumas considerações
sobre o modelo preceptivo e sobre a tese da especificidade da interpretação constitucional. No ponto 1.3 de-
senvolverei algumas considerações sobre a ponderação dos princípios constitucionais. No ponto 2 apresentarei
algumas considerações conclusivas, argumentando a favor de uma diferente configuração do papel da jurisdição
no sistema das fontes (nos países de direito codificado). A tese que pretendo defender com essa análise afirma
que as exigências interpretativas perseguidas pela doutrina neoconstitucionalista são intimamente dependentes
da forma em que ela concebe a constituição, por nada objetivas. Em segundo lugar, os meus argumentos serão
dirigidos também à crítica da proposta neoconstitucionalista pela perspectiva do constitucionalismo garantista.
Palavras-chave: Interpretação. Constituição. Princípio.
Riassunto: Proporrò una breve introduzione sulla nozione di neocostituzionalismo. A ciò farà seguito l’analisi
di alcuni punti particolarmente interessanti e problematici sui quali si confrontano gli opposti sostenitori di
giuspositivismo e neocostituzionalismo. Nel punto 1.1. svolgerò alcune considerazioni sul modello precettivo
e sul rapporto fra diritto e morale. Nel punto 1.2. svolgerò alcune considerazioni sul modello precettivo e sulla
tesi della specificità dell’interpretazione costituzionale. Nel punto 1.3. svolgerò alcune considerazioni sulla
ponderazione dei principi costituzionali. Nel punto 2. svolgerò alcune considerazioni conclusive, argomentando
a favore di una diversa configurazione del ruolo della giurisdizione nel sistema delle fonti (nei paesi a diritto
codificato). La tesi che intendo suffragare con tale analisi afferma che le esigenze interpretative avanzate dalla
dottrina neocostituzionalista sono strettamente dipendenti dalla forma in cui essa concepisce la costituzione e
per nulla oggettive. In secondo luogo, i miei argomenti saranno diretti anche alla critica della proposta neocos-
tituzionalista dalla prospettiva del costituzionalismo garantista.
Parole chiave: Interpretazione. Costituzione. Principi.
Abstract: I will propose a short introduction on the knowledge of neoconstitutionalism. It will be followed by
the analysis of a few points particularly interesting and problematic which the opposites supportive of legal po-
sitivism and neoconstitutionalism are compared on. In the point 1.1. I will develop a few considerations on the
preceptive model and on the connection between law and moral. In the point 1.2. I will develop a few considera-
tions on the preceptive model and on the thesis of the specificity of the constitutional interpretation. In the point
1.3. I will develop a few considerations on the balancing (ponderazione) of the constitutional principles. In the
point 2. I will develop a few (partial) conclusive considerations, deducing in favor of a different configuration
of the role of the jurisdiction in the system of the sources of law (in civil law systems). The thesis I intend to
support with such analysis claims that the interpretative demands advanced by the neoconstitutionalism doctrine
are tight dependent from the form in which it conceives the constitution and for nothing objective. In second
place, my subjects will be directed also to the criticism of the neoconstitutionalist proposal by the perspective
of the constitutionalism as guarantor of liberties and rights.
Key Words: Interpretation. Constitution. Principles.
*Tradução do italiano para português por Juliana Salvetti, revisto por Marcelo Lamy e Luiz Carlos de Souza Auricchio.
**Ricercatore in Filosofia del diritto presso la Facoltà di Giurisprudenza dell’Università degli Studi di Brescia (Indirizzo: via
del Camoscio 10/7, 16142 Genova (Italia), tel: 00 39 010 8376591-cellulare 0039 347 4140485; email:susanna.pozzolo@giuri.
unige.it; pozzolo@jus.unibs.it)
modo de interpretar a constituição está in- reflexão e uma crítica que, às vezes, pro-
timamente ligado ao modo de concebê-la, vinha do mesmo positivismo jurídico e,
ou seja, a metodologia interpretativa e as outras vezes, de áreas teóricas aparente-
exigências interpretativas interligadas não mente próximas e não opostas. No mundo
dependem de uma configuração, por assim anglo-saxão, em especial, foi uma crítica
dizer, neutra, objetiva ou verdadeira, mas dworkiniana que colocou em dificuldade
sim da específica reconstrução neoconsti- o sofisticado positivismo hartiano, dando
tucionalista. Particularmente eles derivam vida a um intenso debate em torno da dico-
da adoção do modelo preceptivo da cons- tomia positivismo inclusivo - positivismo
tituição como norma. Não compartilho, exclusivo (ESCUDERO, 2004).
