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Resumo de “Apologia de Sócrates” por Platão,

traduzido por Maria Lacerda de Souza

Apologia de Sócrates é um livro sobre a defesa do filósofo Sócrates em seu julgamento. O livro foi escrito por Platão, seu discípulo,
uma vez que o próprio Sócrates não deixou nada escrito. Sócrates fora acusado de negar a existência dos deuses da época e de
corromper os jovens. Durante o discurso de defesa, não era permitido ao acusador nenhuma intervenção, a não ser responder
perguntas. Sócrates aproveita-se disto para inquirir seus acusadores, de maneira que fossem obrigados a responde-lo. Para
Sócrates a virtude era conhecimento, e o conhecimento era algo inatingível, daí a famosa frase: "Só sei que nada sei". Sócrates
promovia diversos debates e provocava as pessoas com diversas perguntas; seu objetivo não era irritar ninguém, mas sim fazer
com que as pessoas pensassem sobre o que lhes estava sendo perguntado. Acreditava que dessa maneira as pessoas colocariam
para fora o verdadeiro conhecimento. Muitos jovens gostavam de ouvir Sócrates e começaram a realizar pesquisas eles mesmos.

Os principais acusadores de Sócrates eram: Meleto pelos poetas, Anito pelos artífices e Lícon pelos oradores. Sócrates durante
todo o julgamento é responsável por sua própria defesa, que tem passagens brilhantes como no momento em que ele coloca Meleto
em contradição ao dizer que Sócrates não acredita nos deuses e sua obra é demoníaca, mas como pode ele não acreditar nos
deuses e acreditar nos demônios que também são uma espécie de deuses, por serem filhos bastardos de ninfas e deuses. Seria como
acreditar em coisas humanas, mas não nos homens. Ele recusa-se também a fazer o teatro que era feito pelas pessoas julgadas
naquela época, que levavam os filhos, mães e familiares em geral para apelar ao lado emocional dos juízes. Por fim Sócrates é
considerado culpado e condenado a beber um veneno chamado cicuta. Ele não considera a morte ruim, considera uma libertação
de seus inimigos e de tudo que é ruim na vida. Compara a morte a uma noite de sono sem sonhos, calma e tranquila. Diz também
que se, por outro lado, a morte for o despertar para outra vida, seria igualmente bom, pois ele poderia encontrar pessoas queridas
que já haviam morrido, dentre elas outros condenados injustamente.

