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planejamento escolar consiste numa atividade de previsão da ação a

O ser realizada, implicando definição de necessidades a atender, obje­


tivos a atingir dentro das possibilidades, procedimentos e recursos a serem
empregados, tempo de execução e formas de avaliação. O processo e o exer­
cício de planejar referem-se a uma antecipação da prática, de modo a prever
e programar as ações e os resultados desejados, constituindo-se numa ativi­
dade necessária à tomada de decisões. As instituições e organizações sociais
precisam formular objetivos, ter um plano de ação, meios de sua execução
e critérios de avaliação da qualidade do trabalho que realizam. Sem planeja­
mento, a gestão corre ao sabor das circunstâncias, as ações são improvisadas,
os resultados não são avaliados.

O planejamento se concretiza em planos e projetos, tanto da escola e


do currículo quanto do ensino. Um plano ou um projeto é um esboço, um
esquema que representa uma ideia, um objetivo, uma meta, uma sequência
de ações que irão orientar a prática. A ação de planejar subordina-se à natu­
O planejamento escolar atende, em geral, às seguintes funções:

° Diagnóstico e análise da realidade da escola: busca de informações reais e


atualizadas que permitam identificar as dificuldades existentes, causas que
as originam, em relação aos resultados obtidos até então.

• Definição de objetivos e metas compatibilizando a política e as diretrizes


do sistema escolar com as intenções, expectativas e decisões da equipe da
escola.

0 Determinação de atividades e tarefas a serem desenvolvidas em função


de prioridades postas pelas condições concretas e compatibilização com
os recursos disponíveis (elementos humanos e recursos materiais e finan­
ceiros).

O processo de planejamento inclui, também, a avaliação dos processos e


resultados previstos no projeto, tendo em vista a análise crítica e profunda do
trabalho realizado e a reordenação de rumos.

O projeto pedagógico-curricular características gerais


O projeto pedagógico-curricular é a concretização do processo de pla­
nejamento. Consolida-se num documento que detalha objetivos, diretrizes
e ações do processo educativo a ser desenvolvido na escola, expressando a
síntese das exigências sociais e legais do sistema de ensino e os propósitos e
expectativas da comunidade escolar. De certo modo, o projeto pedagógico-
curricular é tanto a expressão da cultura da escola (cultura organizacional)
como sua recriação e desenvolvimento. Expressa a cultura da escola porque
ele está assentado nas crenças, valores, significados, modos de pensar e agir
das pessoas que o elaboram. Ao mesmo tempo, é um conjunto de princípios

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se ter resultados bons. Com isso, o planejamento curricular se restringia à se­
mana de planejamento realizada no início do ano, depois não se mexia mais
a não ser no ano seguinte.

O projeto pedagógico-curricular deve ser compreendido como instru­


mento e processo de organização da escola. Considera o que já está insti­
tuído (legislação, currículos, conteúdos, métodos, formas organizativas da
escola etc.), mas tem também uma característica de instituinte. A caracterís­
tica de instituinte significa que o projeto institui, estabelece, cria objetivos,
procedimentos, instrumentos, modos de agir, estruturas, hábitos, valores,
ou seja, institui uma cultura organizacional. Nesse sentido, ele sintetiza os
interesses, os desejos, as propostas dos educadores que trabalham na escola,
respondendo a estas perguntas:

• Que tipo de escola, nós, profissionais desta escola, queremos?

0 Que objetivos e metas correspondem às necessidades e expectativas desta


comunidade escolar?

8 Que necessidades precisamos atender em termos de formação dos alunos


e alunas para a autonomia, cidadania, participação?

0 Como faremos para colocar o projeto em permanente avaliação, dentro


da prática da ação-reflexão-açâo?

Considerando o caráter processual do planejamento, o projeto é avaliado


ao longo do ano letivo para verificar se as ações estão correspondendo ao que
foi previsto, se as metas precisam ser alteradas em função de fatos inesperados,
de forma a corrigir desvios, tomar novas decisões e replanejar o rumo do tra­
balho. Todo projeto é, portanto, inconcluso. Isso é assim porque as escolas são
instituições marcadas pela interação entre pessoas, pela sua intencionalidade,
pela interligação com o que acontece no mundo exterior (na comunidade,
no país, no mundo), o que leva a concluir que as situações de ensino não se
repetem, as escolas não são iguais. Por isso é que se diz que as organizações são
sempre construídas e reconstruídas socialmente.

A escola que conseguir elaborar e executar, num trabalho cooperativo,


seu projeto pedagógico-curricular, dá mostras de maturidade de sua equipe,
de bom nível de desenvolvimento profissional dos seus professores, de capa­
cidade de liderança da direção e de envolvimento da comunidade escolar. A
elaboração e execução do projeto pedagógico-curricular, nestes termos, é a
melhor demonstração de autonomia da equipe escolar e uma oportunidade
de desenvolvimento profissional dos professores.

Atente-se que o projeto pedagógico-curricular não pode ser confundido


com a organização escolar nem substitui a gestão. São duas coisas diferentes.
O projeto é um guia para a ação, prevê, dá uma direção política e pedagógica
para o trabalho escolar, formula metas, institui procedimentos e instrumen­
tos de ação. A gestão põe em prática o processo organizacional para atender
ao projeto, de modo que este é um instrumento da gestão.

Por que a expressão projeto pedagógico-curricular'. O termo pedagógico é re­


postas à humanização (emancipação humana) num determinado contex­
to histórico-social, contexto esse sempre em transformação.
• Formula objetivos e implementa as condições organizativas e metodoló­
gicas para a viabilização da atividade educativa.
Trata-se, portanto, de entender a pedagogia como prática cultural, forma de
trabalho cultural, que envolve uma prática intencional de produção e intemali-
zaçáo de significados. E esse caráter de mediação cultural da Pedagogia que faz
viabilizar várias modalidades e formas institucionais de educação, entre elas a
educação escolar. Também daí decorrem as várias projeções das opções políti-
co-pedagógicas em planos ou projetos nacionais, regionais, locais, que, por sua
vez, expressam intenções e ações logo materializadas nos currículos. Essas são
as ideias-chave que esclarecem o caráter “pedagógico” de um projeto.
O termo curricular indica o referencial concreto da proposta pedagógica, o
currículo, uma vez que este é a projeção, o desdobramento, do projeto peda­
gógico. O currículo, no dizer de Gimeno Sacristan (1998), é a concretização
da posição da escola face à cultura produzida pela sociedade. Ou como diz
Stenhouse (apud Pedra, 1997), o currículo comunica princípios essenciais de
uma proposta educativa, aberta a um exame crítico para que possa ser traduzida
na prática. Há muitas definições do termo currículo: conjunto de disciplinas
de um curso, resultados buscados na aprendizagem, experiências que devem ser
providas aos estudantes, princípios orientadores da prática, seleção e organiza­
ção da cultura. Adotar uma ou várias delas dependerá de opção entre as muitas
teorias em voga. Hoje é bastante aceita a ideia de que currículo é, além da
seleção da cultura produzida pela sociedade, uma ambientação para vivenciar
experiências culturais. Ou mais precisamente, “um modo pelo qual a cultura
é representada e reproduzida no cotidiano das instituições escolares” (Pedra,
1997, p. 38). A definição seguinte sintetiza a noção de currículo que nos parece
As decisões a serem tomadas em função do projeto pedagógico-curricular
podem considerar, ao menos, os seguintes pontos:

a) Princípios (pontos de partida comuns): é desejável que os professores e espe­


cialistas formem um consenso mínimo em torno de opções sociais, políti­
cas e pedagógicas, do papel da escola na sociedade, do papel do professor
e dos alunos, dos conteúdos e métodos.

b) Objetivos (pontos de chegada comuns): os objetivos expressam intenções


bem concretas. Aqui entra a importância do diagnóstico, que é um retrato
realista da situação, dos problemas, das demandas a atender no mundo de
hoje em função das necessidades pessoais, sociais, profissionais, dos alu­
nos. Depois segue-se a tomada de decisões, escolha de prioridades, o que
se atacará em conjunto com toda a equipe, o que é de responsabilidade de
cada professor.

c) Sistema e práticas de gestão negociadas: a participação na gestão demo­


crática implica decisões sobre as formas de organização e de gestão.
E preciso que a direção e os professores entrem em acordo sobre as
práticas de gestão. Por exemplo, define-se que as decisões são toma­
das coletivamente, que todos entrem em acordo sobre elas a partir de
um consenso mínimo. Entretanto, uma vez tomadas as decisões, cada
membro assume sua parte no trabalho, admitindo o exercício da di­
reção para coordenar, acompanhar e avaliar o trabalho de cada um. A
decisão é coletiva, mas implica responsabilidades.

d) Unidade teórico-metodológica no trabalho pedagógico-didático: a uni­


dade teórico-metodológica começa pela definição de objetivos comuns e é
assegurada pela coordenação pedagógica e pelo trabalho conjunto e articu­
lado dos professores. E desejável que a escola tenha uma linha pedagógico-

1 -50
rendimento escolar dos alunos, cumprimento de prazos,presença dos
pais na escola etc.) e qualitativa (grau de atendimento das necessidades e
expectativas, nível de satisfação dos alunos e das famílias,evidências de
comportamento dos alunos etc.).