portanto, da tese daqueles que individua- Na área dos países de civil law as
lizam um modelo institucional essencial- vozes críticas são mais diversificadas, mas
mente neoconstitucionalista, se não como tudo somado convergem sobre uma tese
produto interpretativo-reconstrutivo com de fundo que consiste na afirmação da in-
base em certas assunções ideológicas-po- compatibilidade entre positivismo jurídico
líticas relativas à constituição. Ocorre, to- e constitucionalismo contemporâneo: essa
davia, lembrar-se que a afirmação de uma última crítica e a doutrina que a sustenta
concepção da constituição (no nosso caso
foi denominada neoconstitucionalismo
neoconstitucionalista) determina certas
(POZZOLO, 1997, 2001).
exigências interpretativas e o uso de téc-
A crítica neoconstitucionalista indi-
nicas particulares (por exemplo, a ponde-
vidualiza na teoria e na metodologia do
ração dos valores) que se tornam exercício
positivismo jurídico uma ligação incin-
compartilhado e nesse modo contribuem
dível com o estado de direito do século
para redesenhar ou reconfigurar o objeto
VIII, assim sendo, com a supremacia da
interpretado (a constituição). Nesse sen-
tido, tais práticas acabam conformando o lei ordinária do sistema das fontes, com a
estado de direito constitucional, tornando- supremacia da vontade do legislador sobre
o conforme as assunções das concepções a justiça. Essa ligação e tudo que a segue
de partida, ou seja, a concepção acaba de- tornariam inadequado o juspositivismo
terminando uma certa percepção da reali- para enfrentar o direito do estado constitu-
dade por parte dos operadores, portanto, cional. Direito que seria caracterizado:
endereçam-lhes as praxes, e, finalmente, 1 - Pela supremacia da constituição
reconfigura a própria realidade onde eles sobre a lei ordinária;
operam: os ordenamentos contemporâneos 2 - Pela subordinação da vontade le-
estão quase todos envolvidos em um pro- gislativa aos conteúdos de justiça constitu-
cesso de constitucionalização (no sentido cionalmente previstos (a constituição não
de Guastini). constitui um mero invólucro político e de
Diversos são os aspectos aptos para inspiração para o sistema e nem ao menos
caracterizar o neoconstitucionalismo como um simples grau superior de formalidade,
doutrina da interpretação constitucional. mas introduz um vínculo substancial à
Entre esses, aquele central que consiste na criação do direito positivo);
peculiar e específica crítica que os autores 3 - Pela rigidez;
subsumíveis, sob esse apelativo, retornem 4 - Pela garantia da constituição
ao positivismo jurídico. Esse último, mui- (PRIETO SANCHES, 2003, pp. 112-117).
tas vezes e em diversos modos criticado e A capacidade penetrante que caracteriza o
elogiado, viu em anos recentes surgir uma texto constitucional, permeado de princípios
locução ‘a lei é lei’. Isso, porém, é somente ponderação, assumindo uma e outra como
um artifício retórico, é necessário de fato es- técnicas interpretativas. A primeira, consi-
clarecer a ambigüidade de tal locução, caso derada, com razão ou não, própria do jus-
venha ser retirada do contexto histórico em positivismo, seria refletida e concebida por
que nasceu. No âmbito de uma sociedade um direito formado exclusivamente por
constitucional-democrática-pluralista tal lo- regras; a segunda, não empregando ins-
cução pode ser interpretada pela perspectiva trumentos rigorosamente dedutivos, mas
positiva do garantismo legislativo. Se a au- somente instrumentos eqüitativos mais
tonomia e a liberdade são valores e o direito flexíveis, ou de raciocínio prático, seria
um ‘mal necessário’, a afirmação do valor aquela própria de um direito composto
da lei torna-se uma garantia contra as impo- (também) de princípios, seria, de fato, di-
sições morais de quem quer que seja. ‘A lei rigida a equilibrar os valores, levando em
é lei’, em suma, pode representar uma pres- conta as exigências de justiça erguidas por
crição restritiva da liberdade interpretativa cada caso concreto.
