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Tomás de Aquino e os argumentos para provar a

existência de Deus (ou sobre as cinco vias)

Frank Wyllys Cabral Lira1

Resumo

A Suma Teológica é possivelmente a obra mais famosa e estudada do filósofo Santo


Tomás de Aquino. Entretanto, na questão dois do primeiro livro (no início da Prima
Pars para ser mais exato) temos como título para o capítulo a seguinte pergunta:
Deus existe? Para não somente responder o capítulo como tentar responder a
pergunta que o filósofo nos apresenta “cinco vias” para provar a existência de Deus.
Portanto, este trabalho dará foco a apresentação e explanação dessas cinco vias
argumentativas.

Palavras-chave: Santo Tomás de Aquino, argumentos, cinco vias, Deus.

Chegando as cinco vias


Antes mesmo de apresentar e explanar os argumentos do Santo Tomás de
Aquino para provar a existência de Deus, será feito uma rápida menção a sua história
de vida e a obra na qual está presente tais argumentos. Filho do conde Landolfo de
Aquino e de Teodora, Tomás nasceu no castelo de Aquino, em Roccasecca, entre o
ano de 1224/1225. De 1230 a 1239 é educado na abadia de Monte Cassino. De 1239 à
1244 ele estuda Artes Liberais na Universidade de Nápoles. Em 1244, Tomás entra
para à ordem mendicante dos frades dominicanos de Nápoles (mesmo a família
sendo contra essa entrada). Vai para Paris para fazer seu noviciado na Universidade
de Paris, tendo como mestre Alberto Magno e recebendo sua ordenação sacerdotal

1
Licenciando do curso de filosofia na Universidade Federal do Amazonas (UFAM).
entre 1250/1251. Inicia a escrita da Suma Teológica em 1268, terminando-a em
12732.

A Suma teológica é a sua obra mais conhecida e utilizada. O título de cada


capítulo é um questionamento, sendo desenvolvido nele mesmo a resposta para esse.
Toda a sua obra segue uma minuciosa estrutura argumentativa devido a influência de
Aristóteles no pensamento do filósofo – e isso será facilmente percebido quando
explanarmos as cinco vias argumentativas de Tomás. A Suma se dividirá em três
grandes partes – pois é assim que a obra é habitualmente apresentada: Prima Pars,
Secunda Pars – a segunda parte se apresenta dividida em mais duas partes e por isso
a Suma contém habitualmente quatro volumes - e Tertia Pars. Os argumentos de
Tomás de Aquino a favor da existência de Deus estão na Prima Pars, pois nela é que
se trata de Deus. Querendo em primeiro lugar tratar Deus segundo o que Ele é em si
mesmo, conseguimos observar na Prima Pars duas subdivisões: o que se relaciona à
essência divina e o que pertence à distinção entre pessoas. Entretanto, devido Deus
ser o princípio e fim de todas as coisas, fala-se igualmente da forma pela qual as
criaturas procedem de Deus. É nesse ponto que entra as cinco vias.

Conhecendo as cinco vias


Segundo o pensamento Tomista abordado na Suma Teológica, o problema
central da filosofia é a de responder os questionamentos sobre Deus – se Ele existe ou
não por exemplo - enquanto que o principal intuito da Doutrina Sagrada é o de
transmitir o conhecimento de Deus. Segundo Tomás, a própria estrutura do ser
humano exige que o conhecimento comece pelos seus sentidos, elevando-se a partir
deles ao mundo suprassensível, a Deus. A Suma Teológica retoma a metafísica
aristotélica através de uma interpretação cristã afim de poder fundamentar as provas
para a existência de Deus.

Por fim, a questão número dois do primeiro livro da Suma trata do seguinte
problema filosófico: Deus existe? Para Tomás de Aquino, sim, mas a existência dEle
não é assim algo evidente a ponto de somente haver feito a apreensão de seu termo

2
CAMPOS, Sávio Laet de Barros. As Provas da Existência de Deus em Tomás de Aquino. P. 10. Disponível em:
http://filosofante.org/filosofante/not_arquivos/pdf/Provas_Existencia_Deus_Tomas_de_Aquino.pdf. Acesso
em: 15 de Fevereiro de 2014.
ou definição para efetivamente saber que existe – e aqui está a crítica de Tomás ao
argumento ontológico. Tomás expõe inicialmente na questão de número dois
argumentos contra a existência de Deus – o primeiro argumento apresentado, por
exemplo, é sobre o problema do mal -, mostrando neles sua falta de cogência.