A importância do projeto na
organização e gestão da escola
Consideremos, inicialmente, os vários entendimentos sobre a noção de
projeto. Em estudos especializados, o projeto está incluído na noção mais
ampla de planejamento. O planejamento seria o processo à previsão de
objetivos, metas, ações, procedimentos como forma de racionalização da
ação. O plano seria o documento mais abrangente que resultado processo
de planejamento, por sua vez subdividido em programas. Os programas ex­
plicitariam uma linha de ações globais e cada programa seria detalhado em
projetos. Esse entendimento vigorou durante anos, no Brasil,tm sucessivos
governos. Carvalho (1979, p. 38) um conhecido especialista em teoria do
planejamento, faz uma distinção clara entre esses termos.

O planejamento é um processo sistematizado, sendo o plano,


o programa e o projeto documentos. (...) O plano difatdo
projeto essenciabnente no que se refere à a amplitude do objeto.
Enquanto o plano procura reunir um conjunto de elemmlos
de decisão necessários para concretizar raciona!mente a um-
o projeto pedagógico, o currículo também realimenta e modifica o projeto
pedagógico. Supõe-se, portanto, uma estreita articulação entre o projeto pe­
dagógico e a proposta curricular, de modo a promover um entrecruzamento
dos objetivos e estratégias para o ensino formulados a partir de necessida­
des e exigências da sociedade e do aluno com base em critérios filosóficos,
políticos, culturais, pedagógicos, com as experiências educacionais a serem
providas aos alunos por meio do currículo.

As decisões a serem tomadas em função do projeto pedagógico-curricular


podem considerar, ao menos, os seguintes pontos:

a) Princípios (pontos de partida comuns): é desejável que os professores e espe­


cialistas formem um consenso mínimo em torno de opções sociais, políti­
cas e pedagógicas, do papel da escola na sociedade, do papel do professor
e dos alunos, dos conteúdos e métodos.

b) Objetivos (pontos de chegada comuns): os objetivos expressam intenções


bem concretas. Aqui entra a importância do diagnóstico, queé um retrato
realista da situação, dos problemas, das demandas a atender no mundo de
hoje em função das necessidades pessoais, sociais, profissionais, dos alu­
nos. Depois segue-se a tomada de decisões, escolha de prioridades, o que
se atacará em conjunto com toda a equipe, o que é de responsabilidade de
cada professor.
ganrzaçao e oestao aa nscola — leoria e Prática

-didática com a qual todos possam compartilhar, ainda que ela expresse
princípios e orientações mais gerais. Este é, também, um requisito para a
escola trabalhar com a interdisciplinaridade.

e) Sistema explícito e transparente de acompanhamento e avaliação do


projeto e das atividades da escola: o acompanhamento e a avaliação
põem em evidência os êxitos, os resultados, mas também as dificuldades
surgidas na implantação e execução dos planos, confrontando o que foi
decidido e o que está sendo feito. A avaliação depende de informações
concretas e objetivas, o que supõe o acompanhamento. Nenhum mem­
bro da equipe escolar deveria estranhar uma cobrança de trabalho feita
pelo diretor se esse trabalho foi decidido coletivamente. A avaliação da
organização e da gestão escolar pode ser quantitativa (matrículas/evasão,
rendimento escolar dos alunos, cumprimento de prazos, presença dos
pais na escola etc.) e qualitativa (grau de atendimento das necessidades e
expectativas, nível de satisfação dos alunos e das famílias, evidências de
comportamento dos alunos etc.).

A importância do projeto na
organização e gestão da escola

Consideremos, inicialmente, os vários entendimentos sobre a noção de


projeto. Em estudos especializados, o projeto está incluído na noção mais
ampla de planejamento. O planejamento seria o processo de previsão de
objetivos, metas, ações, procedimentos como forma de racionalização da
ação. O plano seria o documento mais abrangente que resulta do processo
de planejamento, por sua vez subdividido em programas. Os programas ex­
sob o mesmo título.

Desse entendimento do processo de planejamento, podem resultar para


as escolas várias concepções de planejamento escolar:
° Se as escolas forem consideradas unidades administrativas dentro do pla­
nejamento geral do Ministério da Educação ou da Secretaria da Educa­
ção, elas seriam a última instância do processo de planejamento, por­
tanto, cada escola configuraria um projeto, todavia, dentro da estrutura
hierárquica do sistema.
° Se as escolas forem consideradas unidades relativamente autônomas, elas
poderíam realizar em si mesmas todas as características de um processo de
planejamento: teriam o plano, os programas e os projetos.
0 Ainda consideradas como relativamente autônomas, as escolas poderíam
configurar-se como um projeto sem, todavia, manter uma excessiva depen­
dência das instâncias do sistema escolar (considere-se que sempre haverá
uma certa subordinação às políticas educacionais e curriculares do sistema).
Observe-se que essas situações refletem diferentes percepções das formas
de gestão e direção. Também indicam diferentes modelos operacionais já que
as escolas poderíam trabalhar, ora com uma dependência maior ou menor da
hierarquia do sistema escolar, ora com diferentes graus de complexidade (ter
um plano global, programas e projetos específicos), ora fazendo um plano e
alguns projetos específicos, ora simplesmente um projeto.
A escolha de uma dessas alternativas envolve uma gama de considerações
que não podem ser esgotadas apenas em um capítulo. Limitamo-nos a co­
mentar, resumidamente, as tendências atuais sobre o assunto e a apresentar
uma solução que, a nosso ver, é mais compatível com a realidade educacional
brasileira, qual seja, a adoção da prática do projeto pedagógico-curricular,
em interação crítica com as orientações dos sistemas de ensino.

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professores e demais educadores na responsabilidade em assumir um papel
na organização do trabalho escolar não apenas na sala de aula, mas na escola
como um todo. É desse esforço que pode resultar a participação do conjunto
dos membros da escola, a corresponsabilização pelas ações de ensino e apren­
dizagem e um bom projeto pedagógico. Resulta, também, no estabelecimen­
to de vínculos mais estreitos com a comunidade. A autonomia propicia aos
professores mais liberdade para travar relações com a comunidade local e
fazer outras parcerias. Tomando-se a gestão e a autonomia nesse sentido, a
organização escolar transforma-se em espaço educativo, em lugar onde todos
podem aprender permanentemente.
Aceita essa justificativa, a ideia de projeto pedagógico ganha força, já que
ele é, precisamente, a forma de concretizar as intenções e as expectativas da
equipe escolar. O projeto surge como forma de superação de um paradigma
técnico (ou tecnicista) em que tudo o que a escola e os professores precisam
fazer já vem estabelecido de cima. O projeto, numa perspectiva progressista,
é o meio pelo qual os agentes diretos da escola tornam-se sujeitos históricos,
isto é, sujeitos capazes de intervir conscientemente e coletivamente nos obje­
tivos e nas práticas de sua escola, na produção social do futuro da escola, da
comunidade, da sociedade.