do juiz, uma interpretação que, fazendo re- Não está claro o que sejam os princí-
ferência ao significado comum das palavras, pios, o que denote e como conote o termo
restringe o âmbito dispositivo da interpreta- ‘princípio’ (para uma panorâmica sobre
ção judicial. Isso pode parecer um defeito esse ponto, consultar POZZOLO, 2001 e
quando a solução legislativa não satisfaz o
bibliografia indicada). Seguramente, são
senso de justiça, e freqüentemente nesses
um tipo de norma, mas distintos são os
casos os juízes configuram a existência de
modos para caracterizá-los. Nem ao me-
uma lacuna axiológica. Mas é necessário
nos está claro o que exija a ponderação (ou
fazer uma particularização. Existe diferença
balanceamento), ou seja, quais são as suas
entre o caso em que seja judicialmente pre-
características. Todavia, podem ser desen-
vista uma exceção ao ditado legislativo em
base de uma consideração abstrata da lei e volvidas algumas considerações sobre es-
o caso em que a exceção seja construída em ses aspectos.
base de uma consideração concreta da lei: Sobre a oposição subsunção/ponde-
no primeiro caso, a exceção permanecerá ração como técnicas interpretativas nota-
também para os casos futuros (satisfazendo se o que se segue.
o princípio de igualdade e de certeza), mas a) A ponderação (ou balanceamento)
não no segundo. tipicamente se aplica para conflitos entre
normas (princípios) não solucionáveis
1.3 Neoconstitucionalismo e ponderação através dos tradicionais critérios de so-
dos princípios. lução das antinomias: trata-se de normas
do mesmo nível hierárquico (quando não
A dimensão constitucionalística do é aplicável o critério da lex superior), en-
direito do estado constitucional derivaria tre as quais não se verifica uma relação
da introdução dos princípios no sistema de especialidade (quando não é aplicável
jurídico. E seria justamente a interpretação o critério da lex specialis), contemporâ-
dos princípios constitucionais a pretender nea entre elas (quando não é aplicável o
uma aproximação e uma metodologia dife- critério da lex priori), caracteristicamente
rentes daqueles positivísticos, em particu- normas ou princípios constitucionais (do
lar, seria diferente a sua interpretação. balanceamento constitucional faz parte
O argumento neoconstitucionalis- ainda um terceiro elemento, constituí-
ta opõe à técnica da subsunção aquela da do pela norma da qual deve ser julgada a
caso concreto que conduziria a uma aplica- Nesse modo, a premissa maior da decisão
ção dúctil da normativa, ou seja, permitiria judicial seria constituída pela reformulação
também uma decisão contra legem. Nesse de um princípio que leva em conta uma
sentido, porém, a configuração do caso pa- normativa complexa, obtida para explicitar
receria determinar a construção da norma: condições de aplicação precedentemente
é necessário então notar que se é o caso implícitas. O resultado, portanto, é uma
individual que determina a identificação da nova norma ou um novo princípio solicita-
norma ou do princípio, ou seja, a sua for- do pelas circunstâncias do caso.
mulação ou o seu conteúdo, é difícil sus- No primeiro caso, na reconstrução da
tentar que seja aquela ou aquele que regule ponderação como hierarquização axiológi-
o caso, já que não preexistiriam à solução. ca entre princípios, a teoria ética com base
Sobre a natureza dos princípios e na qual, segundo o neoconstitucionalismo,
sobre a solução das antinomias daqueles deve operar o intérprete, incide sobre a
gerados observa-se o que se segue: aplicação: o sentido da norma, o sentido
a) Segundo uma certa reconstru- dos princípios é invariável e constante, não
ção (por exemplo, GUASTINI, 2004) a muda com as circunstâncias do caso; aqui-
ponderação daria lugar a uma hierarquia lo que muda é a sua relação de força ou de
axiológica móvel entre princípios. O intér- hierarquia com base em propriedades que
prete atribuindo significado aos princípios emergem do caso concreto.
em conflito daria a eles um certo peso ou No segundo caso, na reconstrução
valor instituindo entre eles uma relação de da ponderação como solução de um con-
precedência que vale para o caso concre- flito entre normas defectíveis, a teoria
to. Observada por essa perspectiva, a pon- moral com base na qual se encontraria a
deração incide ainda sobre a aplicação da operar o intérprete, parece incidir sobre o
norma, mas não sobre sua interpretação. significado da norma, sobre o sentido dos
Nesse caso, baseando-se em proprieda- princípios: se as normas jurídicas (os prin-
des relevantes externas à formulação dos cípios) são defectíveis e as razões morais
princípios, propriedades determinadas podem modificar o antecedente, então são
pelo caso concreto, o intérprete atribui as razões morais que serão universais e
maior peso ou valor ou força a um deles constantes, enquanto aquelas jurídicas são
que regulará o caso. A requisição de ope- somente auxiliares.