Entretanto não são somente apresentados argumentos a favor da inexistência


de Deus: para Tomás de Aquino é possível provar a existência de Deus através de
“cinco vias”, cinco argumentos. Todas as cinco vias necessitam de uma causa
transcendente, pois sem tal ela não poderia existir. São essas vias, no final, formas de
chegar a um único lugar - pois o efeito existe, portanto, deve existir uma causa. Uma
única prova – que no caso é Deus - fundamentada por cinco caminhos diferentes.

As cinco vias são as seguintes:

1. Via do movimento/primeiro motor (fundamenta-se na constatação de


que no universo existe movimento);
2. Via da causa eficiente (diz respeito à ideia de causa geral);
3. Via do contingente e do necessário (refere-se aos conceitos de
necessidade e possibilidade);
4. Via dos graus de perfeição (é de índole platônica e baseia-se nos graus
hierárquicos de perfeição observados nas coisas);
5. Via do governo das coisas/da finalidade ser (fundamenta-se na ordem
das coisas).

Via do movimento/primeiro motor

A primeira via fala de um fato do mundo: o movimento. Conseguimos


facilmente perceber o movimento das coisas através de nossos sentidos.
Proposicionalmente falando3, a primeira via pode ser assim apresentada:

(1) No mundo, algumas coisas são movidas.


(2) Tudo o que é movido é movido por outro.
(3) Não se pode preceder até ao infinito nos moventes e movidos.
(4) Logo, é necessário um primeiro motor, que é Deus.

3
Farei a partir de agora a apresentação de todas as cinco vias através da lógica proposicional, pois além da
facilidade em observar o argumento de forma completa e enxuta, fica mais fácil referenciar determinada parte
dele apenas fazendo menção ao número associado a determinada premissa/conclusão durante o texto.
Primeiro, consideremos aqui movimento toda e qualquer transformação,
mutação ou mudança. Conseguimos perceber no mundo o movimento de algumas
coisas (1), sendo esta premissa facilmente constatável pela nossa sensibilidade. Com
relação a premissa seguinte será necessário apresentar duas palavras: potência e ato.
Para Tomás de Aquino a palavra potência significa aquilo que é movido ou aquilo que
recebe o movimento. Ato significa aquilo que move ou que inicia o movimento. O que
está sendo movido está sempre em potência para o movente, enquanto que o movente
está sempre em ato para o movido (2) – ou seja: o ato antecede a potência assim
como o movente antecede o movido. Devido a essa relação ato-potência, não é
possível fazer uma regressão ao infinito entre moventes e movidos (3) porque nunca
acharemos o primeiro movente (e como a relação ato-potência se dá através de ações
em cadeia, nada seria movido). Logo, devido constatarmos através de nossa
sensibilidade a relação ato-potência no mundo, é preciso admitirmos um primeiro
motor, que é Deus.

Via da causa eficiente

Na segunda via é defendida a existência de uma causa primeira para conseguir


explicar a cadeia de causas que acontecem no mundo. Proposicionalmente falando, a
segunda via pode ser assim apresentada:

(1) No mundo todas as coisas têm uma causa eficiente.


(2) Nada pode ser a causa eficiente de si mesmo.
(3) Não é possível que se proceda até o infinito nas causas eficientes.
(4) Logo, existe uma causa primeira eficiente, que é Deus.