Pode-se dizer, então, que o projeto representa a oportunidade de a di­


reção, a coordenação pedagógica, os professores e a comunidade, tomarem
sua escola nas mãos, definir seu papel estratégico na educação das crianças e
jovens, organizar suas ações, visando a atingir os objetivos que se propõem.
É o ordenador, o norteador da vida escolar.
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Para isso, é preciso prever e antecipar ações, organizando as formas de


intervenção e atuação numa realidade que, pela sua natureza, é mutável.
Isso significa que o projeto é ao mesmo tempo um desejo, uma utopia, e
uma concretização. Melhor dizendo, o projeto incorpora a utopia mas sua
característica é organizar a ação, por isso precisa ser sempre operacional. O
projeto sintetiza:

° O que temos.

• O que desejamos.

• O que faremos em função do que desejamos.

• Como saber se o que estamos fazendo corresponde ao que desejamos.

0 projeto pedagógico assim entendido, é um ingrediente do potencialforma-


tivo das situações de trabalho. Os profissionais (direção, coordenação pedagógica,
professores, funcionários) aprendem através da organização, do ambiente de tra­
balho. Por sua vez, as organizações também aprendem, mudando junto com seus
profissionais. Todos podemos aprender a fazer do exercício do trabalho um objeto
de reflexão e pesquisa. Os indivíduos e os grupos mudam mudando o próprio
contexto em que trabalham, conforme escrevem Amiguinho e Canário (1994).

Como se denomina esse projeto? Projeto educativo, projeto pedagógico,


— icuna c rratica

O processo de elaboração do projeto


pedagógico-cumcular
Conforme vimos mencionando, o projeto concretiza o processo de plane­
jamento, de modo que “fazer planejamento” é ir percorrendo as várias fases
de elaboração do projeto. Não há uma única maneira de elaborar o projeto
pedagógico-curricular porque cada escola, cada situação, têm sua diversida­
de, sua singularidade, seu modo de planejar. Todavia, podem ser indicados
alguns princípios e algumas formas de operacionalização, conforme apresen­
tamos no Capítulo 13.

O documento Parâmetros Curriculares Nacionais (1998), do Ministério da


Educação, estipula quatro níveis de concretização do planejamento escolar. O
primeiro nível corresponde à proposição de subsídios para a discussão e ela­
boração de propostas curriculares nos diferentes estados e municípios, que é o
conteúdo dos próprios Parâmetros Curriculares. O segundo nível é a utilização
dos PCN para as propostas das secretarias de educação nos estados e municí­
pios “como recursos para revisões, adaptações ou elaborações curriculares” de
modo que possam dialogar com as propostas e experiências já existentes. O
terceiro nível refere-se ao uso dos PCN na elaboração do projeto educativo da
escola, em que os professores e equipe escolar discutem e definem objetivos,
conteúdos, abordagens metodológicas e critérios de avaliação para cada ciclo.
O quarto nível é a realização do currículo na sala de aula, em que o professor
compatibiliza seu plano de ensino conforme as metas estabelecidas na fase an­
terior e às características de seu grupo específico de alunos.

Para isso, os PCN propõem:


esquemático, formulado por uma comissão de pedagogos e professores. Este
esboço prévio tem a finalidade de deslanchar o processo e mobilizar as pes­
soas para a discussão pública e elaboração do projeto. A partir desses tópicos
gerais, são distribuídas as responsabilidades das subcomissões para coleta de
dados, análise, identificação de problemas e prioridades, estabelecimento de
metas e atividades etc.

A fase seguinte pode ser a elaboração de um documento gerador, mais


detalhado, também elaborado por uma comissão, a ser estudado previa­
mente por toda a equipe de trabalho e depois discutido e aprovado. Re-
comenda-se que a discussão vá caminhando para um consenso em torno
de pontos que possam ser compartilhados por todos, sem necessidade de
votação. Finalmente, elabora-se e aprova-se o documento final. Uma co­
missão de acompanhamento e avaliação do projeto reunir-se-á periodica­
mente para verificar o cumprimento das metas, a correspondência entre os
resultados e os objetivos previstos, identificar necessidades e problemas e
sugerir soluções.

Os seguintes tópicos compõem a sugestão de um roteiro para formulação


do projeto pedagógico-curricular:

1. Contextualização e caracterização da escola:

1.1 Aspectos sociais, econômicos, culturais, geográficos.

1.2 Condições físicas e materiais.

1.3 Caracterização dos elementos humanos.

1.4 Breve história da escola (como surgiu, como vem funcionando, ad­
ministração, gestão, participação dos professores, visão que os alunos
têm da escola, pais, escola e comunidade).

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5. Estrutura de organização e gestão:

5.1 Aspectos organizacionais.

5-2 Aspectos administrativos.

5.3 Aspectos financeiros.

6. Proposta curricular:

6.1 Fundamentos sociológicos, psicológicos, culturais, epistemológicos,


pedagógicos.

6.2 Organização curricular (da escola, das séries ou ciclos, plano de en­
sino da disciplina): objetivos, conteúdos, desenvolvimento metodo­
lógico, avaliação da aprendizagem.

7. Proposta de formação continuada de professores.

8. Proposta de trabalho com pais, comunidade e outras escolas de uma


mesma área geográfica.

9. Formas de avaliação do projeto.


É apresentada, a seguir, a descrição do conteúdo de cada tópico:

° Contextualização e caracterização da escola: este tópico visa caracterizar o


contexto econômico e sociocultural em que a escola está inserida, descre­
ver os aspectos humanos, físicos e materiais. Estas informações são suma­
mente relevantes para o projeto, a fim de avaliar as condições existentes,
as necessidades da comunidade, a origem social e cultural dos alunos etc.

° Concepção de educação e de práticas escolares: a finalidade deste tópico é


apresentar uma síntese do “pensamento” da equipe de professores e pe­
dagogos sobre educação e currículo, com base nas exigências e necessi­
dades sociais e nas suas próprias crenças, valores, significados. O projeto
pedagógico-curricular reflete expectativas da sociedade e dos próprios
educadores sobre o significado de “aluno educado” e para que tipo de
sociedade se educa.

• Diagnóstico e análise dos problemas e necessidades: essa fase corresponde à ca­


racterização socioeconômica e cultural do contexto da ação escolar. O dia­
gnóstico, realizado a partir do levantamento de dados, visa analisar eexplicar
a situação, articulando o problema e suas causas internas e externas.
O diagnóstico terá a extensão que se julgar mais conveniente. Todavia, se
a escola nunca fez um diagnóstico completo, é bom que o faça uma primeira
vez e o refaça dc tempos em tempos. Nesse caso, cabe uma caracterização so­
cioeconômica, cultural, jurídica, das condições físicas e materiais, do pessoal
ganrzaçao e vrestao aa Jtsscola — leoria e Prática

Há vários meios de se fazer o diagnóstico e o levantamento de proble­


mas: observações, entrevistas, aplicação de questionários, coleta de opiniões
em situação grupai.

8 Objetivos gerais: nesta fase são propostas as metas mais amplas que se
deseja alcançar, deixando os objetivos específicos para o tópico referente
à proposta curricular. Após o levantamento de muitas idéias, de vários
caminhos, procede-se à seleção dos objetivos ou metas. E óbvio que sele­
ção depende de condições reais como espaço físico, custo, capacidade da
equipe de profissionais, tempo e outras.

8 Estrutura organizacional: refere-se à descrição da estrutura de funciona­


mento e dos meios de organização e gestão, responsabilidades, formas
de dinamizar o processo de gestão, tal como descreveremos nos capítulos
seguintes.

• A proposta curricular: este tópico do projeto destina-se, especificamente,


à definição da atuação da escola nos processos de ensino e aprendizagem,
através do currículo. A proposta curricular inclui a organização curricular
propriamente dita e a organização pedagógico-didática. Pela importância
deste item no projeto pedagógico-curricular, será detalhado à parte em
tópico específico.

• Avaliação do projeto: a avaliação será processual somativa, incluindo a coleta


de dados, a análise dos resultados, a redefinição permanente de objetivos e
meios. “A avaliação deverá fornecer os dados necessários para intervir no
sentido de corrigir a coerência (relação entre o projeto e o problema), a
eficiência (gestão e administração dos recursos e meios) e eficácia (relação
curricular, apresentamos algumas idéias sobre o conceito de currículo.