rar segundo eqüidade incide, justamente, O juízo de ponderação, que resolve
sobre a aplicação dos princípios que serão o conflito entre princípios constitucionais,
aplicados seguindo um critério de raciocí- representa metaforicamente o estabeleci-
nio eqüitativo. Nessa perspectiva, todavia, mento de pesos diferentes aos princípios
a formulação dos princípios não depende para determinar qual deles tem maior força
das circunstâncias do caso, desse depende (MORESO, 2002); esse juízo caracteriza-
a sua hierarquização. se por estender a uma antinomia concreta,
b) Segundo uma outra perspectiva ou seja, sobre uma contradição entre duas
(por exemplo: MORESO, 2002, 2002 b), normas entre cujas classes de ações regula-
a ponderação cairia sobre normas defectí- das não existe vínculo conceitual, mas que
veis; o conflito seria resolvido através da no caso específico mostram-se ambas apli-
introdução de novas condições de aplicação cáveis, regulando de modo distinto a ação
no antecedente, modificando o conteúdo do objeto de juízo. Os princípios são ambos
princípio e não somente a sua formulação. válidos, ocasionalmente as suas áreas de
aplicação se sobrepõem e tal antinomia dos quais pode ceder frente ao outro. Seria
deve ser resolvida sem expulsar nenhum por isso um conflito prático sem solução.
deles do sistema. Enquanto que concebidos como normas
As dificuldades surgem porque nesse defectíveis, isso permite uma solução ra-
quadro não parece possível prever antecipa- cional dos conflitos entre direitos funda-
damente os casos de contradição de modo mentais” (COMANDUCCI, 2003, p. 328).
a definir um critério estável de solução ou Celano, todavia, destacou que somente de-
precedência. Isso obviamente determina monstrando a estabilidade das revisões dos
diversos problemas, mesmo institucionais, princípios defectíveis, conseqüentemente
colocando em discussão o conhecimento a sua definitiva transformação em deveres
ex ante do direito positivo, o equilíbrio en- condicionais indefectíveis, seria possível
tre as funções legislativa e jurisdicional, o refutar o particularismo (CELANO, 2002
papel próprio da jurisdição. É, de fato, o b). Mas se existem razões éticas-políticas
debate em torno do juízo de ponderação ou, para considerar defectíveis dois princípios
melhor ainda, em torno do modo de resol- constitucionais em conflito, por que essas
ver os conflitos entre princípios constitu- mesmas razões não deveriam ser consi-
cionais deriva do fato que aqui não parece deradas nos casos de conflitos entre prin-
ser oferecida uma solução razoavelmente cípios constitucionais revistos? Por que
fundamentada e controlável. O ponto, en- essas razões jogam um papel na primeira
tão, é como evitar a conclusão que o resul- revisão e não deveriam jogá-lo mais nas
tado da atividade ponderativa, seja para ser sucessivas?
considerado como meramente subjetivo e Seja concebida a ponderação como
particularista, ou seja, “não [possa] ser jus- instituição de uma hierarquia axiológica
tificado e, nessa acepção, que os conflitos móvel que resolve um conflito entre prin-
entre princípios constitucionais não [pos- cípios, seja concebida como reformulação
sam] ser resolvidos em um modo racional- de normas defectíveis, persiste o problema
mente controlável: [senão] a sua motivação do controle da motivação da decisão. Tal
não estaria sujeita a controle” (MORESO, controle poderá ser desenvolvido sobre a
2002, p.206). A idéia de Moreso é aquela congruência do raciocínio, da razão, mas
de tornar racionalmente controlável e pre- certamente isso torna palpável o poder
visível a solução do conflito entre princí- dispositivo em mão dos intérpretes e co-
pios através da sua revisão, que permane- loca em discussão o papel da jurisdição no
ce sujeita a múltiplos vínculos, para obter esquema tripartite do poder no estado de
como resultado a produção de duas normas direito constitucional.