Causa eficiente tem por definição algo produzir outro algo – e no mundo
conseguimos observar uma ordem de causas eficientes e seus efeitos como bem
aponta a premissa (1). E se o último algo produzir um terceiro algo e assim o ciclo
continuar sucessivamente, assim teremos uma ordem de causas eficientes. Se, por
exemplo, X produz Y, X é a causa eficiente de Y. Y não pode ser a causa eficiente de si
mesmo, mas apenas efeito de uma causa eficiente (2) – que no caso é X. Portanto,
como observamos os efeitos, fazer um regresso ao infinito para chegar a causa
eficiente primeira torna-se impossível, pois assim como na primeira via, caso não
assumíssemos uma causa eficiente primeira, não haveria qualquer efeito posterior
(3). Por fim, se existem efeitos no mundo, é preciso que exista uma causa eficiente
primeira, sendo ela Deus (4).

Via do contingente e do necessário

Na terceira via é defendida a existência de um ser necessário na qual


dependem todos os seres contingentes. Proposicionalmente falando, a terceira via
pode ser assim apresentada:

(1) No mundo, há coisas contingentes que existem mas poderiam não existir.
(2) Mas é preciso que algo seja necessário entre as coisas.
(3) Não é possível que se proceda ao infinito nas coisas necessárias.
(4) Logo, existe um primeiro necessário, que é Deus.

No mundo podemos constatar as coisas contingentes, pois elas poderiam ser


ou não ser/existir ou não existir. Computadores por exemplo não existiam no
passado, mas agora existem. O ser humano pode facilmente estar dentro da categoria
dos contingentes: uma hora existimos e numa outra hora não mais (1). Se toda sorte
de coisa é contingente, então em algum momento essas deixarão de existir. Devido ao
absurdo dessa consideração, é preciso de alguma coisa que seja necessária para dar
origem aos contingentes (2). Entretanto, regredir ao infinito nas coisas necessárias é
impossível, pois será preciso um necessário por si que seja a causa de outros
necessários (3). Essa primeira coisa necessária causadora de outras coisas é Deus (4).

Via dos graus de perfeição

A quarta via fala sobre a existência de um ser máximo na qual todos os seres
presentes no mundo participam no mesmo com Ele em diferentes graus de perfeição.
Proposicionalmente falando, a quarta via pode ser assim apresentada:

(1) No mundo, as coisas têm diferentes graus de perfeição.


(2) Os graus de perfeição atribuem-se em relação à proximidade do grau
máximo.
(3) O grau máximo de um gênero é a causa de todas as coisas desse gênero.
(4) Logo, há algo que é a causa da existência para todas as coisas, que é Deus.

É facilmente observável que, no mundo, as coisas que chegam a nosso


entendimento através de nossos sentidos contêm determinado grau de perfeição –
seja esse grau para mais ou para menos e segundo também nosso julgamento diante
de tais coisas (1). Estando esses graus presentes desde os objetos mais comuns até os
sentimentos mais obscuros ou nobres, julgamos sobre tais grais de tais coisas tendo
como referência alguma coisa de grau máximo (2). Mas esses graus máximos que
temos como referência para determinada coisa é o que da existência de todos do seu
gênero (3). Ainda mais: se para cada coisa existente existe um grau máximo,
portanto, deve existir um Ser que contém todos os atributos e coisas possíveis em
seus graus de perfeição no máximo – e que seria geradora de todas as coisas em grau
de perfeição menos (4). Esse Ser é Deus.

Não somente Deus pode ter algo em seu grau de perfeição máximo como todo
e qualquer ser pode assim ter esse grau máximo, bastando participar da Suma
Perfeição. Ou seja: uma coisa ou ser somente consegue chegar a seu grau máximo de
perfeição caso participe da perfeição do Ser mais perfeito – pois Deus é fonte de toda
coisa ou ser, transcendendo a ordem natural do mundo devido a sua perfeição.

Via do governo das coisas/da finalidade do ser

Na quinta e última via Tomás de Aquino argumenta sobre a existência de


arquiteto inteligente que governa, coordena ou dá uma finalidade a todas as coisas no
mundo. Proposicionalmente falando, a quinta via pode ser assim apresentada:

(1) No mundo, algumas coisas operam por causa de um fim.


(2) Estas coisas não atingem o fim por acaso.
(3) Estas coisas não tendem para um fim a não ser que estejam sendo dirigidas
por algo inteligente.
(4) Logo, existe algo inteligente, que é Deus, que dirige as coisas a um fim.