O termo currículo possui vários sentidos. Etimologicamente, significa


“ato de correr, percurso” (do verbo latino currere = correr). Quando elabo­
ramos um curriculum vitae, apresentamos nossa “carreira da vida”, nosso
“percurso de vida”. No linguajar comum ainda predomina a ideia de currí­
culo como o conjunto das disciplinas que o aluno deve percorrer, ou seja,
o plano de estudos ou a grade curricular, a fim de obter uma titulação, um
diploma. Significados mais ampliados do termo surgem no início do século
XX, identificando quase sempre o conjunto de saberes e/ou experiências
que alunos precisam adquirir e/ou vivenciar em função de sua formação.
Desde o início dos anos 70, os estudos sobre currículo tiveram um desen­
volvimento considerável, especialmente na Inglaterra e nos Estados Unidos,
originando-se daí novas tendências teóricas que, superando as anteriores
concepções positivistas, introduziram referências de cunho crítico para a
investigação do currículo. Algumas dessas teorias trouxeram contribuições
decisivas para a compreensão do papel ideológico e político do currículo,
por tentarem esclarecer a seguinte tese de Basil Bernstein:

A maneira pela qual uma sociedade seleciona, classifica, dis­


tribui, transmite e avalia os saberes educacionais destinados
ao ensino, reflete a distribuição do poder em seu interior e a
maneira pela qual se encontra aí assegurado o controle social
dos comportamentos individuais, (apudPedra, 1997, p. 50)

Essa afirmação expressa, de fato, intenções e práticas sociais que estão por
detrás dos currículos. Isso, todavia, não nos impede de compreendê-los como
seleção de saberes e experiências, acompanhados de sua comunicação na esco­
la, seleção essa feita a partir do que a sociedade julga necessário ser incorpora-
(Pedra, 1997, p. 58)

O currículo é a ligação entre a cultura e a sociedade exterior


à escola e à educação; entre o conhecimento e cultura her­
dados e a aprendizagem dos alunos; entre a teoria (idéias,
suposições e aspirações) e a prática possível, dadas determi­
nadas condições. (Gimeno Sacristán, 1989, p. 22)

A primeira definição destaca a ideia de que o currículo se sustenta em


representações sociais presentes na cultura na qual se dá a teoria e a prática
do currículo. Representações, aqui, entendidas como idéias, conhecimentos,
modos de agir, que devem ser reproduzidos e produzidos para se assegurar o
funcionamento de um tipo de sociedade.

A segunda mostra que o currículo é a concretização do posicionamento


da escola em face da cultura produzida pela sociedade. Existe ensino porque
existe uma cultura, eo currículo é aseleção e organização dessa cultura. Para
Gimeno, o papel social da escola se realiza por meio do currículo. Ou seja,
o currículo representa a seleção e organização da cultura. Quando os profes­
sores e a equipe escolar planejam o currículo, eles realizam uma escolha para
responder a estas indagações: o que nossos alunos precisam aprender, para
que aprender, em função de que aprender? Há aí uma espécie de diálogo com
a sociedade e entre a própria equipe de professores, sobre o que é relevante
que os alunos aprendam em função de suas necessidades pessoais e das ne­
cessidades e exigências de interesses em jogo na sociedade.
Em síntese, o currículo reflete intenções (objetivos) e ações (conhecimen­
tos, procedimentos, valores, formas de gestão, de avaliação etc.), tornadas re­
alidade pelo trabalho dos professores e sob determinadas condições providas
pela organização escolar, rendo em vista a melhor qualidade do processo de
ensino e aprendizagem. (Carvalho e Diogo, 1994)

Níveis de currículo - currículo formal, currículo real,


currículo oculto

Os estudos sobre currículo realizados a partir das décadas 1960-70 desta­


cam a existência nas escolas de vários níveis de currículo: formal, real, oculto.
A distinção entre esses vários níveis de currículo serve para mostrar que o
que os alunos aprendem na escola ou o que deixam de aprender, depende
de muitos fatores e não apenas das disciplinas previstas na grade curricular.
Explicitamos, a seguir, as características desses vários níveis.

• Currículo formal: refere-se ao currículo estabelecido pelos sistemas de en­


sino ou instituição educacional. É o currículo legal expresso em diretrizes
curriculares, objetivos e conteúdos das áreas ou disciplinas de estudo. O
currículo formal ou oficial é aquele conjunto de diretrizes normativas
prescritas institucionalmente, como, por exemplo, os Parâmetros Curri­
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0 Currículo oculto: essa denominação refere-se àquelas influências que afe­


tam a aprendizagem dos alunos e o trabalho dos professores provenientes
da experiência cultural, dos valores e significados trazidos pelas pessoas
de seu meio social e vivenciados na própria escola, ou seja, das práticas e
experiências compartilhadas na escola e na sala de aula. O currículo oculto
representa tudo o que os alunos aprendem pela convivência espontânea
em meio às várias práticas, atitudes, comportamentos, gestos, percepções,
que vigoram no meio social e escolar. 0 currículo está “oculto” porque ele
não é prescrito, não aparece no planejamento, embora se constitua como
importante fator de aprendizagem.

Esses vários sentidos aparecem de alguma forma na prática escolar, cru-


zando-se entre si. Primeiramente, é razoável supor que o currículo tem sem­
pre uma dimensão externa, ou seja, ele segue uma sequência que começa
quase sempre na esfera política e administrativa do sistema escolar, passa
pelas crenças, significados, valores, comportamentos existentes na cultura, é
retrabalhado pelos professores, até chegar aos alunos. Isso significa que ele
está impregnado de influências sociais, econômicas, políticas, que precisam
ser detectadas pelos professores, inclusive para que compreendam que essas
influências limitam o poder de intervenção da escola.

Em segundo lugar, o currículo é submetido a transformações pelos pro­


fessores e alunos (currículo real), de forma que ele tanto pode expressar a
autonomia da escola, o desejo dos professores e da equipe escolar, os ob­
jetivos dos integrantes da escola, quanto diferentes interpretações, ênfases
e, até, distorções de conteúdo, em relação às ciências que dão origem às
matérias escolares. O currículo real obriga a escola a considerar a cultura
nas disciplinas. O currículo é o conjunto dos vários tipos de aprendizagens,
aquelas exigidas pelo processo de escolarização, mas também aqueles valo­
res, comportamentos, atitudes que se adquirem nas vivências cotidianas na
comunidade, na interação entre professores, alunos, funcionários, nos jogos
e no recreio e outras atividades concretas que acontecem na escola que deno­
minamos ora de currículo real ora de currículo oculto.

Concepções de organização curricular


Apresentamos, sinteticamente, algumas concepções mais conhecidas de
organização curricular que expressam formas de concretização das intenções
pedagógicas.

1) Currículo tradicional: o currículo tradicional é o mais utilizado e suas


características mais visíveis são conhecidas: organização do conhecimen­
to por disciplinas compartimentalizadas, caráter livresco e verbalista, en­
sino meramente transmissivo, centrado no professor e na matéria, escola
como responsável pelo ajustamento social dos alunos sem preocupação
com uma visão critica da sociedade. O papel do aluno, na maior parte
das correntes pedagógicas tradicionais, é o de armazenador de informa­
ções. Importam mais frequentemente os produtos da aprendizagem, não
os processos, razão pela qual a avaliação somativa tem grande peso. O
professor é o detentor da autoridade intelectual e moral (mesmo que não
as tenha), o aluno um receptor de conhecimentos. Os alunos são tidos
quase sempre como imaturos, incapazes de refazerem seu próprio percur­
so de aprendizagem. Ignoram-se as diferenças individuais. O currículo é
reduzido a um conjunto de disciplinas e de conteúdos a serem “passados”
aos alunos, organizados numa “grade curricular”.