compatíveis. Como explica Comanducci, A proposta de Moreso é interessante
“As razões, que parecem impelir Moreso também porque me parece indicar um per-
a configurar os princípios constitucionais curso, necessariamente jurisprudencial, de
que conferem direitos fundamentais como especificação e articulação daquelas pro-
normas defectíveis, são de ordem ética po- priedades relevantes, implícitas na formu-
lítica. Se concebêssemos (e aplicássemos) lação dos princípios, que poderiam consti-
os princípios constitucionais como normas tuir uma complexa grade de condições de
indefectíveis, seriam produzidos, na fase aplicação em grau de circunscrever, certo
da sua aplicação, conflitos práticos insaná- que sempre parcialmente, o poder disposi-
veis: no sentido que teríamos dois princí- tivo dos intérpretes, constituindo também
pios constitucionais em conflito, nenhum limite à argumentação interpretativa. A
proposta, em suma, registra de qualquer dade que deve ser considerada no momen-
maneira um movimento já em ato, mas to de decidir um caso, um quadro diferente
creio que sugira ainda a adoção de um ide- é obtido. Desse modo o princípio não res-
al regulador ao longo do qual se moveria ponde à pergunta sobre como se deva agir
a jurisprudência. Isso tudo que ela põe às em um determinado caso, mas indica uma
claras, realmente, é o papel mudado que se propriedade que invariavelmente deverá
encontra para desenvolver a jurisdição no ser levada em conta para definir qual o
direito contemporâneo. Voltarei ao assunto comportamento deve entrar em ação.
nas conclusões. Na hipótese que no caso C possam
Sobre princípios e as razões para ser aplicados os diferentes princípios A e
agir pode-se notar o que se segue. B, estaremos frente a um conflito se assu-
A noção de defectibilidade não é míssemos os princípios como tipo de re-
desprovida da ambigüidade (REDONDO, gra; a solução justificada será obtida com
2005): uma norma pode ser defeated em a revisão do princípio o qual será aplicado
duas maneiras diferentes e com diferen- tornando-o compatível com outro preteri-
tes implicações no plano da concepção do.
da norma. Uma norma pode ser defeated Mas se assumíssemos princípios
porque vem modificadas as suas condições como dois deveres incondicionais inde-
de aplicação: seja modificado o antece- fectíveis que indicam a relevância de duas
dente da norma e, portanto, o conteúdo da propriedades diferentes e contrastantes
própria norma; em tal caso nos encontra- pelas quais será necessário ter atenção,
ríamos dentro de uma concepção particu- não nos encontraríamos necessariamente
larista das razões para agir. Uma norma perante a um conflito. Os princípios pode-
pode ser defeated porque a ela é assinalado riam ser vistos como deveres que não indi-
um peso menor em relação a uma outra, cam o comportamento que deve ser man-
mas sem que se modifique o conteúdo de tido em um determinado caso, mas como
qualquer das duas normas; nesse caso nos deveres dirigidos ao intérprete que deverá,
encontraríamos dentro de uma concepção sempre e invariavelmente, considerar no
universalista das razões para agir. momento de solucionar o caso e do qual
Se concebermos os princípios como deverá ser responsável. Os princípios não
uma espécie de regras aptas para regular o indicariam a solução do caso, mas somente
caso concreto, pede-se a elas que respon- a exigência de considerar invariavelmente
dam a seguinte pergunta “Como devo agir o dever neles indicado; os princípios im-
nesse caso?”. A essa pergunta dá a resposta poriam, portanto, o dever ao intérprete de
Moreso, que parece ainda satisfazer exigên- oferecer uma justificação da relevância a
cias de garantia: transformando o princípio eles atribuída. É claro que nesse panorama,
em uma norma indefectível explicitam-se ao intérprete é explicitamente atribuído um
suas condições implícitas e determina-se notável poder dispositivo, mas ao mesmo
o direito. Todavia, isso funciona somente tempo ele é explícito e em uma certa me-
na medida em que o princípio reformulado dida controlável por se basear em critérios
não esteja efetivamente submetido a uma de racionalidade, razão e congruência. A
nova revisão. solução e a justificação produzidas serão e
Se concebermos os princípios como deverão ser sobrepostas a uma crítica ex-
normas pro tanto, ou seja, como normas terna baseada em argumentos de justiça, a
que indicam a relevância de uma proprie- pretensão de justiça será sempre meramen-