Tomás aqui faz referência a finalidade das coisas do mundo. Existem certas
coisas que não tem inteligência e que, regidas pelas leis da natureza, são ordenadas e
contém a finalidade certa (1). Assim como a flecha, em sua finalidade única, é
direcionada para seu alvo pelo arqueiro, as coisas não recebem uma finalidade
arbitrária (2). Devido ao tamanho e a diversidade de coisas presentes no mundo, não
é possível observar a harmonia e ordem do mundo e a finalidade específica presente
em cada coisa carente de inteligência - ou até mesmo não a contendo - sem pensar na
possibilidade de haver uma inteligência por trás de tudo (3). Como existem essas
coisas ou seres de pouca ou nenhuma inteligência realizando seus atos com finalidade
específica e de forma harmoniosa com o outro que preenche o mundo, deve haver sim
um ser inteligente que governa, coordena e atribui as devidas finalidades a esses. Por
fim, o Ser inteligente é Deus (4).

Complementando as cinco vias


Ressalto aqui que, reunindo as informações presentes nas cinco vias, podemos
montar um singelo quadro onde comparamos Deus e suas Criaturas – pois como ele é
o início e fim de todas as coisas, também devemos perceber como as criaturas voltam-
se para Ele:

Deus Criaturas

Ser necessário Ser contingente

Ato puro Ato e potência


(transformação)

Imutável Mutável

Infinito Finito

Causa de sua própria Sua existência depende de


existência algo externo

Sua Essência é Existência Ser que possui existência


(concreto) e possui uma
essência (abstrato)

Com essa leitura explanada dos cinco argumentos propostos por Tomás de
Aquino para provar a existência de Deus – e assim cumprindo com o problema
central da filosofia que segundo o filósofo deve se assegurar de resolver os
questionamentos sobre Ele -, fica nítida a influência que Aristóteles exerceu através
de seus escritos nesse filósofo medieval - principalmente na parte metafísica e lógica.
Contribuindo com a tradição medieval de conciliar a fé com a razão, Tomás de
Aquino abre mais uma porta para aqueles que desejam chegar a Deus (pois a
primeira teve origem em Santo Agostinho através da ontologia, valendo observar a
influência que Platão teve neste). É observável também a influência do uso da
empiria, pois, diferente do acesso a Deus por via da gnosiologia inata, temos Tomás
de Aquino fazendo uso da empiria de Aristóteles. Ou seja: é no mundo que vemos as
provas da existência de Deus, pois todas as vias partem de uma realidade verificável e
concreta, tendo Tomás suas racionais demonstrações a posteriori. Perceba que Tomás
de Aquino não pretendeu dizer o que era Deus, mas apenas provar sua existência.

Porém, alguns pontos importantes antecedem as cinco vias. Fazer perceber


todo uma gama de conclusões e raciocínios que nos levam a provar a existência de
Deus na obra de Tomás de Aquino é essencial para um melhor entendimento delas.
Logo, um retorno a coisas anteriores – como o contato de Tomás com a filosofia
aristotélica e o desenvolvimento de parte da sua teoria do conhecimento - será
realizada. Como bem disse Carlos Lopes de Mattos:

Foi sobretudo em Paris que Tomás de Aquino viveu intensamente os


conflitos intelectuais, típicos de sua época, que opunha o conhecimento pela
fé ao conhecimento pela razão, a teologia à filosofia, a crença na revelação
bíblica as investigações dos filósofos gregos.

O papado controlava a organização das universidades e contribuía, para o lado


dos teólogos, o embate existente entre os dialéticos (filósofos) e teólogos. A
prerrogativa era que a igreja considerava a dialética uma ferramenta auxiliar para os
teólogos, devendo estes não ostentá-la. Além disso, um vetor que acentuou mais os
conflitos da época foram as divulgações da tradução da filosofia aristotélica. A
existência de vários conflitos dessa filosofia com os dogmas da igreja levou essa
última a uma censura, porém não bem-sucedida. Entretanto, visando a cristianização
da filosofia aristotélica, ela “[...] só veio a se tornar possível graças ao espírito
analítico, à capacidade de ordenação metódica e à habilidade dialética de Tomás de
Aquino, que aliava a um profundo sentimento de fé cristã” 4.