2) Currículo racional-tecnológico (tecnicista): é o currículo propos­


to para a transmissão de conteúdos e desenvolvimento de habilida­
tem sido denominada, também, de tecnicismo educacional, identificando
ensino com métodos e tecnologia educativa, liberado de qualquer consi­
deração em torno de finalidades, valores etc. Atualmente, uma derivação
dessa concepção é o currículo por competências, em que a organização
curricular resulta de objetivos assentados em habilidades e destrezas a se­
rem dominados pelos alunos no percurso de formação. A crítica que se faz
a esse tipo de currículo é a sua definição muito estreita de competência,
apenas restrita ao saber-fazer, sem acentuar os saberes, as atitudes e os
processos cognitivos.
3) Currículo escolanovista (ou progressivista): o enfoque escolanovista
coincide quase sempre com a ideia de currículo centrado no aluno e no
provimento de experiências de aprendizagem como forma de ligara esco­
la com a vida e adaptar os alunos ao meio. Daí a ênfase nas necessidades
e interesses dos alunos, na atividade, no ritmo de cada um. 0 professor é
o facilitador da aprendizagem, o conteúdo vem das experiências dos alu­
nos. Identificado com as idéias de John Dewey, esse modelo de currículo
compreende a educação como um processo interno de desenvolvimento,
de contínua adequação ao meio, colocando os conteúdos escolares como
instrumentos para o desenvolvimento de processos mentais, náo como
verdades estabelecidas. Por isso, os conteúdos são subordinados às neces­
sidades e interesses dos alunos no seu processo de adaptação ao meio, va-
loriza-se bastante a atividade de pesquisa do aluno e o clima psicológico
e social da escola e da sala de aula.
4) Currículo construtivista: no Brasil, o currículo construtivista está dire­
tamente associado à influência de Jean Piaget e seguidores. Umas das
ideias-chave do construtivismo é a crença no papel ativo do sujeito no
processo de aprendizagem e, portanto, no desenvolvimento dos pro­
cessos de aprendizagem ativa, derivando-se daí consequências para a
organização curricular. O currículo deve prever atividades que corres­
pondam ao nível de desenvolvimento intelectual dos alunos e organi­
zar situações que estimulem suas capacidades cognitivas e sociais, de
modo a possibilitar a construção pessoal dos conhecimentos. O pro­
fessor tem o papel justamente de organizador e facilitador da apren­
dizagem visando a assegurar a interação do aluno com os objetos de
conhecimento. Nas concepções fundamentadas em Piaget, recai um
peso maior na aprendizagem subordinada ao processo de desenvol­
vimento cognitivo, valorizando mais a construção do conhecimen­
to pelo próprio aluno do que a influência da cultura e do professor.
Atualmente, o construtivismo tem influenciado as chamadas ciências
da cognição (entre elas a neurofisiologia, a linguística, a neurociências, a in­
teligência artificial), que alguns autores chamam de neocognitivismo. Seu
objetivo é buscar novos modelos e referências para avançar na investigação
sobre os processos psicológicos e a cognição. A partir da psicolinguística,
da teoria da comunicação e da cibernética (ciência dos computadores),
surgem duas versões: (a) Psicologia cognitiva que estuda diretamente o
gjCii nz^ciydU v. vjCSldü Ud ISòCUlcL 1C01 lei C l^lcltlCR

lizadas de algo socialmente constituído. A maior parte dos educadores


que trabalham com esta posição, a conhecem como sociointeracionismo,
justamente porque destaca o papel do meio, isto é, postula a origem
social das funções mentais superiores, bem como do outro, da cultura,
do professor, dos colegas. Isso significa admitir um papel essencial do
ensino na promoção do desenvolvimento cognitivo e social dos alunos.
Por isso, essa posição é também denominada concepção sociocultural ou
sócio-histórica, diretamente associada ao currículo sociocrítico.

5) Currículo sociocrítico (ou histórico-social): a abordagem sociocrí-


tica possui várias correntes, às vezes divergentes entre si, algumas dão
mais ênfase às questões políticas do processo de formação, outras co­
locam a relação pedagógica como mediação da formação política.
Neste segundo caso, a educação cobre a função de transmissão cultu­
ral mas também é responsável pela ajuda ao aluno no desenvolvimen­
to de suas próprias capacidades de aprender e na sua inserção crítica
e participativa na sociedade em função da formação da cidadania.
As abordagens críticas convergem na concepção de ensino como
compreensão da realidade para transformá-la, visando a construção de
novas relações sociais, de modo a eliminar as mazelas sociais existentes
como a pobreza, a violência, o desemprego, a destruição do meio am­
biente, enfim, as desigualdades sociais e econômicas. Em razão disso,
considera especialmente os efeitos do currículo oculto e do contexto da
ação educativa nos processos de ensino e aprendizagem, inclusive para
submeter os conteúdos a uma análise ideológica e política. Metodolo-
gicamente, adere à ideia da aprendizagem como construção do sujeito,
da compreensão do conhecimento como ligado à prática e à solução de
comunicação entre as disciplinas escolares. São duas as idéias norteado-
ras desse modelo curricular: (a) buscar a integração de conhecimentos e
experiências que facilitem uma compreensão mais reflexiva e crítica da
realidade; (b) ressaltar, ao lado dos conteúdos culturais, o domínio dos
processos necessários ao acesso aos conhecimentos e, simultaneamente, a
compreensão de como se produzem, se elaboram e se transformam esses
conhecimentos, ou seja, o aprender a aprender. (Torres Santomé, 1998)
Para se chegar a esses objetivos, o currículo globalizado articula várias
práticas educativas que possam contribuir para os processos de ensino e
aprendizagem, superando os reducionismos psicológicos, epistemológicos
ou sociológicos. Na prática curricular, adota-se o currículo experiencial,
pelo qual a escola torna-se um espaço de reconstrução, pelos alunos, das
experiências e conhecimentos próprios de sua comunidade, mediante o mé­
todo de projetos. Com essa orientação, pretende-se que, no currículo em
ação, se preste atenção a tudo o que acontece na escola e nas aulas, inclusive
naquilo que não foi previsto pelos professores, no currículo oculto, nas vá­
rias experiências de aprendizagem tipo biblioteca, visitas, vídeos, laborató­
rios. Incorpora-se, também, neste modelo, o valor daatividade do próprio
sujeito na aprendizagem, a ligação dos conteúdos culturais com a realida­
de, a vivência cultural dos alunos, a seleção de experiências de aprendiza­
gem verdadeiramente interessantes, a importância dos processos mentais
na aprendizagem (observação, comunicação, análise, síntese, classificação,
tomada de decisões, comparação etc.), a interdisciplinaridade. A ênfase aos
processos não significa minimizar a importância dos conceitos, das teorias,
dos conteúdos culturais.

7) Currículo como “produção cultural”: a Sociologia Crítica da Educação


também acentua os fatores sociais e culturais na construção do conhe­
cimento, lidando com temas como cultura, ideologia, currículo oculto,
linguagem, poder, multiculturalismo (Moreira & Silva, 1994). Os auto-

1 /1Q
A cultura é vista como terreno de produção cultural e de política cultural.
Na visão da Sociologia Crítica não há urna cultura unitária, homogênea; a
cultura é um terreno conflitante onde enfrentam-se diferentes concepções de
vida social. O currículo, nesse sentido, não tem a ver com a organização de
matérias cujo conteúdo deve ser absorvido, mas a um terreno de luta e con­
testação, em que se criará e produzirá cultura. No âmbito, ainda, da esfera
cultural, destaca-se o tema da diversidade cultural e da diferença, em que se
inscrevem novos movimentos sociais e novos sujeitos sociais que afirmam
sua identidade: crianças, mulheres, negros, homossexuais e outros. Quando
se pensa um currículo, é preciso começar captando as “significações” que
estes sujeitos fazem de si mesmos e dos outros através da experiência com­
partilhada de vivências. Na prática, o discurso da diferença e da pluralidade
. constitui o tema do multiculturalismo, de uma educação e um currículo
multicultural. Na esfera dos sistemas de ensino, leva a políticas de integração
de minorias sociais, étnicas e culturais ao processo de escolarização. Na esfera
da escola e do currículo, ao acolhimento da diversidade, das diferenças, à
diversificação da cultura escolar, a um currículo multicultural. Está claro que
se propõe uma transição da ênfase no social para o cultural. E bem ilustrativa
a declaração de Giroux (1994, p. 145 e 146):

“(...) é imperioso que se criem métodos de análise que não par­


tam do pressuposto de que as experiências vividas podem ser
automaticamente inferidas a partir de determinações estrutu­
rais. (...) Uma política cultural requer o desenvolvimento de
uma pedagogia atenta às histórias, aos sonhos e às experiências
que os alunos trazem à escola (...) começando por essasformas
subjetivas, os educadores poderão desenvolver uma linguagem
e um conjunto de práticas que confirmem, acolham e desafiem
formas contraditórias de capital cultural”.

