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ESOCIAL - UM FISCAL QUE NUNCA DORME

Sergio Ferreira Pantaleão

A falta de Auditor Fiscal para atender toda a demanda quanto à fiscalização das empresas sobre o atendimento das
normas trabalhistas, previdenciárias, bem como do recolhimento do FGTS e do Imposto de Renda, era uma grande
dificuldade enfrentada pelos órgãos fiscalizadores como Ministério do Trabalho, Previdência Social, Caixa Econômica
Federal e Receita Federal.

Normalmente as fiscalizações ocorriam por conta de denúncias de irregularidades cometidas pelas empresas em razão
da indicação do próprio órgão fiscalizador, por falta de recolhimento de encargos sociais por longo período, por conta
de denúncia junto ao Ministério Público do Trabalho ou decorrentes de reclamações trabalhistas.

Além do número de Auditor Fiscal ser insuficiente para atender toda a demanda,  quando a fiscalização acontecia, a
morosidade era outro empecilho, já que o tempo que um auditor fiscal levava para fazer uma fiscalização no ambiente
da empresa era relativamente considerável, pois muitas das obrigações eram comprovadas por meio físico, exigindo a
análise de documentos pessoais de trabalhadores, relatórios de folha de pagamento e de cartão ponto, guias de
recolhimentos e comprovantes de pagamentos bancários, dentre outros.

Com isso, as empresas ganhavam tempo para regularizar situações pontuais como falta de anotação da CTPS, falta
de exame médico admissional ou atraso na assinatura do contrato de trabalho, por exemplo, problemas estes que
poderiam ser solucionados depois de 10, 20 ou até 30 dias após o empregado já ter iniciado suas atividades, sem que
isso representasse (na prática) uma multa para o empregador.

Com o eSocial esta situação se inverte completamente, já que não só as obrigações devem ser cumpridas no prazo
legal, como devem ser informadas eletronicamente ao eSocial, sob pena da empresa incorrer em multa.

A grande diferença é que o eSocial é um "fiscal que nunca dorme", pois como funciona de forma online e 24h por dia,
as empresas estão mais expostas, e qualquer atraso ou erro na informação, já é o suficiente para que acenda o alerta
vermelho do respectivo órgão fiscalizador ou até aplique a multa prevista legalmente.

A título de exemplificação, podemos citar algumas das obrigações que, até então, passavam desapercebidas pelas
empresas, ou simplesmente eram praticadas sem se ater aos potenciais riscos de serem multadas, conforme abaixo:

Obrigação Evento Comentários


Os valores pagos em folha de pagamento devem ser informados através das
rubricas, as quais obrigatoriamente devem constar as incidências
tributárias. 
Parametrizaç
ão das S-1010 - Com o eSocial não é possível pagar um determinado valor isolado, sem
rubricas da Tabela de que o mesmo esteja enquadrado nas regras de incidências de encargos
folha de Rubricas previstos no eSocial.
pagamento
Se há pagamento de determinada verba que exige a apuração de encargos e
a empresa não o faz, automaticamente o eSocial acusa apuração a menor de
contribuição previdenciária ou imposto de renda.
A realização de mais de 2 horas extras diárias gera a multa prevista no art.
S-1200 59 da CLT. 
- Remuneraçã
Horas extras
o de Embora a informação no citado evento seja apenas do total de horas do
além das 2
trabalhador
mês (sem a necessidade do envio do controle diário do ponto), se a soma
horas diárias
vinculado ao
das horas extras for superior à média de 2 horas por dia, pode ensejar a
RGPS suspeita de realização de horas extras além da máxima diária prevista,
ensejando o descumprimento do referido artigo da CLT.
Admissão do S-2200 - O eSocial estabelece que a admissão do empregado seja informada até o
Empregado Cadastramento dia imediatamente anterior ao do início da prestação de serviços, salvo na
Inicial do admissão por transferência, cujo prazo é até o dia 15 do mês subsequente.
Vínculo e
Admissão / Nos termos do art. 47 da CLT, o empregador que mantiver empregado sem
Ingresso do registro está sujeito a multa de R$ 3.000,00 (por empregado), ou de R$
Trabalhador 800,00 (no caso de ME e EPP).
O intervalo para refeição (intrajornada) não concedido deve ser informado
através da rubrica 1006. 
Intervalo intr S-1200 -
Se as informações desta verba forem prestadas de forma reiterada ao
ajornada Remuneração
eSocial, a empresa estará atraindo o risco de eventual fiscalização, já que
(natureza de trabalhador
estará infringindo o art. 71 da CLT, cuja norma retrata uma obrigação de
indenizatória vinculado
natureza da saúde e segurança do trabalho. 
) ao RGPS
Tal verba, nos termos do art. 71 § 4º, tem natureza indenizatória e implica
no pagamento apenas do período suprimido.
O intervalo entre jornadas (interjornada) não concedidas de acordo com o
S-1200 - art. 66 da CLT devem ser informadas ao eSocial. 
Remuneração
Intervalo
de trabalhador Neste caso, como a CLT não estabelece se o intervalo interjornada
Interjornada
vinculado ao suprimido tem natureza indenizatória, entende-se que teria natureza
RGPS remuneratória, com incidência de todas as repercussões legais de uma hora
extra, atraindo também os riscos de eventual fiscalização.
A contribuição da assistência médica da empresa (não relativo a
Participação S-1200
vencimento ou desconto), relativo à assistência prestada por serviço
da empresa - Remuneraçã
médico ou odontológico, próprio da empresa ou por ela conveniado, como
nos valores o de
benefício ao trabalhador, ao ser informado ao eSocial deve ser
pagos de trabalhador
parametrizado como sem incidência de encargos, sob pena de a empresa
plano de vinculado ao
descontar valores indevidos ou contribuir indevidamente para a
saúde RGPS
Previdência Social ou para o Imposto de Renda.
A frequência e os valores pagos a título de PLR deve seguir o que
S-1200 - determina a Lei 10.101/2000, pois eventuais valores pagos de forma
Participação
Remuneração desproporcional à renda de um ou outro empregado, pode gerar
nos Lucros
de trabalhador questionamentos pela Receita Federal, sob o entendimento de que aquele
ou
vinculado ao valor se trata de uma verba remuneratória ou outro rendimento que não a
Resultados
RGPS PLR, incidindo assim a contribuição previdenciária e o Imposto de
Renda normal.

As empresas precisam ficar atentas para que, situações como as acima mencionadas, não sejam alvos de auto de
infração ou de um Termo de Ajustamento de Conduta - TAC.

Pensar que tudo está informatizado e "qualquer um" que sabe apertar o botão poderá ser responsável pelo envio das
informações ao eSocial, pode ser um tiro no pé. Ter profissional qualificado que possa garantir a integração das
informações entre os setores, bem como cumprir com assertividade esta nova obrigação acessória, poderá minimizar os
riscos de autuação, diminuir retrabalho, bem como reduzir o passivo trabalhista.

Se atualmente a empresa só sofre fiscalização quando um Agente Fiscal da Receita Federal ou do Ministério do
Trabalho comparece in loco e pede para ver os comprovantes de recolhimentos de encargos ou dos registros dos
trabalhadores, com o eSocial a fiscalização tende a ser sistemática e automatizada, na grande maioria das vezes sem a
necessidade da presença do fiscal no ambiente da empresa. 

Isto porque não há como a empresa prestar as informações previstas no eSocial sem deixar um rastro, uma pista de
inconformidade, já que tanto a empresa pode se autodenunciar, assim como outras empresas ou prestadores de
serviços, ao prestarem suas informações, poderão indicar que a empresa tomadora de serviços deixou de cumprir com a
obrigação principal ou mesmo a acessória.

Sergio Ferreira Pantaleão é Advogado, Administrador, responsável técnico pelo Guia Trabalhista e autor de obras na área trabalhista e previdenciária .

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