A obra é dividida em 3 partes. Na primeira parte, Sócrates faz a sua defesa propriamente
dita das acusações apresentadas pelos seus detratores. Após esta defesa, ocorre a votação e
Sócrates perde. É-lhe dada a oportunidade de sugerir uma pena alternativa e, utilizando-se da
ironia, Sócrates, sugere um benefício estatal, pelo que incita mais ira ainda no meio de seus
inimigos. Não deu certo, pois o tribunal resolveu, ainda assim, condená-lo à morte. A terceira
parte é o discurso de Sócrates após a decisão da pena capital. Neste discurso faz vaticínios e tece
alguns comentários sobre a morte.
Na primeira parte, Sócrates já deixa claro que é inverídica a acusação. Em sua defesa
afirma que sua oratória não consiste em recursos espalhafatosos e sofísticos, mas em falar a
verdade. Este é o mérito do acusado, o do juiz é o de julgar com justeza suas palavras. Sócrates
aponta que as acusações que faziam agora não eram novas. A acusação de não crer nos deuses já
vinha sendo feita desde a época de Aristófanes. Sócrates aponta tais acusações como caluniosas.
Ele passa a mostrar que seu ensino é válido e sua índole pode ser comprovada no fato de
que nunca cobrara para ensinar, ao contrário dos sofistas. Sócrates vai dando curso ao seu
argumento de defesa, apontando possíveis perguntas do tipo: “mas de onde vem tua sabedoria?”
Sócrates afirma que uma pessoa presente sabia que a pitonisa de Delfo afirmou que Sócrates era
de fato o homem mais sábio. Todavia, o próprio Sócrates tentou provar o erro da pitonisa,
procurando homens que o refutassem, mas não os encontrou.
Procurou obter sabedoria entre poetas e artífices, mas Sócrates descortina os erros deles.
Sobre os poetas: “embora digam muitas e belas coisas, não sabem nada daquilo que dizem”.
Sobre os artífices: “pelo fato de exercitar bem a própria arte, cada um pretendia ser
sapientíssimo também nas outras coisas de maior importância, e esse erro obscurecia o seu
saber”.
Sócrates passa a mostrar que um homem pobre como ele não desvirtuaria jovens
voluntariamente. Então, o que sobraria para Sócrates seria fazer o mal involuntariamente. Mas
neste caso, mereceria advertência e não julgamento, mas Meleto não demonstra amor ou
respeito, pois ao invés de advertir Sócrates levou-o ao tribunal.
Meleto cai em contradição dizendo que Sócrates não crê em deus algum e atribuí
palavras a Sócrates que já haviam sido ditas por muitos filósofos. Sócrates ironiza do seu
argumento acusatório e nega a acusação de ateísmo. Meleto diz que o ensino de Sócrates era
demoníaco, mas se alguém crê em ensino demoníaco também deve crer em demônios e se o faz
automaticamente deve crer em deuses, uma vez que os demônios são filhos dos deuses com
ninfas, em um argumento auto refutatório.
Trata ainda do medo da morte, salientando que muitas pessoas desistem de suas missões
pelo medo da represália e da morte. Sócrates não volta atrás em nada de seus ensinos, pois o
importante é ser justo e obedecer a um princípio (julgando que este princípio era uma
obediência ao deus, contra quem não poderia se opor). Utiliza os heróis de Ilíada, Aquiles, como
exemplo de coragem para morrer por seus princípios. Entre o deus e o parecer dos juízes,
Sócrates ficaria com o deus. Sócrates tinha uma missão e não abriria mão dela de forma alguma:
“parece que o deus me designou à cidade com a tarefa de despertar, persuadir e repreender
cada um de vós, por toda parte, durante todo o dia.”
O sacrifício de seu tempo, de sua família e a sua não busca por dinheiro apontam para
um testemunho último da inocência de Sócrates: sua pobreza.
Outra evidência apresentada de sua inocência é ausência de qualquer testemunha
parente de algum jovem que viesse denunciar que havia corrompido seu familiar. Não havia
evidência da perversão dos jovens.
Sócrates termina essa parte não apelando ao emocional, mas convocando os juízes a
fazerem seu julgamento por meio da razão e da análise dos fatos descritos. Sócrates não levou
seus filhos ao tribunal, como muitos faziam. Usar meios escusos e psicoafetivos pela libertação
da morte seria covardia. Deve-se encorar os falsos julgamentos por meio da verdade exposta,
meramente isto.
Nada disto adiantou.
Então Sócrates, passa à segunda parte, onde tem a oportunidade de propor uma pena
alternativa. Parece, porém, que Sócrates de fato desejava morrer e, então, usa de ironia, para
provocar mais ainda a ira de seus juízes.
Eis sua contraproposta dita em paráfrase: “eu que trabalhei a vida toda com afinco em
todos os postos, sem desejar riquezas ou cargos e grandes postos. Sou digno e merecedor de um
bem – nutrição às expensas do Pritaneu. Sou mais merecedor que atletas olímpicos (corridas de
cavalos, bigas, quadrigas). Eles fazem com que vocês se sintam felizes, eu com que vocês sejam
felizes. Eles são ricos e não têm necessidade de subsistência, eu sim.”
Critica a lei ateniense que dispensava um dia apenas para um julgamento capital, ao
contrário de outros povos que tinham um processo mais demorado. Sócrates afirma que se
tivesse mais tempo conseguiria convencê-los de sua inocência porque “não é fácil, em pouco
tempo, destruir grandes calúnias”. Não cede a sugestões de alguns a fim de pagar fiança ou
viver longe da pátria, mas se nega a fazê-lo. Aponta para o erro que os juízes estão cometendo
de condenar um sábio injustamente e afirma que não seria liberto porque não iria adular os
juízes.
Termina a segunda parte com uma sequência de raciocínio acusando não só Meleto,
Anito e Lícon, mas os juízes também: “no entanto, senhores, talvez o difícil não seja isso: fugir
da morte. Bem mais difícil é fugir da maldade, que corre mais veloz que a morte. Neste
momento eu, preguiçoso como sou e velho, fui apanhado pela mais lenta, enquanto os meus
acusadores, válidos e leves, foram apanhados pela mais veloz: a maldade. Assim, eu me vejo
condenado à morte por vós; vós, condenados de verdade, criminosos de improbidade e de
injustiça. Eu estou dentro da minha pena, vós dentro da vossa. Essas coisas, por certo,
devessem acontecer mesmo assim. E creio que cada qual foi tratado adequadamente”.
Na parte III, temos o último discurso de Sócrates, após sua condenação. Ele faz um
vaticínio contra seus acusadores e mostrando sua crença nos deuses, sugere que Zeus faria
vingança contra esta injustiça, matando os acusadores de Sócrates, o que de fato se confirmou
pouco tempo depois. Meleto foi condenado à morte; Anito exilado em Heracleia (onde foi
apedrejado) e Lícon suicidou-se de desespero. Sócrates teve uma estátua erguida em uma praça
de Atenas.
Dirige-se, também, aos que o absolveram e afirma a inocência deles neste julgamento e
os tranquiliza dizendo que sabia estar indo para o lugar certo: a morte. Esta evidência vinha do
sinal dos deuses que sempre o dirigiam, impelindo sua consciência a ir contra algo errado, mas
agora enquanto caminhava para a morte sua consciência estava em paz. No Hades, para onde
iria teria o benefício de conversar com muitas pessoas, inclusive com homens que também
foram julgados injustamente.
Sócrates parte para a morte resoluto, porém, com uma crença de mérito pessoal: “não é
possível haver algum mal para um homem de bem, nem durante sua vida, nem depois de morto;
que os deuses não se desinteressam do que a ele concerne.”
O texto apresenta lições de que a justiça não se vende, é inegociável e a ironia deve ser
aplicada com a finalidade de ensinar os homens.

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