Essa perspectiva da Sociologia Crítica denuncia o papel da escola como


reprodução da estrutura social, sustenta a importância da ação dos sujeitos e
as possibilidades de um currículo critico centrado na cultura dos oprimidos.
Entretanto, não parece facilitar muito as coisas para os professores. Na verdade,
o viés sociológico faz desvincular o trabalho docente de preocupações mais
pontuais com questões de aprendizagem, desenvolvimento, processos cogniti­
vos. Ao criticar a psicologia comportamental e a cognitiva por estarem dema­
siadamente voltadas para questões mais imediatas e mais metodológicas des­
cuidando da ênfase na analise das relações de poder, da ideologia, da cultura,
a sociologia crítica também descarta os aportes da didática e da psicologia no
processo de ensino e aprendizagem. E certo que o currículo é espaço de produ­
ção de cultura, é luta. Mas não vejo como dispensar as mediações cognitivas, o
desenvolvimento de processos cognitivos internos, progresso na leitura critica
da realidade propiciado pelo conhecimento científico. Ao se perguntar sobre
igamz.aij.du c vrcstao aa Escola — lèoria e Prática

que os professores precisam compreender as formas pelas quais o conheci­


mento escolar se constitui e em que grau as relações sociais na sala de aula
estão impregnadas de relações de poder. Mas, daí, como se realiza o trabalho
efetivo de ensino? Qual é a contribuição desses autores sobre as condições de
provimento de melhores situações de aprendizagens, de recursos eficazes de
promoção de aprendizagens mais sólidas e duradouras pelos alunos?

Tipos de currículo

Os tipos ou modelos de currículo decorrem das concepções e posicio­


namentos teóricos sobre conhecimento e ensino, o papel da educação e do
ensino na sociedade e para os indivíduos, o que se busca com o currículo, a
relação do currículo com a prática. Dessa forma, o formato do currículo tra­
dicional corresponde melhor à ideia de plano de estudos, isto é, um conjunto
de disciplinas a serem estudadas pelos alunos ao longo das séries escolares.
0 currículo tecnicista gera um formato de currículo baseado na tecnologia
de elaboração e de aplicação de programas curriculares: como selecionar e
organizar objetivos e experiências de aprendizagem, quais técnicas devem
utilizadas pelos professores, quais materiais de ensino e instrumentos de ava­
liação são mais eficazes. 0 currículo numa perspectiva cognitiva acentua o
desenvolvimento das capacidades cognitivas, das estratégias de aprendizagem,
acentuando mais o “como” do que o “o quê”, ou seja, as disciplinas aparecem
apenas como valor instrumental para a aprendizagem das habilidades cogniti­
vas. O currículo sociocrítico, como também o integrado, atribuem importân­
cia à prática, tanto no sentido de a prática ser a referência para a elaboração e
desenvolvimento curricular como no sentido de entender a prática curricular
de cunho cognitivo e social. Interdisciplinaridade é um procedimento de
organização da escola e do ensino que favorece a integração de aprendizagens
ede saberes e a busca de saberes úteis para lidar com questões e problemas
da realidade (levar o aluno a confrontar-se com a realidade, como cidadão).
0 resultado prático da interdisciplinaridade é o estabelecimento de ligações
de complementaridade entre as matérias escolares, de modo que os conhe­
cimentos, procedimentos, atitudes, sejam integrados na estrutura mental do
aluno. Alguns princípios da interdisciplinaridade são:

0 Ter como referência o sujeito que aprende e sua relação com o saber.
• Suscitar e garantir processos integradores e a apropriação de saberes en­
quanto produtos cognitivos dos alunos (implica a organização de saberes
sob o ponto de vista curricular, didático e pedagógico).
• Estabelecer ligações entre teoria e prática.
’ Estabelecer ligações entre pontos de vista distintos acerca de um objeto
de conhecimento.

° Fazer o caminho entre a especialização disciplinar e a integração interdis-


ciplinar e vice-versa.

Alguns princípios orientadores da proposta curricular

Se a organização curricular expressa os objetivos e estratégias de ação do


projeto pedagógico-curricular, torna-se relevante considerar alguns prin­
cípios na construção de um currículo de cunho sociocrítico. Os tópicos
que apresentamos não cobrem o conjunto dos fatores e exigências de um
currículo sensível aos problemas da nossa época, apenas indicam algumas
idéias a serem consideradas.
humana tanto para os indivíduos quanto para o conjunto da sociedade sendo,
portanto, um caminho para a igualdade e a inclusão social. Aprender a cultura,
a ciência e a arte através de um ensino que forme sujeitos pensantes e críticos
não é nada muito mais do que a sempre proclamada formação geral que, ao
mesmo tempo que possibilita a internalizaçâo de um conteúdo significativo
e útil, proporciona também as ferramentas mentais para lidar praticamente
com os conceitos nas situações concretas da vida cotidiana, do trabalho e do
exercício da cidadania. Essa tarefa deve ser concretizada nas escolas e nas salas
de aula, pondo-se em prática o lema: uma escolaridade igual para sujeitos di­
ferentes em uma escola comum (Gimeno Sacristán, 2000). Ao mesmo tempo
que se propicia uma cultura geral comum, busca-se incorporar no currículo os
interesses de todos os alunos em sua diversidade tanto no âmbito psicológico
quanto no âmbito social e cultural.

2) A escoiarizaçáo obrigatória requer criteriosa seleção de conteúdos e adoção


de adequadas práticas pedagógicas, conforme uma pedagogia diferenciada.

Não há que se alimentar ilusões, as escolas têm uma responsabilidade


concreta e real: propiciar a assimilação e a reconstrução dos conteúdos esco­
lares e, através deles, os processos de desenvolvimento das capacidades cog­
nitivas e operativas. Este é um dever de justiça social. O termo “conteúdos”
refere-se aos conhecimentos sistematizados, selecionados das bases das ciências
e dos modos de ação acumulados pela experiência social da humanidade e
organizados para serem ensinados na escola; são habilidades e hábitos, vin­
culados aos conhecimentos, incluindo métodos e procedimentos de apren­
dizagem e de estudo; são atitudes, convicções, valores, envolvendo modos de
agir, de sentir e de enfrentar o mundo. Além disso, supõe-se uma pedagogia
diferenciada em que, a partir da diversificação de metodologias e procedi­
mentos, cada aluno sinta-se valorizado e respeitado em sua subjetividade, em
quaisquer situações de aprendizagem e de convivência social.

3) O currículo escolar representa o cruzamento de culturas, constituindo-se num


espaço de síntese em que a cultura elaborada se articula com os conhecimen­
tos e experiências concretas dos alunos vividas no seu meio social, com a cul­
tura dos meios de comunicação, da cidade e de suas práticas sociais.

Os objetivos de formação cultural e de desenvolvimento curricular pre­


cisam considerar hoje a nova configuração econômica e política e as novas
realidades sociais e culturais do mundo contemporâneo. Isso significa pro­
piciar aos alunos conhecimentos e experiências diversificadas, integrando no
currículo a variedade de culturas que perpassa a escola: a cultura científica,
a cultura acadêmica expressa no currículo, a cultura social, a cultura dos
alunos, a cultura das mídias, a cultura da escola (organizacional). Trata-se de
compreender a escola como lugar de síntese entre a cultura formal, sistema­
tizada, e a cultura experienciada que acontece na família, na rua, na cidade,
nas mídias e outros contextos culturais, o que implica formular coletivamen­
te formas pedagógico-didáticas de assegurar essa articulação.