O começo do trabalho de Tomás pode ser observado na distinção aristotélica


entre essência (O que é um ser?) e existência (Esse ser existe?). A resposta da
primeira pergunta sobre o ser nos leva a busca da definição de sua essência. Todavia,

4
MATTOS, Carlos Lopes de. Sto. Tomás de Aquino, Dante Alighieri (Os pensadores). P. 10. Disponível em
http://copyfight.me/Acervo/livros/AQUINO,%20Tomas%20-%20Dante%20-
%20Colec%CC%A7a%CC%83o%20Os%20Pensadores.pdf. Acesso em: 05 de fevereiro de 2015.
“[...] para Aristóteles, uma definição não implica jamais a existência, lógica
ou empírica, do definido. Assim, em Aristóteles, a distinção entre essência e
existência é puramente conceitual, lógica. Tomás de Aquino, ao contrário,
interpreta aquela distinção como ontológica, real”.

O pulo do gato de Aquino está justamente nessa interpretação. Ele, tendo em


vista o princípio do realismo ontológico, conclui que as criaturas não existem por elas
mesmas. Isso ocorre devida a definição de essência das criaturas, não resultar em sua
existência, restando atribuir a algo ou alguma coisa uma origem e existência. Logo,
apenas Deus contém a identidade entre essência e existência (pois existe por si e é
criador e fundamento de todas as coisas e de suas existências contingentes).

Complementando ao ponto sobre a cristianização desenvolvido anteriormente,


temos ainda um aprofundamento na forma como Tomás de Aquino entende o
conhecer humano. Considerando também a possibilidade por ele levantada para
demonstrar a existência de Deus, temos, como resultado último, as cinco vias. Tais
objetivam uma única coisa: provar a existência de Deus. Partindo de uma exposição
destacado por Sávio Laet de Barros Campos da teoria do conhecimento de São
Tomás, é observável que temos: um conhecimento sensível, um conhecimento
intelectivo e um conhecimento humano de Deus.

Conhecimento Sensível

O conhecimento é originado pelos nossos sentidos. Sabendo que o homem se


eleva através do sensível ao inteligível, nosso saber advindo dos sentidos serve de
base para essa elevação. Vale detalhar que o ser humano nasce sem conhecimento –
sendo desconsiderado todo conhecimento inato de coisas e criaturas -, mas com a
faculdade/potência de conhecer. Aquino pressupõe que os nossos sentidos não nos
enganam, pois é a nossa forma de entrar em contato com o real. E se os mesmos são
enganosos, nosso conhecimento também o é – o senso comum é que está passível de
erro, não os sentidos. Além disso tudo, os nossos sentidos apreendem as qualidades
sensíveis dos objetos, portanto, através dessas qualidades, conseguimos diferenciar
os objetos similares por exemplo ou diferenciar objetos de qualidades similares. Mas
são muitas as qualidades que um objeto tem. Por isso, temos o senso comum, que nos
ajuda a reunir no intelecto essas qualidades e associá-las a um ou mais objetos. Esses
objetos são a imagem da própria coisa e esta é guardada na imaginação.

Conhecimento Intelectivo
Para que haja um conhecimento intelectivo, é necessário a presença de um
corpo e uma alma. Assim, o intelecto deve voltar-se ao sensível para saber, pois só há
saber intelectivo com a presença do sensitivo. Portanto, além de termos uma
faculdade intelectiva, ela nos leva (através das qualidades das matérias do sensível) a
uma universalidade dos objetos. Por isso, o objetivo do nosso intelecto é conhecer a
universalidade e natureza dos objetos sensíveis. Tomás distingue duas funções do
intelecto (devidamente nomeadas):

• Intelecto agente: é “[...] aquele que abstrai da imaginação as qualidades


inteligíveis do objeto”5.
• Intelecto possível: é “[...] aquele que reúne essas qualidades inteligíveis
gerando assim o conceito, ou, a espécie expressa inteligível”6.