4) O processo de ensino e aprendizagem deverá estar centrado no ensino


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5) A organização e desenvolvimento do currículo implica a inserção da edu­


cação moral — compreensão e clarificação de valores e atitudes.

A equipe escolar precisa incluir na definição e na discussão pública da


proposta curricular a educação para os valores, mediante formulação explíci­
ta de conteúdos e competências e de formas metodológicas que suscitem nas
salas de aula o “pensar” sobre valores e práticas morais. O currículo em ação,
quanto ao tema da dimensão moral do ensino, significa pôr em prática não
apenas as competências do pensar sobre valores, nas várias disciplinas, mas
levando a escola, os professores, os alunos a praticá-los em contextos e situ­
ações concretas. Nesse sentido, há de se considerar formas criativas de lidar
com os temas transversais propostos nos Parâmetros Curriculares Nacionais.
Mas o trabalho com valores liga-se, também, com a cultura da escola.

Certamente, a todo momento, a escola, os professores, o ambiente, pas­


sam valores, como parte do chamado currículo oculto. Mas é justamente por
isso que o grupo de professores e especialistas de uma escola precisa explicitar
princípios norteadores para a vida prática decorrentes de um consenso mí­
nimo, a partir da busca de sentidos de sua própria experiência e da cultura
organizacional que vivenciam na escola. Não se trata, obviamente, de incul-
car valores, de doutrinação política ou religiosa, mas de propiciar aos alunos
estratégias e procedimentos de pensar sobre valores e critérios orientadores
sobre modos de decidir e agir. (Libâneo, 2000, p. 45)

6) As transformações em curso na esfera econômica, cultural e educacional


estão requerendo um vínculo mais estreito entre os saberes propiciados
pela escola e as capacidades e competências internalizadas pelos alunos
que expressam a relação entre conhecimento e ação.
do projeto pedagógico-curricular e as capacidades e competências desejadas,
definem-se os objetivos e conteúdos da disciplina e as possibilidades de ar­
ticulação com as demais disciplinas de uma mesma série de modo a atender
os objetivos, capacidades e competências definidos pelo conjunto dos pro­
fessores. A interdisciplinaridade como forma de compreensão do processo
de construção do conhecimento é ao mesmo tempo uma atitude — diálogo
entre vários especialistas, permuta de experiências e conhecimentos, produ­
ção conjunta de conhecimentos; uma forma de organização administrativa
e pedagógica — elaboração coletiva do projeto pedagógico e participação na
gestão da escola; uma prática curricular- construção conjunta de uma pro­
posta curricular baseada na integração entre as disciplinas e envolvimento
em projetos comuns de desenvolvimento do currículo.

8) A escola voltada para uma sociedade que inclua todos precisa considerar a
diversidade cultural e as diferenças, de modo a representar num currículo
comum os interesses de todos os alunos.

0 provimento da cultura escolar aos alunos e a constituição de um espa­


ço democrático na organização escolar devem incluir a interculturalidade: o
respeito e valorização da diversidade cultural e das diferentes origens sociais
dos alunos, o combate ao racismo e a outros tipos de discriminação e pre­
conceito. O currículo intercultural é o que, a partir de uma base comum de
cultura geral para todos, acolhe a diversidade e a experiência particular dos
diferentes grupos de alunos e que propicia, na escola e dentro das salas de
aula, um espaço de diálogo e comunicação entre grupos sociais diversos. Um
dos mais relevantes objetivos democráticos no ensino será fazer da escola um
lugar em que todos os alunos possam experimentar sua própria forma de
realização e sucesso.
democrática.

A cultura hoje não passa somente pelo ler, escrever efazer con­
tas. Passa pelo conhecimento teórico-prático, conhecimento e
uso de novos instrumentos deprodução e comunicação entre os
homens. Epreciso dar instrução, sim, mas como instrumento
concreto de conhecimento, de capacidade operativa, produti­
va, e de capacidade cognoscitiva. (Manacorda, 1986. p. 60)

Portanto, a qualidade social da escola se manifesta na garantia da qualida­


de cognitiva e operativa das aprendizagens para a produção de saberes, para
o que se mobiliza o currículo, a gestão e o desenvolvimento profissional dos
professores.

10) O currículo escolar deve propiciar no processo educativo a articulação


entre as dimensões cognitiva, social e afetiva da aprendizagem.

Essas dimensões estão presentes no comportamento dos sujeitos que


aprendem, mas no desenvolvimento do currículo e das práticas de ensino é
preciso especial atenção para o fato de que os alunos são sujeitos concretos,
condicionados por culturas particulares da sua origem social, portadores de
saberes decorrentes de suas experiências vividas. Isso implica em conhecere
compreender motivações, interesses, necessidades de alunos diferentes entre
si, ajudá-los na capacidade de comunicação com o mundo do outro, ter sen­
sibilidade para situar a relação docente no contexto físico, social e cultural.
Implica, também, mobilizar procedimentos, técnicas, meios, de tornar as ex­
periências de sala de aula mais agradáveis, mais prazerosas, que possibilitem
aos professores conversar mais com alunos, deixá-los falar, expor seus senti­
mentos, seus desejos, de forma organizada. A busca da articulação entre o
cognitivo, o social e o afetivo possibilita compreender o papel da escola e da
equipe docente em ajudar os alunos a construírem sua subjetividade como
pessoas humanas e como sujeitos portadores de uma identidade cultural e
pertencentes à humanidade.

11) E necessário um incessante investimento no desenvolvimento pessoal e


profissional dos professores, seja propiciando-se, na escola, um clima de
trabalho receptivo seja promovendo ações de formação continuada.

A busca de condições de exercício da profissão aponta para a necessidade


de as escolas assegurarem um ambiente de trabalho em que as pessoas se
sintam bem e que possam crescer pessoal e profissionalmente. A elaboração
e desenvolvimento do currículo é um exercício de reflexão coletiva sobre a
prática, o que implica a reordenação de formas de organização do trabalho
na direção de relações sociais interativas e solidárias, mas não basta a partici­
pação. A par disso, é indispensável que o desenvolvimento do currículo esteja
vinculado ao desenvolvimento profissional dos professores. No terreno da
cultura e da ciência, ninguém dá o que não tem. Professor que não se cultiva,
que não está seguro ao menos no campo de conhecimento em que se especia­
xeuna c natica

isso, precisa prover oportunidades em que os alunos possam exercer a democra­


cia mediante formas de participação, capacitação para tomar iniciativas, discus­
são publica de pontos de vista, processos organizados de tomada de decisões.

O processo de elaboração da proposta curricular

No projeto pedagógico-curricular são formulados, de forma mais abran­


gente, os objetivos gerais, expressando intenções e expectativas sobre a for­
mação dos alunos. A proposta curricular, propriamente dita, concretiza essas
grandes linhas em objetivos, competências, conteúdos, métodos e formas
organizativas do ensino, por áreas curriculares ou disciplinas, tendo em vista
os resultados da aprendizagem.

A elaboração da proposta curricular supõe dois momentos articulados


entre si: a proposta curricular formulada pela escola e os planos de ensino
dos professores.

A proposta curricular da escola implica decisões conjuntas dos professores,


para o que se requer:

1) Conhecimento e análise critica das orientações normativas do sistema


nacional de ensino e das diretrizes estaduais ou municipais (LDB e nor­
mas legais regionais), para definir a proposta curricular da escola: Qual
modelo curricular adotar? Quais objetivos e conteúdos? Quais os crité­
rios de seleção e organização dos conteúdos?
2) Explicitação dos princípios norteadores de formação expressando expec­
tativas em relação à formação esperada (perfil) dos alunos, considerado o
5) Explicitação de formas de participação dos alunos no planejamento do
currículo e nas instâncias de organização e gestão, incluindo a inserção
deles nos processos de tomada de decisão.

6) Concepções e procedimentos de avaliação da escola, do currículo, dos


professores e da aprendizagem dos alunos.