Por conseguinte, “[...] o conceito é o meio no qual conhecemos o objeto, pois o


conhecimento do conceito só ocorre por reflexão sobre o próprio ato cognitivo” 7.

Conhecimento Humano de Deus

Nosso conhecimento sobre Deus se dá por duas formas distintas de verdade.


Na primeira, os filósofos ascendem das criaturas a Deus através da razão. O resultado
é determinadas verdades sobre Deus. Na segunda, o caminho se inverte: devido
certas verdades estarem além da nossa capacidade humana, a verdade se toma por
revelada. Por isso os teólogos são os responsáveis por estudar as revelações de Deus.
Devido a teologia conhecer a partir de Deus para as criaturas (ao invés do filósofo,
que parte das criaturas até Deus), Tomás de Aquino a considera mais perfeita como
doutrina e mais próxima da verdade. Portanto, não somente o conhecimento natural
sobre Deus é o ápice do conhecimento humano como também a tarefa/investigação
filosófica tende a saber sobre Deus, tendo sua conclusão no fim último da filosofia
Deus e as suas verdades divinas, como objetos da metafísica. Com relação a esses
caminhos de saber (natural e de fé), eles não se contradizem. Primeiro porque Deus

5
CAMPOS, Sávio Laet de Barros. As Provas da Existência de Deus em Tomás de Aquino. P. 17-18. Disponível em:
http://filosofante.org/filosofante/not_arquivos/pdf/Provas_Existencia_Deus_Tomas_de_Aquino.pdf. Acesso
em: 15 de Fevereiro de 2014.
6
CAMPOS, Sávio Laet de Barros. As Provas da Existência de Deus em Tomás de Aquino. P. 18. Disponível em:
http://filosofante.org/filosofante/not_arquivos/pdf/Provas_Existencia_Deus_Tomas_de_Aquino.pdf. Acesso
em: 15 de Fevereiro de 2014.
7
CAMPOS, Sávio Laet de Barros. As Provas da Existência de Deus em Tomás de Aquino. P. 18. Disponível em:
http://filosofante.org/filosofante/not_arquivos/pdf/Provas_Existencia_Deus_Tomas_de_Aquino.pdf. Acesso
em: 15 de Fevereiro de 2014.
dotou o ser humano de ter em si esses dois. Segundo porque elas também existem em
Deus como sabedoria (e coisas contrárias não podem existir nEle, pois isso atenta a
sua qualidade de perfeição). E a partir disso que Aquino toma como certo a verdade
natural (dos filósofos) concordar com a fé/religião cristã (dos teólogos).

Como a verdade revelada é, não sendo preciso demonstrá-la, sempre se partirá


da posição de que Deus existe (para que a revelação seja válida). Porém, não temos
isso assegurado através de uma verdade natural, onde partimos das criaturas e
ascendemos a Ele. Por isso a importância em provar a existência de Deus, pois
qualquer conteúdo sobre ele, sem o respaldo de sua existência, não terá validade.
Segue-se que a prova da existência de Deus tem que ser feita dentro dos limites do
conhecimento sensitivo. Dele, apreenderemos os efeitos que Deus gera, sendo o
intelecto responsável por ruminar esses e, através da sua busca da natureza e
universalidade, gerar um conceito sobre Deus e suas qualidades.

Para que a proposição “Deus existe” seja provada, será necessário


compreender o que é, para Tomás de Aquino, evidência e demonstração. Evidência é

“[...] o que pode não ser visto. Um objeto evidente é de tal forma manifesto à
inteligência que esta não pode negá-la. Na evidência não há nada para se
demonstrar. A necessidade da demonstração nasce quando uma verdade não
pode ser vista pela inteligência imediatamente. Ora, a manifestação de uma
verdade evidente é tão grande que não pode ser vista pela inteligência”8.