Tais “intenções” devem ser expressas, de preferência, em linhas gerais,


de modo que os professores possam tomar decisões mais pontuais em suas
próprias disciplinas e no âmbito das séries. Convém, ainda, considerar que
é sumamente imprescindível que a elaboração do currículo leve em conta
a situação concreta de cada escola, da cultura organizacional, da cultura
local. A legislação e as orientações oficiais são legítimas, mas as escolas pre­
cisam desenvolver uma interação crítica com os dispositivos normativos.
Trata-se de promover a reflexão crítica sobre esses dispositivos, cotejando-
-os com os contextos particulares em que são aplicados, de modo a conferir
sua relevância frente a necessidades e demandas concretas da escola e aos
significados, expectativas e sentimentos compartilhados pelo grupo social
que constitui a escola.

Osplanos de ensino são elaborados pelos professores, em consonância com


a proposta curricular da escola. Algumas recomendações:

1) O plano de ensino compreende os objetivos, os conteúdos, as competên­


cias, o desenvolvimento metodológico, a avaliação.

2) O plano deve conter uma justificativa do papel da disciplina no currícu­


lo de formação geral, explicitação das interfaces com outras disciplinas,
compatibilização com a proposta curricular da escola e os objetivos ter­
minais por série.
ta curricular e dos planos de ensino. Há quem critique esse termo e sua utili­
zação nas escolas devido à sua semelhança com os chamados “objetivos com-
portamentais”, adotados no Brasil com base na teoria behaviorista aplicada
ao ensino, teoria essa que recebeu a denominação de tecnicismo educacional.
A crítica refere-se a um excesso de quantificação na definição e detalhamento
de objetivos operacionais, em função de certa obsessão pela objetividade e
eficiência.

Hoje não há mais lugar para a quantificação de objetivos de ensino, mas


objetivos continuam sendo imprescindíveis, porque o processo pedagógico-
-didático que movimenta o currículo implica intencionalidade. Sendo o en­
sino uma prática intencional e supondo-se que os professores precisam saber
se seus objetivos estão sendo atingidos, é preciso que explicitem o que espe­
ram conseguir da aprendizagem dos alunos. Os objetivos esclarecem o que
se pretende fazer, constituindo-se em guia para a ação da escola e da equipe
de professores. E justamente aqui que aparecem as competências. Há vários
sentidos de competência e o mais conhecido está ligado a uma visão econo-
micista segundo a qual a busca da produtividade econômica requer pessoas
competentes, isto é, pessoas tecnicamente eficientes. O sentido que assumi­
mos aqui é outro: competência refere-se à mobilização de recursos cogniti­
vos (saberes, procedimentos, técnicas, atitudes) para enfrentar situações refe­
rentes a conhecimentos aprendidos (Perrenoud, 2000a). Ou seja, a questão
aqui é a da relação significativa e operativa que o aluno estabelece com os
conteúdos. Segundo Perrenoud, é falso o dilema sobre se é mais importante
a aquisição de conhecimentos ou o desenvolvimento de competências, por­
que as competências estão apoiadas em conhecimentos e numa variedade de
outros recursos cognitivos. As competências, portanto, utilizam, integram
ou mobilizam conhecimentos, ou seja, ter competência é saber mobilizar
recursos cognitivos diante de um problema, um dilema, uma atividade prá­
tica. Compreendidas nesses termos, as competências são compatíveis com
uma teoria sociointeracionista em que o ensino impulsiona as capacidades
cognitivas dos alunos de modo a mobilizar formas de apropriação e utiliza­
ção de conteúdos.

Nesse sentido, formular competências a serem dominadas pelos alunos no


final de uma série ou ciclo escolar não é muito diferente de definir objetivos em
termos de práticas observáveis. Todavia, diferentemente dos antigos “objetivos
comportamentais”, as competências expressam metas claras comunicáveis aos
estudantes, representam uma transferência de conhecimentos e uma capacida­
de para lidar com situações complexas ou não previstas. No plano de ensino,
pode-se entender que os objetivos de ensino referem-se a uma explicitação
mais geral daquela fórmula conhecida dos professores: “O aluno deverá ser ca­
paz de...”; as competências, por sua vez, referem-se ao detalhamento de ações,
habilidades, modos de fazer, em relação aos conhecimentos teóricos e práticos
correspondentes.
^tgaiiiz-dçau c vjcstao da tscola — Teoria e Prática

todos os brasileiros. Este é o princípio que justifica o dever social e ético do


governo em oferecer subsídios para um currículo básico comum e propiciar
os suportes financeiros, operacionais e técnicos necessários ao atendimento
universal da demanda por escolarização. Um currículo básico comum repre­
senta um benefício para a democratização do acesso e permanência na escola,
consideradas a heterogeneidade social e cultural e as disparidades econômi­
cas do país, bem como as condições de aprendizagem das crianças e jovens
que se apresentam desiguais conforme cada contexto social.

Obviamente, está-se considerando que os PCN são, de fato, parâmetros,


isto é, oferecem orientações pedagógicas e curriculares gerais, enquanto subsí­
dios aos professores para refletirem e tomarem decisões, em nível local, sobre
objetivos e conteúdos, formas metodológicas de atuação docente. Além dis­
so, não se pode acreditar que tais subsídios curriculares sejam suficientes para
elevar o nível de qualidade da educação escolar. Uma coisa é a letra do docu­
mento, outra são as práticas de aprendizagem na sala de aula que precisam ser
consideradas em relação a outros fatores como o salário, a carreira docente, as
condições de trabalho, o reconhecimento social da profissão de professor.

Os PCN sâo, pois, uma referência, um ponto de partida, para que se pos­
sa articular objetivos e conteúdos com a cultura das escolas e das salas de aula
envolvendo tudo o que um documento geral como este não pode nem deve
prever: a diversidade regional, as decisões do professor, a dinâmica das inte­
rações na sala de aula, o currículo oculto, a adequação local de conteúdos, o
significado social dos conteúdos, as práticas de avaliação, os desenvolvimen­
tos metodológicos etc. Cabe, portanto, aos sistemas de ensino, aos coordena­
dores pedagógicos, orientadores educacionais e responsáveis por sistemas de
comunidade escolar num momento em que o ensino fundamental torna-se
crucial na capacidade de aprender e do provimento dos instrumentos básicos
de pensamento.

Os PCN e a organização curricular


Os Parâmetros Curriculares Nacionais definem a organização curricular
considerando a especificidade das áreas e disciplinas dentro de um todo inte­
grado e a organização da escolaridade por ciclos.

A organização do conhecimento escolar em áreas, os respectivos conteú­


dos e o tratamento transversal de questões sociais constituem os elementos
básicos da organização curricular, integrando conhecimentos de diferentes
disciplinas. Diz o documento:

A concepção da área evidencia a natureza dos conteúdos tra­


tados, definindo claramente o corpo de conhecimentos e o ob­
jeto de aprendizagem, favorecendo aos alunos a construção
de representações sobre o que estudam. Essa caracterização
da área é importante também para que os professores possam
se situar dentro de um conjunto definido e conceitualizado
de conhecimentos que pretendam que seus alunos aprendam,
condição necessária para proceder a encaminhamentos que
auxiliem as aprendizagens com sucesso.

Os temas transversais referem-se a questões que interferem na vida dos alu­


nos e com as quais se veem confrontados no seu dia a dia. São apresentados
como temas transversais: ética, saúde, meio ambiente, orientação sexual e plu­
ralidade cultural. Em algumas escolas, as temáticas sociais já vinham sendo
Amazônia ou na periferia das grandes cidades.

A organização em ciclos é uma tentativa de superar a segmentação exces­


siva produzida pelo regime seriado e minimizar a ocorrência da repetência e
da evasão escolar. A flexibilização daseriação permitiría trabalhar o currículo
ao longo de um período de tempo maior, respeitando-se os diferentes rirmos
de aprendizagem dos alunos.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais estão organizados em ciclos de


dois anos. O primeiro ciclo se refere à primeira e à segunda séries; o segundo
ciclo, à terceira e à quarta séries; e assim subsequentemente para as outras
quatro séries. O documento alerta que a estruturação por ciclos não contem­
pla os principais problemas da escolaridade no ensino fundamental como a
ruptura entre a quarta e quinta séries, início tardio da escoiarizaçáo, entre
outros. Trata-se de uma das possíveis estratégias de intervenção na problemá­
tica educacional do país, necessitando de ações cautelosas para sua adoção.

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