A evidência de algo se dá por duas maneiras: em si mesmo e não para nós e em


si mesmo e para nós. Em ambos os casos temos um sujeito e predicado, mas
enquanto que para o primeiro é evidente por si (pois é instantaneamente entendido
as definições desses elementos), para o segundo não (pois é preciso
explicar/demonstrar algum elemento que não se apresenta auto evidente na
proposição). A proposição “Deus existe” pertence a esse segundo tipo de evidência,
devendo ser demonstrada por raciocínio. Demonstrar é “[...] esclarecer uma verdade
com outra verdade”9. E, para Aquino, São duas formas de demonstração: a primeira
começa da causa e termina no efeito, sendo que a segunda faz isso inversamente. Por

8
CAMPOS, Sávio Laet de Barros. As Provas da Existência de Deus em Tomás de Aquino. P. 22. Disponível em:
http://filosofante.org/filosofante/not_arquivos/pdf/Provas_Existencia_Deus_Tomas_de_Aquino.pdf. Acesso
em: 15 de Fevereiro de 2014.
9
CAMPOS, Sávio Laet de Barros. As Provas da Existência de Deus em Tomás de Aquino. P. 23. Disponível em:
http://filosofante.org/filosofante/not_arquivos/pdf/Provas_Existencia_Deus_Tomas_de_Aquino.pdf. Acesso
em: 15 de Fevereiro de 2014.
fim, para chegarmos a uma prova de que “Deus existe”, será necessário partir dos
efeitos no mundo para chegar na causa (que é Deus). Portanto, a outra forma de
demonstração não é possível para nós, pois tanto não conhecemos a causa como o
elemento de existência (predicado de Deus ou o sujeito Deus) não nos é evidente.
Precisamos provar que a existência pertence a essência divina.

Conclusão
A filosofia tomasiana é rica e vasta. E, nesse artigo, vislumbramos um pouco
dela – mais precisamente na prova da existência de Deus. As cinco vias, que tem por
objetivo apresentar 5 provas relativamente distintas sobre a existência de Deus, são
mais ricas do que a realização de uma leitura direta delas poderia imaginar. Muitos
são os pontos efetivamente demonstrados entre as vias que fazem referência ao
trecho da teoria do conhecimento desenvolvida por Tomás de Aquino. Por fim,
visando não somente apresentar as cinco vias, procurei complementá-las através de
um desenvolvimento minimamente necessário.

Referências
CAMPOS, Sávio Laet de Barros. As Provas da Existência de Deus em Tomás de
Aquino. Disponível em:
http://filosofante.org/filosofante/not_arquivos/pdf/Provas_Existencia_Deus_Toma
s_de_Aquino.pdf. Acesso em: 15 de Fevereiro de 2014.

TORREL, Jean-Pierre. Iniciação a Santo Tomás de Aquino: Sua pessoa e sua obra.
Trad. Luiz Paulo Rouanet. 2ª ed. São Paulo: Edições Loyola, 1999. P. 174-176.

FARIA, Domingos. Deus existe? Cinco argumentos de Tomás de Aquino. Disponível


em: http://blog.domingosfaria.net/2013/01/deus-existe-cinco-argumentos-de-
tomas.html. Acesso em: 15 de Fevereiro de 2014.

MATTOS, Carlos Lopes de. Sto. Tomás de Aquino, Dante Alighieri (Os pensadores).
Disponível em http://copyfight.me/Acervo/livros/AQUINO,%20Tomas%20-
%20Dante%20-%20Colec%CC%A7a%CC%83o%20Os%20Pensadores.pdf. Acesso
em: 05 de Fevereiro de 2015.
NASCIMENTO, Rosemberg do Carmo; ROSA, Jhonatas Tadeu da Costa. A concepção
de Deus na filosofia medieval em São Tomás de Aquino, Santo Anselmo e Santo
Agostinho. Disponível em:
http://pensamentoextemporaneo.wordpress.com/2012/02/08/a-concepcao-de-
deus-na-filosofia-medieval-em-sao-tomas-de-aquino-santo-anselmo-e-santo-
agostinho/. Acesso em: 15 de Fevereiro de 2014.

WIKIPÉDIA. Existência de Deus: As cinco provas de Tomás de Aquino. Disponível


em:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Exist%C3%AAncia_de_Deus#As_cinco_provas_de_To
m.C3.A1s_de_Aquino. Acesso em: 15 de Fevereiro de 2014.

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